Astronaut: ReFlying

Kaline Bogard

Capítulo 21

No fim das contas, Wade ganhou mais do que um sermão “congelante”. Como castigo por ter saido da linha, pegou detenção pelo resto da semana. Uma punição pesada se fosse para outro aluno, mas o diretor Fury conhecia o passado do rapaz e as regras do projeto com a SHIELD eram claras. Nenhum deslize seria tolerado, afinal, eles faziam um investimento a longo prazo.

Por isso, Peter acabou os dias restantes sem a companhia de Wade. E era tão... silencioso! Com seu jeito imprevisível, inconveniente e invasivo, marcara a vida de Parker, e jamais pensaria isso, que sentiria falta do amigo tagarela.

Se conheciam a cerca de menos de um mês e, de repente, parecia que Wade estivera ao seu lado a vida inteira. A compreensão equivaleu a um golpe da realidade.

Realidade que golpeou Tony Stark e Bruce Banner também, evidentemente. Eles estudavam em uma escola pública, que tinha grandes restrições de materiais. Não conseguiram nem metade do que seria necessário para concretizar os planos de Bruce, muito menos os de Tony.

Eles até procuraram o diretor, pois a família Stark podia bancar o projeto tranquilamente. Mas Fury foi irredutível. Não aceitariam nenhum material que não fosse aprovado pelo Conselho de Escola.

Voltaram ao ponto de partida, precisando decidir-se o que apresentariam pro trabalho interdisciplinar.

Nesse ínterim, Peter conheceu Danny Rand, o garoto do primeiro ano mais zen que existia no mundo. E Ava Ayala, ao contrario de Danny, extremamente estressada e impaciente com tudo. Ambos eram integrantes do Clube de Ciências, embora passassem pouco tempo no laboratório, já que os veteranos desperdiçavam tanto tempo brigando.

Com a semana chegando ao seu fim, Peter foi chamado ao jornal do colégio. A matéria sobre Jessica Jones não alcançara o impacto que Mary Jane imaginara, pois a fofoca do momento era Wadeker (ou alguma palavra semelhante, Peter perdeu o interesse quando descobriu que era o nome que tinham dado ao “ship” que fazia com Wade, ou melhor, que não fazia).

Pois o garoto não pensou duas vezes em acabar com qualquer esperança de que ele e Wade fossem capa do jornal. Mostrou-se irredutível nesse ponto.

Terminar a conturbada semana foi, sem sombra de dúvidas, um grande alivio. Só menor comparado ao prazer de chegar em casa, na sexta-feira em que Tia May estava de folga, e ser abraçado pelo cheirinho delicioso de comida sendo feita.

— Tia May, cheguei!! — foi dizendo assim que entrou na sala.

— Como foi seu dia, Peter? — a velha mulher apareceu na passagem dos cômodos.

— O de sempre. E o seu dia?

— Nem me pergunte. Houve um acidente terrível na Terceira Avenida, alguns feridos foram levados para o hospital onde eu trabalho, mas não se preocupe. Nenhum deles corre risco de vida.

— A senhora deve estar exausta! Quer ajuda com o jantar?

— Não precisa. Vá se lavar e fazer os deveres. Quando estiver tudo pronto eu te chamo.

O garoto obedeceu sem reclamar. Passou no quarto para deixar a mochila e a câmera fotográfica. Pegou uma troca de roupa limpa, calça de moletom cinza e uma blusa velha do Batman. Peter realmente admirava os heróis da DC...

Tomou um banho mais longo do que planejava. A água quente e agradável bateu no corpo e relaxou um bocado. Nem se dera conta do quão cansado estava! E precisava dar conta da lição de casa, para poder ir ao shopping despreocupado no sábado. Queria aproveitar ao máximo!

Com o forte pensamento de acabar os exercícios o quanto antes, sentou-se na escrivaninha e debruçou-se sobre os livros. A ponta do lápis desfilava pelas paginas do caderno como uma espada afiada.

E foi em algum momento entre a mudança de Álgebra para Literatura Inglesa que seu apurado sexto sentido começou a incomodar com aquela sensação chata de estar sendo observado. O que era um absurdo, já que estava no quarto, na parte de cima da casa. Quem poderia...

Sem poder conter-se, ergueu a cabeça apenas para confirmar a intuição. Deu de cara com Wade, com os braços apoiados no batente da janela, e o queixo sobre eles. Levou um susto tão grande que quase caiu da cadeira.

— Cara! Não faça isso!!

— Desculpa, Petey. Você concentrado é tão bonitinho que a gente ficou com pena de atrapalhar.

— E quase me matou do coração! O que você quer?

— Um boquete? — insinuou com um sorriso mais do que sacana. Ganhou em troca um olhar atravessado — Zueirinha inocente. A gente tava com saudades de você.

— Sei. — Peter suspirou.

— Não sentiu minha falta nem um pouquinho...?

— Não.

— Nem hesitou! Petey mau.

A voz falsamente magoada fez Parker rir. O garoto desistiu dos exercícios e cruzou os braços sobre a escrivaninha.

— Como foi a detenção?

— Nah. Apenas outra terça-feira. Serviu pra eu aprender umas palavras novas em Frances. Je vais vous faire gémir.

— Não entendi nada — a resposta veio acompanhada de um franzir de sobrancelhas.

— Eu te mostro... — e fez menção de levantar-se, porem Peter o impediu com um gesto de mãos.

— Nem se atreva — cortou seco. Nada de inocente poderia vir daquele cara, fosse em Francês, Inglês ou Javanês!! — Não preciso de simulação pra deduzir do que se trata.

Wade não reclamou, apenas acomodou-se na janela outra vez, daquela forma que podia ficar olhando para Peter e ficar um pouco confortável. O morador da casa até sentia curiosidade em descobrir como ele se mantinha pendurado do lado de fora, só não ia conferir por puro receio de chegar perto e ser agarrado!

O olhar de admiração se prolongou por tanto tempo, que incomodou Peter.

— Wade, posso te fazer uma pergunta pessoal?

— Sim, temos camisinha aqui.

— Não é isso, cara! Você só pensa em sexo!

— E tem coisa melhor pra se pensar? Hum... ah, claro. Petey ainda não tem parâmetros para comparar. Quando resolver foder com a gente vai ver o que é bom.

— Idiota — o garoto girou os olhos, sentindo as orelhas esquentarem.

— O que ia perguntar?

— Essas insinuações que você faz... você é gay?

Wade deu uma risadinha safada.

— Rótulos? A gente não se preocupa com rótulos. Mas se for pra usar um, então a gente é hetero, gay, bi, pan... a gente gosta de sexo com homem, mulher, alienígena, viajante de outra dimensão. Grupal. Outro dia a gente estava num beco e viu um cachorro...

— PELO AMOR DE DEUS... NÃO TERMINE ESSA FRASE!! — Peter saltou da cadeira como se pregos tivessem brotado no assento. Ganhara uma imagem mental que o traumatizaria pelo resto da vida.

A única coisa que Wade fez foi rir.

— Peguei você!

— IDIOTA! — ele voltou a sentar-se, um tanto irritado. Wade não tinha noção nenhuma! Como pudera sentir falta disso?!! Era masoquista?!!

— Hummmm a gente tá sentindo um cheirinho bom...

— Nem sonha — Peter resmungou com um bico.

— Tudo bem. É que a gente não tá acostumado a comida caseira. Nunca tive isso na minha vida — Wade falou sem qualquer afetação na voz, embora os olhos azuis continuassem presos em Peter, com um brilho indecifrável. Tão carregados com um sentimento que calou fundo na mente de Peter, dando aquela sensação de quando ele estava a frente de Mary Jane, incapaz de negar um pedido da jovem ruiva.

Incapaz de negar o pedido meramente insinuado pelo tormento que aceitara carregar.

— Tudo bem, Wade. Pode jantar com a gente.

— OBA!! Petey é o melhor!

— Prometa que vai se comportar.

— Claro. Não farei nada do que eu não faria.

— O que?

— Não se preocupe. A gente vai se comportar. Não quero deixar a autora num beco sem saída, pensando em outro jantar cagado pra escrever. Hehe.

Peter balançou a cabeça. Sabia que ia se arrepender do convite, mas tudo bem. Não ia se enganar com a historia de que não sentira falta da inconveniência e audácia de Wade. A verdade era outra, apesar de tudo.

Sentira sim.

Bastante.