O Rebelde de Ferro escrita por ValentinaV


Capítulo 4
Ela quer um poeta


Notas iniciais do capítulo

Olá realezas de plantão!
Tenham uma boa leitura :)



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— Cara, eu não entendi nada! – Igor reclamou ao meu lado.

Ele vinha do estado da Carolina do Sul, e tinha um sotaque bem carregado. Sua pele negra contrastava com seus olhos dourados. Seu porte, maior do que o meu, também era um ponto com o que me preocupar, mas a inteligência... Passara longe daquele bobão.

— É como uma prova – eu resmunguei, tentando ir mais para longe, embora a bancada não permitisse tanto – Escreva alguma coisa, pinte alguma coisa e declame alguma coisa.

— Silêncio! – o fiscal repreendeu, olhando para mim – Mais um cochicho e eu tomo-lhe o papel.

— Eu só estava exp...

— Silêncio – ele repetiu com um tom mais agressivo.

Bufei, voltando minha atenção ao papel em minha frente. A apresentação da família real no brunch foi no mínimo... A jato. Sentamo-nos na grande mesa de café da manhã e eles chegaram cinco minutos depois do horário marcado. O rei tinha olheiras tão profundas que eu facilmente podia dizer que ele não dormia há mais de um mês. Seu cabelo parecia muito mais branco que nas aparições dos jornais, e sua pele tinha um jeito opaco e esquisito.

Já a rainha mostrava um sorriso torto e branco para qualquer um dos meninos que a olhava. Seu cabelo em perfeito estado e suas jóias cheias de pedras preciosas e metais raros doíam aos meus olhos, de tanto que brilhavam. Embora ela fosse a rainha, seu aspecto parecia mais de alguém que juntara todas as jóias do palácio para se adornar de uma só vez. Ela também se movia de um jeito estranho, como se estivesse um pouco tonta. O que meu pai diria sobre ela?

E então, finalmente, foquei na princesa Amora. As manchas de tinta sumiram de seu rosto, e as roupas sujas deram lugar a um vestido azul bebê rodado, com uns detalhes roxos na cintura. Seu cabelo estava totalmente solto, e batia na altura dos quadris. Seus olhos pouco circulavam entre os rapazes, que esperavam ansiosamente por uma troca de olhares com ela. Dei risada de quão patética era a cena.

Aproveitei os frios importados e os sucos exóticos ao máximo. Estavam deliciosos. Shang comia tanto quanto eu, e alguns caras do nosso lado jogavam olhares de desprezo para nós. Eu só sorria com tamanha ironia. Comer pouco nunca foi demonstração de realeza para um candidato a rei. Reis deveriam comer bem e manter o porte e a saúde intactos. Era tão óbvio.

Eu ainda estava na metade da minha refeição, e o rei e a rainha se retiraram. Ele disse:

— Sejam bem-vindos. Espero que se esforcem ao máximo para conquistarem o lugar ao lado de minha filha. Vocês não serão poupados de nada.

E ela disse:

— Se comportem, rapazinhos!

Saíram pela porta e logo atrás deles, Amora se esgueirou sem olhar para nenhum de nós.

Eu e todos os outros trinta e quatro bobocas ficamos em silêncio, sem reação por tamanha esquisitisse daquela família. Mas o silêncio não durou muito, e logo os boatos e suposições começaram a surgir na boca dos mais falantes, e o local se transformou num salão de mulherzinhas fofoqueiras, com as idéias mais absurdas que poderiam ter.

— A princesa é sem graça.

— A rainha é linda!

— O rei é meio velho... Será que já passou dos 100 anos?

— A princesa tem um cabelo gigante.

— A princesa tem medo de nós. É bom que tenha, né?

— A rainha é cleptomaníaca!

Confesso que soltei uma gargalhada gigante com esse último palpite. Eram tantos caras burros, que eu imaginava só por diversão o que aconteceria se um deles conquistasse o trono. Ilea cairia tão rápido quanto uma bola de neve descendo o Himalaia.

E então fomos surpreendidos por um homem alto e magrelo, com um óculos fundo de garrafa que nos fez levantar antes mesmo que eu pudesse terminar minha maçã. Ele nos guiou para a sala que eu estava agora, e era o fiscal da tal prova que faríamos.

“A princesa ordenou que todos vocês mostrassem a ela quem são através da Arte. Um poema deve ser escrito, sem limite de linhas, a respeito de vocês mesmos. Vocês o declamarão depois, na frente dela. E deverão pintar um quadro sobre o porque estão aqui no castelo. Devem mostrar a ela através da pintura. Vocês tem cinco horas para isso. Sentem-se nos lugares marcados e boa sorte. Sem conversas paralelas, senhores.”

Olhei para meu papel em branco. Considerei escrever sobre a falsa infância que meu pai me fez decorar mais de 120 vezes no treinamento. Ou sobre em quais esportes eu era bom. Ou sobre o que gostava de fazer nas horas livres.

Mas nada daquilo pareceu realmente bom. Foi então que coloquei a caneta no papel e minha mão começou a deslizar pelas linhas, sem muito compromisso. Aquela prova era realmente idiota, e eu não tinha que me esforçar tanto. Duvidava que fosse realmente contar se nós não soubéssemos escrever poemas. Éramos candidatos a futuros Reis. E não a futuros poetas.

♛.♛.♛

— Senhor Martin Rudolf, por favor, queira se levantar.

A noite tinha caído, e nossos quadros idiotas já estavam pendurados nas paredes daquela sala mais privada, onde estávamos apenas com a princesa Amora e o fiscal que eu ainda não decorara o nome.

Levantei-me despreocupadamente, ao contrário dos outros caras, que gaguejaram irritantemente durante vários minutos de poemas melosos e narcísicos, alguns sem pé nem cabeça, outros totalmente maçantes. Nenhuma novidade ali.

Limpei a garganta, fiz uma reverência à princesa, que me olhou com um sorriso de canto e acenou com a cabeça para que eu começasse.

— Rosas são vermelhas, violetas são azuis, não quis fazer esse poema, pois quero que me conheça de verdade.

O fiscal arregalou os olhos, como se estivesse engasgado com um espinho de peixe na garganta. Fiz outra reverência para a princesa, e então olhei para ela, esperando uma risada ou um olhar de espanto.

Mas tudo o que ganhei foi um olhar de... Pena?

— Uma pena – ela confirmou meus pensamentos, com um ar decepcionado – que não tenha se esforçado para me mostrar quem é através da escrita. Eu admiro muito as artes, senhor Rudolf. E admiro mais ainda quem se esforça para fazer o que lhe é pedido. Próximo, por favor.

Senhor Rudolf? Eu fiz uma reverência e fui sentar-me zangado. Para onde tinha ido a doçura da princesa de antes? Quanto exagero, só por causa de um poema idiota. Prova idiota. Prova idiota.

A partir dali, comecei a prestar realmente atenção nas reações dela, para provar a mim mesmo que era uma tolice tudo aquilo, e não passava de encenação. Mas me peguei totalmente errado, a medida que fiquei olhando para Amora.

Suas sobrancelhas se arqueavam de modos diferentes enquanto os rapazes declamavam seus poemas. Eu podia notar as microexpressões em seu rosto. Ela estava interessada nos poemas e aparentemente gostava de ouvi-los, embora a maioria fosse um completo desperdício. Mais para o fim, especificamente quando chegou na vez de Shang, a princesa desencostou-se da sua poltrona e inclinou-se interessada depois que o descendente de oriental começou a falar.

— Flores de cerejeira, arrozais pelo campo, passam pela minha mente, quando eu me deito e descanso. Sinto saudades de onde vim, sinto saudades do que já fui. Sorrisos e travessuras, artes e jogos, uma paisagem feliz, um manto de alegria. Ainda carrego o aroma do jardim, ainda carrego a cor do sol, que pintava a todos de tons escuros, até o anoitecer. A noite caiu, o frio chegou, mas a esperança não passou. Depois do inverno, a carta chegou. E meu coração transbordou. Gratidão à princesa, gratidão ao palácio, tenho tudo o que sempre quis. Ou melhor, ainda não. Falta o coração de uma garota, que além de princesa, tem nome de frutinha. Doce Amora, eu quero conquistá-la, doce Amora, eu quero adorá-la. Obrigado por me aceitar.

A princesa se levantou da poltrona e começou a aplaudir. Os rapazes acompanharam com aplausos duros, cheios de inveja. Eu não acompanhei as palmas, ainda estava com raiva da reação dela sobre mim. Shang fez uma profunda reverência, e voltou-se ao seu lugar.

— Senhor Shang Futatsu, esteja no Jardim Leste às dez horas, por favor – a princesa disse, com um sorriso gigante em seu rosto.

Aquilo era sério? Era realmente sério?

Ela queria um poeta, ela não queria um Rei.

— Muito obrigado, Vossa Alteza – Shang falou empolgado de seu lugar.

Eu não conseguia entender. Aquela prova era tão sem sentido, e aquela família real era tão estranha que por mais que eu tivesse inúmeras informações da princesa, não conseguia entender nada daquilo. Já havia descartado a chance de encenação: não podia negar que havia visto sinceridade de ambos os lados. Amora se encantara por Shang e ele estava tão feliz quanto o passarinho que viva cantando em minha janela, perturbando o meu sono. Eu queria socar alguma coisa, mas não podia. Eu devia ter feito aquele poema idiota de algum jeito. Qualquer vantagem que eu havia ganhado antes, sumira como poeira.

Eu queria socar alguma coisa.

Fechei os punhos.


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Notas finais do capítulo

Quem se acha muito geralmente não se dá bem, dizem por aí...
Não esqueçam de comentar o que estão achando de Martin e de Amora!
Obrigada ♥



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