San Peter: A Escola dos Mimimis Amorosos (Vol.1) escrita por Biax


Capítulo 14
Convite




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Quando abri os olhos, me lembrei de um detalhe. Era sexta-feira, o fim da minha primeira semana longe da minha casa e família. Eu nunca imaginei que ficaria bem estando tão longe. Não que eu não esteja com saudade, mas não era aqueeela saudade louca.

Nunca tive problemas com a minha família, só não éramos tão grudados.

Deixei de refletir e levantei para começar meu dia. Após me trocar, esperei Lili já no corredor, até que animada para o próximo ensaio.

— Bru, não quer ir pra minha casa hoje? — indagou Lili enquanto eu trancava a porta do quarto.

— Como assim?

— Eu não fico aqui nos finais de semana. Eu vou pra casa.

— Ah... Não, acho que vou ficar aqui pra ver como é.

— Tudo bem. No próximo você vem?

— Vou sim.

...

Depois do almoço, Lili, Júlio e James iam para casa, assim como a maioria dos alunos. Pelo que eu percebi, alguns nem esperavam pelo almoço, já saíam da aula e partiam para fora.

Assim que acabamos de comer, me despedi deles e os observei indo embora, e depois fui para o meu quarto. Me apoiei no guarda-corpo da varanda e observei o jardim, assistindo o restante das pessoas saindo do dormitório e caminhando para o refeitório. Eu já conseguia sentir a escola esvaziando, e a sensação era um pouco estranha.

Espero que não tenha assombrações, porque não vai ter ninguém pra me ouvir gritando...

Melhor eu não ficar pensando nisso, vou é ocupar minha cabeça... Fazendo lição.

Peguei alguns cadernos, meu estojo e rumei para a biblioteca vazia com exceção da recepcionista simpática. Fiquei com uma mesa só para mim e pude espalhar os cadernos e livros sem me preocupar. Mas no fim acabei organizando tudo por matéria, ou não ia conseguir me concentrar.

Quando finalmente terminei, já eram quatro horas da tarde.

Conferi os cadernos, só para ter certeza de que não esqueci de nada. Em um deles, vi uma escrita na folha da contracapa.

“Jardim de rosas mortas”

Ah, não! Esqueci completamente do livro! Eu nem lembrei de pedir pro Yan... E agora? Mesmo que pedisse agora, não ia dar pra ler tudo e ainda fazer as atividades... Será que ele já devolveu?

Fui até a sessão J e vasculhei as prateleiras duas vezes, mas nada.

Mas que droga! Não posso perder a primeira nota de atividade... Mas talvez dê tempo. Se eu achar o Yan, posso pedir emprestado. Isso se ele não tiver saído pra algum lugar.

Voltei para a mesa, guardei os livros e juntei minhas coisas, pensando em como diacho ia conseguir encontrar ele. Desci para o primeiro andar, me virei para descer a última leva de escadas e esbarrei com alguém. Meus cadernos voaram escada abaixo, eu quase caí e me agarrei nos braços dele, sentindo até uma fraqueza pela possível queda.

— Meu Deus, desculpa! — Yan exclamou, assustado.

Eu demorei alguns segundos para afrouxar meu aperto nele, sentindo o coração acelerado de medo, e depois que o choque passou, de vergonha por ser ele ali. O soltei e encostei na parede, buscando o corrimão para segurar e me sentir mais firme.

— Desculpa, de verdade. Eu não prestei atenção. — Ele me olhou, só para confirmar que eu não ia desmaiar, e desceu, pegando meus cadernos do chão.

— Não, tudo bem — falei, me sentando no primeiro degrau. — A culpa é minha, eu tava distraída e não ouvi seus passos.

Yan voltou e me passou as minhas coisas, porém, ficou com um livro, que fiquei encarando mesmo sem entender o motivo da minha curiosidade.

— Eu tava indo na biblioteca pra levar esse aqui. — Ele indicou o livro, o estendendo para mim.

Minhas sobrancelhas se levantaram com a surpresa. Era justo o livro que eu ia pedir para ele. Que universo mais doido.

Peguei o livro com uma mão, admirando a capa bonita.

— Você já leu ou quer ler? Pela sua cara... — Deu uma risada.

— Nenhum dos dois, na verdade, mas precisava ler.

— Precisava?

— É... Eu tinha que ler e fazer um resumo e um artigo de opinião. — Virei o livro, querendo ler a sinopse.

— E por que não leu? — indagou ele, curioso.

— Esse é o único exemplar que tem.

— Tem certeza?

— Tenho, eu perguntei na recepção.

— E a dona Graça não falou que tava comigo? Era só me pedir.

— É que eu esqueci. Eu ia pedir, mas com a correria da primeira semana acabei esquecendo completamente desse trabalho.

Ele suspirou. — Você não pode tirar um zero. Eu vou te ajudar.

— Me ajudar como? — Coloquei o livro em cima da pilha de cadernos e levantei.

— Eu te conto tudo o que sei sobre o livro. Mas... — Yan pegou meus cadernos, passando as mãos nas minhas, o que me fez corar, óbvio, e baixou o tom da voz. — Temos que achar um lugar que ninguém veja a gente... Se algum professor ou outra pessoa ver e falar sobre nós, estamos fritos... Bom, só se você quiser minha ajuda, claro.

Será que tinha chances de alguém ficar sabendo e falar? — Eu aceito... Não quero ficar com zero.

Yan sorriu e concordou. — Já tomou café?

— Ainda não.

— Nem eu. Quer ir? — Ele começou a descer, não me deixando outra escolha. Claro que eu não ia recusar.

— Vamos.

Descemos para o refeitório em silêncio, quase vazio, e pegamos nossos lanches.

— Pelo jeito vamos ter que ensaiar alguma parte nossa hoje — comentou ele, espetando sua salada de frutas. — A Erica foi embora, não foi?

O pedaço do lanche ficou preso na minha garganta enquanto eu arregalava os olhos para o prato. Peguei a xícara e tomei um gole do café com leite. — Eu nem vi ela hoje.

Não é possível uma coisa dessas. Eu não tô preparada pra isso. Ainda não.

— Vai fazer alguma coisa amanhã? — perguntou Yan, continuando a comer.

— Não. — Dei uma olhada para ele, curiosa com o que ele tinha em mente.

— Quer ir conhecer o centro? Podemos fazer seu trabalho lá.

Nós... saindo juntos! Eu devo estar sonhando, não é possível. Alguém me belisca. — Quero sim.

Ele sorriu, animado. — Podemos sair às dez?

— Pra mim tá bom.

— Não esquece de levar um caderno pra fazer as anotações — sussurrou, mesmo que não tivesse ninguém por perto para ouvir.

Acenei, rindo. Tentei me apressar e comer mais rápido, senão íamos nos atrasar. Assim como também tentei não pensar em tudo o que me esperava, tanto para hoje quanto amanhã. Minha cabeça não parava um segundo.

Yan se inclinou e pegou algo do bolso da calça. Seu celular. — Quase cinco horas. Vamos? — perguntou, o guardando de volta e arrumando as louças.

Afirmei e tomei o último gole da minha bebida, já fria. Ele levou nossas bandejas e caminhamos para fora. Passei no meu quarto para deixar meus materiais e voltei rapidamente, tomando cuidado para não vomitar o que tinha acabado de comer por subir e descer as escadas.

Assim que entramos no teatro, vimos os professores no palco, que nos olharam. Tinha uns seis alunos na plateia, que eu não conhecia, junto do professor Marcos, em um grupinho.

— Vocês viram a Erica? — A professora Eduarda perguntou assim que chegamos perto.

— Acho que ela foi embora — respondeu Yan.

— Eu não acredito... Ela se responsabiliza pelo papel e vai embora?

— Então... — começou a professora Beatriz —  Vocês querem adiantar alguma parte de vocês?

Yan afirmou com um aceno, e eu neguei, mentalmente.

— Tá bom. Podemos fazer um aquecimento com todo mundo, pra relaxar um pouco os ânimos, e vocês podem pegar o palco pra vocês. Eles ali estão discutindo sobre os cenários e as roupas, então não vão atrapalhar.

Aquela ideia da professora tomou quase uma hora, mas até que foi divertido e serviu para que eu relaxasse mais. Fizemos alongamentos de várias partes do corpo, deitamos no chão, esticamos as pernas, pulamos e até fizemos uma rodinha para conversar um pouco sobre as ideias de cada um para a peça.

Depois que Beatriz se deu por satisfeita, enxotou o outro grupo do palco e deu espaço para Yan e eu. Tanto ela quanto Eduarda nos ajudaram, inclusive interpretando alguns figurantes e outros personagens secundários. Mesmo que Yan tivesse mais experiência que eu, ele também recebia dicas, e nós dois prestávamos atenção em como elas faziam, sobre postura, tons de voz e etc.

Fizemos a primeira parte quatro vezes e a segunda cinco. Na terceira parte, nós ficamos “sozinhos”. Era a primeira cena em que Jasmim e Heitor ficavam frente a frente sem ninguém perto.

Começamos o diálogo e Yan começou a andar em minha direção. Dei passos para trás, três, como a professora tinha dito, e fingi que encostei em uma parede. Yan levantou os braços, fazendo uma barreira, impedindo que eu saísse dali. Eu estava presa.

Sorte que Jasmim também ficava vermelha. Pelo menos nisso eu atuava muito bem. Nem precisava pensar.

— Você tem certeza disso? — Yan perguntou, com o rosto próximo ao minha.

— Um pouco mais alto — Beatriz pediu.

Ele repetiu, aumentando o tom de voz. — Você tem certeza disso?

Afirmei com a cabeça, tentando fazer um olhar um pouco assustado. Ele se aproximou mais, e as pontas dos nossos narizes se encostaram.

Aquela era a parte em que Heitor dava um beijo em Jasmim e saia andando.

Com uma piscadela e um sorrisinho de canto, Yan se afastou, como se fosse embora, para o outro lado do palco. Eu quase suspirei.

Ele tava quase incorporando o Heitor. Era engraçado como eles tinham semelhanças e diferenças. O Heitor era muito galanteador, meio sem vergonha e atirado, mas era delicado e romântico. Me dava vergonha ver Yan sendo daquele jeito, já que ele era bem diferente.

Estranhamente, nenhuma das duas professoras falou ou demonstrou algo sobre o não-beijo que demos. Talvez Yan tenha avisado sobre a nossa “condição”.

Repetimos a cena mais vezes, e quase no fim eu até que tinha melhorado em relação a vergonha. Estava um pouco mais fácil de deixar de me concentrar em como eu reagia e a reagir como Jasmim. Não que fossem reações tão distintas assim.

No fim, todo mundo foi jantar junto na mesma mesa.

— Acho que vocês dois são perfeitos pra esses papeis — comentou Eduarda, balançando o garfo em nossa direção. — Vocês têm muita química.

Tive dois pensamentos: 1. Meu Deus que vergonha ela falar um negócio desse na frente de todo mundo. E 2. Temos química, hein? Ouviu essa, mundo? TEMOS QUÍMICA!

Ficamos conversando e opinando sobre as coisas da peça. Estava tão bom que mal percebemos o tempo passando, e eu só me toquei que estava tarde porque mal aguentava manter os olhos abertos. Fui a primeira a me despedir, e Yan fez o mesmo.

Levamos as bandejas e ele me acompanhou até o dormitório, comentando, animado, sobre como o ensaio tinha sido legal com as coisas diferentes que fizemos.

— Dez horas em ponto estarei aqui te esperando — disse ele, parando na frente da entrada.

Dei risada com o tom dele e concordei, abrindo a porta. — Tudo bem, vou tentar não atrasar. — Corei, lembrando que estávamos praticamente sozinhos no jardim.

— Tá bom. — Ele sorriu, me deixando levemente boba com a covinha. — Então boa noite.

— Boa noite.

Fechei a porta bem devagar, e nós dois acompanhamos o movimento até restar só uma frestinha. Antes que eu fechasse de vez, ouvi ele rindo.

Subi as escadas pulando de alegria, sem saber se eu esfregava a cara com as mãos, se me descabelava, ou qualquer outra coisa que pudesse demonstrar meu estado de espírito no momento.


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