Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 88
LXXXVIII




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20/06/2019

Galera, to imensamente feliz com os comentários e com a empolgação de vocês! Chegamos a mais do que 500 reviews e a fic vai fazer aniversário de 3 anos em breve, então eu queria dar um presentinho pra vocês. Confiram as notas finais para conferir as opções e me digam o que preferem! Um beijo enorme no coração de cada um!

 

* * *

Wanda não sabia onde exatamente estava indo quando se teletransportou. Sabia apenas que era urgente, um chamado feito por aquele feitiço tolo que lançou em James Barnes naquela tarde em Bucareste, e ela atenderia tal invocação. Então a Feiticeira surgiu em luz, chamas e cor escarlate no meio de um campo de batalha. Seu ouvidos não captaram o som das máquinas, seus olhos arregalados mal se focaram em detalhes dos escombros e do metal. Ela viu apenas ele, caído e ferido, seu corpo coberto por cinzas.

— James! — Ela gritou, correndo em sua direção. Ajoelhou-se rápido ao seu lado, suas mãos segurando com medo o rosto dele. O coração de Wanda contraiu-se ao notar que o ombro de vibrianium do soldado jazia inerte, danificado por um golpe. Ele piscou de forma mais demorada, talvez beirando a inconsciência, até que Wanda pôde ver um brilho de reconhecimento no azul de seus olhos. — James, fala comigo.

— Wanda, eu… — Ele franziu a testa e soltou um gemido de dor. — Você veio.

Ela soltou um riso curto e triste, alívio inundando seu corpo por ouvi-lo falar.

— Eu te disse, James. Quando ver a cor escarlate e precisar de mim, eu estarei lá. E eu estou aqui, certo? Eu estou aqui.

Em resposta, ele lhe ofereceu um dos seus melhores sorrisos de lado, mesmo que estivesse inteiro avariado. Sangue coloria seus dentes.

— Devo ter soltado um uivo e tanto pra você ter ouvido, boneca.

Wanda o abraçou com delicadeza, depois depositou um beijo em sua testa ferida. Ele disse algo que ela não entendeu e em seguida segurou sua mão. Seu corpo tremia inteiro por vê-lo machucado assim, sua cabeça era alvejada por lembranças de um campo de batalha, uma visão de dois atrás. Sokovia. Pietro. Destroços. Até mesmo sua pele ardia na memória da morte de seu irmão, ocasião na qual ela caiu de joelhos e ali ficou por muito tempo. As lágrimas vinham quase como instinto. Ela engoliu seco, dizendo a si mesma que não era a mesma coisa. Estava diferente, mais forte. Ninguém iria morrer. Não deixaria ninguém morrer naquela vez. Apertou o corpo de Bucky contra o seu com um pouco mais de força, com um pouco mais de desespero. Entendeu o quanto era difícil para ele vê-la desaparecer e agora o terror de assisti-lo quase se esvair trazia terror ao seu peito. Não existia nada mais no mundo naquele segundo.

Murmurou baixinho o nome dele, lábios trêmulos, até que sentiu Bucky pressionar mais sua mão. Ele queria chamar sua atenção para algo. Foi nesse instante que a Feiticeira  desligou-se do choque e passou a encarar o cenário de destruição ao seu redor. Suas íris se banharam em luz vermelha ao distinguir auras variadas combatendo peças de máquinas. Lá estava o azul de Steve, o amarelo radiante de Sam. Havia mutantes, havia apenas humanos horrorizados, todos tentando se proteger no que parecia um porto. Entre o desespero e a sucessão de eventos catastróficos, veio o entendimento inevitável:  Estavam em Genosha. Enfrentavam Zola. Sentiu o desespero, sentiu os ferimentos de seus amigos como seus. Se perguntou o por quê Anna Marie e Remy estavam lá, se perguntou o por quê Natasha não estava.

E Magneto. Onde estava ele? Onde estava Erik Lensherr?

Ela olhou para frente, som voltando a banhar seus tímpanos. Havia vento e o barulho ininterrupto de uma turbina, embora não se tratasse de uma turbina de fato. Era uma estrutura triangular feita de peças de robôs metros adiante, um arco de metal girava em seu próprio eixo ao redor da base. Atrás daquela máquina de aspecto estranho, um imenso Sentinela esperava, sua silhueta maior do que qualquer um que a Feiticeira já havia visto. Um titã, um monstro de carapaça metálica e luzes artificiais. E no centro, preso pelos punhos e pelos tornozelos, um homem. Era isso, então. A Máquina de Almas e seu pai.

Demorou um segundo a mais para compreender o que ele falava entre gritos de dor.

— Wanda, saia daqui! — Um novo engasgo sofrido, um novo par de lágrimas desceu por sua face. — Saia!

Com cuidado, ela apoiou Bucky no chão e se levantou. Sentia os joelhos bambos, o tecido intricado do sobretudo ondulava por causa do vento. A tiara lhe concedeu mais foco e ela podia ver claramente o ponto rubro do outro lado, a cor que a aura de seu pai emanava.  Atrás da Máquina, o Sentinela pareceu rir, aquele som artificial e grave.

— Ora, deixe-a! Vai ser mais fácil para mim. Como eu disse, depois de você, será ela. — O robô disse, dando um passo pesado para o lado. Pelo sotaque e pelo deboche, Wanda distinguiu que quem falava era Arnim Zola, e logo ele a chamou: — Fräulein Maximoff. Descobriu a verdade em Wundagore? Do laboratório de onde veio?

— Descobri uma parte. — Respondeu. — O suficiente para desintegrar você.

— Já lhe disse, menina. Você é um rato de laboratório e sempre vai ser. Uma cobaia.

Wanda inclinou a cabeça de leve, dando um passo para frente. Escutou um murmúrio indistinto de Bucky Barnes, mas soube que a preocupação dele era infundada. Houve um grito distante de Steve Rogers. Nada podia mudar sua decisão. Ela estava lá para acabar com aquilo. Enterrar Zola de uma vez por todas.

— Mesmo agora você é tão pequeno. Sua mente é tão limitada que não consegue ver o que está a sua frente.

Ele riu.

— E o que está à minha frente agora, fräulein?

— Eu vou te mostrar.

A primeira coisa que fez foi erguer um campo de força para proteger os inocentes ali na ilha. Suas mãos moveram-se inquietos e treinados, círculos de luz enrodilhavam seus dedos enquanto suor cobria sua testa. A parede de energia escarlate cresceu grossa e brilhante, envolvendo Steve, Sam e o resto de mutantes e pessoas atrás. Em realidade, era mais um cerco que mantia Zola, a Máquina de Almas, Wanda e Bucky no mesmo local, numa mesma arena. Ela sabia que seu inimigo era baixo o suficiente para atacar as pessoas com que se importava, numa tentativa de distraí-la do principal, mas Wanda não estava disposta a perder nada naquele dia. Foi por este motivo que ela olhou para Bucky e soltou um sorriso breve. Ele, embora ferido e no chão, recebeu aquele sorriso com desconfiança, estreitou os olhos tentando prever o que a Feiticeira faria a seguir.

Ao mesmo tempo que o som das máquinas levantando recomeçou, Wanda agachou-se do lado do soldado de novo e lhe deu um beijo rápido na testa.  

— Te vejo depois, James.

Não houve tempo para discussão. Em poucos segundos, o corpo de Bucky Barnes desvaneceu-se e foi teletransportado ao lado de Steve Rogers, há metros de distância e a salvo do perigo. Ela levantou-se mais uma vez, observando-o agora do outro lado. Era possível ouvir seus protestos mesmo de trás da barreira de energia escarlate, mas tudo o que Wanda fez foi dar as costas e se preparar para a batalha. Havia cogitado se teletransportar para perto de Erik e trazê-lo para o outro lado, mas não tinha como fazer isso rápido o suficiente. Teria que fazer o esperado: Derrotar o inimigo.

* * *

Quando ouviu o disparo, Yelena Belova tivera a certeza de que ali seria seu fim. Não era triste, afinal, era dentro do destino trágico que esperava. Um tiro na cabeça de uma espiã russa. Não saberia dizer se doeria tanto. Parecia bem instantâneo, na verdade. O que era grave era saber que não teria concluído a missão e que Natalia e seus amigos correriam um risco terrível. O barulho então veio, mas a bala não.

O tiro veio de longe e atingiu o braço de Paladino. Havia se passado um segundo de silêncio depois que o tiro cravou o antebraço do homem, um segundo de incredulidade enquanto os dois encaravam a parte superficial de sua pele estourada de baixo da roupa, também danificada pelo projétil. Ele derrubou a arma e com a outra mão começou a estancar o ferimento. Sangue espirrara na face da espiã, que aproveitou para se arrastar para longe enquanto seu algoz gritava e xingava de dor. Ela estava dividida entre três coisas: Se manter à salvo de Paladino, encontrar o pendrive de Shuri no chão e escutar os gritos das pessoas atingidas pelas seringas na ilha. Pior que isso era escutar o som de máquinas despertando entre os contêineres ali perto, local onde toda a carga havia desembarcado. Sentinelas, concluiu. Segurava o próprio ombro, onde foi ferida por Paladino antes, e com a mão livre tateou o solo. Deveria ser rápida.

Ela não entendeu de onde tinha vindo o segundo disparo para salvá-la naquele derradeiro instante, mas não podia se dar ao luxo de conferir. Não havia tempo. Ouviu Paladino xingar e xingar, talvez tivesse visto o atirador. Sacou uma pistola com o braço bom e mirou em um ponto no horizonte, na direção de onde viera a bala que o atingiu. Depois de gastar um pente inteiro, ele se apoiou com as costas no painel de controle da torre de comunicação para fugir da chuva de balas em retaliação e para recarregar. Yelena, no entanto, deixaria seu agressor lidar com isso. Estava agachada e a sorte estava ao seu lado. O atirador desconhecido parecia ser competente o suficiente para não acertá-la, o que lhe deu oportunidade de continuar procurando o pendrive. Assim que seus dedos tocaram na superfície dura do objeto, finalmente encontrando-o, Paladino virou-se para ela, furioso o suficiente para nem fazer um último comentário debochado antes de engatilhar o próximo disparo.

Foi nesse momento que ele sofreu outro ataque, desta vez físico. Uma mulher de roupas brancas e cabelos platinados lhe deu um golpe de lado, focando em desarmá-lo. Paladino estava mais vulnerável por causa do tiro, mas era maior e mais forte que a mulher e contava com uma dose de adrenalina e outra de ira para conter seus ataques, seus chutes e joelhadas. Quando a arma dele caiu no solo e a mulher conseguiu aplicar-lhe um mata-leão, os olhos dela e de Belova se cruzaram por menos que um segundo, mas não foi necessário mais do que isso para o entendimento cair sobre a russa. A pessoa era Silver Sable e ela lhe deu a oportunidade de concluir a missão. Mesmo ferida, ela se levantou com agilidade e correu até o ponto no painel de controle onde deveria inserir o pendrive.

A tela abriu um aviso do dispositivo conectado, executando o programa. A barra de processamento começou a carregar.

No entanto, era tarde demais.

As peças dos Sentinelas romperam os contêineres e começaram a se montar sozinhos no ar. Partes do metal estourado atravessaram o cenário, quase atingindo a torre de comunicação, além de Sable e Paladino. Eles se separaram para escapar do impacto, enquanto Yelena apenas esperava de forma impaciente o programa carregar em 100%. Em poucos segundos, o caos tomou conta do local: a terra tremeu quando os robôs começaram a andar, quebrando qualquer coisa que fosse menor e mais frágil no solo. O processo ainda estava em 67% no instante que Yelena foi obrigada a desviar, pois à distância Paladino já estava de novo com uma pistola em mãos e pronto para lhe dar um tiro.

Silver a puxou para trás e para baixo.

Mutantes identificados. Calculando… Níveis variados. Quantidade exacerbada.

Ameaça iminente.

Ativando…

Ativando…

Iniciar contra medidas.

— Merda! — Silver rangeu os dentes, conferindo a pouca munição que lhe restava com suor no rosto. As duas encararam os Sentinelas marchando para além do horizonte, figuras colossais entre a névoa. A caminhada daqueles robôs, suas pernas grossas e pés do tamanho de um carro, eram tudo o que separava as duas de Paladino, que só esperava o momento certo para atirar. — Alguma chance de você ter mais algum pente de balas com você?

— Não. Era uma infiltração e eu tive que falar com civis. Só tenho um punhal.

A outra deu de ombros.

— Vai ter que servir.

Belova tirou a lâmina da bainha que estava presa em sua coxa e ofereceu à Silver, que por sua vez voltou-se à direção do inimigo. Ela parou instante para observá-lo, raciocinando a melhor forma de abate-lo. Para o horror de ambas, Paladino conseguiu chegar à torre de comunicação e desplugou novamente o pendrive da entrada.

— Nós não vamos derrotá-lo em terreno aberto. — Yelena disse com urgência. — Precisamos ser mais inteligentes do que ele. Precisamos cercá-lo.

— E o que você sugere?

— Lá.

Inclinou a cabeça em direção às fileiras contêineres em carcaças, pedaços de metal retorcido e objetos destruídos com a liberação dos robôs. Era um labirinto de destroços, imagem um tanto distante do vazio da memória que Yelena tinha em mente, uma recordação antiga de quando trouxe a câmara criogênica de Magneto. Ela estivera ali antes, mas o local estava diferente tanto pelo tempo quanto pela recente ocupação dos mutantes.

— Você está sangrando. Não vai dar certo.

— Nós temos um punhal e ele uma pistola. Assim que os Sentinelas passarem, quem vai sangrar e morrer são nós duas.

Ela franziu a testa, derrotada. Passou seu braço por ela, apoiando Yelena em seu corpo pelo ombro.

— É bom que ainda consiga correr.

Belova não conseguia, mas fez o seu melhor para acompanhar o ritmo de Silver Sable. Elas se moveram até os contêineres, evitando as últimas peças dos robôs que ainda passavam com velocidade no ar, desviaram de punhos e troncos de metal. Um tiro de longe quase atingiu Sable nas pernas, porém ela continuou caminhando. Ao fundo, Yelena ouviu o som da batalha entre os Sentinelas e Vingadores, e esperava que eles conseguissem aguentar enquanto ela enfrentava seu próprio desafio. Chegaram até o lado oposto entre as estruturas de metal e Silver a apoiou sentada.

— Fique aqui. Você não vai longe com esse seu ombro estourado. — A agente observou o punhal que Yelena lhe dera com mais atenção, talvez imaginando a melhor forma de cravá-lo no inimigo. — Eu vou matar aquele desgraçado.

— Não.

— Não o que? Ele roubou minha empresa pra ajudar um cientista insano num genocídio!

— Não vá atrás dele. Deixe que ele venha até você. Ou melhor, deixe que ele venha até mim e então você vai ter uma chance.

Silver lançou-lhe um olhar cuidadoso, depois sorriu. Yelena não soube como reagir diante de do sorriso branco dela, mas aquela expressão lhe caía bem.

— Você é esperta. Um tanto suicida, mas esperta.

— A gente conversa depois que tudo isso acabar. Precisamos… Precisamos ainda pegar o pendrive dele e inserir na torre pra evitar que Zola escape. — Ela se interrompeu com um gemido de dor. — Só quero ver esse maldito morto logo.

— Não morra antes, então.

Silver deu uma última piscadela para Yelena e se foi, um ponto branco e prateado entre o cenário escuro. O céu tinha nuvens negras e relampejava, uma mudança de clima súbita e assustadora. Logo choveria e o terreno ficaria molhado, lamacento. Seria terrível. Yelena, mesmo com devaneios catastróficos, não pode evitar de recostar seu corpo com mais folga, sua face franzida por causa da dor. Apertava o tiro numa tentativa de estanca-lo, mas sabia que já tinha perdido sangue demais. Não esperava exatamente sobreviver muito tempo ou não sem sequelas. Sua visão já estava embaçada, ou então era a névoa da ilha. Além da batalha morro abaixo com os robôs, ela ouviu uma sequência de três tiros.

Paladino já tinha chegado até os contêineres.

Não era uma boa ideia arfar naquele momento e a russa tinha que se esforçar para não fazer nenhum som sequer. Será que ele já tinha eliminado Sable? Impossível dizer. Em resposta, ela escutou mais um disparo. Os minutos se arrastavam enquanto cogitava as alternativas à sua disposição: Poderia sair correndo e morrer por conta de um tiro de Paladino; Poderia fugir em direção aos Vingadores e morrer esmagada por um Sentinela; também havia a possibilidade de permanecer ali indefinidamente até que a perda de sangue enfim à matasse. Permaneceu em silêncio, pensando de novo na inevitabilidade do que aconteceria a seguir. Não ouvia nem mais os acordes das músicas orquestradas em sua cabeça, Tchaikovsky havia parado de tocar. Selou os olhos, imaginando cortinas se fechando.

Abriu-os quando ouviu passos mastigarem o chão ali perto, uma figura pouco iluminada e cada vez mais próxima. Uma figura grande demais para ser Sable. Paladino.

— Voltamos onde tínhamos parado. — Disse ele e, pela iluminação difusa, Yelena pôde enxergar o reflexo de sangue espirrado na ponta da arma. Ele andava um tanto trôpego, sua voz estava descompassada. Ele também tinha levado um tiro antes, mas o sangue que agora coloria sua pistola não parecia ser dele. — Eu tinha dito que doía ter que matar garotas bonitas como você, docinho...

Ela não tremeu e não desviou o olhar, nem mesmo quando viu pela visão periférica Silver Sable se aproximando  ao fundo, um tanto agachada e com o punhal na mão direita. Na esquerda, havia um rastro de sangue, o que fez Yelena concluir que, qualquer ferimento que ela tenha sofrido, foi de raspão. Estava pronta para atacar quando o mercenário engatilhou a arma.

— Mas meter uma bala numa vadia que se acha esperta sempre me traz satisfação.

Paladino se virou de súbito e deu um tiro na altura do peito de Silver Sable. Yelena mal conteve o grito quando sua aliada apoiou-se de joelhos com fraqueza no solo, em silêncio. O punhal tinha escapado de sua mão e ela tremia, seus cabelos platinados tampando seu rosto inclinado para baixo.

— Talvez não sejam tão espertas assim. Acharam que eu não ia notar?

Yelena engoliu seco. Não tinha nenhuma arma para eliminá-lo e duvidava que lhe restassem forças o suficiente num combate direto. Mas ela tinha ódio e viu uma barra de metal retorcido no chão. Quem sabe fosse o suficiente. Antes que pudesse se mover para pegar o metal e avançar sobre Paladino, ela ouviu uma breve risada de Silver Sable. Ela ergueu seu belo rosto, seus dentes muito a mostra quando disse:

— Achou que eu não usava Kevlar?

E então juntou o punhal no chão e se lançou sobre o homem.

Iniciou-se uma sequência de luta corpo a corpo, com direito a grunhidos de Silver e golpes baixos de Paladino, que havia largado a pistola quando sofreu ataque da agente. Ele puxou o cabelo dela para evitar que a lâmina encontrasse seu pescoço, quase a mordeu e também a jogou no chão. Era óbvio que seu objetivo era pegar o punhal, pois Kevlar era um tecido à prova de balas, não de armas brancas. Ao menos ela não ficava para trás e conseguia evitar os seus ataques. Apelou também em esmurrar o ferimento dele no antebraço, mas nesse momento as mãos dele seguraram seu pescoço.

E Paladino começou a apertar.

Silver soltou o punhal, ficando fraca e vermelha. Tentou arranhar seu algoz e lhe aplicar um contra-golpe, sem sucesso. Yelena conseguiu reunir forças para pegar a barra de metal que havia visto no chão, mais próximo de si do que o punhal, e avançou em direção a Paladino. Ele também se levantou com rapidez, soltando o pescoço da agente que, apesar de tudo, ainda respirava com vida.

Yelena preparou-se para o impacto. Em outras condições, ela seria vitoriosa. Bastaria um movimento ou outro para subjugá-lo com suas pernas fortes. Agora, mal mantinha-se de pé. A ideia era dar mais uma chance para Silver, um segundo a mais para que pudesse acabar com Paladino.

Ele foi atingido antes, no entanto. Um, dois, três disparos. Cada projétil veio por trás, fazendo florescer uma mancha de sangue na altura de seu peito. Havia estourado sua carne, vasos sanguíneos e muito provavelmente o coração. Sem conseguir dizer nada mais do que um xingamento, o mercenário arregalou os olhos e caiu de joelhos, em seguida seu rosto enterrou-se no solo. Yelena observou-o com espanto, depois viu quem foi responsável pelos tiros: Uma conhecida que deveria ser ruiva, mas que naquele momento estava loira. Sua metade no espelho, sua fantasma. Ela contornou o corpo do Paladino e se aproximou.

— Esse homem estava incomodando vocês, Rooskaya?

Natalia.

As duas se abraçaram forte. Natalia estava com o rosto sujo por fuligem e a pele entrecortada por cortes ocasionais, mas estava bem - mesmo que o barulho morro abaixo soasse como o inferno. No entanto, o que era o inferno para as duas? Talvez uma lembrança do que já tinham passado juntas no inverno há tanto tempo. E elas estavam ali, vivas. Yelena soltou um soluço guardado no garganta, um lamúrio incontido e sem lágrimas. Natalia de desenlaçou do abraço e a encarou com atenção.

— Você levou um tiro.

— À essa altura, acho que não morro mais. Ajude Silver.

Ouviram uma tosse ao fundo. Era a outra, tentando se levantar.

— Eu vou sobreviver. — Murmurou, sua afirmação tão fraca quanto sua voz. — Só quero sair daqui.

— Bem, não só você. — Ela respondeu de forma sucinta ao colocar a própria arma de volta no coldre. — Trouxe sua equipe da Sable International?

— A ONU não autorizou nenhuma atividade, ainda mais que agora faço parte dos… Mata-Capas. Apenas eu nessa missão atrás do Paladino.

— É, ele não é muito bom de cobrir os próprios rastros. — Natalia deu de ombros e encarou o corpo do homem por alguns instantes. — E bem-vinda ao time dos fora-da-lei, senhorita Sable.

A outra lhe ofereceu um sorriso breve, sem ligar para a alfinetada. Já estava sentada e massageando o próprio pescoço, curtindo a dor. As mãos de Paladino lhe deixaram marcas que não sumiriam tão cedo. Yelena aproveitou aquele momento para chegar mais perto do mercenário morto, agachou-se e virou seu corpo para vasculhar seus bolsos e coldres. Não queria passar mais tempo que o necessário revirando seus pertences para encontrar o pendrive e ficou feliz de encontrá-lo logo. O corpo dele ainda estava quente e aquilo provocou arrepios nela, como se ele pudesse levantar a qualquer instante para também pegar seu pescoço.

Voltou a ficar de pé e exibiu o pequeno dispositivo às aliadas.

— Antes de sair da ilha, tenho que terminar a missão.

— Então vamos. — Natalia concordou. — Não vai sozinha.

— É, — Soltou um suspiro, voltando a segurar o ferimento no ombro. — Eu acho que não conseguiria.

A outra ergueu a sobrancelha.

— Conseguiria sim. Mas não precisa.

As duas se encararam. Yelena não deixou de lembrar daquele episódio no gelo, como ela deixou que a mais nova seguisse em frente para se salvar. E como ela a abandonou logo depois, para morrer de hipotermia no lago. Agora o cenário era diferente, as duas também. Natalia tinha voltado por ela.

Ela passou o seu braço bom de Yelena em torno do seu pescoço e a sustentou com mais firmeza. Chamou Silver e as três começaram a fazer o caminho de volta.

O trajeto pareceu mais curto apesar do ritmo cauteloso de seus passos, o que fez a russa pensar o quanto a adrenalina afetava sua percepção de tempo. Felizmente tinha o apoio de Natalia para continuar marchando até a torre de comunicação, um tanto quanto retorcida pelos Sentinelas que passaram por ela. No lado esquerdo, Silver Sable. Afinal chegaram no seu destino e Yelena pôde inserir o pendrive na entrada do painel. Aguardou o 100% na tela sem levar um tiro naquela vez e, com um novo suspiro, teclou o enter, sabendo que a Inteligência Artificial de Zola estaria isolada do mundo externo, sem meios de se espalhar de novo. Bastava agora destruí-lo inteiro e tudo então acabaria por completo. A jornada que ela tinha começado ao esconder a câmara criogênica de Magneto finalmente chegaria ao fim.

— Rooskaya. Fique aqui com Sable.

Yelena desabou no chão, assentindo. Mas antes que Natalia Romanova pudesse correr morro abaixo, em direção ao campo de batalha, uma muralha de energia vermelha se ergueu entre a névoa e a fumaça daquele lado. Um campo de energia um tanto quanto familiar.

— Minha nossa. — Yelena suspirou. — É aquela menina?

Natalia deu um passo para frente, seus joelhos bambos e rosto iluminado pela cor escarlate. Seus olhos estavam muito abertos, enquanto sua boca não soltou mais do que um murmúrio:

Wanda.

— Bem, Viúvas-Negras… — Silver sentou-se no chão. — Acho que teremos que esperar mesmo.

***

Wanda deu mais um passo, depois mais outro. Seus joelhos mal queriam obedecer, mas lá estava ela, caminhando de maneira cadenciada pelo campo de batalha, entre pó, destroços e fumaça: um cenário familiar para a jovem sokoviana. Seu rosto emoldurado pela tiara jazia com a mais calma expressão, seu corpo era protegido por uma camada de luz. Ia direto ao perigo, sabendo que talvez parecesse apenas uma mutante orgulhosa e estranha, marchando rumo ao seu fim. Talvez parecesse um pequeno demônio, etérea e vermelha, indo a seu destino.

Zola ordenou que as peças das robôs fossem em sua direção, que a atingissem e a esmagassem. Que garantissem que ela morresse, afinal. Foi nesse instante que os olhos dela tingiram-se inteiros nos tons de sangue, suas mãos inquietas e cheias de magia. Um punho de robô veio em sua direção, Wanda gesticulou de forma rápida e o punho metálico foi desviado. Depois veio mais outra peça, e mais outra e mais outra. Assim como no metrô em Bucareste, os membros dos robôs se desmontavam para se reagruparem em seguida, no entanto ali era uma escala muito maior. Com suor salpicando sua pele devido ao esforço de desviar os ataques com magia, ela pôde notar duas coisas: tais peças dos Sentinelas não pareciam mais querer formar um robô inteiro, muitas delas já estavam danificadas demais pelo combate anterior. A nanotecnologia presente conseguiu ainda recuperar algumas funções, como as pequenas turbinas que permitiam tais estruturas voarem entre os destroços. A segunda coisa é que havia cada vez mais velocidade nos ataques, talvez mais do que seus gestos conseguiam acompanhar. Ainda tinha que se manter concentrada em sustentar a barreira de proteção nos seus amigos e nos civis, ainda tinha que prestar atenção no que acontecia com Erik. Não estava cansada, mas estava dividida em muitas tarefas simultâneas para acabar logo com o combate. Existia a possibilidade de Zola querer apenas gastar seu tempo para concluir seu plano e essa era uma suposição que ela não permitiria se tornar realidade.

Rangeu os dentes, suas pernas muito firmes na mesma posição - até que ser firme já não era uma boa escolha. O corpo de Sentinela usado por Arnim Zola disparou meia dúzia de mísseis. Ela rolou para a esquerda para escapar de uma última perna de robô lançada sobre si e usou sua telecinese para frear os mísseis ainda no ar. Eles explodiram um a um, fazendo chover estilhaços, calor e fumaça sobre a arena, mas Zola apenas riu.

As peças que Wanda tinha desviado de si estavam todas ao seu redor e começaram a brilhar, saindo do chão e ficando à alguns centímetros do solo sujo. Ela engoliu seco, sem saber o que era o propósito exato daquilo. Ia erguer um escudo de energia para si própria quando afinal o ardil revelou seu objetivo: os membros do Sentinelas soltaram uma descarga elétrica na Feiticeira Escarlate. Era um cerco à sua volta, conectados por uma corrente que soltava estalos e luz azul.

E a eletricidade alcançou seu corpo.

A barreira de energia escarlate oscilou no primeiro grito da Feiticeira. Seus braços tremiam num espasmo incontido, seus dentes batiam. Não desejava desfazer o escudo protetor em seus amigos, mas foi inevitável. A parede que os mantinha em segurança desvaneceu-se no ar.

Seu corpo, sua magia, tentava instintivamente protegê-la contra o ataque, por mais que suas pálpebras estivessem fechadas e sua cabeça fragmentada por dor. Energia rubra cobria-a quase como uma segunda pele, para em seguida se dissolver. Podia até estar ainda de pé, mas Wanda tinha a postura encolhida, contraída sobre si mesma. Ela ouviu seus amigos avançarem no campo de batalha, tiros e comandos de ataque direcionados ao Sentinela usado por Zola e às peças que soltavam a descarga elétrica. Tudo em vão. Ele apenas soltou disparos com o tórax de sua carcaça em um contra ataque rápido e efetivo.

— Isso não te lembra, fräulein? Do laboratório onde você e seu irmão foram forjados? Tem sorte de eu ainda precisar de você viva… Mas logo isso vai mudar. Tudo vai mudar.

Wanda soltou mais um ganido, sem condições de responder ao comentário de Arnim Zola. Notou apenas a luz esmeralda da Máquina de Almas tornar-se ainda mais intensa, o som de seu funcionamento agudo e ininterrupto. Os gritos de Magneto recomeçaram graves, como se algo fosse descolado de seu corpo, e de fato: A Feiticeira, mesmo naquele estado, sentiu uma anomalia no ar. Algo que não deveria ser possível, mas que acontecia ali e agora. Uma alma sangrava, escorrendo direto para um receptáculo artificial e vil. Uma alma rubra, passional e cheia de dor. A alma de Erik Lensherr.

— Isso nada mais é do que o mais forte se adaptando. — Zola prosseguiu, primeiro se direcionando a Wanda, que havia ouvido mais discursos eugenistas do que queria escutar numa vida inteira. — Uma arma na mão daquele vai sobreviver. Pergunte à sua aliada, Vampira. Pergunte você também, herr Lensherr, à Mística. Vocês vão ver Sentinelas no futuro como nunca viram antes. E vai começar com você, Magneto. Isto é, depois de lidarmos com sua filha, claro.

Sabia que deveria morrer com aquele ataque e que, se não fosse por seus poderes, realmente já estaria com o coração em silêncio absoluto e irreversível. Ah, a dor. Eletricidade. Recordava-se de uma coleira e uma camisa de força, há alguns meses. Sim, antes disso lembrava-se de uma cela fria e de gritar pelo nome do irmão até ficar sem voz, quando foi alvo de experimentos. E, naquela memória, Wanda Maximoff era uma casca vazia que brincava com cubos de madeira, naquele seu estado dissociativo e caótico. Existia algo mais, algo mais vil. Lembrava-se quando os desintegrou com um gesto só, sem esforço.

E era o que faria agora.

Wanda gritou, punhos cerrados e luminosos. A descarga elétrica ainda a atingia de direções diferentes, através das peças dos robôs que a cercavam, mas agora a postura dela era firme, seus gestos expansivos. Não haveria corpo nem nada para que uma segunda cabeça da HYDRA crescesse. Sem mais Zola, sem mais Sentinelas. A Feiticeira pairou há pelo menos dois metros do chão, sua aura vermelha e olhos bem abertos.

Cada grama, cada pedaço, cada átomo de disparo ou peça, retorceu-se sobre si próprio e desintegrou-se com um ganido mastigado de metal. Ela se lembrava do preconceito que matava judeus, que matava roms, que matava mutantes. Wanda, a menina suja, a bruxa cigana, esquisita e judia. Se lembrava de tudo e muito mais. O caos dentro do tórax da Feiticeira jamais esteve tão certo em se deixar derramar em cada suspiro. Era algo que exigia sua concentração, algo que exigia controle. Algo que agora ela podia entregar à altura, sem se deixar levar pelo caos e pelos seus desejos cheios de vício. Rangeu os dentes, franziu a fronte.  Apesar de seu repertório de feitiços e proteções, era só ela naquele instante. Somente Wanda Maximoff e sua magia intensa, palpável. Era só o que ela precisava.

A cor escarlate tingia o ambiente como névoa estelar, brilhando e devorando os inimigos até que restasse apenas ela e Zola, a Máquina de Almas entre eles.

Uma a uma, cada peça de Sentinela ao seu redor se desintegrou. Não houve explosão, não houve pó. Só barulho agudo, seguido de silêncio. A eletricidade se desfez como se nunca estivesse presente, mesmo que seu corpo estivesse marcado.

Avançou, ainda no ar, ainda mais alto no céu. Sua figura era sustentada por sua magia, por seu ódio.

Ela encarou bem o rosto duro de seu pai abaixo de si, os vincos que a face dele fazia ao sentir dor. Mesmo sofrendo, havia um brilho nele, um lampejo de encanto ao assistir a jovem desintegrar uma horda inteira de robôs apenas com a força de seu pensamento. Com um apenas um aceno rápido de sua cabeça, Wanda obrigou o anel que girava a máquina parar. No segundo seguinte, tal arco de metal simplesmente foi arrancado e arremessado para o outro lado através dos poderes dela. A luz esverdeada da estrutura passou para um fraco pulsar, escorrendo para um ritmo gradativamente mais fraco.  Ela não sabia o que Arnim Zola queria dizer ao falar de um laboratório em Wundagore, mas não precisava dele vivo para descobrir e,de qualquer forma, algo dizia que ela encontraria as respostas sozinha. Olhou aquele Sentinela imenso, seu tronco grosso e seus braços e pernas capazes de esmagar um caminhão. O círculo no seu peito metálico começou a brilhar em amarelo, anunciando que carregava mais um disparo. A cor alcançou sua face, iluminou também a figura de seu pai, que por sua vez gritou de novo, clamando para que Wanda ficasse segura.

Ela não piscou. Seus poderes escarlates acenderam-se feito chamas, o caos palpitando em seu coração.

Primeiro, sua magia arrancou os antebraços do Sentinela, seus circuitos e fios soltando um ganido elétrico. Depois, ela desmembrou suas pernas e ombros. Cada parte ainda pairava no ar, inclusive o tronco e a cabeça. Isso fez com que ele adiasse o momento do disparo, sua voz mais uma vez destilando veneno e deboche:

— Eu não sinto dor, sua tola!

— Você não sentia nada antes mesmo de não ter um corpo. Só estou garantindo que não cresça outra cabeça da HYDRA.

Cada fração da cor escarlate fazia parte dela naquele instante, todas as Wandas que ela viu em diferentes realidades a acompanhavam quando encarou os olhos artificiais e mortos de Zola e sentenciou, antes que ele pudesse atirar:

Desapareça.

O som de um robô inteiro se desintegrando foi entrecortado, um barulho agudo e fragmentado de uma existência obliterada a menos que cinzas, menos do que nada. Ainda assim, Wanda teve a satisfação de ouvi-lo gritar enquanto era apagado daquela realidade, mesmo que lançar mão de tal poder provocasse um rasgo dentro de seu tórax. Em um segundo, havia o imenso Sentinela, que abrigava Zola. No outro, nada - apenas névoa.

Em seguida, quietude. Sólida e tensa quietude.

Wanda voltou ao chão e levou alguns segundos para conseguir andar. Seus ouvidos latejavam, mal escutou a gritaria de seus aliados do outro lado do campo de batalha. Estava congelada na mesma posição, seus olhos vermelhos e vítreos, que muito aos poucos voltaram aos tons de verde. Respirou fundo, acalmando seu ímpeto de prosseguir tocando os véus do universo. Tateou o espaço logo abaixo do nariz, checando se tinha sangrado como em tantas outras vezes. Não, não havia o calor do sangue ali. Tropeçou, avançou o que faltava de distância para chegar até ele, até Erik Lensherr. Com sua telecinese, ela soltou seus tornozelos e punhos, depois o colocou sentado no chão. Ele grunhiu, soltou um arquejo de dor e  se manteve com o tronco levemente erguido, já com intenção de se levantar. Wanda pegou seu rosto com firmeza, perscrutando sinais de ferimentos mais graves do pai, embora ele já respirasse com mais folga. Sua alma estava lá ainda, ela sentia. Abalada e ferida, mas . Estava prestes a perguntar o por quê estava sem capacete quando os olhos dele repousaram nos seus e um sorriso fraco e terno escapou de seus lábios.

— Você está com a tiara. — Ele constatou, sua mão trêmula na lateral de seu queixo. Wanda segurou seu antebraço com ternura, sem saber muito como responder àquele homem passional e cheio de autoridade, inteiro vulnerável na ocasião. Ele estava machucado, fraco. E, ainda assim, só conseguira reparar que ela vestia um presente dele.

A jovem sorriu de volta. O pai que ela conhecia era um homem gentil de lembranças desvanecidas, um rom que fazia bonecos de madeira. No entanto, a verdade era inegável. Ela e Magneto eram tão parecidos. Violentos, sofridos, vermelhos. Erik a encarava como quem havia perdido quase tudo, mas não uma última pessoa. A encarava como quem tinha ainda aquele fio de esperança de começar de novo. E ela seria diferente, afinal? Queria começar de novo. Estava começando de novo. E ela só pode responder, sua voz frágil:

Pai

— Isso é um sonho?

Ela sorriu, lágrimas ardendo escapar. Foi terrível notar o quanto sua voz saiu embargada.

— Sim, é um sonho. — E então, ela soltou um riso triste e lembrou-se da conversa em Zurique, entre os destroços na estação de metrô. Talvez ele achasse que Wanda não se recordava do que tinha revelado à ela, de suas palavras doces e frágeis. Mas ela se lembrava de cada palavra, de cada tom, de cada nuance entre dor e esperança. Da canção polonesa. Juntou fôlego para sorrir e dizer, numa paráfrase do que ele tinha dito antes: — Eu espero que essa parte seja feliz. Para mim. Para você.

Erik retirou a mão de seu rosto e entrelaçou seus dedos com os dela.

— Para nós.

Wanda o abraçou forte, desejando se ancorar naquele segundo para a eternidade.

 

Steve Rogers apareceu em poucos segundos ao seu lado, perguntando com séria preocupação se os dois estavam feridos e duvidando de quando Wanda respondeu que não. Sam veio logo depois, mancando e com a asa do equipamento danificada. Seu sorriso não era lá os dos mais radiantes que ele podia oferecer, mais como um fraco raio de sol entre as nuvens, mas a Feiticeira ficou feliz mesmo assim ao vê-lo. Ele a ajudou a se levantar e lhe disse, sua voz áspera pela dor, embora de humor evidente:

— Bem, bruxinha… Não é uma forma muito convencional de resolver as coisas, mas acho que é válido.

Wanda riu. Uma vez, há muito tempo, ele havia dito praticamente a mesma coisa pra se referir ao fato de que ela tinha extraído verdades estranhas da cabeça de James Barnes. Ouvir a mesma frase em um contexto tão diferente, tão maior e catastrófico, a fazia rir e perceber que realmente não fazia as coisas da minha esperada. Steve ajudava Magneto, ainda desorientado por todo aquele caos. E então veio Bucky.

O soldado chegou um tanto trôpego, segurando o braço metálico que sofreu sérios danos. Tinha fuligem na pele, arranhões, hematomas, e também aquela expressão de um sorriso implícito que Wanda tanto gostava de decifrar. Sua voz veio calma, um tanto cansada, e grave:

— Hey, boneca.

— Oi, James.

Não disseram mais nada. Talvez fosse mais uma não-conversa dos dois. Wanda só foi capaz de abraçá-lo forte, enquanto James acariciava seus cabelos com a mão direita. Não se sentiu constrangida apesar dos vários olhos sobre si e sobre James, mas notou uma lembrança vinda de Steve Rogers através de seus poderes escarlates. Era mais um pensamento, na verdade, algo terno em sua aura azul. Um pensamento sobre outra pessoa que foi traduzido numa pergunta:

— Cadê a Natasha?

Wanda se desenlaçou do abraço e encarou o Capitão América, que por sua vez tinha Erik Lensherr apoiado em seu ombro.

— Eu ia fazer a mesma pergunta. Não a vi quando cheguei.

Não demorou para ouvir uma voz macia se aproximando. Natasha Romanoff trazia sua antiga nêmesis, Yelena, apoiada sobre si. A outra russa estava notavelmente mais pálida que o normal, seu ombro sangrava. Ao lado, mais uma figura ferida e alva: Silver Sable. Esta parecia mais sã, apesar do sangue acumulado em seu antebraço, e sua atenção caia sobre Yelena de forma absoluta, preocupada - de maneira semelhante com qual Steve Rogers olhava para Nat agora.

— Aqui. Fui atrás de Belova. — Natasha encarou rapidamente todos no cenário, entre fumaça e destroços. — Vamos precisar de atendimento médico.

Magneto se remexeu um pouco, tentando recuperar sua postura reta e imponente. Não teve muito êxito, embora suas palavras fossem carregadas de peso.

Todos vão precisar. Há alguns jovens na ilha que poderiam ajudar, mas… — Se referiu às habilidades de cura de alguns mutantes, mas logo fechou os olhos numa expressão de dor. — Urgh, o efeito do soro ainda não passou.

Silver interviu:

— Posso fazer alguns telefonemas. Duvido que seja atendida pela ONU por quebrar o Acordo, mas ainda tenho alguns contatos.

— Um telefonema não vai adiantar se chegarem em quatro horas. — Natasha levantou um tom da voz. — Rooskaya vai morrer antes disso.

Bucky se ofereceu para apoiar Yelena com seu braço bom, notando que a outra estava cansada e frustrada. Wanda também captou com seus poderes algo mais terno, um desejo do soldado de querer cuidar de suas pequenas bailarinas. A Feiticeira tentou se recordar de feitiços de cura, mas a maioria envolvia ingredientes que ela não encontraria ali e não ousava a moldar a realidade para restaurar corpos naquele momento. Tiros e sangue eram mais complicados que cortes. O máximo que lhe vinha à cabeça era retardar os efeitos do disparo até que um equipe médica aparecesse. Ajeitou a tiara e acendeu seus poderes nas mãos:

— Talvez eu possa…

Uma voz conhecida escapou pelos comunicadores de Steve, Sam e Natasha, enquanto um som abafado de aeronaves se aproximava da ilha. Com a névoa cada vez mais fraca em Genosha, não demorou para enxergarem uma frota inteira de naves de design curvos e belos, de naves encaminhadas pelo único lugar na Terra que teria aquele nível de tecnologia: Wakanda. Quem falava era Shuri:

— Birnin Zana para Washington. Eu não estava certa quando disse que sempre precisavam de uma ajuda wakandana?


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Notas finais do capítulo

Olá! Mais uma vez venho interagir com vocês pelas notas finais. Sobre a votação anterior, a decisão é que teremos uma cena mais *intensa* entre a Wanda e o Bucky, embora seja algo delicado e implícito. Já está em desenvolvimento!
E agora lanço mais uma pergunta pra vocês : O que desejam ganhar de presente? Temos 3 opções:
1) Capítulo Extra WinterWitch. Vai ser postado à parte e vocês decidem entre Primavera, Verão, Outono e Inverno. Só fofura.
2) Asks WinterWitch. Sabe aquelas asks bem ~tumblr sobre ships? Entao, seria basicamente isso e também seria postado à parte. Aliás, todas as opções são à parte kdjsksja
3) Capítulo Extra de outro shipp da lore de Vazios. Vocês decidem entre Steve+Natasha; Remy e Anna; Jean + Scott + Logan (sim, trisal favorito); Ororo e T'Challa; Yelena + Silver Sable (eu gostei desse shipp hahah).
Digam o que acham!