Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 46
XLVI


Notas iniciais do capítulo

Ahá! Venho oferecer mais um capítulo nesse feriado!
Peço desculpas por não postar na quarta-feira como eu mencionei para algumas pessoas nas respostas dos comentários, apesar de também ter dito que, se não fosse na quarta, seria no final de semana mesmo. Enfim, agradeço mais uma vez a companhia de vocês nessa fanfic.
Vamos ler o que Daddy Magneto tem a dizer?



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Magnus encarou o rosto assustado da jovem a sua frente, seus olhos refletindo a luz vermelha e etérea que ela própria conjurava com as mãos. Ele somente sorveu lentamente os detalhes de sua face tão parecida com Magda, e tentou não parecer muito impressionado. Ou muito furioso. O que aquele cientista havia dito…

Inspirou fundo e expirou como se estivesse apenas entediado, enquanto na verdade remoía as palavras ácidas do idiota que aparecera na tela. Eram ameaças, ele sabia. Jogo mental com uma pessoa que já sofrera perseguições de todos os lados. Ela era judia igual ele, mutante igual ele.

Não esperava encontrá-la ali, tão cedo e em lugar perigoso. Agora fazia sentido que todos aqueles soldados estivessem amontoados e desacordados no mesmo lugar. Tinha sido ela, com seus poderes telepáticos. O que não fazia sentido era o orgulho de saber tais proezas da jovem, a qual ele nem sabia a origem ou se realmente era mutante. Não haviam laços, apenas empatia.

Agradeceu por Frost ter sido rápida. Esperaram em Lviv assim como combinaram e somente os experientes saíram nessa missão, ou seja, ele, Frost, Psylocke e Raven. Objetivo principal era arruinar a base da antiga organização nazista, acabar com os Sentinelas e as três estavam a caminho disso, nos andares superiores. O objetivo pessoal de Magnus era descobrir mais justamente sobre a garota que insistia ser deveras semelhante com sua falecida esposa.

Viajaram num carro. Graças a telepata, não precisaram apresentar nenhuma documentação na fronteira. Graças a ela também, ele estava com seu capacete e trajava seu uniforme rubro, uma cor queimada por todas as suas memórias. Sentia, pela expressão da garota, que ela tentava ler seus pensamentos. Sentia que ela via um estranho reflexo de si mesma. Os dois no mesmo tom de sangue, com gestos das mãos semelhantes.

— Você é a quem chamam de Feiticeira Escarlate?

A mulher não respondeu, apesar de ter aberto levemente a boca. De repente aproximou o próprio braço perto dos lábios, chamando algum contato através de uma espécie de comunicador. Ajuda, reforços. Magnus fez um leve gesto com os dedos, lançando um novo pulso eletromagnético para avariar o dispositivo dela. Tudo o que era eletrônico felizmente era suscetível aos seus poderes.

E agora ele sabia que o século 21 era todo digital. Todo… Vulnerável.

Tsc, tsc, tsc. Não seja tão imprudente. Eu só quero conversar.

— Você é o homem das fitas. Dos manifestos mutantes… Magneto.

Ele assentiu, tirando um sorriso sem humor dela.

— Tenho certeza de que não quer só conversar.

— Perspicaz. — Não estava sendo sarcástico. — Eu vou destruir cada centímetro desse lugar e ir atrás de quem financiou esse… Projeto genocida. E empalá-los com o metal usado aqui. Você vai me impedir?

Mais uma vez, silêncio. Magnus andou um pouco pelo ambiente, observando os painéis cheios de pequenas telas e botões, medidas… Circundou a jaula de vidro, ainda assistindo a figura da garota através da superfície transparente. Parou então em frente a tela que recebera o golpe psíquico da jovem, apreciando a destruição e as faíscas que ainda saíam dos cabos elétricos. Por fim, parou poucos metros a frente dela, também em frente ao arquivo aberto. Encarou bem seus olhos.

Pegou uma das pastas, estranhou o grande “M” vermelho na capa. Folheou de forma casual.

— Bom, — Ele soltou mais um “tsc” casual com a ponta da língua. — Eu poderia ler melhor se você iluminasse mais aqui.

— Faça o que quiser com esse lugar. Só me dê esses arquivos e me deixe partir com meus amigos.

Magnus levantou uma sobrancelha e em seguida voltou seus olhos para a pasta. Tinha lido o próprio nome, visto também uma foto dela naquele centro de experimentos. Não tinha visto muito bem, só de relance, mas podia dizer de forma categórica que ela não tinha a mesma aparência saudável de hoje naquela foto. Estava encolhida, no canto de uma cela. Ele engoliu seco, sentindo ira inundar suas veias.

— Você não está em posição de exigir. — Disse, embora com a voz muito calma.

Mais uma vez veio um movimento rápido das mãos de Wanda Maximoff e a névoa escarlate tentou puxar a pasta das mãos firmes dele, que em seu turno somente fez um gesto breve, pregando o bracelete de metal do braço esquerdo dela no painel de controle de forma súbita. As costas da jovem sofreram um baque mudo, embora não muito violento. Ela arregalou os olhos, tentando puxar o pulso de volta, sem sucesso. E então, rendida e imobilizada por um braço, sem ter como chamar ajuda, ela se viu sem escapatória.

— Por que quer esses arquivos? Os Sentinelas eu entendo. Seu povo, mutantes… Eu acho errado também. Cruel. Repulsivo. Enfurecedor.— Magnus inclinou a cabeça, apreciando a última palavra que ela dissera. — Mas… Esses arquivos? São sobre mim e meu irmão. Por favor… Não os leve embora.

O silêncio foi dele. Os segundos escorreram, desconfortáveis e pontiagudos. Tantas perguntas.

— Diga-me, Wanda Maximoff… Você me teme?

— Não. — Uma pausa. — Eu já fui considerada um monstro também. Eu só… Não o entendo. Não o conheço. Mas sei que…— Ela encarou o chão por alguns segundos, parecendo presa a alguma memória. — Cedo ou tarde as pessoas se revelam.

Magnus tentou não transparecer a pontada que o alfinetou por dentro de seu tórax, no lugar onde ele não achava que ainda batia um coração. Sua mente voltou no tempo, no dia que perdera Anya, sua primeira filha.

“É provavelmente um monstro igual o pai. E monstros não merecem viver”

Aquelas palavras… Magneto pensava que já tinha superado o que aqueles guardas disseram. Wanda não era um monstro, ele podia farejar isso a distância. Mas ela procurava rendição e ele vingança. Um basta. Não soube dizer se divagou tudo isso por menção à palavra “monstro”,  ou pela semelhança absurda de Wanda com Magda, fato que o mergulhava em várias lembranças, boas e ruins. A maioria dolorosa.

Seria possível? Wanda Maximoff. Sua parente. Sua...

— Honesta. — Magneto assentiu, interrompendo os pensamentos mais uma vez. — Eu respeito isso.

Ela levantou o queixo.

— Então significa que…

— Não. Eu não vou te dar esses arquivos. Nem lhe devo satisfações do porquê. — Soltou-a, desfazendo o enlace magnético que a prendia no painel pelo bracelete. A jovem o encarou com curiosidade e receio, mas ela era inteligente o suficiente para não começar um combate direto. — Você é talentosa, jovem. E eu estou começando, ou melhor, continuando um trabalho. Poderia fazer parte de algo maior do que tudo isso. Nunca mais teria que se esconder desses humanos hipócritas. Somos deuses em meio a insetos.

— Eu já tentei fazer parte de algo maior aqui, nesse país. E meu irmão morreu. As vezes eu acho que estou morta também.

— Conheço a morte de perto, de vários encontros. É por isso que faço o que faço. Nunca mais.

A jovem engoliu em seco, visivelmente abalada, embora com a expressão ainda dura. Desafiadora. Estava pronta para qualquer desfecho daquele encontro inesperado, inclusive uma batalha que ela teria poucas chances de vencer. Só não preparara-se para uma proposta de armistício.

— Vá. Permito que parta com seus aliados.

— Você “permite”?

Magneto deu um passo para frente.

— Sim, eu permito. Não está conversando com uma lenda, com um mero boato. Está falando com um homem que deixaram congelado por mais de cinquenta anos… E diferente de seu amigo Steve Rogers, não havia interesse de nenhum governo em me despertar. Você sabe por quê?

— Sim. Revolução.

Ele assentiu.

— Nossos caminhos vão se cruzar de novo, tenho certeza. Somos iguais, eu e você. Conheço a mesma morte que você conhece, e sei que você sabe que não há como esquecer ou perdoar.

— Isso é vingança.

É? — Soltou no ar, semeando dúvida. Sabia que daria frutos, pois ela flertara com os mesmos ideais antes. — Chame do que quiser. Vingança. Justiça. Direito. Não estou fazendo isso só por mim, entende? É por todos nós. Por você. E por todos aqueles que enterramos.

As mãos dela tremiam. Algo dentro dele também. De alguma forma, eles sabiam que podiam moldar o mundo ao seus caprichos, juntos. Dois desconhecidos.

— Quando se cansar de seguir ovelhas… E lobos em pele de ovelhas, venha até mim. Sinto que você saberia me encontrar.

Não houve tempo para resposta. A base inteira tremeu, soltando sons pesados de impacto, explosivos e tiros. Wanda e Magnus se entreolham, ele a ajudou a se manter de pé enquanto todo o resto chacoalhava. Trabalhariam juntos mais cedo do que esperavam.

 * * *

Sam Wilson sentia que havia algo errado antes mesmo de receber a mensagem do Capitão América, pois enxergou sombras indistintas, traiçoeiras e muito familiares. Estava no andar de cima, tentando encontrar documentos importantes, já scanneara algumas coisas e implantara bombas em outras. Mas as sombras… Eram a mulher azul, Mística, tentando atraí-lo para uma emboscada, de forma semelhante à que fizera em Viena, assumindo vozes de memórias ruins, em pequenos sussurros. Ele só não entendeu o porque suas aliadas telepatas, a mulher loira e a oriental, não interviram para deixá-lo confuso e sucumbi-lo ao delírio. Talvez não estivessem ali, talvez fosse obra de Wanda essa proteção. Talvez esse já tivesse superado bem os traumas do passado.

Todas as suas dúvidas foram sanadas quando as três se revelaram, prontas para derrotá-lo. A Rainha Branca, Mística e Psylocke. Não queriam mais enganá-lo. Não se preocuparam com discrição e furtividade. O objetivo era derrubá-lo.

Psylocke, em um determinado momento, chegou perto demais e sua lâmina cortou o comunicador. Quase não levou seu antebraço junto. Agora, sem como pedir reforços ou avisar sobre o inimigo, estava por conta própria. Ele saltou para desviar dos golpes, usando as asas metálicas, e esperava que mutantes não tivessem nenhum tipo de resistência a tranquilizantes em munição não-letal. Acertou a oriental no ombro, Mística na perna. Nada fatal, mas ainda existia dor pelo impacto e isso as manteria afastadas por tempo o suficiente para que ele descesse as passarelas de metal e avisasse Steve.

Estava no cômodo próximo, ao lado praticamente, apenas no andar de cima composto por escadas de ferro. Podia mais uma vez saltar e voar, coisa que ele nascera para fazer.

Até que uma rajada de luz violeta perfurou seu equipamento.

Falcão caiu ainda na passarela de metal, logo se virou para ver a loira com as as mãos ao lado do corpo, Pyslocke ao seu lado com contornos de energia púrpura em seus olhos. As asas de seu equipamento soltavam bipes e faíscas, pesando seus movimentos. Recarregou a arma da forma mais rápida que podia, enquanto Emma e Psylocke aproximavam-se. Diferente de Wanda, não havia preparação mística, nervosismo nos dedos antes de lançar um golpe psiônico. Era calculado, seco, frio. Certeiro.

— Fique no chão. — Estacas de luz rodeavam seus braços, prontos para perfurar qualquer coisa. A Rainha Branca agachou-se, pondo uma das mãos nas têmporas. Sam assistiu um traço luminoso sair da testa da mulher e tal luz sondar sua própria cabeça, como feito em Natasha em Viena. Suor desceu do rosto dele. Apesar da arma em punho, havia risco da outra empala-lo, pois a oriental estava perto e com estacas de energia em riste. — Oh, proteção. — A voz dela era igual a neve lá fora. — Foi a menina, não? Wanda. Não se preocupe, consigo superar essa barreira mental. Só não resista. Não quero que sinta dor. Mas não vou me sentir culpada caso seja forçada a isso.

Ele deu um chute na boca do estômago da mulher e se protegeu com a asa, observando-a ser perfurada por estacas de luz fria. A mutante arquejou de dor, tentou aplicar-lhe um golpe físico com as mãos, mirando em pontos vitais, enquanto Psylocke conjurava uma katana de energia para matá-lo. Ele conseguiu bloquear cada tentativa, querendo ter firmeza na mão e pontaria para atirar. Empurrou-a para poder ter uma visão limpa e poder acertar o ombro da mutante ou qualquer outro lugar que a derrubasse rápido.

Só não contava com o abalo nas paredes, no chão. Parecia estar no epicentro de um terremoto de tão forte. Parecia vir lá de baixo, onde Steve e Bucky tinham ido.

Sam Wilson apenas assistiu horrorizado Emma Frost bater com o quadril nas barras da passarela de metal e perder o equilíbrio, indo direto para uma queda de quinze metros.

O tempo desacelerou aos olhos dele enquanto a loira despencava para a morte certa. Iria bater direto com a cabeça, provavelmente quebrar o pescoço com um só estalo. Haveria sangue. Sam gritou, sem poder voar pra ajudá-la, e isso atraiu a atenção de Steve e Bucky que estavam lá embaixo.

No meio da queda, a pele da mulher iluminou-se de forma difusa, e depois refletiu e refratou as luzes vindas de holofotes do hangar. O corpo dela atingiu o chão com um baque que ecoou por toda a base.

Silêncio.

Ela respirou com dificuldade, levantou seu torso. Seus contornos cintilavam.

Emma Frost era feita de diamante.

 

E os Sentinelas em standby olharam diretamente para ela.

 

Luz vermelha saiu dos olhos de um dos robôs, uma linha que perpassou o corpo de diamante de Emma Frost, ainda sentada no chão. Todo o cômodo estava silencioso e banhado em luz vermelha e branca; Steve e Bucky no andar de baixo, Sam, Psylocke e Mística no andar de cima, apenas observando com medo e atenção. Houve som de eletricidade, depois as pernas de um dos colossos de metal deu um passo a frente, mais uma vez abalando a estrutura do lugar. Sua couraça roxa reluziu, seus olhos acenderam amarelos.

 

 Mutante identificado. Calculando… Nível Alfa. Ameaça iminente. Iniciar contra medidas. Ativando…

 Outro deu um passo a frente, sua voz alta, grave e inumana.

 

Ativando…

 

Ativando…

 

Ativando…

 

Quatro Sentinelas avançaram um passo, de forma lenta e com seu intuito inabalável. Seus braços grossos como troncos de árvore ergueram-se, engatilhando munição antiaérea na direção da mutante. Mesmo sendo feita de um dos materiais mais resistentes do mundo, seu corpo mineral não seria capaz de suportar um fuzilamento daqueles. Estilhaçaria em mil fragmentos. Emma Frost deu um passo para trás, de repente muito pequena.

 — Raven, Betsy… Saiam daqui. — Disse ela, muito trêmula. — Saiam daqui agora

Steve Rogers encarou aquela cena. Ele e seu grupo não eram alvos,  portanto poderiam escapar ilesos. Faltava só encontrar Wanda, mas… Era para isso que ele estava aqui, não? Evitar que mutantes fossem caçados e mortos. Afinal, ele não gostava de valentões, não importava de onde vinham.

Ele trocou um olhar com seu amigo Bucky. Talvez um sniper e o Capitão América sem escudo não fossem suficientes, entretanto eles podiam tentar. Esqueceu-se da furtividade da missão. Era hora de lutar.

* * *

O caminho de volta pareceu mais longo. Wanda corria com o estranho ao seu lado, sentindo os tremores no chão e paredes, ouvindo sons de tiros e gritos. Seu coração batia rápido, suas íris vermelhas faiscavam. Houve um breve apagão de energia quando chegaram ao elevador para subir, mas Magnus não teve paciência para esperar. Fez um gesto e a porta se abriu, fez mais um movimento contínuo com as mãos e o elevador subiu até mais veloz do que faria normalmente. Ele a ajudou a se manter no lugar quando enfim chegaram ao andar de cima, segurando seu ombro para que a inércia não a jogasse para o alto.

As portas se abriram e Wanda assistiu um pesadelo.

Haviam Sentinelas despertos, esmurrando o chão para eliminar… Emma Frost? Fazia sentido que ela, Raven e Psylocke estivessem junto a Magneto, mas toda a cena era atordoante. Bucky mirava na nuca de um dos robôs, enquanto Steve estava agarrado ao ombro de outro, também tentando arrancar a cabeça do robô. Mística atraia a atenção de um terceiro para que a outra mutante, a oriental, pudesse golpeá-lo com lâminas de energia púrpura. Sam Wilson atirava com pistolas, do alto do andar superior, apoiado na passarela de metal.

Era óbvio que eles mais recuavam do que tinham sucesso. Os dois grupos tinham vindo a base da antiga HYDRA com pouco preparo, para missão de furtividade que devia ser simples e curta. Podiam só esperar com fé tola e talvez até burra que apenas o impacto da munição não-letal nos pontos certos pudesse derrubá-los. Os abalos devido ao combate comprometiam toda a estrutura física do lugar, provocando rachaduras, buracos enormes nas paredes grossas e queda ocasional do teto, tão no alto. Se já não soubessem que algo muito errado acontecia naquele lugar tão afastado de Sokovia, logo iriam saber.

Wanda viu que um desses pedaços do teto cairia na direção de Steve Rogers. Não houve dúvida, mal houve tempo. Ela se lançou no meio da confusão e desviou o concreto em pleno ar com seus poderes, atirando-o sobre o Sentinela que avançava sobre o Falcão. A Feiticeira Escarlate grunhiu ao deslocar tanto peso de forma súbita, mas logo teve que subir uma barreira de energia sobre si para não receber uma chuva de balas de um dos robôs.

 

Mutante nível Ômega detectado. Recalculando.

 Recalculando…

 

De amarelo, os olhos vazios dos robôs foram para o vermelho. Outra luz desceu sobre a figura de Wanda Maximoff, um grande facho circular que saía do peito dos Sentinelas e a marcava como um alvo. Ela engoliu em seco, clamou que seus poderes fossem suficientes, ao menos para mantê-la viva até que seus amigos partissem em segurança.

Parecia fechar um ciclo completo. Ela e Pietro nasceram em Sokovia… Era correto que morressem naquele mesmo país. Só tinha que aguentar mais um pouco, ser forte… Apenas para que eles fossem embora.

 

Concentrar esforços em ameaça principal. Tempo estimado para eliminação:

dez minutos.

Os punhos dos robôs se abriram, revelando canhões maiores do que de tanques de guerra. Nesse instante, o Capitão América caiu de um dos Sentinelas, num baque que só não foi maior porque utilizara o escudo retangular de seu bracelete, concedido por T’Challa, para abafar o impacto. Foi logo amparado por Bucky, que o arrastou para longe do enfoque dos inimigos.

Iniciar.

 Wanda voou com a ajuda de sua magia escarlate para os fundos do hangar, e por pouco não teve o escudo de força destruído por todo o poder de ataque dos Sentinelas. Mas as paredes atrás de si foram alvejadas e destruídas. Ela sentia o sangue escorrendo de seu nariz devido ao esforço, no entanto não havia descanso. Recuou mais, já do lado de fora e no meio da nevasca.

 Emma estava chocada, aproximou-se de Magneto e trocou com ele um olhar preocupado, enquanto Mística ajudava Psylocke a se levantar.

— Nós mal sobrevivemos. Nós…

— Ela é uma de nós. — Magnus a cortou, muito sério. — Nível Ômega. É só uma criança… E não vamos deixá-la para morrer. Você. — Apontou para Steve. — Tem mais balas?

Sinal negativo.

Magneto deu alguns passos urgentes, tateando o ambiente com seus poderes magnéticos. Sentiu ali, mais atrás e num pequeno armário no depósito, as armas e a munição utilizadas pelos homens e mulheres da HYDRA. Puxou-os de uma só vez, espalhando-os no chão a frente de Capitão América, permitindo-o escolher. Antes de ir para fora, para executar os robôs, ele parou um momento e encarou o amigo de Rogers, um homem de cabelos castanhos na altura dos ombros e um braço metálico. Um rosto familiar.

 — Você. — Deu um passo para frente. O homem engatilhou a arma, num instinto estúpido de sobrevivência, e isso quase o obrigou a rir. Magnus fez um gesto curto, como se desse um tapa no vazio, e o rifle sucumbiu ao seu comando, saindo das mãos de James Barnes. A arma pairou no ar e apontou para a cabeça dele.

 Ninguém mais estava entendendo. Steve protestou, Sam Wilson também. Com a outra mão, Magneto os prendeu nos pedaços da escada de metal que havia se torcido e despencado no chão. Estúpidos, pois tinham braceletes de metal. Comunicadores, talvez iguais ao que a menina mutante usava. Emma soltou um arquejo confuso. Não importava, pois Magnus entendia e sabia que aquele homem, o do braço metálico, entendia também.

 Foi quando ouviu-se um grito de Wanda do lado de fora. Magneto deixou o rifle cair.

 — Eu cuido de você em outra oportunidade. Tenho coisas mais importantes para fazer agora… Mas quando chegar a hora, vou arrancar esse seu braço e enfiá-lo em sua garganta. Isso será pelo meu tempo perdido. Por Lorna.

 Ele libertou o Capitão América e o Falcão.

 — Venham, se não forem fracos.

* * *

 

Parte de Wanda amaldiçoou a lealdade de seus amigos, parte sua agradeceu que eles tenham vindo ajudar, mas tais pensamentos desviaram sua atenção e ela quase foi morta por um soco de um dos Sentinelas. Eles formavam uma roda entorno da Feiticeira, que por sua vez tentava sair daquele cerco e assim fazer com que as máquinas atirassem umas nas outras. Ela sentia o cheiro do próprio sangue e do próprio suor, sua pele ainda mais gelada pelo vento.

 Bucky atirava a distância, acostumado com sua posição de sniper, focando na parte superior dos robôs para não correr o risco de acertar Wanda. O problema era que o revestimento roxo dos Sentinelas mais parecia uma carapaça, refletindo o curso das balas. Isso era perigoso para quem estava perto, até mesmo atingiu a mulher loira que se aproximava do campo de batalha, em sua forma de diamante. Ela franziu os cenhos e encarou feio o Soldado, pelo o que ele tinha visto da mira de seu rifle. Deste modo, ele focou-se mais nas juntas dos inimigos, como o pescoço.

Sam estava ao seu lado, jogou os restos de sua asa mecânica na neve. Não teria como voar mais, mas contava com experiência de combate e artilharia. Havia pegado uma das armas dentro do hangar e seguia com o mesmo intuito de Bucky Barnes, sendo preciso em sua pontaria, ainda que não fosse inteiramente suficiente. Mística estava ao lado deles, seus olhos amarelos analisando toda a situação, enquanto Pyslocke e o Mestre do Magnetismo seguiam em direção à luta.

A oriental tentava fatiar as pernas dos Sentinelas com seus poderes psiônicos, sua katana de luz púrpura brilhava e arranhava um deles. Magneto, logo ao lado, engoliu em seco. Os Sentinelas não eram feitos totalmente de metal… Ou ao menos não de metais ferromagnéticos. Ele ergueu as mãos, tateando, tateando, tateando em vão o pobre campo magnético feito pela pouca concentração de ferro ou outros metais de transição nos Sentinelas. Deu um puxão com seus poderes, evitando que Wanda Maximoff fosse esmagada, mas apenas isso. Não conseguiria fazer as máquinas tornarem-se suas marionetes.

 Steve Rogers parou um momento. Perderiam se prosseguissem naquele ritmo. Existiriam baixas, funerais. Ao menos um funeral, de uma garota. Não poderia deixar isso acontecer. Ele cogitou chamar suporte aéreo da aeronave wakandana, pilotada remotamente pela princesa, mas ainda existia o risco de acertar alguém no campo de batalha. Além  disso…

Virou seu queixo para Leste.

 Houve um som distante. Helicópteros. Exército. Governo. Alguém vinha, talvez o exército de Sokovia ou entao suporte internacional, e ele não poderia quebrar sua promessa de manter Wakanda segura e em sigilo. Toda a agitação na base não tinha passado despercebida. Ele praguejou em voz baixa. Se vissem a aeronave, ficaria claro quem os auxiliava. Tinha que arrumar outra solução, uma que envolvesse sair com todos vivos dali sem denunciar sua aliança com T’Challa.

 “Steve? O que diabos --- acontecendo?”

O sinal de rádio com Viúva Negra picotava, sua voz urgente era indistinta. O Capitão América rangeu os dentes, sem saber como se aproximar de um dos Sentinelas para tentar derrubar a cabeça deles. Subir no tronco daquelas máquinas não dera muito certo antes.

— Problemas, Nat. Sentinelas.

A resposta do rádio foi um som exasperado de estática.

— Vossa Alteza, — Steve avançou correndo, desviando de uma rajada de energia lançada por um dos robôs, refletida por Wanda. Ele cruzou o olhar com a Feiticeira a distância e percebeu o quanto ela estava cansada. Ouviu-a gritar para que saíssem dali. — Shuri. Preciso que ative as bombas quando eu disser.

Vo-- é doido? --- Essas bombas têm um raio de mais de vinte metros, sem falar nos fragmentos--

— Estamos longe o suficiente para não ferirmos os soldados? Aqueles que deixamos na entrada?

Sim, -- mas -- perigoso.”

— Primeiro vamos eliminar esses robôs. Depois nos preocupamos com a volta na aeronave. Se os helicópteros chegarem aqui antes, quero que decole. Pode fazer isso?

Hesitação do outro lado da linha. Como então sairiam dali?

“Sim.”

 Quando voltou sua atenção para a arena, viu que um dos Sentinelas estava no chão, empalado por uma barra de ferro tirada de dentro do hangar. Magneto havia feito aquilo, embora houvesse dificuldade em concentrar seus esforços no resto dos adversários. Eram mais rápidos do que pareciam, pegavam o metal lançado em sua direção e os desviavam com os punhos.

 Steve aproximou-se de Bucky e Sam, saindo do foco do combate.

— Vamos implantar as bombas de Shuri nos Sentinelas e então correr. Precisamos ser rápidos, exatos e não morrer no processo. Há companhia chegando.

— Eu notei. — Sam replicou, virando seu rosto a Leste. Escutara o som. A neve absorvia um pouco do barulho, mas o que verdadeiramente atrapalhava discernir melhor o que vinha, era o som dos Sentinelas. Estavam ficando sem tempo.

— Posso ser rápida. E certeira.

Os três olharam para a mutante azul. Steve franziu os cenhos, pensou um momento, afinal deu a ela três de suas cinco pequenas bombas. Ela recusou a terceira, dando de ombros.

— Preciso só de duas tentativas para derrubar um deles. Uma para mim, outra para Frost.

O Capitão América não argumentou com a arrogância.

— Diga para… Magneto nos dar cobertura. Depois disso tudo acabar, cada um segue seu caminho.

— É claro. Sem ressentimentos.

Em dois segundos, Mística já havia partido. Eles se entreolharam uma última vez e depois seguiram o exemplo da mutante, correndo com agilidade no cenário gélido.

 — Sério. — Sam Wilson exclamou, longe. — Barton resolveria isso com aquelas flechas estúpidas dele. Ele e aquele… Homem-Formiga.

— Foco, time. — Steve fincou o escudo retangular no Sentinela, tentando subir mais uma vez. Parecia estupidez repetir tal ato, mas seria efetivo se conseguisse pôr a bomba na cabeça. Já mais perto da Feiticeira, gritou o seu plano:— Wanda, use as bombas!  As bombas!

 Psylocke ajudou Frost a subir com um empurrão na perna do Sentinela, implantando uma das bombas em seu joelho. Mística repetiu o gesto, embora tenha sofrido um golpe depois. Foi parar do outro lado do campo de batalha, rolando na neve.

Ao ver sua aliada ferida, a fúria de Magnus cresceu. Ele soltou um urro e atraiu outra estrutura de ferro do hangar, atrás de si, com um movimento as mãos. Soltou pino por pino, solda por solda, e envolveu um dos robôs com aquilo, esmagando-o até que sobrasse apenas faísca e óleo na neve.

Faltavam apenas mais dois.

Wanda tinha a respiração rápida e entrecortada. Sentia o sangue quente querendo secar abaixo do nariz, seu rosto ardendo devido a ferimentos de estilhaços. Sua visão escurecia pela exaustão, embora seu cérebro a mantivesse em alerta, desperta. As bombas. Havia cinco consigo. Tinha que implantar as bombas, auto adesivas em qualquer tipo de superfície. O ideal seria implantar em pontos estratégicos e tal coisa não era difícil com seus poderes telecinéticos, no entanto estava concentrada demais em apenas sobreviver. As duas máquinas concentravam balas e rajadas de energia de forma ininterrupta em cima dela, tanto que sua barreira de força já não aguentava mais. Rangeu os dentes. Com uma mão manteve a barreira vermelha, com a outra ela levitou três bombas e as fincou no tronco de um dos Sentinelas.

 Os helicópteros chegaram. Não tinham nenhuma bandeira na pintura, não ecoaram nenhuma mensagem de rendição ou aviso: apenas abriram fogo contra a equipe dos Vingadores Secretos e os mutantes.

 A Feiticeira Escarlate ouviu Steve gritando para que todos se afastassem. Também ordenou para que Shuri tirasse a aeronave do lugar. Talvez eles não voltassem junto com o veículo wakandano, talvez nem mesmo voltassem, mas Steve não quebraria sua promessa de manter as alianças de Wakanda em sigilo.

Tudo acontecia mais rápido que o próprio tempo e, diferente das outras vezes em que Wanda assistia tudo muito devagar por conta da adrenalina, o cenário foi um turbilhão mal compreendido pelos seus olhos. Estava cansada. Estava preparada para fechar os olhos uma última vez. Esperou ver a cor azul, e somente azul. Piscou.

Ouviu alguém gritar seu nome e despertou, desviando de outro tiro poderoso de um Sentinela. Sabia que precisavam destruí-los completamente e não conseguiriam fazer isso apenas atingindo suas pernas e braços. Eles, da HYDRA ou qualquer organização que estivesse por trás da construção daquilo, os consertariam rápido, talvez mais do que levaram tempo criando-os. Ela precisava fazer algo…

— Steve! Steve, diz pra Shuri… — Ela ganiu com o esforço de manter a barreira. — Ative as bombas! Ative as bombas AGORA!

 O Capitão América chegou a aproximar os lábios do comunicador, mas hesitou. Ela estava perto demais. Ela… mal sobreviveria.

 — Steve, as bombas! ATIVE!

 Ele começou a pedir para que a princesa liberasse as explosões, sua voz trêmula e o coração pesado.

 Magnus cuidava do ataque aéreo. Evitar as balas de alto calibre exigia concentração, mas amassar os helicópteros como lata de alumínio lhe dava prazer. Não importava quem estivesse lá, pois era claro que tais pessoas preferiam suas máquinas, suas criações, do que seres de carne, osso e divindade: os mutantes. Decidiu puxar os tiros, alvejando na verdade o carapaça roxa de um dos Sentinelas. Ele tombou, embora não totalmente destruído.

Sam e Bucky continuaram atirando a distância, afinal desligando por completo o robô. Psylocke dava cobertura para que suas aliadas escapassem do foco da batalha, usando seus poderes para evitar ataques do último Sentinela enquanto Emma ia atrás da amiga, Raven.

No entanto, aquilo desviou sua atenção da pobre garota que resistia aos Sentinelas, a jovem com o rosto doce de Magda. Quando lembrou-se de que deveria oferecer suporte à menina, virou seu queixo e a assistiu ser lançada para cima, com um empurrão só do último dos robôs de pé.

 O tempo parou. A Feiticeira Escarlate estava no ar, sentindo-se um floco de neve suspenso na atmosfera. Seu corpo doía por ter sido jogada por um dos Sentinelas; soube que aquilo lhe deixaria um grande hematoma - se sobrevivesse. Mas lembrou-se das aulas de Clint Barton, como focalizar um alvo tão longe. Sem arco, quase sem forças: só seus dentes rangendo num rosnado e seus poderes graciosos, devastadores. Ela concentrou sua magia escarlate em uma flecha, grossa e veloz: fincou-se no meio da cabeça do último Sentinela.

 Shuri autorizou a ativação dos explosivos.

 Houve som, houve luz e Wanda afinal fechou as pálpebras. Não viu mais nada enquanto caía.


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Notas finais do capítulo

*O capítulo foi revisado, mas existe a possibilidade deste arquivo ser sabotado pela HYDRA. Caso encontre algum erro, favor reporte à Shalashaska.

*Caso exista algum tipo de erro de continuidade e/ou coerência durante a sequência de ação, por favor me avise. Não gostaria que ficasse confuso, mas cenas desse tipo não são exatamente o meu forte.

*Tenham um excelente & açucarado final de semana! ♥