Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 61
LXI


Notas iniciais do capítulo

05/09/2018
Ahá! Estou aqui novamente, mais cedo que esperavam! Mas seria muito triste deixá-los esperando depois do final do capítulo anterior, huh? Foi maldade, eu sei hahah Preciso dizer que a tiara foi um sucesso daqueles! Acho que foi uma surpresa legal e um item que eu não poderia deixar de colocar nessa fic. Enfim, agradeço a todos que continuam lendo ♥ Se possível, deixem um alô!
Boa leitura ♥



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Não foram somente os mutantes a notaram o perigo da situação. Os olhos dos Sentinelas estavam muito vivos e iluminavam o ambiente com sua luz doentia e amarelada, mirando o grupo composto por Professor Xavier, Ororo, Jean, Scott e Logan. A multidão se afastou do palco fazendo barulho e soltando exclamações de preocupação, enquanto os Mutantes deram um passo para trás. Logan afastou a cadeira de rodas do professor, já Scott colocou as mãos sobre a lateral de seus óculos, numa posição defensiva.

Tony Stark agradeceu por ser uma pessoa precavida, embora palavra certa para ele seja paranóico. Assim como em um 2010, quando enfrentou Ivan Vanko em Mônaco, ele trouxera uma versão relativamente  portátil de sua armadura. A diferença era que, ao invés de pesada e do tamanho de uma mala como a Mark V ou a versão que se acoplava ao seu corpo igual aos protótipos de 2013, a nova armadura foi reduzida a finos braceletes que cresciam em seu corpo, bem como as solas de seus sapatos e o aro de seus óculos. Tudo isso graças aos avanços em nanotecnologia compartilhados por Wakanda. Ainda não era a versão final - bem longe disso - e tinha que fazer alguns ajustes de compatibilidade com o reator Arc, mas era compacto o suficiente para emergências como essa. Só não era resistente o bastante para enfrentar robôs daqueles. De qualquer modo, foi só olhar para os cinco colossos a sua frente para que FRIDAY mapeasse os prováveis pontos vulneráveis a ataques: o centro do tronco, a cabeça e também os punhos, para que não tivessem chance de causar muitos estragos com disparos ou mesmo socos. O orador do congresso soltou gritos enquanto outras pessoas da equipe pediram para que os técnicos desligassem as máquinas e, coitados, eles tentaram. No entanto, cada uma delas deu um passo para fora do palco, seus pés grandes e o peso fazendo tremer as estruturas do local.

— Por que nenhum dos protocolos de segurança está funcionando? — Disse um dos homens do outro lado do palco, sua voz abafada pelo som da multidão que se espremia próxima as saídas. — Desliguem essas coisas ou então deixem as pessoas saírem!

Os jornalistas, ao mesmo tempo em que registravam os movimentos dos robôs, também tinham o mínimo de instinto de sobrevivência para se afastarem. Flashes de câmeras, gritos, oscilação de energia e a presença sufocante de cinco robôs. Era o plano de Arnim Zola de trancá-los e aniquilá-los. Nada disso estava na programação oficial do congresso em Zurique naquela noite, mas o combate estava prestes a se tornar atração principal. Parte dos antigos Vingadores, os X-men e os dois wakandanos seriam protagonistas desta peça.

— Eu vou acalmar essas pessoas. — Xavier afirmou, colocando o dedo médio e o indicador nas têmporas. Imediatamente os arquejos indistintos do público se reduziram a murmúrios, a movimentação caótica cedeu espaço a uma massa quieta. Alguns dos representantes do staff, antes tão perdidos quanto o resto, começaram a direcionar todos aos fundos da construção, nos corredores internos que davam as salas de controle, camarins e banheiros. Assim, ficariam longe do perigo. —  Jean, não deixe os Sentinelas atingirem o público, tente também abrir as saídas. Scott, Ororo e Logan, vocês sabem o que fazer, mas a prioridade aqui é a segurança dessas pessoas. Cuidado. Conto com todos para que esse seja um exemplo do que podemos fazer de bom.

— Sabe que muitos estavam aqui para votar numa caça aos mutantes, não sabe? — Logan fechou os punhos e revelou um trio de garras metálicas.

— Ele sabe. — Scott respondeu por ele. — E estamos aqui pela nossa espécie. Fazemos o que fazemos para honrar o que pregamos. Paz. E isso envolve não deixar pessoas morrerem.

— Foi uma boa hora para repensar a sua estratégia de fazerem as coisas nas sombras.

Jean não se deixou abalar pelo comentário de Tony Stark, tampouco ligou para as caretas de desprezo trocadas entre Scott e Logan. Com calma, tentou explicar em meias palavras:

— Nós raramente fazemos as coisas nas sombras. — Seu sorriso não dizia muito, embora houvesse muitas histórias por trás da afirmação. — Mas vocês nunca se lembram.

Tony fez uma anotação mental para visitar o Instituto Xavier quando voltasse para a América. O que diabos eles aprontavam lá?

— Okoye, você trouxe sua lança de vibranium?

— Sempre trago, meu rei.

O monarca tocou o próprio colar com as pontas dos dedos, logo uma camada de vibranium cobriu seu corpo inteiro e moldou seu corpo com o traje elegante e tecnológico do Pantera Negra. Stark também ativou sua armadura, embora o processo fosse visivelmente mais lento e a armadura em si não fosse tão impressionante. Dos braceletes e da sola do seus sapatos, metal cobriu seus braços, pernas, tronco. O óculos demorou para liberar o capacete. Stark e T'Challa se entreolharam nesse meio segundo, um olhar deveras constrangedor.

O bilionário até abriu a boca para tentar se defender, porém em seguida metal cobriu face, impedindo som de escapar seus lábios. Era a hora de lutar.

 

Tony Stark não sabia o que esperar das pessoas do Instituto Xavier, mas decidiu não se surpreender com mais nada depois que a vice-diretora, Ororo Monroe, invocou raios que desceram imediatamente dos céus e estilhaçaram a cúpula de vidro da construção, atingindo um dos Sentinelas. Apesar de não ter sido desligado completamente, com certeza causou uma avaria severa de modo que a máquina nem conseguia mais mirar com precisão nos seus alvos. De qualquer modo, ainda existiam outros para se preocupar.

Scott Summers colocou as mãos sobre a lateral de seus óculos estranhos e pressionou um botão que o levantava, quase como se levantasse uma espécie de viseira, permitindo a passagem de uma grossa rajada de laser vermelho sair de seus olhos.

Junto a T’Challa, Logan se lançou sobre os robôs, garras saindo de seus punhos. Ele urrava, fatiava e se movia rapidamente sobre o colosso, evitando ser pego e fincando as lâminas de seus punhos na carapaça do Sentinela. Já o Pantera Negra se focava em pontos estratégicos, também tentando fazer com que um Sentinela atingisse o outro. Okoye lhe dava cobertura, bem como Visão lançava raios de energia contra uma das máquinas.

Era claro que o objetivo dos Sentinelas se resumia aos mutantes, pois não miravam no rei de Wakanda, muito menos no público que ia saindo de cena. Nem mesmo pareciam levar o Homem de Ferro e Visão em seus cálculos. Tinham como alvo principal os dois telepatas que ficavam na retaguarda, Jean Grey usando sua telecinese para abrir as saídas e Charles Xavier que acalmava a multidão. Neles, os Sentinelas punham toda sua força, disparavam sem parar e tentavam alcançá-los. Com a ajuda de FRIDAY, Tony havia mapeado as áreas vulneráveis das máquinas e alvejava-os com pequenos mísseis e energia das palmas de seu traje. Um já havia sido destruído, graças aos esforços de Ororo, T’Challa, Logan e Okoye em conjunto. Tony queria alcançar o cerne da Inteligência Artificial dos Sentinelas para desligá-los por dentro, pois isso seria menos catastrófico, no entanto não obtivera  êxito algum. Somente conseguiu desmembrar um dos punhos de canhão de um robô. FRIDAY nem ao menos conseguia rastrear de onde vinham os comandos lançados para eles. De repente, dois deles pararam de contra atacar.

 Segundo mutante nível Ômega detectado nos arredores. Recalculando.

 Recalculando…

 Comando aceito. Concentrar esforços em ameaça vizinha. Tempo estimado para chegar ao local: três minutos. Tempo estimado para eliminação: dez minutos.

Decolar.

 Os pés dos robôs se abriram, revelando canhões de propulsão muito maiores do que Tony Stark tinha na sua armadura. Ele não se recordava tão bem quanto gostaria das classificações de mutantes, mas seu raciocínio era claro o suficiente para fazê-lo supor que as máquinas se referiam a Erik Lensherr no centro de Zurique. E se ele já estava enfrentando os Mata-Capas antes… Mal teria forças para lidar com um Sentinela. Sem falar que Tony não soube dizer se todos os metais  utilizados para construir os Sentinelas eram ferromagnéticos, ao menos o lado externo não parecia. Isso também não dava vantagem alguma ao mutante em questão.

T’Challa pareceu ler seus pensamentos.

— Stark! Você não pode deixar os Sentinelas chegarem no Centro! Eles vão matar Magneto!

— Eu não consegui desmembrar um! Um! — Voando, ele concentrou seus esforços no pescoço da máquina.Você precisa ir! Seu traje absorve todos os disparos deles!

— Eu não voo!

— Oh. Justo.

Visão, que acabara de desviar de um ataque e lançava um raio de energia da joia em sua testa, parou por um momento.

— Vá, senhor Stark. Nós cuidamos do resto aqui.

— Bem, Junior, eu preciso de cobertura lá fora.

Os robôs acionaram os propulsores, queimando tudo o que havia abaixo deles. Já estavam a dois metros do chão quando Ororo retirou seus ataques de um dos Sentinelas e flutuou até o Homem de Ferro.

— Eu vou com você, só… Faça alguma coisa.

— Ok, isso doeu. Mas vamos lá, temos robôs assassinos para lidar.

 

Dois Sentinelas saíram pela cúpula do prédio, Tempestade e o Homem de Ferro logo atrás.

***

O braço metálico de Bucky mais uma vez encontrou a aspereza do asfalto destruído, seus dedos arranharam os escombros tentando movê-los. Ele sentiu o suor na nuca e no cabelo solto, talvez sangue em algum ferimento que nem sabia que fizera durante a batalha contra os trípodes. Seus olhos estavam arregalados e fixos contra o lugar em que viu Wanda Maximoff pela última vez. Próximo dele havia uma pilha do entulho que tinha retirado dali. Ele ouviu distante o som de sirenes, talvez os bombeiros chegando na cena. Não tinha certeza. Não tinha como raciocinar muita coisa. Sabia que deveria ter dado cobertura a Wanda enquanto ela lidava com a muralha vermelha, sabia que tinha que ter cumprido sua missão de protegê-la.

Mas falhara.

Alguém falou com ele. Essa pessoa repetiu o que quer que tivesse dito, encostou em seu ombro. Foi nesse momento que ele notou que se tratava de Natasha Romanoff. Sua voz era suave, porém Bucky conhecia seu rosto e seus trejeitos de uma outra era. Apesar das palavras firmes, havia um quê de tremor no lábio inferior da russa. Estava com medo, ele conseguia ver isso.

— Vamos, Bucky. Uma equipe de resgate chegou. Vão usar cães farejadores.

— Sabemos onde ela está. — Ele ainda olhava para o chão. — Está aqui embaixo. E a cada minuto que essa tal equipe demora significa… Morte para Wanda.

Ela olhou para o chão também, depois se voltou ao rosto dele. O soldado sentiu as palavras que Natasha jamais diria. Sentiu o aspecto duro e cheio de arestas de cada sílaba.

Talvez não houvesse mais tempo.

Porque aconteceu uma explosão. Porque aconteceu um desmoronamento do asfalto e a entrada do metrô cedeu. É claro que tinha sido melhor Wanda ser levada por Magneto para as escadarias do metrô, era o mais próximo que teria de uma chance de sobrevivência. Estar exposta a uma crua e terrível explosão era a certeza de aniquilação. Mas só existam escombros ali. Escombros e mais nada.

— Eu sei, eu sei… — Ela respondeu. — Não era para ser assim. Eu não queria...

O vento forte trouxe o cheiro da fumaça e de certa forma o odor de metal quente, um pouco de pólvora. Muitas pessoas falavam. Eram o público, as equipes de Resgate, soldados recebendo assistência… James Barnes ergueu o queixo para os céus. Não se recordava do tempo de chuva antes, ou então não prestara atenção. Nuvens pesadas cobriam a cidade, em certos pontos o horizonte era colorido por raios. Os trovões ficavam mais e mais perto, como se para ilustrar a tempestade dentro da cabeça do Soldado Invernal.

Ele foi levado gentilmente por Natasha à companhia de Steve e Sam, onde Silver Sable acabava de deixar algumas palavras com eles. Imaginou que fosse algo que expressasse pesar, ainda que não se tratasse de nada muito sentimental. Na realidade ele não escutou  muito bem, tão aéreo que estava. Em seguida, ela se ausentou para acompanhar seus colegas de equipe na assistência médica.

Psylocke estava apoiada num bloco de concreto próximo. Apesar de sangrando, recusou a ajuda de paramédicos e negava a oferta de sair de cena numa ambulância. Parte de disso era causado por seu trauma de hospitais, vindo do histórico de mutantes enfrentarem experimentos desumanos e prisão. A outra parte vinha de sua vontade de esperar Magneto sair daquele buraco. Assim como Bucky, a mutante esperava. Só podia fazer isso, pois seus poderes não lhe adiantariam mais nada. Assim como ele, sua força era inútil. Porém esperar era o inferno.

— Ele está vivo, eu sei. — Ela soltou a frase num sopro. Seus joelhos estavam bambos, a energia violeta que soltava das mãos nada mais era do que um fraco espectro lavanda, formando asas de borboleta ao redor de seus olhos. Quando piscava, tal espectro desvanecia. Ninguém sabia se a mulher tinha de fato alguma habilidade telepática ou se aquelas palavras não passavam de uma oração.

Steve e Bucky cruzaram o olhar. Nada disseram e nem era necessário. Deram um abraço curto, Bucky recebeu pequenos tapas amigáveis nas costas. Não sabiam o que fazer ou o que falar. Nenhum dos quatro queria verbalizar a ideia terrível de que talvez… Houvesse um funeral de uma jovem. Sam limpou a garganta, franziu a testa como se de repente se recordasse de algo urgente.

— Então, — Engoliu seco. — Antes da avalanche de trípodes, Zola disse algo. Se algum deles se conectasse, os Sentinelas despertariam.

— E sementes da consciência dele… — Natasha interrompeu a própria fala, embora não existisse xingamento forte o suficiente para a situação. — Meu Deus.

Steve reprimiu uma expressão de dor, segurou as próprias têmporas.

— Precisamos agir. Se os Sentinelas realmente despertaram, temos que descobrir onde. Eu acredito que de alguma forma a Conferência esteja envolvida, afinal iam mostrar os projetos lá. E se eles estão lá…

— Tony vai enfrentá-los. — Natasha completou.

— Sim. Ele nos ajudou com a divulgação das provas, espero. É nosso dever retribuir.

Um assovio de Falcão.

— Vai ser estranho.

Bucky ficou dividido entre o dever de ir e o dever de ficar. É claro que o ideal seria acompanhar seu melhor amigo, era sua promessa. Uma promessa eterna, até o fim da linha. Aquele garoto mirrado que não fugia de uma briga, Bucky o seguiria. Foi o que disse mais uma vez, foram as palavras que deram um estalo em sua cabeça e o despertaram para a realidade em 2014.

Mas…

Bucky virou o rosto para a equipe de bombeiros de Zurique, que avaliava os estragos e a probabilidade de sobreviventes. Cães farejavam os destroços com seus adestradores. Algo dentro de si esperava que os escombros começassem a flutuar envoltos em névoa escarlate, revelando uma feiticeira com sangue escorrendo no nariz e um sorriso selvagem e quieto nos lábios. No entanto, ele também sabia que não podia orar que um milagre acontecesse duas vezes.

Steve o encarou fundo.

— Vamos precisar de todo o apoio possível… Mas não quero que Wanda fique sozinha quando a resgatarem lá debaixo. — O soldado agradeceu mentalmente por seu melhor amigo dizer “quando” ao invés de “se”. — Buck, fique aqui. Não deixe que a levem para qualquer lugar.

O rosto tenso de James Barnes se afrouxou, embora lhe restassem pontos de dúvidas. Era óbvio que Steve tinha notado algo entre ele e Wanda, pois era seu melhor amigo há praticamente um século e até citara qualquer coisa sobre fondue. No entanto, era ainda inesperado se deparar com sutil sensibilidade depois de anos sob o controle da HYDRA. Mais do que perguntar sobre seus anseios, Steve era capaz de notá-los sem que Bucky os dissesse e ele não podia ser mais grato por isso.

Uma pena que não soube responder da maneira que queria, além de uma monocórdica palavra:

— Entendido.

— Agora temos que descobrir um jeito rápido de chegar até lá. Duvido que os Mata-Capas nos emprestem um jipe oficialmente, mas Sable pode abrir uma exceção. E se não abrir, pegamos o jipe mesmo assim. Natasha…

Um relâmpago cortou o céu e iluminou a noite inteira. O trovão que se seguiu foi ouvido por quilômetros. Bucky franziu a testa e trocou um olhar rápido com Steve, enquanto Sam e Natasha compartilhavam um xingamento em admiração ao som.

— É aquele amigo de vocês? Aquele dos raios, o Thor?

Não era.

Começou a chover forte, pingos grossos e gelados. O que desceu do céu num impacto súbito no asfalto não foi nenhum deus nórdico, mas sim um homem de armadura vermelha e dourada. Bucky sentiu seu punho do braço metálico se apertar de forma instintiva ao reconhecer Tony Stark.

Houve silêncio em meio a chuva. Steve Rogers deu um passo à frente, sua postura, sempre tão altiva, agora um pouco vacilante. Ele ergueu o queixo e abriu a boca. O Homem de Ferro desativou seu capacete revelando seu rosto apreensivo, também com uma frase não dita nos lábios. Cada um deles mesmo, sem poderes telepáticos de uma certa Feiticeira, pode sentir o peso daquele meio instante trocado entre os dois. Tony olhou diretamente para James Barnes, olhou para sua amiga Natasha. Engoliu seco, chuva pingando em sua fronte, até que pareceu alarmado por uma lembrança mais urgente e muito mais importante. Não havia tempo para introduções, desculpas ou o sentimento de traição.

— Eu vim avisar. Uma mutante está lá em cima atrasando os Sentinelas, mas não sei se vai aguentar por muito tempo. Eles querem Magneto. Sentiram a presença de mutante nível Ômega.

Steve encarou o chão por um segundo, seu raciocínio longe. Bucky entendeu o que ele pensava.

— Não. Em Sokovia, na luta contra os Sentinelas… Eles detectaram ele e Wanda. Ela é Ômega.

— O… O quê? —  De tão chocado, Tony nem mesmo expressou raiva ou deboche pela fala de Bucky. — Wanda é mutante? Merda. E onde ela está?

— Ela foi… — Steve tomou a fala e indicou o local com um gesto. — Soterrada durante o combate. Nós...

Tony franziu os cenhos.

Merda.

O xingamento foi repetido mentalmente por Bucky Barnes quando um robô colossal pousou entre eles e Tony Stark. O chão tremeu e os bombeiros deram um jeito de afastar seus cães, pois sabiam que uma nova batalha se desenrolaria ali. Silver Sable, que dava os últimos comandos de recolhimento para sua equipe, virou-se para a cena fantasmagórica de um imenso robô andando sob a chuva, sua carapaça roxa e olhos amarelos.

Uma luz vermelha saiu do peito do Sentinela, fazendo uma varredura no chão. Não se importou pelo tiro dado por Sam Wilson e não considerava o Homem de Ferro voando mais do que um mosquito. A luz em forma de círculo, como um alvo, fixou-se nos escombros da entrada do metrô.

 Localizado. Iniciar contra medidas. Eliminação prevista para:

dois minutos.

 Os punhos do robô se abriram revelando canhões luminosos, mas nenhum dos Vingadores  permitiria que um Sentinela simplesmente matasse Wanda Maximoff enquanto estivessem lá. Ela era uma Vingadora também. Mesmo sem poderes, unidos dariam conta do robô - tinham que dar. Antes que um tiro grosso escapasse da máquina, eles atacaram.

Em algum ponto da luta, Bucky percebeu que uma mulher tinha se juntado a eles, uma mutante cujo rosto era familiar. Não tinha certeza se a viu pessoalmente em Wakanda no breve período em que ficou desperto ou se viu seu retrato na jóia kimoyo do príncipe T’Challa, mas não fez força para se lembrar naquele instante, afinal, não era conhecido por ter uma memória incrível. Já era sensacional o bastante conservar seus conhecimentos em línguas estrangeiras e a capacidade de calcular a mira perfeita, considerando os ventos e trajetória da bala, embora aquilo fosse já uma segunda natureza, instinto. O fato é que chovia e era difícil se locomover entre os escombros e poças d'água, dificultando a sua mira ao atirar contra o robô do Serviço Sentinela. Tony Stark atingia-o por cima enquanto Steve golpeava-o por baixo e fincava as pontas de seu escudo retangular nas juntas de suas pernas. Psylocke também o ajudava nisso, num ritmo fraco devido ao cansaço. Sam, Silver e Bucky gastavam balas no tórax e na cabeça dele, frustrando-se com a resistência de sua estrutura. Natasha estava agarrada no ombro esquerdo do robô tentando alcançar seu pescoço para eletrocutá-lo, mesmo que seu corpo escorregasse por conta da superfície lisa e molhada pela chuva.

O robô em si não parecia se importar com os Vingadores, porém incomodava-se com Psylocke e agora com a mutante no céu. Somente quando elas atacavam que a máquina tentava revidar, desviando-se de seu objetivo principal. Foi num desses momentos em que a mão dele, transformada em canhão, voltou a sua forma original e tentou alcançar as agulhadas que a mutante Psylocke inflingia aos seus pés. Ele tropeçou e caiu ajoelhado, fato que derrubou Natasha. Steve, por sorte, estava lá para pegá-la antes que rumasse para a morte certa.

Do centro do peito do robô, porém, saiu uma rajada de energia que atingiu os escombros da entrada do metrô. Bucky reprimiu um grunhido de sair da garganta e focou-se em atingir aquele ponto específico do Sentinela com o grosso calibre de sua arma, mesmo que isso fosse pouco em comparação com o dano que a máquina causava. Nem parou para pensar no que poderia ter acontecido com Wanda se aquele tiro de energia tivesse a atingido. Mas um, dois, três, cinco tiros. Nada. A cada segundo que se passava e a rajada de energia permanecia acesa contra o local onde estava a Feiticeira, lá embaixo, Bucky sentia seu estômago se afundar. No momento em que pensou em simplesmente sair correndo para absorver o impacto com sua braço de vibranium, um novo auxílio veio ao seu encontro.

O yeti. Ou, se não fosse um yeti, um monstro branco e peludo sem nome. Bucky reconheceu a transmorfa da equipe Mata-Capas, e caso se recordasse bem o nome dela era - ou um nome artístico dela - Snowbird. Deu um soco no Sentinela e apesar de não movê-lo do lugar, o fez parar com o ataque. O problema é que levou um soco de volta e foi parar do outro lado, transformando-se de volta numa humana uniformizada.

Os escombros do metrô agora jaziam com um buraco.

A mulher que Bucky viu no céu tinha inconfundíveis cabelos brancos e, se sua vista não o enganasse, ela agora tinha os olhos luminosos e alvos também. Ela voava sem a ajuda de nenhum equipamento e, diferente das pessoas com habilidades que Bucky conhecera, não havia nenhum tipo de aura cintilante ao redor do seu corpo. Ela gritou algo que não pode ouvir, mas que Tony pareceu entender perfeitamente lá do alto.

— Galera, todo mundo se afasta! A Tempestade aqui vai fritar o nosso amigo.

— O quê? — Steve carregava a parceira para longe, evitando pedaços de destroços. Não entendera bem o que o bilionário disse por conta do barulho chuva e a adrenalina não ajudava. Ao menos o ritmo entre Capitão e Homem de Ferro era fluido e não precisavam de mais palavras:

— Sai daí, desgraça!

Deu tempo apenas para se afastarem meia dúzia de passos do robô. A mulher no alto uniu as mãos sobre a cabeça como se segurasse algo, até que o céu noturno obedeceu aos seus comandos e formou um raio imenso e brilhante entre os seus dedos. Com um gesto descendente, a mutante lançou o relâmpago no Sentinela.

Um clarão cegou a todos momentaneamente.

Quando Bucky voltou a enxergar algo, assistiu o cenário escuro em contraste com apenas alguns focos de luz. Um era a armadura de Tony Stark, outros pontos a distância se tratavam de postes da cidade e o último eram os olhos amarelos do Sentinela falhando. Estava parado e ajoelhado, seus membros soltando faíscas azuis. A mão ainda estava estendida, travada, sobre o buraco em que abriu entre os destroços, embora não houvesse sinais de vida vindo dali ou do robô. Tudo preocupava Bucky imensamente.

A mulher pousou perto, ajudando Psylocke a se levantar. Seu rosto era gentil e a chuva amenizou-se à uma breve garoa depois do sorriso reconfortante oferecido por ela à outra mutante. Sable correu para ver a amiga do outro lado da cena de combate. O Homem de Ferro também desceu dos céus, embora ainda observasse o robô com muita atenção. O alívio era geral, mas o receio falava mais alto.

E com razão.

Bastou um segundo de descuido para que a máquina soltasse um som alto, suas peças internas arranjando-se de volta para o lugar. Natasha soltou um grito de alerta, Sam praguejou. A mão estendida de fibra de carbono do Sentinela avançou para dentro do buraco de maneira rápida e predatória, prestes a cumprir sua tarefa:

Eliminação.

Mas estacas de metal o empalaram. De dentro dos escombros, os trilhos do metrô ganiram ao se desprender do solo, tira por tira, atingindo a cabeça e o tronco do imenso Sentinela. Ele tombou para trás devido ao impacto, tentou se levantar e tirar as estacas de seu corpo artificial. Bucky deu um passo para frente, desacreditado. Uma outra faixa de ferro atravessou o tórax da máquina, estilhaçando o material que compunha o canhão central.

Foi nesse momento em que Magneto surgiu dos destroços, sua capa chamuscada e o elmo rubro ainda mais escuro. Havia apenas ele e a chuva fraca no céu, até que Bucky percebeu que ele trazia Wanda Maximoff em seus braços.

Bucky não conseguiu se sentir exatamente reconfortado por esta visão. O pescoço dela pendia para baixo, seus cabelos soltos. Havia algo vermelho acima da testa dela, uma espécie de tiara, se esta fosse a palavra. A Feiticeira Escarlate jazia inconsciente. Ele piscou de forma demorada, a boca de repente seca e a arma muito pesada nas mãos. Por qualquer deus que existisse, Bucky orou para que ela não estivesse morta.

A expressão de Erik Lensherr era severa. Com um aceno curto, um mero levantar de queixo, outra faixa de ferro saiu do buraco do metrô e atingiu o Sentinela na diagonal contrária da estaca anterior, traçando um um imenso X. O robô não lutou mais para tirar aquilo do corpo, seus movimentos apenas diminuíram mais e mais até que não sobrou mais resistência. As luzes que compunham seus olhos apagaram-se em definitivo. Seu corpo não era mais do que uma carcaça inútil.

Chuva, silêncio e vermelho no céu noturno de Zurique.

Magneto era contemplado tanto pelos Vingadores quanto pelo público comum que acompanhou a sequência. Seu poder era tão forte, tão absoluto, que parecia palpável na atmosfera e capaz de atrair todas as coisas, não só ferro. Era só estender a mão e senti-lo. Ainda acima de todos, a voz dura do mutante se fez ouvir sobre as demais:

— Nessa mesma cidade e nessa mesma noite, vocês decidiam se devíamos viver ou morrer. Olhem de novo. Olhem essa máquina moribunda, enviada para matar mutantes já enterrados em escombros. Nós nos levantamos dessa cova. — Sua voz atingia a todos assim como as estacas de metal atingiram o Sentinela. Certeira e simples. Mesmo que ferido, Magneto estava firme e parecia ter passado da ira em chamas, borbulhando então uma fúria serena e justificada. Segurava bem a jovem nos braços. — Vocês testemunharam as consequências àqueles que tentam nos destruir, àqueles que matam mutantes. — Uma pausa, seu tom ainda mais carregado. — Àqueles que ferem a minha filha. Que sirva de exemplo para o Homos sapiens, pois invoco o Homos superior a repetir comigo: “Nunca mais.”

 Não houve som que quebrasse as palavras sólidas de Magneto, nem mesmo o fogo ocasional entre os destroços ousava crepitar. O mundo inteiro era composto de quietude, quietude tal que Bucky sentia na garganta ao ver o mutante trajado em carmesim e cinzas descer do céu. Pousou no asfalto molhado, o cenário de destruição ao seu redor e curiosos ao fundo, repórteres. Ele olhou para o rosto desacordado de Wanda por alguns instantes sem um único dizer, somente sentimentos. E então inclinou o queixo, se virou em direção aos Vingadores - e andou até eles.

Tony xingou baixinho, acompanhado por Sam. Natasha mandou-os calarem a boca. Steve endireitou a postura, Bucky também.

As suspeitas de Wanda portanto eram verdadeiras, suas confissões recentes durante uma madrugada em São Petersburgo. Como eram verdadeiras ninguém sabia, suspeitava que nem mesmo ela ou Magneto a sua frente. Não era filha de quem achava que era e agora, além de todos os títulos, rótulos pelos quais foi marcada a vida inteira, Wanda era também mutante e, seu pai, considerado o maior vilão entre eles. O mundo inteiro agora tinha conhecimento disso.

— Ela confia em vocês. — Era uma constatação, não uma pergunta. Não era, porém, uma afirmação de que ele confiava também. — E cuidaram dela depois da batalha em Sokovia. Fizeram um bom trabalho, embora tenham a trazido para cá. Para o lugar que poderia ter sido seu jazigo.

— Na verdade, foi ela que nos trouxe. — Steve deu um passo à frente, as mãos unidas e apoiadas no cinto. — E fico aliviado por isso. Se não estivéssemos aqui, haveria mortes.

O Capitão América se referia ao próprio mutante e aos inocentes nos arredores, mas Magneto sorriu de lado e concordou, num tom sombrio. Se direcionava aos Mata-Capas e aos responsáveis pela violência:

— Sim. Haveria mortes.

E não se sentia mal por isso.

Com o canto dos olhos, viu a mulher de cabelos brancos estremecer quase que imperceptivelmente. Estava firme, apoiava a outra mutante - Psylocke - em um dos ombros, porém o instinto a fez temer pelo tom utilizado pelo Mestre do Magnetismo. Não, não temer. Se preparar.

Bucky desejou manter o olhar firme ao rosto severo de Magneto, mas seus olhos o traíram e sua atenção caiu sobre a face de Wanda Maximoff. Ela estava com a face suja de cinzas e sangue seco mais ou menos limpo, os lábios ligeiramente abertos. Respirava. Nesse momento, ele pôde voltar a respirar também. Percebeu em seguida que o mutante o encarava fixo, de forma predatória. Ele deu um passo em sua direção.

— Você. Matou o presidente que podia ter conferido direitos aos mutantes há décadas atrás. Foi responsável pela minha captura. — Steve se antecipou para intervir ao mesmo que tempo em que Stark perguntava em voz alta se tinha sido JFK, mas não foi necessário. Magneto repeliu qualquer palavra dele com apenas uma erguida de sobrancelha. — Um dia entenderei como nem parece o mesmo homem, embora use o mesmo rosto. E um dia entenderei porquê Wanda confia tanto em você. Por enquanto só preciso que a mantenha a salvo e que… Não a deixe perder a tiara.

Dito isso, Magneto se aproximou para passar Wanda aos braços de Bucky. Antes de pegá-la, ele virou a alça do fuzil na mão para colocar a arma sobre o ombro, e assim que se endireitou, ergueu os braços para receber a jovem. Ela pareceu recobrar a consciência levemente naquele instante, balbuciou algo sem sentido e desmaiou de novo. A boca de James Barnes quis se derreter num sorriso, mas ele soube conter suas expressões na frente de Magneto.

O olhar do mutante permaneceu sobre ele.

— Se algo acontecer com ela e você for o responsável, eu saberei. E você vai desejar não ter um pingo de ferro correndo no seu sangue, muito menos ter um braço de metal.

Bucky assentiu.

— Senhor, hm, Lensherr? — Tony Stark se pronunciou, o capacete aberto. — E aonde vai? Não acha melhor…

— Sei o meu lugar. É ao lado dela, mas agora não é o momento. Eu vou para Genosha e demando não ser incomodado.

— Vai precisar de mais segurança. — Steve argumentou. — E cuidados médicos.

— Eu tenho o necessário. Psylocke, venha. Nós vamos para casa.

Ela se desenlaçou da outra e caminhou um tanto trôpega ao encontro de Magneto, que por sua vez atraiu um pedaço de metal de uma estrutura próxima e a fez de plataforma. Bucky imaginou que faria aquilo flutuar em direção a outro destino, assim como fazia com os solados de metal para voar. Antes de partirem, uma última palavra:

— Nós vamos nos encontrar novamente. Espero que ainda estejamos do mesmo lado.

Ele pousou seus olhos sobre Wanda de maneira terna e demorada antes de alçar voo e desaparecer no horizonte escuro e sem estrelas.

 


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Notas finais do capítulo

*Alguém havia pedido mais momentos genro X sogro? Hahah tadinho do Bucky, vai acabar sem braço!

*O capítulo foi revisado, mas existe a possibilidade deste arquivo ser sabotado pela HYDRA. Caso encontre algum erro, favor reporte à Shalashaska