Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 58
LVIII


Notas iniciais do capítulo

20/08/2018
Gente, então.
Eu to com meu braço engessado hahaha
Lembram da tendinite que falei, amiguinhos? Ás vezes a dor pode piorar oaidhaos Nada grave, porém, tirando o fato que minhas habilidades para fazer qualquer coisa com a mão direita é nulo. A felicidade é que na quarta-feira eu tiro o gesso hahah
Eu agradeço muito o apoio de todos vocês. No último capítulo eu estava meio bad por coisas ruins que aconteceram, mas contei com o apoio de muitas pessoas queridas. Em troca, aqui vai outro capítulo e tenho outros já finalizados que irei postar ao longo da semana. O único porém que não vou postar imagens por enquanto, lamento.
Também cabe aqui um pedido de desculpas para a galera que conversei antes e que disse que iria postar no final de semana. Não estava nos meus planos ter o braço engessado, de verdade. De qualquer forma, atitudes são melhores do que palavras, portanto tenham a certeza de que um novo capítulo sairá ainda essa semana, acredito que quarta-feira. Já está pronto!
Boa leitura!



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Tony raramente se intimidava em iniciar conversas com pessoas importantes ou fora de seu círculo social, e aquela noite foi uma dessas esporádicas situações em que ele quis - mesmo que por uma fração de segundo - sair da própria pele ao dialogar com estranhos. Era óbvio para qualquer um que não fazia parte daquele grupo de ativistas mutantes do Instituto Xavier, e era ainda mais perigoso que fosse visto com justamente tais ativistas, pois sua posição de filiado a ONU pedia certa discrição em assuntos polêmicos. Ainda bem que ele era Tony Stark e tinha passe livre pra fazer coisas de potencial catastrófico e estúpido.

Deixou Visão em seu lugar marcado. Ele parecia um tanto enjoado por conta do pulso eletromagnético que fizera a energia oscilar, tanto que nem se queixara por Tony se ausentar novamente.

— Boa noite, pessoal. — Cada um deles interrompeu a própria conversa e preocupações com o Congresso para encará-lo, embora não de forma muito receptiva. Tony vestiu a irreverência como uma armadura e sorriu. — Vocês parecem bem unidos, talvez pudessem usar uniformes. Amarelo, azul… Ou então roupas escuras, bem começo dos anos 2000.

A ruiva que FRIDAY identificara com o nome “Jean Grey” o observou longamente, como se para decorar as linhas de expressão de seu rosto e contar os poros de sua fronte. Era algo semelhante com o que Wanda Maximoff fazia quando bisbilhotava a cabeça de alguém, porém algo dizia que tal gesto era teatral, de propósito, talvez para afugentá-lo. Não era como se ele não tivesse visto coisas piores do que uma estranha buscar seus olhos. Ele piscou para ela e isso a fez voltar para a realidade. Neste momento, T’Challa aproximou-se acompanhado do homem de óculos engraçados, que pareceu bem incomodado com a abordagem de Stark em Grey. O Homem de Ferro não precisou ver os olhos do tal Summers para saber que estava com raiva.

— Senhor Stark. — T’Challa o saudou em reconhecimento. — Não acha que esse é um momento inconveniente para…

— Sei, sei. Opressão mundial, falhas de energia aqui, falas preconceituosas daquele cara da bancada...— Adiantou a conversa. — Não estou aqui para reclamar do serviço do garçom, Majestade. Mas é bom saber que tenho sua atenção.

A general do rei de Wakanda, antes distraída com um diálogo paralelo com Ororo Munroe, voltou ao lado de seu monarca e travou com ele poucas, porém violentas, palavras em sua língua natal. Tony também não precisou conhecer o idioma para entender que se tratava de algum tipo de ameaça por ter se direcionado ao rei com pouco respeito. Ele fechou os olhos, um tanto estressado. T’Challa levou o caso com frieza, amenizou o humor de Okoye e por fim suspirou.

— Ah, — Stark deu mais um passo para perto do Pantera Negra. Há tempos que ele imaginava que T’Challa pudesse estar envolvido com as missões ilícitas de Steve Rogers de alguma forma, ou então era sua neurose falando. A questão é que precisava da ajuda do rei para expor o esquema de Zola em pleno Congresso e tal coisa seria mais agradável se não houvesse outras cinco pessoas encarando-o. Tentou deixar a sensação de lado, pois não tinha tempo para digerir sua ligeira ansiedade. Valeu-se pelo sarcasmo. — Que bom que vamos deixar as formalidades de lado. Eu precis-

Ele estava errado. Ou parcialmente errado. Não teve como escapar do ritual das apresentações e formalidades.

— Jean Grey. Mas acho que já te contaram isso. — A mulher interrompeu sua fala, erguendo a mão num cumprimento. Tony retribuiu de maneira automática, um tanto surpreso. Ela, em seguida, se virou para o próprio grupo, principalmente para o senhor cadeirante que vinha de outra direção, sua cadeira de rodas trazida pelo sujeito mal encarado. — Ele tem informações importantes para nós.

Silêncio.

— Sou Charles Xavier, diretor do Instituto Xavier para Superdotados. — O careca de mais idade se apresentou, um poço de calma. Seu rosto era gentil e Tony poderia simpatizar mais com ele se lá fora não houvesse um cientista suíço querendo um genocídio e um líder revolucionário capaz de destruir Zurique inteira. — E esses são meus alunos, digo…. Ex-alunos. Ororo hoje é vice-diretora, Jean e Scott dão aulas.

Por algum motivo, Stark pousou sua atenção sobre o homem que puxava a cadeira de rodas de Professor Xavier. Não mencionara nada sobre ele, embora já soubesse por FRIDAY que o nome dele era James Logan Howlett. Vestia uma camiseta branca por debaixo da jaqueta preta com faixas amarelas, o couro surrado como se comprado num brechó há anos. Seu cabelo escuro tinha um jeito despojado e agressivo. Ele soltou um pigarreio baixo e rouco.

— Logan. —Disse seu nome, suas mãos sobre os apoios da cadeira de rodas como se apertasse o guidão de uma moto Harley. — E estou com eles porque Xavier tem whisky de quarenta anos no escritório e cigarros cubanos.

Em um flash, Stark imaginou que se daria muito bem com o tal Logan, mas precisava atender ao seu dever antes de pensar em um copo de whisky.

— Vocês sabem quem eu sou. — Respondeu. Depois franziu a testa. — Espera, como sabe que tenho “informações importantes” pra vocês?

— Ela é telepata. Eu solto laser pelos olhos. — O rapaz cruzou os braços. Ele falava sério com suas frases cheias de acidez, embora Tony tenha ficado mais impressionado com seu aspecto polido e cabelo liso ligeiramente repartido. Quem sabe Steve se desse bem com aquele outro, Scott Summers. — Nós somos os mutantes que vocês têm tanto medo.

— Scott… — Jean o repreendeu com sua voz suave.

— Não, minha querida, eu acho que consigo me defender dessa. — Tony parou um instante. Tinha pressa, mas não ia permitir que acreditassem que compactuava com a caça ao gene-X. — Quero que conste nessa conversa que nunca votei para nada no Projeto Sentinela. Recusei compartilhar tecnologias das Indústrias Stark.

— Exatamente. Nunca compactuou, mas nunca votou um “não”.

A respiração de Tony tornou-se pesada e FRIDAY recomendou outro copo d’água, embora tivesse também mapeado três pontos vulneráveis de Scott Summers na tela dos óculos escuros. Um soco na maçã do rosto, um golpe na lateral do aparelho que englobava a visão do outro, mais um último ataque na altura de seu esôfago. Três golpes sugeridos por FRIDAY, que talvez tivesse passado muito tempo com Karen e seu modo “Morte Súbita”.     

— Eu estou aqui em Zurique por um “não”. — Retomou o ar. — E estou aqui na frente de vocês por um “não” ainda maior. Estou fazendo fazendo agora mais pelos mutantes do que imagina.

— Ele está certo. Essas votações são quase simbólicas e um filiado como Stark não tem direito a voto, e sim os representantes oficiais do Estado.— Jean Grey o apoiou, sem se tocar o quanto era desconfortável para o engenheiro ter alguém que ouvia seus pensamentos assim como ouvia sua voz. — Magneto está aqui.

Ororo ficou lívida, Professor Xavier gaguejou:

— Aqui?

— Ele deu um pulo no centro. — Tony afinal tinha a palavra e expunha o assunto necessário.— E Steve Rogers está lá fora impedindo que ele cometa alguma bobagem ou seja morto por Arnim Zola.

— Steve Rogers realmente está aqui na Suíça? — T’Challa estava com a face dura, seu sotaque rangendo. — Ele…?

— Majestade, eu não faço ideia de seu grau de envolvimento com Rogers nesses últimos meses, mas não importa agora. — Vendo a face confusa dos mutantes presentes e sabendo que apenas Jean poderia entender sem que explicasse, Tony se sentiu na necessidade de resumir: — Zola é um cientista que transformou sua própria mente em uma Inteligência Artificial e apoiou inúmeras mortes. Responsável pelo Projeto Insight em 2014. Steve me passou agora provas de que o fulano é culpado por diversos experimentos com mutantes, incluindo com o próprio Magneto e a filha dele, Lorna… — FRIDAY recapitulou a informação na tela do óculos. — Lorna Darne. Magneto quer um acerto de contas,  Zola quer a aprovação dos Sentinelas.

— Erik está sofrendo. — Disse Xavier, com compaixão. — Ele tem se alimentado pela raiva há muito tempo, é melhor que nós cheguemos o quanto antes aonde ele está.

O Homem de Ferro se odiou por saber que aquela não era uma boa ideia. Em realidade ardia por estar onde Steve e Natasha estavam, no meio da ação e salvando o mundo. Sentia falta dos velhos tempos, de agir com fluidez com seu grupo e rir com eles depois de levar alguns hematomas para casa. Doía ver os mutantes unidos a sua frente e lembrar do seu grupo que nao existia mais. No entanto, sua parte nessa difícil missão era tática e no Congresso, sob o olhar do mundo. Merecia atenção dobrada. Contra seus instintos de acionar sua armadura e sair voando, se forçou a ficar.

— Isso só vai servir para mostrar o quanto os Sentinelas são necessários. Vejam, ninguém mais sabe direito sobre Zola e os experimentos contra mutantes, toda a manipulação. Só vão ver um mutante revolucionário arrumando briga e mais outros dando apoio. Sem falar que tem Mata-Capas lá.  

— Então não podemos ir, mas não adianta ficar. — Ororo concluiu.

Um silêncio pensativo se instalou sobre eles, até que Scott se pronunciou:

— Estamos esperando a parte em que você tem uma sugestão melhor.

— É. — Logan apoiou os cotovelos no encosto da cadeira de rodas de Xavier. Tony ponderava se aquilo era falta de respeito ou não, no entanto lhe pareceu que aquilo acontecia com tamanha frequência que ninguém se importava mais. — O Homem de Ferro salva o dia? Ou a gente tem que fazer o serviço sujo?

— O quê? — Foi o que Tony se limitou a dizer.

— Se bem que isso faria valer a pena essa viagem escrota.

— Logan, não fale assim. — A vice-diretora, de cabelos brancos, fez uma expressão severa. Indicou a figura de Okoye e T’Challa com os olhos, preocupada.  — E você concordou em não reclamar.

— Só porque fiz uma aposta com a guria. Se eu passar essa viagem sem levar muita bronca sua, ela vai pedir para aquele namoradinho dela gelar minhas cervejas por três meses.

— Mas o vocês fariam, afinal? Nunca soube, sei lá, dos Superdotados do Xavier em lugar nenhum!

— É porque fazemos nosso trabalho direito. Ninguém precisou de aplausos e ninguém precisou quebrar uma cidade inteira.

— Diz o cara que solta laser pelos olhos.

— Quieto, Logan!

— Quando lidarem com robôs assassinos e aliens voando em Nova York, aí discutam comigo sobre quebrar uma cidade inteira. Aliás, voces deveriam rever essa politica de não se mostrar pro mundo, quem sabe aí as pessoas tivessem mais confiança na causa mutante e a gente não precisasse vir num Congresso desses! — Tony segurou um ponto entre os olhos, sentindo o cortisol subir. — Eu não acredito que to discutindo isso enquanto Arnim Zola tenta se safar.  

— Bom, mas… O que faremos?— O professor uniu os dedos com as mãos apoiadas sobre o proprio colo. — Sua cabeça está dividida entre muitas variáveis, não consigo acompanhar muito bem.

— Ah, então o senhor é telepata também? — Stark soltou um longo suspiro. — Serei franco que meu objetivo não era falar com vocês… Só que ficaram no meio do caminho.

— Suponho que eu era o objetivo? — T’Challa tinha uma sobrancelha erguida.

— Exatamente, Vossa Majestade. Rogers me deu um roteiro. Tenho todas as provas de que Zola está por trás de tudo e que teve ajuda de algumas nações. Preciso mostrar isso para o mundo e o Congresso é o palco perfeito. Mas eu preciso de uma assistência técnica.

— Assistência técnica? — Okoye repetiu, um tanto confusa e um pouco enojada com a comparação.

— Sim. Sei que tecnologia wakandana não usa o mesmo tipo de codificação ocidental, nem oriental. Não foram afetados pelos pulsos PEM, então pode comandar que redirecionem o sinal de nossas mensagens pro mundo inteiro através dos satélites. O mundo inteiro vai ver qual é a real intenção do Serviço Sentinela e repudia-lo no mesmo instante.

T’Challa ficou um minuto em silêncio, Okoye acompanhando-o. Eram ainda cautelosos em expor o país no cenário político internacional para não trazerem desgraças à própria nação, porém não podiam negar tal ajuda, pois isso significava sobrevivência para os mutantes fora de Wakanda. Eles já estavam lá pelos portadores dos gene-X, sentaram-se junto aos ativistas do Instituto Xavier…

O rei olhou para Ororo Munroe e tomou sua decisão.

— Contará conosco. E você, Stark? O que vai fazer?

— Serei a diva. — Não sorriu, já começando a arquitetar detalhes sobre o mecanismo do plano, quais mídias acessariam e quais provas mostraria primeiro. Sua cabeça trabalhava rápido e em série, triturando as ideias. — Mas mantenham Summers por perto. Nunca se sabe quando vai precisar de efeitos de luz com laser.

Logan soltou uma gargalhada rouca.

Seria uma noite interessante.

 

Visão foi útil em auxiliar o rei de Wakanda acessar o que passava-se nos telões do congresso, embora tenha sido a lábia de Tony Stark que permitiu a passagem deles para os bastidores. A maioria dos técnicos estava mais preocupada em dar continuidade às apresentações depois das quedas de energia, sem tempo para reparar nos estranhos que não tinham credenciais autorizadas. Passaram por uma das salas anexas com a porta aberta, inúmeras telas monitorando o saguão principal e os Sentinelas. Seguiram em frente pelo corredor, viraram a esquerda duas vezes e  então encontraram seu objetivo.

— Aqui. — O Pantera Negra indicou com um gesto. Parecia vazio. Entraram no recinto e olharam a miríade de cabos e telas, algumas desligadas.

— Bem, — Logan soltou um assovio longo. Concordou em acompanhá-los porque, segundo ele, nao estava fazendo mais nada divertido. Justamente por decidir ficar perto do rei de Wakanda, Okoye se viu na necessidade de se juntar ao grupo. Não iria deixar seu rei à própria sorte com um selvagem daqueles. — Eu só sei lidar com a antena de TV.  E geralmente é com um pontapé. Boa sorte para vocês três. Vou ficar do lado de fora para checar se algum babaca chega.

— Sim. — A guerreira estava aliviada por aquele sujeito se afastar do monarca.

— Se alguma pessoa chegar, nos avise. — Visão pediu.

— Tranquilo, torradeira. Se algum idiota chegar, dou um jeito. — Ele mostrou as garras de uma das mãos. — Mas vai ser do meu jeito.

— Oh. Tudo bem, senhor Howlett.

O Pantera tentou não rir do contraste entre os dois: um sintozóide com a educação de um britânico e o mutante de aspecto rude. Talvez o melhor fosse ver a expressão de nojo de Okoye.
Na realidade duvidava que Logan partisse direto para uma agressão, mas percebeu que ele também havia se divertido em brincar com as expressões artificiais da criação de Tony Stark e Bruce Banner. Sacudiu a cabeça e perscrutou seus olhos sobre os painéis de controle.  

Não havia necessidade de hackearem cada sistema das emissoras presentes para retransmitir para o resto do mundo, pois o que eles mostrariam  - independente do quê - já seria televisionado. O rei retirou uma das contas da joia kimoyo em seu pulso e inseriu no painel. O que antes era uma esfera dura de sua pulseira achatou-se como massa.

O foco dos olhos de Visão estreitou-se, impressionado.

— Do quê é feita essa conta, Vossa Majestade? Estou analisando, mas não encontro uma resposta conclusiva. Suspeito que seja uma espécie de liga, nanotecnologia… Fascinante.

— Você chegou perto. — O monarca disse, olhando agora para o próprio pulso. Selecionou a conta de comunicação direta com seu país, já colocando sua senha de segurança para acessar os satélites da nação. Redirecionar e amplificar o que era transmitido na Suíça era uma tarefa fácil. — Mas a resposta levaria mais do que quinze minutos para ser satisfatória,  tempo que não temos.

— É claro, Majestade.

Pantera franziu os cenhos. Não obtivera nenhum tipo de toque ou mensagem de Shuri. Quem pediu a confirmação de seus acessos foi a própria Inteligência Artificial, não sua irmã - que sempre era sua retaguarda em missões fora do país. Ela não tinha o costume de seu ausentar de deveres assim, pelo contrário: ficava vinte e quatro horas online e à disposição.

— Tem algo de errado.

— Com a retransmissão? Eu deveria… Adequar o painel três? É da emissora de Londres e me parece com problemas na codificação.

— Faça isso, mas não ligo para a emissora de Londres. O problema é minha irmã. Ela não atende.

Okoye trocou um olhar preocupado com T’Challa.  

— E precisamos dela para completar a tarefa?

O rei sabia que era uma pergunta inocente do sintozoide, mas lançou-lhe a frase seguinte com o ar pesado. Era isso ou a lança de Okoye atravessada em sua garganta vermelha e artificial.

— Não, não precisamos. Continue com o código para Londres, eu finalizo o resto. Okoye, fale com a equipe de Wakanda...

— Sim, Majestade

— Tony está quase no palco e já selecionou a ordem em que vai mostrar as provas. FRIDAY terá acesso ao Central em 3, 2, 1…

 

Não houve necessidade que Jean Grey ou Charles Xavier manipulasse a cabeça de alguém para que Tony Stark subisse no palco atrás e acima dos Sentinelas. Bastou seu sorriso e seu charme para falar com o orador do Congresso. Aproximou-se dele e lhe apertou as mãos, dizendo que o conhecia de tal evento anterior - o que não era verdade, apenas um fato mostrado por FRIDAY na sua tela. O orador pareceu lisonjeado pela lembrança e isso deu a oportunidade perfeita para Tony.

— Vamos, passe aqui o microfone. Sabe que eu tenho experiência em entreter a plateia e acho que vocês estão precisando de uma distração até esses lapsos de energia acabarem.

— Ora, senhor Stark… Eu não acho que…

Jean Grey estava mais próxima do palco. Ela olhou para Tony, para o rosto hesitante do outro homem e depois para o público. Com um aceno leve da cabeça, um grupo de pessoas  começou a se levantar reclamando, alto o suficiente para que o orador escutasse. Quem estava perto se viu tentado a repetir o gesto.

O Homem de Ferro agradeceria depois pela ajuda telepatica sutil. Fazer com que as pessoas se afastassem com notável desagrado na frente do orador era a deixa perfeita para que Stark o convencesse.

— Bom, meu amigo… Esse é o problema de fazer as coisas igual festa. Se não tem diversão, não tem gente. Matemática básica.

— Eu… — Ele suspirou. Entregou o microfone. — Só não fale nada muito absurdo.

— Oh, claro que não.

O orador saiu de cena e Tony lançou um discreto, porém significativo, olhar de agradecimento para a mutante. Ela assentiu e todos pareceram se virar para ele, prestando atenção no que o bilionário filantropo diria. Começar quebrando o gelo parecia uma boa opção.

— Som, som. — Ele pigarreou, tocou no topo do microfone. — Como vocês puderam ver, a galera teve problemas técnicos e enquanto isso estou aqui pra encher os ouvidos de vocês de piadas envolvendo HammerTech e o que uma torradeira disse para a outra. E se a torradeira for da Hammer, ela só explodiu.

Risos nervosos.

Os rostos da maioria se aliviou pelo gracejo tolo e o grupo que se direcionava a saída voltou para suas cadeiras. Isso era bom. Tony deu alguns passos para o lado, pensando no que mais diria e em como Pepper estaria surtando em casa ao ve-lo ali. Fotógrafos se voltaram ao palco novamente, câmeras se inclinaram em sua direção. Certas pessoas torceram o rosto em descrença.

Na tela de seu óculos, FRIDAY lhe alertou que já estavam sincronizados com o sistema do Congresso e poderia encher o telão de memes se quisessem. Tony ficou satisfeito por ela saber de seus gostos virtuais e referências, a tinha criado bem. Inspirou fundo.

Conseguia dar discursos inspiradores para jovens no MIT, conseguia fazer auto propaganda e também promover seus produtos. Tinha feito isso a vida inteira. Mas discursos morais não eram sua especialidade. Xingou Steve Rogers por lhe dar essa tarefa que apenas ele poderia fazer.

— Vocês me conhecem. Eu sou o Homem de Ferro. — Mais risos breves. Ele deu de ombros e andou mais um pouco, sua presença contagiando o público — E devem estar pensando: “O que um cara como ele está fazendo aqui nesse Congresso sobre Sentinelas? Nem usam tecnologia Stark! Onde está Pepper Pots?” Sim, sim. Vocês estão certos e senhorita Potts está sendo mais útil do que eu nesse momento. A resposta curta, pessoal, é que estou aqui porque sou um filiado da ONU e eles precisavam de alguém para fazer piadas. A resposta certa é porque sei que vocês estão cansados de piadas. E tudo isso aqui é uma piada.

Silêncio.

Agora Tony Stark tinha a atenção total do público.

— Aqueles que não dormiram nesses discursos regados a PowerPoint devem ter percebido que o Serviço Sentinela é um plano muito simples, e caro, de vigiar e punir aqueles que não escolheram nascer com habilidades especiais.

Vieram protestos que ele já esperava escutar. Exemplos, os mesmos que apresentaram em vídeos naquele exato Congresso, como a morte de JFK. Não discutiria se eram certos ou não, não discutiria teorias da conspiração. Mostraria o que estava acontecendo agora. Com um aceno, ele cortou tais protestos.

— Houve mortes? Sim, eu não nego. É uma situação delicada e terrível, todos estão com medo e desesperados o suficiente para se agarrar no primeiro que oferece solução. Mas,— Ele se lembrou das crianças com quem “trabalhava”. Se Peter tivesse nascido com aqueles poderes e não adquirido eles, como seria sua vida? Engrossou a voz. — Nós não devemos punir a parcela da população que nem mesmo tem chances de se desenvolver. Qual é, gente? Existem crianças assustadas que não fazem ideia do que está acontecendo com o próprio corpo. Nenhum país, nenhuma nação dentre todas que estão hoje presentes, apresentou políticas públicas para mutantes. Não há escolas especializadas, mas querem construir reformatórios. Não há hospitais, mas existe quem faça experimentos. Eles não têm empregos, não tem Educação, não tem Saúde, não tem uma mísera assistência de seus respectivos governos para suas condições e mesmo assim espera-se que paguem seus impostos como um cidadão comum. Porém, nenhum deles é tratado como um cidadão comum. E agora todos concordam em gastar bilhões em monitoramento, em chips subcutâneos? O que há de errado com vocês? Não esqueceram de isso já foi feito antes na História e foi simplesmente errado? Marcas no pulso de pessoas consideradas ameaçadoras?

Em conjunto com Jean Grey,  Charles Xavier impediu que tirassem o Homem de Ferro do palco. Os seguranças não acatavam ordens de pegar Tony Stark pelos pulsos e arranca-lo do palco, inclusive barravam quem tentava fazer isso. Scott e Ororo continuavam observando o engenheiro esboçar a questão no ar como se resolvesse uma equação. A resposta era que o Serviço Sentinela era cruel.

— E como se não bastasse, — Ele seguiu. — Essa neurose em cima dos mutantes não passa de um teatro muito bem orquestrado.

Você não passa de um cara rico, um canalha sem ter o que fazer! — Um homem de meia idade gritou ao fundo. — Tem gente morrendo, isso não é manipulação de mídia! O que me diz da indústria farmacêutica atacada há poucos dias em Sokovia?

Tony parou um momento. Era a deixa perfeita para começar a mostrar as provas, dizer por A e B o porque estava certo.

— Tudo o que eu disse até agora pode ser muito melhor discutido com que se dedica ao assunto, como o Instituto Xavier e outras entidades sem fins lucrativos. Eu só sou um engenheiro, mas nós sabemos que alguns de vocês não dariam atenção para a causa se fosse um mutante falando. Isso se deve ao fato que alguns de vocês são hipócritas, o que me leva a responder sua pergunta, senhor…? Vamos, alguém de um microfone para o Homer Simpson do mal ali.

Um funcionário da equipe ativou o microfone na mesa do homem.

— É Walter Camp, seu desgraç-

— Ok, já podem cortar o microfone dele. Obrigado. Bom, senhor Camp, acho que é de conhecimento geral que uma das maiores organizações de segurança e espionagem da América, a SHIELD, foi pega num esquema de corrupção e tentativa de homicídio em massa em 2014, quando inúmeros porta-aviões foram derrubados porque existia um código lá que iria puxar o gatilho para quem contrariasse os interesses deles. HYDRA estava infiltrada há anos na SHIELD, sendo responsável por muitas mortes, inclusive… de Howard e Maria Stark. Foi nessa ocasião que todos os arquivos da SHIELD vazaram, denunciando muitos de seus funcionários. O que impede o Serviço Sentinela de ser igual?

Houve uma pausa, tanto por drama de Tony Stark quanto pelo fato do microfone de Walter Camp estar desligado novamente.

— Oh, é mesmo. Nada impede e é por isso que é igual. Até mesmo conta com a colaboração de um dos seus cientistas mais medonhos, Arnim Zola. Manipulação de dados é algo que nos tem enganado faz tempo, mas cá estamos para descobrir a verdade.

Houve quem gritasse que ele estava errado. Arnim Zola estava morto, afinal. Tony tocou na tela de seu relógio, girou os hologramas que subiram a poucos centímetros de seu pulso. Depois de selecionar o que queria, apontou para o telão ao fundo.

— Essas provas foram entregues por uma fonte anônima que na verdade todos conhecem. —Ele se referia a Steve Rogers, mas deixou o nome em aberto para não desviar o foco de sua argumentação. — Aqui estão fotos de uma base ao norte de Sokovia, a mesma localização onde está essa suposta indústria farmacêutica. Isso não é uma fábrica de medicamentos, meus senhores. Antes mesmo da homologação do Projeto Sentinela, esses robôs já estavam sendo fabricados em massa por uma base antiga da HYDRA, o que viola expressamente qualquer tipo de acordo internacional.  

No telão ao fundo, imagens que Sam Wilson tirara das documentações suspeitas e também das peças dos robôs penduradas em correntes, assim como os exemplares prontos no funesto corredor onde se enfrentaram. Tony passou imagem por imagem daquele lugar sombrio, feito de concreto, metal e sustentado pelo sofrimento. Ele viu pessoas do público fecharem a expressão. Viu Ororo Munroe soltar uma lágrima solitária, provavelmente pensando em seus irmãos e irmãs mutantes.

A quietude tomou conta do ambiente inteiro, ou era essa sensação que o Homem de Ferro tinha. Seus olhos estavam muito abertos, sua mão tremia um pouco. Sua voz, porém, permanecia firme.

— Há nomes nisso tudo, cargas de material vindas de muitos países que hoje estão aqui, representadas por seus secretários de segurança e alguns empresários. — Agora mostrava partes do lado externo da base, onde existiam contêineres com suas respectivas origens. Itália, Dinamarca, Sul dos EUA. — Há pessoas e nações que compactuam com esse plano de extermínio, se é que não se pode dizer que encomendaram tudo isso. E aqui estão as vítimas que deram base ao aprimoramento do Serviço Sentinela.

FRIDAY havia selecionado as imagens em ordem cronológica e retirado as cenas mais chocantes de experimentos feitos com portadores do gene-X. Mostrou as asas retiradas de “Libélula”, a sequência de eletrochoques feito com um rapaz que crescia espinhos das costas. Havia um documento com descrições perturbadoras de uma jovem chamada Emilja, que os cientistas descobriram que era mutante em meio a técnicas de aprimoramento. Ao fim, Erik Lensherr, também conhecido por Max Eisenhardt, Magnus ou o nome mais conhecido, Magneto.

— E esse é o homem que todos acham que matou JFK. Spoiler, ele não matou. — A sequência continuou passando, arquivos que Yelena cedeu ao grupo dos Vingadores Secretos e que Steve, por sua vez, repassou a Tony. — Foi mantido em criostase, perdeu a filha pelo mesmo cara e seu corpo se perdeu por anos. Até que Zola decidiu que seria uma boa oportunidade de procurar esse fulano, que não acordou muito feliz.

— Conspiração. Ele é um assassino!

— Isso está acontecendo hoje! — Tony rebateu a acusação. — Ele está lá fora agora, tentando eliminar o mainframe de Arnim Zola, um assassino, enquanto nós estamos discutindo a caça aos mutantes, que nunca tiveram uma única assistência na vida!

Uma mulher se levantou e Tony pôde perceber que era jornalista de uma emissora francesa. Pediu permissão de fala e ajuda para ligar seu microfone ligado à mesa. Esperava apenas que não fosse de tablóides especulativos.

— Mas, senhor Stark… — A mulher de meia idade começou, com pouco sotaque. — Mesmo que Zola tenha sido responsável por muitas dessas catástrofes, a perícia identificou que o que sobrou da consciência de Arnim Zola foi destruído por uma explosão em 2014. Como você explica que ele está por trás de coisas que aconteceram esse ano? Você teve acesso informações privilegiadas? Teria ele se espalhado pela web e, se isso for verdade, a consciência de Ultron poderia ter feito a mesma coisa?

— Eu gostei de você até a primeira pergunta, mas vou responder tudo. Estruturas de processamento de dados ainda são coisas imensas. Nós, como engenheiros estamos perto de reduzir isso usando armazenamento em nuvem e outras saídas, mas tanto Ultron quanto Zola precisariam de algum lugar preparado para receber esse volume de dados enorme. Ultron teve o acesso a internet bloqueado, não tinha outro corpo e foi desligado definitivamente na época, mas Zola é esperto e não se deixaria morrer tão fácil, não concorda? E ele tinha outra casca que está aqui em Zurique, no centro. LernaBank. Mas o que são as minhas palavras contra as palavras do próprio? Vamos ver um pouco das gravações.

Tony tinha apenas lido a maioria dos documentos e visto as imagens, não teve tempo para analisar as gravações feitas por Rogers. Confiou no julgamento de FRIDAY quando ela afirmou que aquilo, mesmo que o áudio estivesse um tanto cortado, era uma prova irrefutável. O vídeo iniciou com a cena já em andamento. O ambiente era tanto escuro, igual às fotos tiradas da base em Sokovia, e era fácil supor que era o mesmo lugar. A diferença é que havia uma tela ciano ao fundo, mostrando o rosto de Arnim Zola em pixels.

“Os mutantes nunca me fizeram alg- … Belas espécies.  Estudei vários deles em minha vid- de carne e osso, e agora posso  processar dados e arquivos sobre eles como jamais pu--”

Houve interferência, um som agudo que fez a espinha de Tony Stark sentir um arrepio.

“...Também precisei de corpos no meu laboratório.”

Quietude.

“Talvez --- queira ver o mundo queimar. Tal--- só quisesse reunir to-- meus inimigos.”

— Isso é o Norte de Sokovia, há uma semana quase. A perícia também pode analisar a autenticidade do vídeo se quiser. Todas essas informações foram passadas hoje de forma anônima para mim e eu tenho o orgulho de dizer que já os disponibilizei nos editais desse Congresso na internet. Todos poderão ler tudo com calma.

Ele se apoiou na mesa com os dois braços, sentindo que estava perto do fim de seu discurso e perto do fim de sua razão. Inspirou fundo uma última vez.

— Nós os recrutamos para fins militares, violamos seus corpos em experiências e demonizamos qualquer tentativa de defesa deles. Esse plano ofende acordos internacionais de paz, é engendrado por um cientista que prega a eugenia racial e é fomentado por ideais errados. Nós somos os vilões aqui, gente. E o Serviço Sentinela não é a solução.  

Tony Stark endireitou a própria postura, armou-se com uma expressão séria e fez um “v” com os dedos indicador e do meio. Seu corpo era alvejado por flashes.

— Paz.

Desde 2008 Tony Stark não era alvo de tantos jornalistas.


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Notas finais do capítulo

* Espero que tenham gostado da referência aos uniformes clássicos dos X-Men e os primeiros filmes dos anos 2000 hahah

* Foi bem desafiador arranjar todos esses personagens numa única sequência de cenas, mas sinto que foi legal trazer o grupo dos X-Men com um pouquinho do charme de Wakanda e o deboche de Stark;

* É nesse momento que agradeço a Switchblade por revisar as cenas do Homem de Ferro. Todos sabem o quanto prezo pelo desenvolvimento dos personagens e também por conservar essência deles, e o discurso me deixou um tanto insegura. Tinha que ser algo convincente, mas tinha que ser algo bem Tony Stark.

* O capítulo foi revisado, mas existe a possibilidade deste arquivo ser sabotado pela HYDRA. Caso encontre algum erro, favor reporte à Shalashaska.

* Paz.