Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 31
Pech’


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Temos mais um capítulo pra vocês saborearem!
Também quero conversar algo com vocês que tenho notado gradativamente nessa fic, algo que não planejei e saiu do meu controle - de uma forma positiva : o nível de empatia entre Wanda, Nat e Bucky. São pessoas com personalidades distintas, mas com traços em comum e maneiras próprias de lidar com o passado. Existe também a língua em comum (que não é exatamente o russo no caso da Wanda apesar da proximidade linguística e cultura), e isso me fez lembrar da teoria Sapir-Whorf, que diz que nosso modo de pensar é condicionada pela nossa língua. Ok, ok, essa teoria é refutada por muitos com argumentos embasados, mas acho legal pensar.
Os três em lugares de longos invernos. Cirílico. Liberdade restrita. Bloco Comunista.
Enfim, era só isso mesmo. Não baseei minha fic nisso, mas achei um ponto interessante de se divagar Sei lá.
Espero que curtam a leitura!



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 Pech’ 

"Fornalha"

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“Uma aranha subiu pela parede...”

A alvura da neve e o preto dos troncos sem folhas compunham uma imagem que poderia ser uma fotografia melancólica se não existissem duas figuras transitando pela trilha da floresta, rápidas e quietas. Seus pés pequeninos mal deixavam rastro, pois foram treinadas para a elegância tanto na neve quanto nos palcos, mas o silêncio das duas não fazia jus às marteladas de seus corações. As árvores pareciam observá-las com seus galhos secos, tentando tocá-las para ter certeza de que eram reais. Vez ou outra a menor murmurava o nome da menina que guiava o caminho, dizendo para a quietude: “Yelena, Yelena”.

A loira não respondia, apenas virava seu torso e fazia um gesto nervoso, embora delicado, com a mão enluvada, precisando que a ruiva fosse mais rápida. Já estavam longe, mas não o suficiente. Talvez nunca estivessem. Ainda era possível enxergar o Salão Vermelho através dos galhos e desníveis do terreno e Yelena temia que eles enviassem suas compatriotas para uma missão de busca, ou melhor, de captura. Seria melhor que soltassem os cães.

A oportunidade fuga fora calculada por meses. Seria numa troca de turnos da vigia, em um dia que as monitoras e mestras estivessem ocupadas com os detalhes do Lago dos Cisnes ou  com a formatura das mais velhas. Yelena tremia toda vez que pensava na celebração, cada vez mais perto.
Ao pensar nisso, sua atenção foi roubada e ela caiu, arranhando o braço e o rosto. Ela rangeu os dentes, mas não gritou, não gemeu. Seus pés, tão feridos pelas sapatilhas de bailarina, já estavam amortecidos pela temperatura cada vez mais baixa, enquanto suas mãos tinham os dedos entorpecidos dentro da luva, machucados por ter arrebentado o arame farpado da grade antes de saírem.
Natalia não a ajudou. Permaneceu parada ali, seu rosto inexpressivo e salpicado por flocos de neve, o cabelo ruivo escapando da touca em contraste com as cores do cenário. Mas o olhar indiferente de Natalia não era a própria indiferença ou até mesmo desprezo, pois sabia que assim como ela, a mais velha poderia se levantar sozinha. Foi o que fez, sangue escorrendo do nariz. Não deveriam esperar auxílio de ninguém e realmente não esperavam. Tentou lembrar-se do trajeto de fuga, planejado através de mapas desenhados porcamente à mão e trechos de conversas entre os superiores que escutara às escondidas, dizendo sempre qual caminho era mais difícil e qual vilarejo era mais amigável ou não.

Nenhum as hospedaria em casa, isso era fato. Mas podiam abrigar-se em algum celeiro, em algum depósito de fábrica qualquer, que talvez por sorte tivesse com fornalhas ainda em brasa para se aquecerem.

Yelena preocupava-se com a demora. Tinham escolhido as melhores roupas que podiam para atravessar o terreno ora pesado, ora escorregadio, mas nunca há o suficiente para o Inverno, mesmo com casacos e botas militares. Tudo era uma questão de tempo e a neve não poupava sinais para que soubessem que não eram bem-vindas ali. Ninguém era bem-vindo para aquela estação que tudo devora e consome, que morde com o vento e assola com o frio.
Sentir sono era ilusório. Ter a sensação de aconchego era um convite sublime para a morte. As extremidades tornavam-se cada vez mais frias e Yelena temia que Natalia, sendo menor, se exaurisse mais rápido.

Não havia razão de trazê-la consigo. Seria até mesmo mais seguro ir sozinha.

Mas...

Yelena lançou outro olhar pelos ombros enquanto avançava, vendo se a outra a acompanhava. Sim, ela estava ali, as mãos encostadas nos troncos e ligeiramente agachada. Satisfeita, virou-se para frente, já enxergando o lago.

Ela sabia o que a esperava se permanecesse dentro do Salão Vermelho, entre escopetas, facas e tutus. Ela conseguia lidar com a dor dos treinos e alongar o pescoço com a elegância do cisne, conseguia lidar com sangue e morte. Era, freqüentemente, a melhor no que fazia. Mas ela não queria, pois dia após dia, eles as faziam competir.
Não suportava mais as notas calmas da orquestra quando iniciava a rotina da manhã nas barras e olhando-se com ferimentos no espelho, uma figura quase sem rosto assim como as outras. As monitoras, sempre de preto, comentavam o quanto ela progredia. O quanto deveria estar perfeita.

E o quanto Natalia poderia ultrapassá-la.

Impecáveis nos à deux bras e na mira de suas pistolas Torakev. Yelena tinha a vantagem de ser mais velha e experiente, sendo a favorita para protagonizar missões e até mesmo supervisionar as mais novas, enquanto Natalia era admirada por seu jeito dissimulado, secretamente travesso. Imprevisível. Em uma das excursões para fora, encontrara uma arma com sua amiga Marina, envolveu-se com uma briga e atirou em um homem.

Lembrava-se em ouvi-la dizer, quase resmungar, que tal ato era justificado. “Eu queria dançar igual ela” Pelo o que Yelena entendera, Natalia interveio numa briga entre um casal, uma bailarina e seu amante, um criminoso que quebrara sua perna.
 Aquilo lhe deu esperanças, não pela situação, não pela morte ou pelo espancamento.
 Talvez ela se importasse com os outros. Talvez... Talvez ainda restasse um pouco de... Não, seria ingênuo afirmar que restaria bondade ou luz. Mas restava algo, algo que o Salão Vermelho não conseguira tirar.

Foi o suficiente para engolir sua vaidade de prima ballerina e motivá-la a levar Natalia.

Yelena tomou cuidado em se aproximar da rival, tornando-se aos poucos sua aliada. Era algo velado, pois as mestras censuravam qualquer tipo de laços que não fossem das sapatilhas ou de cordas para estrangular suas vítimas. Cada uma ali aprendeu meios de manter algo, o menor que fosse. Até mesmo com o instrutor, o Americano, que cuidava delas tão rígido quanto seu braço de metal. Ela ensinou-a alguns golpes, Natalia passou um pouco de seu talento teatral.

Não iriam mais competir pelo título de Viúva Negra ou pela posição falsa de Cisne Negro, na missão de fachada: O grandioso Lago dos Cisnes, quando fariam execuções importantes para a glória da cultura soviética. As duas eram melhores do aquilo, melhores do que o futuro que lhes prometiam – se é que prometiam coisa alguma. Elas mereciam ir embora e seriam as únicas que conseguiriam.

E então elas ouviram os cães, os gritos ao fundo.
Yelena puxou a mão de Natalia, ainda silenciosa, porém urgente. Ter saído enquanto começava a nevar tinha sido uma idéia de perigo óbvio, mas que em teoria deveria ter despistado seus rastros, pois a neve preenchia suas breves pegadas. Natalia seguia exatamente onde Yelena pisava, dando a entender que apenas uma pessoa saíra da trilha, não duas garotas.  Não puderam levar botas de tamanhos maiores para confundi-los, nem dar voltas para ganhar tempo.

Ela se arrependeu imediatamente de ter gasto o pobre dinheiro que vinha desviando para pagar três pessoas que lhe dessem cobertura. O par de idiotas que levava o lixo embora no caminhão. Os ciganos. O leiteiro. Todos haviam sido pagos para que agissem de maneira suspeita, mas não as levariam para fora daquele inferno. Yelena e Natalia seguiriam até o lago, onde a costureira de seus trajes esperava.

Não recebera muito para ser subornada, tampouco era bondosa, mas sabia o quanto poderia ganhar com duas belas meninas. Yelena deixou-a acreditar que não passava de uma garota sonsa, sabendo que a mataria com suas próprias tesouras e alfinetes depois que estivessem seguras.

Suor desceu quente de suas têmporas enquanto corria. Já não era mais uma missão furtiva, era um ato desesperado. Ignorou o hábito da elegância, a delicadeza em seus pés. Precisavam atravessar o lago congelado, depois dele haveria...

 O carro cor de oliva de Zoya, a costureira, que trazia os collants e adereços brilhantes. O charme do espetáculo e alfinetadas, penas e um sorriso seco.

Ainda estava lá, pequeno e indistinto do outro lado do lago. Faltava tão pouco.
O vento confundia a origem do som e a proximidade de seus perseguidores, mas ela sabia que estavam perto. Os cães ainda latiam, por mais que a neve abafasse o som, e ela secretamente pediu para que caísse mais neve do céu naquele exato instante, então elas poderiam seguir a favor do vento, despistá-los mais, até que fosse suficiente.

“Yelena” Natalia disse, a voz infantil. Não quis se lembrar do quanto ela era jovem, o quanto as duas eram.

“Natalia.” Respondeu, ajudando-a a subir o desnível de neve e seguir em frente. Um galho tirou a touca dela, revelando sua franja ruiva e vibrante. Apoiou sua mão nas costas dela, depois subiu ela própria o obstáculo criado por troncos caídos. “Vá.”

As duas correram ainda mais e afinal, ali estava o lago. Não era a decisão mais inteligente, mas era a mais aflita que tomara. Não houve tempo para ponderar se a superfície era grossa o suficiente, se haveriam estalos demais enquanto cruzava aquele imenso chão cinzento. Esperava que seus pés de bailarina fossem delicados o bastante para atravessar o gelo sem ser tragada por ele.

Sabendo que Natalia estava logo atrás de si e que havia culpa em trazê-la, Yelena se viu no meio do lago em poucos segundos, veloz. Iriam conseguir, iriam, mesmo que os latidos estivessem próximos, mesmo que ela tivesse a sensação que...

Olhou para trás, um arrepio formando se em sua espinha.

Natalia estava parada na beira do lago, sua face inocente e os olhos bem abertos. Mesmo à distância, Yelena foi capaz de ver o brilho verde que jamais esqueceria, os cabelos vermelhos soltos e adornados por flocos de neve. Ao seu lado, os cães vinham e seus adestradores também.

Passaram direto, rumo ao lago. À Yelena.

Os lábios dela tremeram e a neve pareceu engolir todo o som e todo o tempo. A ruiva estava parada no mesmo lugar sobre o gelo, apenas encarando-a fundo, o rosto plácido e a postura tão perfeita. Mais do que jamais fora, uma prima ballerina.

Dissimulada. Imprevisível.

Traiçoeira.

Os homens não avançaram sobre o lago. Não soltaram os cães. Natalia sequer mudou de posição. Todos apenas olhavam quando o Americano destacou-se entre eles, o rifle nas mãos e o reflexo pálido de seu braço de metal. Em menos de alguns segundos, o tiro ecoou no ambiente, cravando a bala no chão abaixo de Yelena Belova.

O que era horizonte tornou-se água. Gelo. E ódio.

 

 

Wanda acordou como se ela própria tivesse saído do lago na Rússia, os braços gelados em meio ao suor frio e escutando a Valsa dos Flocos de neve, de Tchaikovsky . Passou a mão na testa, assegurando a si mesma que era só um sonho, por mais que não fosse. Seus dedos ainda tremiam quando ela se desvencilhou dos livros que deixará espalhados na cama e pegou um copo de água na moranga do criado-mudo.

Demorou alguns minutos para que pudesse por a mente no lugar.

Pegara no sono tarde, de repente, e dormira em cima de livros de mudras e de seu caderno de anotações sobre o Soldado Invernal. Precisa saber quais eram as partes constantes de seus poderes e até onde conseguia ir usando-o com plena consciência. Não era fácil. Mas as palavras de Agatha Harkness, uma estranha velha, e o Charles Xavier a motivaram a continuar pesquisando, continuar treinando. Em suma disseram a mesma coisa: que tinha potencial, mas era descuidada. Xavier ainda por cima lhe deu um status poderoso, Nexus. Se poderia fazer absolutamente tudo, parecia justo - embora irônico e cruel - que ela acreditasse o contrário. Era poder demais para uma única pessoa.

E ela conhecia de perto o lado destrutivo disso.

Natasha...

Jamais pensou que depois daquilo conseguiria ser sua amiga. Por trás de sua máscara bem convincente de bem resolvida e até mesmo implacável, havia alguém que nao superara todos os traumas do passado. Talvez a maioria, mas não todos. E esse alguém era uma Natasha de rosto ainda mais belo, por mais vulnerável que fosse, que não suportava a ideia de que outra pessoa pudesse saber de sua historia inteira - e foi praticamente isso que Wanda fez.

Existia certa vergonha ali, embora nao seja exatamente essa a palavra que a Feiticeira Escarlate pudesse usar para descrever a Viúva Negra. Talvez culpa, um tanto de resignação pelo o que não podia ser mudado. A verdade é que ela traíra aqueles que a chamaram de amiga, aliada. Isso aconteceu com Yelena. Aconteceu com Marina, uma colega do Salão Vermelho, anos depois. Quase aconteceu com Barton no início de sua amizade. Natasha não queria ser marcada pelas decisões que fizera para sobreviver, não suportaria ver a face de todos soubessem, se Steve soubesse...

Wanda recordou-se de súbito o breve e feliz período que viverá no Norte do estado de Nova York, aprendendo a se defender, atacar, voar. Nat a ensinou alguns truques sobre camuflagem, disfarces, falas e tons que poderia usar numa situação extrema. Um sorriso lindo, tão falso.

E elas sabiam da vida uma da outra, sem que falassem sobre isso. E, quando falavam, era na língua que o inverno conhecia, os dialetos do leste europeu, um pouco de russo. Sabiam de suas infâncias roubadas de diferentes formas, de uma adolescência cheia de privações em países que haviam saído há pouco do bloco comunista. O cinza, o vermelho e a neve. A crueldade e o pequeno calor da lareira.

Natasha gostava de tirar fotos numa velha câmera Polaroid. Era outro pequeno segredo seu, flashes discretos e fotos instantâneas nas palmas das mãos. Tirou fotos escondida de Steve, selfies com Wanda e retratos nada enobrecedores de Barton. E depois queimava-as, as vezes uma a uma com um isqueiro, as vezes todas juntas numa pequena pilha de lembranças. Ainda um habito de não ter laços, não deixar rastros. Clint salvava todas as que podia, tendo um acervo respeitavel de fotografias parcialmente chamuscadas.

Elas se entendiam silenciosamente.Tinham um passado terrível no gelo.

Natasha, em uma madrugada em que ensinava Wanda beber vodka – sem que o Capitão América  soubesse – contou brevemente sobre aquela noite de Dezembro, num momento estranho de vulnerabilidade. Wanda sabia, de qualquer forma.
 O rosto dela não expressava emoção, mas a Feiticeira Escarlate não precisou assistir sua testa franzir ou seus olhos lacrimejarem para ver algo além de sua face. Dissera que Yelena Belova sobrevivera a queda no gelo, mas que nunca mais a vira. Somente soube vez ou outra sobre seu desempenho no Salão Vermelho, sobre as mortes que causava.

Natalia executara os fouettes, os famosos rodopios complicados do Cisne Negro. Para Yelena, sobrara somente a morte do Cisne, num lago de verdade e abaixo de zero.

Era curioso, porém, ver aquela lembrança. Parecia ter sido mostrada através dos olhos frios de Yelena, não de Natasha. Mas sabendo da estranheza de seus poderes escarlates, tudo poderia acontecer.

Wanda soltou um suspiro, sabendo que por mais que estivesse com sono , não seria mais capaz de dormir. Trechos de seu passado orbitavam sua cabeça, assim como vislumbres do passado de outrem. Era mais uma desvantagem de saber demais, entender demais. As dores dos outros frequentemente se tornavam suas.

Ela arrumou seus cabelos, arrumou os livros sobre ocultismo que deixara sobre a cama. Foi quando notou que estava chovendo mais forte, pingos batendo contra o vidro. A distância era possível enxergar alguns relâmpagos, mas demorava alguns segundos para que o som do trovão reverberasse nas janelas.  Ela ficou sentada na beirada da cama por muitos minutos, sentindo a gravidade.

Carregar a guerra depois dela acabar era pesado e deixava seus ombros cansados. Sam dissera para carregar isso numa carteira, mas havia coisas que não cabiam ali. Ele sabia disso, ela também. Talvez fosse por isso que ele e Steve Rogers ainda acordavam as cinco da manhã e faziam flexões, corriam. O cotidiano militar ainda estava ali, por mais que a guerra não.

Se cada um deles tinha conseguido aprender a viver depois de uma morte em vida, talvez em conseguisse também. Estavam comprometidos com algo e por isso continuavam, continuavam, continuavam. E ela tinha que sobreviver. Por Pietro, por Emijia, por aqueles que não estavam ali. Tinha que sobreviver.

Outro relâmpago cortou o céu de Wakanda, clareando o quarto e os pensamentos de Wanda Maximoff. Seu fascínio sobre James Barnes pareceu de súbito justificado, pois ele assim como ela não tinha seguido em frente completamente com uma nova página de sua vida. Mentiram para si nesses dois anos, ele na Romênia, ela em Nova York, até que o passado não suportou mais ser ignorado.
Se Xavier tinha dito tanto sobre seu poder, talvez ela conseguisse mudar ao menos a realidade de Bucky. Sentia que estava cada vez mais perto, mas ajudaria saber como ele havia sido transformado do rapazote patriota do Brooklyn para o impiedoso Soldado Invernal.
Com ela, seu irmão e anos antes Natasha, os meios foram letais, mas ministrados de maneira tão impecável que demoraram a saber que aquilo, a HYDRA, não era a cura e sim o veneno.
Ela desconfiava que ele foi tratado de forma pior. Tortura física, privação de sono, manipulação mental. Típica e eficiente lavagem cerebral, talvez algo mais.

 

“Tudo o que ele teve que fazer foi dizer as malditas palavras.” Foi o que Bucky contara a Steve, o braço preso por segurança na ocasião. E foi o que Steve relatara a ela, sobre o incidente na Alemanha.

E agora ela tinha palavras sublinhadas em anotações.

грузовой вагон

Один

возвращение на родину

добросердечный

Девять

Wanda pegou seus cadernos na pressa. A língua do inverno. Talvez não acontecesse nada, talvez acontecesse tudo. Ela faria uma nova visita ao Soldado Invernal.

***

Wanda mal viu o tempo passar até estar de frente para a câmara criogênica, olhando para seu rosto calmo e a mecha de cabelo que cobria um pouco de seu olho assim como cobrira há dias atrás, há praticamente um mês.
Ela tinha seu caderno nos braços como se aquilo fosse a única coisa que a ligasse até o tempo presente. Parte de si entendia que aquilo que desejava era um devaneio egoísta e impulsivo, exatamente como Agatha descrevera no dia anterior, mas ela também sabia que madrugadas não foram feitas para decisões conscientes. Havia um brilho vermelho em Wanda quando ela se aproximou da câmara criogênica e apoiou uma das palmas no vidro gélido. Franziu a testa, respirou fundo, tentando acalmar o coração trêmulo.

“Só mais algumas palavras...” Ela disse para si mesma, o sopro de sua promessa vazia condensando contra a câmara criogênica.

Era tão tolo. Tão tolo cruzar todos os avisos de perigo para ajudá-lo. No entanto, ela estava acostumada a transgredir regras e conselhos e foi o que fez.

Ela fechou os olhos e sentiu-se desvanecer.

Wanda Maximoff queria ir ao começo do Soldado Invernal. O começo de sua tortura, o método que aplicaram para que se tornasse um assassino impessoal e tão eficiente, pois assim poderia entender e talvez... Ajudar. Talvez reverter o processo, de alguma forma, ou amenizar suas conseqüências.

Mas, para isso, ela tinha que seguir os passos que ela mesma mapeara. Primeiro deveria entrar em sintonia com o sentimento que, possivelmente, Bucky vivenciara na ocasião. Não foi difícil.
Wanda sabia o que era ser forjada.

Fez-se luz vermelha.


Haviam lapsos e lacunas vazias. Ela pôde ver, com horror, dezenas de execuções feitas por ele ao longo dos anos servindo a HYDRA, em momentos políticos diferentes, em lugares diferentes.
O estresse atingindo-a era constante. A visão de sangue, de dor e de morte a pressionava com dor intensa e ela pensava em sair ou em simplesmente se deixar desaparecer. Tudo aquilo a fazia recordar do que passara, da guerra em Sokovia e o laboratório da HYDRA. Verter-se em agonia era uma resposta instintiva e ela não podia evitar, por mais que tentasse se manter distante e consciente.
Não havia nada em ordem cronológica, não havia...

Ele estava lá, num cômodo que parecia ter sido feito pela matéria mais escura do universo. Havia apenas um foco de luz no rosto abatido de Bucky Barnes, com eletrodos e suor na testa.

Injetavam coisas diversas em seus braços. Substancias de cores coloridas ou sem cor alguma, que não podiam ser nomeadas por sua mente febril. Em momentos de lucidez, tentava descobrir o que era. Não sabia. Talvez até mesmo os cientistas não soubessem. Febre. Frio. Fome.
Mas não podia fazer perguntas. Não deveria fazer perguntas. Não. Sem questionar, somente obedecer. Havia clareza no raciocínio daqueles que argumentavam com tapas, com choques. Com agressão. Seja resistente, mas não ofereça resistência. Tudo o que ele tinha que fazer era cooperar.

Privação de sono. Isolamento. Repetição. Repetição de palavras que ele não entendia, depois palavras que ele entendia muito bem, seguidas por altas voltagens.

“Pronto para cooperar?”

Ameaça. Ameaça. Ameaça. Violência.

As vezes Bucky não fazia nada que pudesse irritá-los, mas ainda assim eletrocutavam seus braços e tórax. Outras vezes ele oferecia resistência, gritos, violência, e eles diziam que realmente precisava reagir. Essa alternância entre crueldade e benevolência; entre afirmações e contradições, o deixava desnorteado, sem reação. Em um laboratório lúgubre e bem equipado, tipo de lugar que Wanda vira o suficiente para uma vida inteira, ele pedia ajuda amarrado à cadeira, a boca seca e a dor fantasma do braço que não estava mais lá.

S o c o r r o

s  o  c  o r  r  o.

s    o    c   o    r   r    o

 

E se sentia patético.

Depois de muitos gritos, da sensação de metal se fundir com o que restava de seu braço, ele cedeu ao cansaço. Não era a primeira vez que desmaiava e não seria a última. Fraco, fraco, fraco. Ao acordar de leve, esganou um cientista com a força descomunal de sua prótese.

Aqui, um novo braço. O antigo? Foram eles, eles o tomaram. Tiraram de você. Lhe deixaram para morrer. Quem eram eles? O inimigo. Seja grato, grato, grato por ter sobrevivido. Por nós termos te salvado. Pague sua gratidão. Pague sua dívida. Pague sua lealdade. Bucky? Quem diabos é Bucky? Você é um soldado, uma máquina, e máquinas não choramingam.

Vamos tentar de novo.

Eletricidade.

Reiniciar. Reiniciar. Reiniciar.

Желание

Ржaвый

Семнадцать

Рассвет

Печь

.

.

Девять

Добросердечный

 возвращение на родину

Один

грузовой вагон 

 

 

“Bom dia, soldado.”

“Pronto para cooperar”



Wanda não sabia como podia ter a sensação de lágrimas nos olhos e no rosto, sendo que não estava em sua forma física e, portanto, não poderia chorar. Mas, ela chorava. Não era concebível o tamanho da dor que ele passara e como continuava vivo. Como? Wanda se perguntava, cada vez mais incrédula.
Se fosse tão poderosa, poderia tirar sua dor. Tirar a dor de todos. Entretanto, era uma garota assustada que só queria seu irmão e ficar segura.

— Você está chorando.

Wanda levantou a face para ver o dono da voz grave e viu o rosto de Bucky, agachado no chão à sua frente. Seus cabelos castanhos quase na altura dos ombros estavam tingidos pelo Sol do final da tarde e ele parecia em tão em paz. Os lábios dela tremeram, pequena e infantil, mas ela não conseguiu responder.

— Por que você está chorando?

Ele perguntou, sentando-se ao lado dela. Ela franziu a testa, confusa, olhando para o mundo parado em que viviam naquele momento sem tempo. Viu postes ultrapassados. Construções antigas, anúncios vintage. Anos 40. Ou final dos 30. Deus, sua vida era tão caótica. Novamente no Brooklyn, na parte... Bom, Wanda não sabia dizer que encontrara a parte consciente de James Barnes, pois da última vez ele parecia tão confuso quanto ela sobre o que se passava naquele ambiente predatório e noir. Ele ainda parecia um tanto confuso.
Felizmente, não viu nenhuma bandeira nazista. Poucas pessoas passavam e elas pareciam normais, versões coloridas daquelas filmagens em preto e branco da época. Uma fantasia vívida.

Wanda precisava descobrir como acessara aquela parte dele e por que estava tão diferente.

— Ei, boneca. — Ele repetiu. Ainda havia um semblante cansado em seu rosto, mas era de um tom ameno, como o alívio depois de um dia exaustivo. Do jeito que ele a chamara, ela pôde ver uma ponta do rapazote alegre do bairro, querido por todos. — Você está encrencada com alguma coisa?

Ela soltou um riso breve, enxugando as lágrimas com as pontas dos dedos.

— Sim. Acho que... Estou sempre encrencada com alguma coisa.

Hesitação.

— Eu posso fazer algo por você?

— Não. Vai passar. Não se preocupe, vai passar.

— Eu tenho um amigo assim. — Disse, feliz por ter feito-a sorrir. — Um verdadeiro punk.

Eles se olharam e Wanda sentiu seus olhos arderem ainda mais. O jeito que se referia a Steve, a gentileza em que se punha a ajudar uma completa estranha que invadia sua cabeça... O mundo não era digno de merecê-lo.

Muito menos ela.

E então algo mudou em sua expressão. James apertou os olhos para enxergá-la bem, a face um tanto franzida e focada.

— Você... Eu... Eu me lembro de você. Eu te conheço.

— Sim. — Ela, sentada na calçada, abraçou mais os seus joelhos. Sua boca mal proferiu uma palavra audível, seus cabelos cobriram seu rosto. — Você me disse isso.

— Não, não. Eu me lembrei de algo que não aconteceu. Só surgiu, de repente. Um sonho.

Os olhos verdes dela o encaram com curiosidade por de trás das mechas de cabelo castanho.  

— Vou pegar algo para você beber. Água. Chá? — O tom era incerto. O que uma garota em apuros poderia querer? Se fosse por opção dele, a levaria para tomar milkshake na sua lanchonete favorita, embora estivesse há alguns quarteirões de distância. Ele tentou se levantar, entre a decisão do que faria e a lembrança incompleta que preenchia sua cabeça. Tonteou e caiu sentado no chão, no mesmo lugar. — Você... Você era feita de luz vermelha e eu apontava uma arma na sua direção... Urgh.

Wanda precipitou-se, saindo da pose encolhida em que estava. Segurou os ombros de James, mantendo-o no lugar. Era ridículo o fato de querer ajudá-la, sendo que tudo aquilo acontecera com ele. Toda aquela... Tortura. Seus dedos finos queriam confortá-lo, mas eram muito leves, muito delicados. Não queria quebrá-lo.

— Calma. Fique sentado.

— Por que eu apontaria um fuzil para você? Isso é errado. É errado, não é? — Ele precisou de sólidos minutos para recompor seu raciocínio, enquanto ela o segurava com zelo. Encarava o outro lado da rua onde havia uma pequena loja de verduras e mantimentos, fechada àquela hora,  como se na verdade olhasse para dentro de si.

Wanda murmurou um breve “shh”, apertando seus ombros com delicadeza. Não parecia real poder tocá-lo e de fato não era. Tudo se passava na mente... De ambos? Só dela? Só dele? Era difícil saber. Não era “real”.

— O que houve com esse lugar, James?

— Não sei. — Ele passou a mão no rosto, nos cabelos. A mecha, porém, permaneceu tampando um pouco de sua visão. — Minha cabeça parece mais... Cristo, eu não sei. Leve? Eu acho. Isso faz sentido?

— Continue.

— Eu me lembro de estar andando. Depois que você... Apareceu. Lembra? Você veio aqui no bairro. E estava confusa também. Isso aconteceu. Aconteceu, não?

Ela suspirou. O quanto era saudável conversar sobre aquilo? O quanto poderia revelar? Wanda apenas disse:

— Sim. Aconteceu.

— Você sumiu. — Bucky continuou, com a expressão mais suave. Era um alívio saber que aquilo tinha realmente acontecido. — Eu estava andando, fugindo daqueles... urgh. — Ele segurou as próprias têmporas. — Nazis. Mas clareou um pouco. Eu não tive que... Que enfrentar ninguém. Pessoas me cumprimentaram na rua. O que é você?

Wanda o encarou. A guinada em outra direção daquela conversa a deixou com a boca ligeiramente aberta e seu estomago frio. O que era ela?

Fez-se silencio e os dois observaram crianças rirem no final da rua, transeuntes andar pela calçada com sacolas de compras na mão.

Aquele era um espaço mental delicado, criado pela fantasia de sua psique e envenenado pela HYDRA. Era onde secretamente James Barnes guardava suas lembranças de adolescência, de infância. Do Brooklyn. Era, assim como Wanda supôs anteriormente, um lugar que deveria significar paz, aconchego, identidade. A matriz de si. E mesmo que tivesse as estruturas básicas de seu bairro natal, estava infestado de nazistas que o caçavam, ou seja, até mesmo sua consciência mais sagrada foi maculada pela guerra. 
Surpreendia, porém, o fato que antes estava escuro e pessoas os perseguiam e ela agora não enxergava nenhuma bandeira vermelha com a suástica, não captara nenhum movimento suspeito. Aquela área do bairro era segura.
Aquela parte de sua consciência purificara-se afinal.

 A Feiticeira Escarlate deixou de confortar os ombros dele, e finalmente arrumou a mecha de cabelo que atrapalhava seu rosto com a ponta de seus dedos.
Ela quase derreteu quando ele fechou os olhos devido ao toque gentil.

— Uma amiga. — Afirmou. — Estou tentando ajudar.

Mas ela percebeu que assim que colocara a mão em seu cabelo, as pessoas que inocentemente andavam na rua congelaram-se em sua última posição, de súbito com os olhos vidrados na cena que acontecia entre os dois, rostos inexpressivos e hesitantes. O cenário agradável tornou-se uma foto mórbida e desbotada, desaturando aos poucos até o preto e branco.
Wanda sentiu o perigo e afastou seu braço com delicadeza. Bucky e o seu bairro – sua parte semi-consciente ou um termo qualquer que a psiquiatria dissesse – poderiam aproveitar de um pouco mais de paz, um pouco mais de sol, mas aquilo ainda mostrava que os resquícios da HYDRA ainda estavam ali, tentando manter as aparências, tentando mantê-lo cativo.

Ela poderia ter ajudado no processo de cura ao identificar, mesmo que sem querer, as palavras que o obrigavam a entrar no modo Soldado Invernal. Trazê-los à tona, ver como aquilo funcionava e o afetava, era um método arriscado para que pudesse desconstruir a identidade forjada pela HYDRA. Assim como Sam Wilson dissera, não era uma forma ortodoxa de fazer as coisas, mas dera certo. Deus, algo que ela fizera dera realmente certo! Estava ciente de que tinha sido apenas um pouco, pois ainda havia escuridão e sangue. Um pouco, porque ele ainda estava ali, um tanto confuso. Mas no meio do Brooklyn agora existia um pôr-do-sol e Bucky para assisti-lo.

Assim que Wanda tirou as mãos de Bucky, os cidadãos fantasmas voltaram a normal e ele mal notou. Eram apenas os dois sentados numa calçada do bairro.

— Wanda. É Wanda, não? Amiga do Steve. — James abriu as pálpebras. Havia um brilho diferente refletido em suas pupilas um tanto dilatadas, talvez o começo de lembranças verdadeiras. Linearidade. — Me ajudou com o Pantera.

— É. — Disse depois de uma curta gargalhada, sem graça. — Então... Você realmente se lembra? De tudo?

— Sim. Digo, acho que sim. — Uma pausa. — Existem coisas confusas mesmo depois de tanto tempo. Dois anos desde que Steve... Desde que salvei Steve do lago em Washington, DC.  Você estava na HYDRA. Com seu irmão, antes. O que... Aconteceu?

— Pode se dizer que... — Ela inspirou fundo, deu de ombros. — Que eu estou sempre encrencada com alguma coisa. Só que agora estou sozinha.

Ele absorveu as palavras dela com cuidado.

— Eu posso fazer algo?

— Não.  — Wanda lhe ofereceu um sorriso triste, repetindo o que dissera antes. — Vai passar. E talvez você não se lembre do que aconteceu aqui. – Ela se levantou, sabendo que aquele era o momento de partir. –  Ou de mim, uma aparição escarlate. E eu não me importo se esse for o custo, se for para ficar melhor.

Ele fixou bem seus olhos azuis nos dela, confuso,  enquanto Wanda dizia algo inspirado no que ele mesmo pensara antes; quando a vira realmente pela primeira vez: ela numa cela, ele na prisão que era sua mente dominada pela HYDRA.

— Eu só espero que jamais se esqueça disso aqui. – A Feiticeira Escarlate fez um gesto expansivo para o ambiente claro, vivo. Se referia ao que existia dentro dele, apesar de tudo, apesar dos becos escuros e sem saída, apesar da violência. Se referia ao que fazia a vida ser vida, não mera existência. – Por que eu estou esquecendo e não quero que isto aconteça a você. Adeus, James.

 

No ocaso, os fachos de luz laranja dissolveram a figura rubra, enquanto James Barnes observava mesmerizado. Seus dedos alcançaram as partículas vermelhas ao sabor da brisa e da gravidade, seus olhos ainda tentavam entender aquela garota.

E então ele se viu sozinho. E confuso, mais uma vez. E de repente sem saber por que ele estava ali.

Sabia que estava andando antes. Que procurava algo. Que fugia de alguém. Ou era o inverso e ele procurava alguém e fugia de algo? Lembrou–se de um amigo punk e magro, que provavelmente estava num beco procurando uma bela briga. Seria ele? Talvez. Talvez.
Ele continuou andando e andando, a sensação inquietante de não chegar a lugar algum e de ainda assim não querer parar. Por vezes, sentia-se observado por nove cabeças de serpentes. Por vezes, sentia-se guiado por uma presença estranha.

Ele andou um pouco mais. Talvez descobrisse o que era. Talvez.

 

 

Wanda resfolegou, de volta ao mundo material. Sentir sua alma tomando forma, seus ossos, carne e peso, era mais doloroso e lento do que imaginava. Demorou cinco minutos inteiros juntando sua respiração dentro do tórax para poder raciocinar, para por a mente no lugar. Estava ajoelhada na frente da câmara criogênica.

Levantou a cabeça, afastou o seu próprio cabelo para limpar sua visão. O que acabara de acontecer não parecia real e naquela altura, era difícil distinguir ilusão e realidade. Mas, lembrou-se ela, o que acontecia dentro de si não deixava de ser verdadeiro por mais que não fosse tangível.

E desse modo, ela sorriu.

Levantou-se.

Tonteou um pouco, apoiou-se numa mesa. E então lembrou-se que deveria escrever as palavras que ouvira o torturador dizer para Bucky, antes que tudo se desvanecesse como um sonho. Pegou o caderno que trouxera, caído no chão, e anotou-a uma por uma em sua língua natal, na caligrafia enganchada em cirílico. Poderia ser útil no futuro.
 Antes não falara nada para Steve, Shuri ou Sam porque não sabia se conseguiria minar as armadilhas da HYDRA na mente de Bucky e não era justo fazê-lo á força. Não era justo trocar uma manipulação por outra. Mas agora... Agora que o eu dele estava presente, que dava sinal claros de cura... Precisava contar o que tinha acontecido para Steve.

Ela deu um último olhar na câmara criogênica antes de ir embora.

***

Andar pelos corredores de Wakanda durante a madrugada não era novidade para Wanda. Novidade era andar com uma sensação agradável no peito, mal enxergando o caminho, e com um sorriso parvo no rosto. A chuva tropical do lado de fora não a assustava, nem mesmo os clarões de raios. Ela mal conseguia acreditar.

Não o quebrara.

Não o intoxicara.

Por mais que ainda houvesse muito a ser feito, ele pudera apreciar um pôr-do-sol, sem medo.

Chegou até a ala dos dormitórios e rumou para o quarto de Steve, o primeiro. Ela bateu, impaciente. Bateu, bateu, até que forçou a tranca – usando tanto força física quanto poder escarlate – somente para encontrar um cômodo vazio, cortinas fechadas. Wanda entrou com os pés hesitantes, chamando-o baixo pelo nome. O relógio ao lado da cama ainda indicava que faltavam duas horas para o amanhecer, portanto ele e Sam ainda deveriam estar dormindo.

Frio tomou conta de seu estômago.

Saiu do quarto, foi até o hall. A temperatura parecia ter caído quinze graus. Pensava em mil coisas diferentes, em ramificações mais e mais catastróficas da realidade. Até que viu Steve saindo de seu quarto, no meio entre o dele e o de Sam.

— Ah, Steve... Eu preciso te contar. — Soltou a respiração e sentiu o sorriso retornar à sua face. Mas ele não sorriu de volta.

Sua postura era arqueada, o rosto tenso iluminado vez ou outra pelos relâmpagos. Wanda aproximou-se, sem entender a razão de seus lábios comprimidos e o vinco na testa dele. Steve Rogers estava com os olhos avermelhados devido a lágrimas que não permitira cair.
Algo tinha acontecido.

Algo muito ruim tinha acontecido.

— Wanda. — Ele afirmou, sem saber por onde começaria. — Natasha, ela...

— Não. — Negou, balançando a cabeça. Sua voz embargara-se de súbito, mesmo sem saber. — Não. Não.

A tempestade parecia muda aos ouvidos dela. Só existia Steve, seus olhos avermelhados e o relato do ocorrera.

 

 

“... Veio a chuva forte e a derrubou.”


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Notas finais do capítulo

Caso encontrem erros de concordância, gramaticais, qualquer coisa, me avisem!

*prima ballerina - a bailarina principal.
*à deux bras - uma das posições de balé no estilo soviético, segundo esse site: https://dancer.com/ballet-info/in-the-studio/terms-positions/
*fouettes - um passo difícil no balé - segundo todos os sites que vi hahah - em que a bailarina gira sem parar no mesmo lugar.

Желание - Saudade
Ржaвый - Enferrujado
Семнадцать - Dezessete
Рассвет - Aurora
Печь - Fornalha
Девять - Nove
Добросердечный - Benigno
возвращение на родину - Regresso
Один - Um
грузовой вагон - Vagão de Carga

Essas são as palavras de ativação do Soldado Invernal, que eu coloquei em cirílico no capítulo. Vocês devem ter notado que os capítulos que contém memórias importantes também tem essas palavras como título, porém na ordem inversa e na escrita ocidental mesmo.

O lugar onde Wanda viu e conversou com Bucky é um lugar na mente dele, uma parte pequena consciente e ainda em atividade, por mais que tenha sofrido danos ao longo dos anos sob custódia da HYDRA. Ele não se lembra exatamente dela depois que ela se vai ao fim do capítulo, é mais como um sonho que nós não nos recordamos ao certo depois de acordar. Isso será tratado depois.
Tentei deixar mais claro nesse capitulo, mas caso tenham dúvidas, é só conversar comigo ♥ Ás vezes eu sou confusa mesmo, sorry.

E aí, o que aconteceu com nossa espiã russa? Mais no próximo capítulo, uma perigosa missão em Vienna! Até mais!



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