Vazios escrita por Shalashaska


Capítulo 18
Odin


Notas iniciais do capítulo

OE. Bom, não adianta muito eu me desculpar com as mesmas justificativas de sempre a minha ENORME demora. Entãooo, fiz meu dever de casa e já estou terminando mais dois capítulos *0* Na moral, espero que perdoem meu atraso. Estou fazendo TCC e isso toma meu tempo e minha saúde, já que tendinite existe, infelizmente XD Boa leitura!



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Odin

 

“Um”

 

Wanda mal podia acreditar no silêncio da noite. Talvez fosse sua mente aguçada, desperta, talvez fosse algo físico e palpável, mas o que quer que fosse a razão, a quietude imperava no breu com solidez e sobriedade. Já havia acendido e apagado o Menorah, chorado um pouco ao se lembrar de seu irmão; Já havia sido consolada por seus amigos e prometido que estava tudo bem. Eles comeram e riram, sofreram também por não falarem de coisas que ainda doíam por mais que o tempo passasse.

E então, o silêncio. A consciência de sua metade muda. Apenas ruídos da noite, a respiração pesada de Steve no quarto e um suspiro ocasional de Sam na sala.

Ela se perguntava do por quê não dormir, mesmo exausta. Quem sabe fossem questões não resolvidas, clamando seu nome para que permanecesse desperta. Ou somente algum distúrbio de sono, um reflexo comum para depressão. Fez o que era esperado dela: olhou as estrelas, caminhou nos corredores. Foi até um em específico, numa parte erma.

O som da porta automática rasgou a escuridão, bem como os fachos de luz branca. Wanda deu um passo a frente, quase se arrependendo de imediato. Retomou fôlego e coragem, deu outro passo. Bamba entre insegurança e atitude, ela gastou muito de si até estar frente a frente com ele.

— Oi, James. – Cruzou os braços, em seguida os descruzou. Não era como se ele fosse reparar que Wanda agia de maneira estranha, mas o desejo de camuflar seus gestos nervosos ainda lhe perturbava. – Desculpe. Não trouxe nada de Natal. Só soube que gostava de bengalas de açúcar hoje de manhã.

O riso dela foi fraco, depois se desfez.

— Por quê não disse nada antes? Digo, não “dizer”...Mas, você sabe. – Ela deu de ombros. – Steve veio aqui e nada aconteceu. Nenhuma memória, nenhum vislumbre. Eu não entendo... Não entendo se estou enlouquecendo ou se você me mostrou algo, James.

Apesar de não ser uma surpresa que ele nada falasse, Wanda não pode deixar de ficar desapontada. Ela ainda não entendia exatamente a razão de ter visto estilhaços de lembranças ou como isso exatamente acontecia, embora soubesse que tanto a visão de Natasha quanto de Steve vieram através de lascas de pensamentos.

O rosto dele ainda estava impassível, quase como esculpido em mármore. Havia uma mecha pequena de cabelo perto de seus olhos fechados e Wanda teve o impulso de afastá-la. Então recolheu a mão suspensa no ar, sabendo que aquilo era tolice e que havia uma câmara de vidro os separando.

Com um suspiro, ela se afastou e foi se sentar numa cadeira confortável ali perto, com costas altas e rodinhas silenciosas nos pés.

— Não o culpo se não quiser falar comigo. Nem eu sei se sou boa companhia.

Ela se lembrou do que dissera para Shuri, de como os olhos dela e de T’Challa se arregalaram naquele momento.

“Tempestade. Eu vejo tempestade.”

Aquilo pareceu mais do que uma ameaça, pareceu uma promessa ou um mau presságio, e naquele mesmo instante Wanda sentiu-se a bruxa que todos falavam. Encolheu-se na cadeira, cruzando os braços outra vez.

— Eu não sei o porquê disse aquilo. Eu realmente não sei. – Segurou as têmporas com as mãos, embargando a voz. – Só saiu da minha boca e eu não sei a razão, assim como não sei se aquilo que você mostrou é real ou se... Ou se... Se estou ficando louca. Se sou louca.

O rugido das máquinas ressoava fraco como uma pulsação, enquanto névoa de nitrogênio acumulava-se perto da câmara criogênica. Junto à este som, vinham os bipes dos painéis de sílica com gráficos coloridos.

— Por favor, diga alguma coisa. Qualquer coisa.

Ele não disse e a cada segundo naquele silêncio, Wanda sentia sua garganta se apertar.

Seus olhos perderam-se no ambiente aos poucos, ancorando em memórias próprias tão distantes. Afundou em algo abissal, tanto que o toque daquela lembrança sobressaltou seu corpo, agora imerso em aura escarlate.

Ela tinha sete ou oito anos e além da cor rubra do casaco grosso, havia sangue escorrendo pelo seu pequeno nariz. Alguém a levantou, gritou em sua voz infantil. Era Pietro, logo em seguida correndo atrás do grupo de crianças que haviam batido em sua irmã. Wanda lembrava-se do vento do outono e a figura dele lançando pedras em seus algozes, embora sem acertar. Lembrava-se de pôr a mão no nariz e sentir a viscosidade do sangue e seu calor.
Lembrava-se das crianças a empurrando antes:

Aberração. Cigana suja. Anormal. Esquisita.

Bruxa.

Sempre houve algo a mais em Wanda, algo que jamais pode dizer o que era. Talvez um semblante etéreo e sério somente, uma vã e sublime esquisitice adolescente. Mas, esquisitices adolescentes não traziam tantos pesadelos durante a madrugada, não sussurravam pensamentos vagos de terceiros, não traziam memórias estranhas que não eram suas ou moviam coisas de lugar. Sempre houve algo que Django Maximoff não lhes contou, com seus olhos tristes e saudades. Algo que ele não teve tempo de contar, pois um míssil tirou sua vida cedo demais.

Ela entrelaçou seus dedos nos cabelos, segurando sua cabeça ao mesmo tempo em que permitia mais lágrimas escaparem dos olhos.

Wanda, esquisita e escarlate de vingança, procurou quem havia a procurado antes. É claro que eles não se nomeavam da HYDRA ou algo assim, quando se apresentaram. Pietro a seguiu. E então ela se tornou algo que todos esperavam:

Uma bruxa.

Um soluço escapou de sua boca. Lembrou-se do primeiro dia. O primeiro de muitos.

O concreto separando-os, de como quase sentia a presença de seu irmão com as palmas sobre a superfície lisa dos azulejos da parede. Agulhas, líquidos e sons estranhos. Aquilo era realmente uma furadeira? Isto está limpo? Isso é soro? Isso é sangue? Lembrou-se disso e muitas coisas, mas principalmente do silêncio assim como aquele que imperava neste instante.

Ela ergueu o queixo de volta para Bucky, com a imagem de sua cela em mente. Ao invés de enxergá-lo em sua contestável paz, Wanda viu a si mesma. Trajava aquele vestido encardido, uma tentativa de imitação falha de roupa de paciente em um hospital.

Não conseguiu fazer nada senão observar, paralisada.

Wanda, no chão e atrás de grades, tinha o olhar perdido e as mãos erguidas, balançando os dedos como uma maestrina numa suave melodia. Cubos de madeira acompanhavam o ritmo e era possível enxergar os lábios dela cantarolando muito baixo alguma canção, da qual ela não se recordava bem agora e em uma língua que não era o dialeto de Sokovia, nem yiddish ou romani.

“Como os gêmeos estão?”

Não havia notado dois homens conversando. Reconheceu Strucker, mas não o outro. Talvez algum cientista qualquer, que lhe injetara substâncias inimagináveis e lhe aplicara cargas absurdas de eletricidade.

“Vivos. Isso é mais do que muitos conseguiram em todos esses anos, desde...”

“Desde a recriação do Projeto Renascer?” O cientista perguntou, logo sendo repreendido por um olhar severo de Strucker.

“Projeto I, eu assumo que saiba.”

“Sim, senhor.”

“O resultado destes experimentos é quase aleatório.” Continuou, mais para si próprio do que para o cientista. “Nenhum com tanto sucesso quanto Capitão Rogers”... Ou quanto ao nosso recurso aqui.”

Um frio tomou conta de seu estômago quando o Barão a encarou diretamente.

Certo, Soldat?

S o l d a t

Aquilo atingiu seus tímpanos como uma bala. Wanda olhou para si no corpo de outro alguém. Era uma constituição física forte, mas havia uma dor de cabeça leve e contínua, uma resposta pronta da ponta da língua para o que seu superior dissesse. Ela viu o reflexo do próprio braço esquerdo, feito de metal e com uma estrela vermelha.

Ya gotov otvechat’ O corpo respondeu, mas não era ela.

E nem parecia ele. Dentro de si, Wanda pode sentir um formigamento baixo, como uma flama diminuta que teimava em queimar, trêmula e esquecida. Ela não conseguiu dizer se aquilo era desespero ou se era o resto de consciência de James que murmurava o quanto tudo era errado. Era uma voz baixa, grave e enterrada fundo sob aquele corpo, suspirando:

Eles te pegaram também? Você ainda vai cantar? Vai se lembrar de quem é e de quem ama?

Eu estou esquecendo. E espero que isso não aconteça a você.

Strucker sorriu com certo orgulho.

“É claro, tivemos belas exceções como a Arma-X, por mais que não fosse da nossa base ou muito menos de nossa posse. De qualquer modo, todo o conhecimento adquirido durante todo o programa é precioso. Estamos vivendo uma excelente era.”

O Soldado Invernal deu uma última olhada para aquela coitada no chão antes de seguir seu superior, vazio e frio como a nevasca.

Wanda implorou que seu poder caótico a trouxesse de volta para a sala de criogênia, um vez que era preferível o silêncio à violência que assistia, mas as memórias do Soldado Invernal a arrastaram mais a fundo. Ele mostrou a primeira vítima, a primeira missão. A primeira tortura que sofreu em um fortuito momento de lucidez, quando o instinto de escapar foi mais forte. A primeira vez que foi ao Salão Vermelho e abateu uma garotinha no concreto.

A primeira vez que se viu sozinho, deixando Steve na beira do lago. Sem seu amigo, embora sem as cordas de marionete que lhe deixavam submisso à HYDRA. A primeira vez que falou com alguém em anos e a primeira vez que acariciou um cachorro perdido numa praça.

Demorou para que ela percebesse que já não via mais nenhuma memória dolorosa, e sim que apenas chorava sozinha. Não soube dizer quanto tempo levou, mas seus olhos estavam inchados e vermelhos.

— Você... Você conheceu a Nat. – Murmurou ela, praticamente inaudível. – Você me conheceu também? Meu Deus. Meu Deus... Nós três, completamente destruídos. Por quê conosco? Por quê...?

Houve uma pausa.

— Eu não sou insana, ou a única insana. Olha só o que fizeram comigo, com Pietro, Natasha... Você. Eles nos reviraram de cima pra baixo. Eles bagunçaram a gente, James, e ainda querem que eu me sinta inteira.

Levantou-se da cadeira de súbito. A vontade de gritar, de chorar, de tirar Bucky dali e lhe dar uma abraço ou um soco, ardeu em sua garganta. Sentiu que deveria encontrar Nat, e o restante das meninas que foram torturadas no Salão Vermelho. Alguém deveria ser responsável por isso. Alguém deveria pagar. Ela faria pagar.

— Meu Deus... – Wanda repetiu, mais para dentro. Suas pernas bambearam e ela ficou de joelhos na frente da câmara. – Eles conseguiram. Eles nos tornaram armas. Eles me transformaram em um... Monstro. Eu matei meu irmão, não matei?

Sua mente estava confusa e ela já não articulava bem as palavras. Só sabia que havia se tornado a bruxa que negara em se tornar, no entanto, restava ainda uma sombra:

Sempre houve algo a mais em Wanda, algo que que jamais pode dizer o que era. Seria esse “algo a mais” a violência de um monstro? O interior rubro que sempre existira? Algo que não lhe dava poderes, e sim sede de violência?

Talvez fosse certo as pessoas sentirem medo dela e ela também.

De repente Wanda abriu os olhos.

— Eu não lembro daquela canção, James. – Franziu a testa. – Lembro da dor, de todas as maneiras possíveis... Mas eu não lembrei de você e não lembrei daquela canção.

Os lábios da Feiticeira Escarlate se abriram brevemente, ensaiando a melodia esquecida. Tocaram a ponta de sua língua como uma névoa as sílabas, e logo se foram com a mesma rapidez que vieram, diáfanas. Por mais que tentasse cavar a música dentro de si, esta era esquiva e impalpável. Um fato absurdo, uma vez que a lembrança deveria ser dela e não do Soldado Invernal.

Se Wanda pudesse comparar com algo real, seria uma falha de programação, um glitch no sistema ou um buraco no enredo, e a única pessoa com quem poderia conversar sobre isso estava incubada num sono incerto. Será que, conscientemente, ele sabia disso?

Não havia resposta e nem outras maneiras de se desvendar a verdade, apenas Wanda com seu toque escarlate.

O silêncio observou a garota respirar fundo, em seguida a cor rubra tomou conta do ambiente.


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Notas finais do capítulo

Bom, uma coisa que quero explicar é que o título não remete ao Pai de Todos, nosso papai asgardiano nem nada. Talvez vocês tenham notado - ou não - que a cada vez que Wanda entra na cabeça de Bucky, o capítulo inicia com uma palavra de ativação do "Modo Soldado" do Soldado Invernal. "Odin" é uma delas. E sim, tem a ver com a forma que ela consegue entrar nas memórias dele.
Muito obrigada pelo apoio *0* Estou adorando escrever essa fic!



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