Twenty One escrita por Helly Nivoeh


Capítulo 18
Questionável Cinderela


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!

Recapitulando:

Annabeth, Luke e Thalia viveram boa parte da infância fugindo dos pais e agora vivem juntos;
Frederick Chase foi atrás de Annabeth para que ela voltasse para casa;
Percy interveio e o expulsou da sorveteria dos Jacksons;



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— Você está bem?

Annabeth demorou alguns segundos para processar a pergunta. O irmão de Tyson ainda estava ao seu lado, olhando-a com atenção e Annabeth só conseguia olhar para a porta, esperando que seu pai voltasse a qualquer momento, fizesse um grande escândalo e arruinasse o que restava da sua vida. Ela rezava com todas as forças para que aquilo não acontecesse.

— Estou. — Conseguiu murmurar por fim, abaixando a cabeça em sua mãos, sentindo-a latejar.

— Annabeth! — A voz de Tyson ecoou. — Você está bem?

Dessa vez ela nem se deu ao trabalho de usar palavras, apenas assentiu com a cabeça. Ela precisava de um plano, um plano que tirasse Frederick de sua vida. A única coisa que havia lhe dado liberdade era dinheiro e ela daria o quanto fosse necessário, ficaria sem uma única moeda..., mas, ainda assim, não sabia se seria suficiente para ele. Tinha que ser uma forma definitiva.

— Tem certeza? — Tyson perguntou de novo e Annabeth sentiu uma mão em seu braço. Em reflexo, ela puxou o corpo de uma vez para trás, assustada com o toque.

Demorou um segundo para perceber que era Tyson e outro para notar o olhar magoado que ele lhe dirigiu quando ela o afastou como se ele fosse tóxico.

— Tyson, eu não… — murmurou, sem saber como continuar. Sua cabeça estava tão embaralhada… Justo quando não podia estar.

Annabeth tinha que pensar em como se livrar do pai, como arrumar sua vida, como proteger Thalia e Luke… Céus! Se Thalia e Luke descobrissem que Frederick não se fora, que Annabeth estava errada quando disse que havia resolvido tudo… Eles não a deixariam ficar!

— Tyson, dê um tempo à ela.  — O irmão mais velho aconselhou e logo um copo d’água surgia na frente de Annabeth. — Ela está assustada.

— Não estou. — Annabeth retrucou, um click em seu cérebro a deixando em modo de ataque. Ela ainda se sentia acuada com tudo aquilo e ter os dois rapazes ao seu lado, enchendo-lhe de atenção e perguntas só a fazia se sentir abafada.

— Você quer ir pra casa? — O irmão de Tyson ignorou a resposta, mantendo uma distância segura, os olhos verdes a perscrutando de uma forma irritante. — Quer que eu te leve?

Casa. Annabeth queria ir pra casa de Luke, mas precisava resolver seu problema antes que Frederick descobrisse onde era. No entanto, com certeza, ele a estava esperando do lado de fora da lanchonete, apenas aguardando o momento em que ela sairia...

— Não precisa. — Annabeth retorquiu, pensando em como escaparia sem seu pai vê-la. Fosse a pé, táxi ou com carona, Frederick a seguiria. Precisava sair sem ser vista, pelos fundos. — Eu vou sozinha.

Ela tentou obrigar-se a colocar em pé, mas sentia-se trêmula e zonza, então contentou-se em encarar Tyson que, por sua vez, também a encarava. Com certeza ele nunca mais a olharia de novo, como poderia querer ser amigo de uma menina tão complicada?!

— Tem uma porta lá atrás? — Annabeth perguntou para o, até então, amigo. — Uma saída sem que ele me veja?

— E-eu não sei… — Tyson gaguejou, nervoso. Annabeth não teve escolha a não ser encarar o irmão mais velho dele.

— Você não vai sozinha. — O mais velho, Percy, entoou cruzando os braços e usando o mesmo tom mandão e autoritário que havia usado com Frederick. — Seu pai pode estar te esperando. Quer ligar pra alguém te buscar?

Ah, claro! Se ela ligasse para Luke, tinha certeza que seria a última vez que conversariam. Luke a mandaria embora da sua vida em dois tempos. E como poderia julgá-lo? Thalia havia levado um tiro da última vez, sabe-se-lá o que aconteceria nessa!

— Eu vou sozinha. — Ratificou ao encarar Percy, pensando em um plano. A cafeteria de Thalia não era tão distante, se corresse e pegasse os caminhos certos, Frederick ainda estaria na porta da sorveteria a esperando. Mas ela precisava de uma saída traseira.

— Se você for sozinha, vai acabar sendo jogada dentro de um carro. — O irmão mais velho retrucou. — Eu não quero que isso aconteça depois de todo o trabalho que tive para tirá-lo daqui.

Eu não pedi sua ajuda. — Annabeth retorquiu ríspida, dessa vez levantando-se da mesa, a irritação lhe dando forças. Quem ele estava achando que era? Seu principe encatado? Bom, Annabeth nunca teve vocação para princesa! — Eu poderia muito bem ter me virado sozinha.

— Ah, sim?! — Percy questionou com uma risada irônica. — Você parecia estar indo muito bem quase sendo arrastada por aqui! Você praticamente estava gritando por socorro!

— Eu não preciso da ajuda de ninguém. — Annabeth retrucou, arrebitando o nariz para olhá-lo nos olhos. Ela era alta, mas Percy, infelizmente, era ainda mais alto.

— Ah, claro. Percebi isso claramente hoje. — Mais uma vez ele tinha aquele tom debochado, extremamente irritante.

— E quem você acha que é?! — Foi a vez dela usar o sarcasmo. — Um príncipe encantado?!

— Já me disseram que meu trabalho é salvar donzelas. — Ele deu um sorriso sacana que Annabeth precisava tirar com um belo de um tapa. — Talvez seja verdade.

— Pois saiba que eu não tenho vocação pra princesa! — Annabeth retorquiu, com a língua ferina. — E sempre achei essa coisa de príncipes patética, prefiro meu cérebro à uma espada!

— Você pode ter os dois, sabia?

Annabeth queria retrucar, mas era em vão. A cada segundo que passava ali, menores eram as chances de escapar de Frederick. O problema era seu pai, e não Percy Jackson e seu maldito ego!

— Eu preciso ir. — Ela resmungou, obrigando-se a manter a calma. — Pode me dizer ou não se tem outra saída?

— Não, eu não posso. — Percy retorquiu, abaixando o tom e a analisando, ainda com aquele sorriso irritante que pedia por um soco. — Sabe, eu te ajudei porque Tyson me pediu e eu até acreditei em tudo o que você disse, mas seu jeito está me fazendo questionar se o que seu pai disse era apenas mentiras.

Annabeth sentiu um arrepio pela espinha. Só faltava agora ele chamar seu pai até ali e a entregar sem resistência alguma, jogando tudo fora. Ela precisava provar que o pai estava errado, ainda que fosse por ora.

— Se eu realmente tivesse problemas mentais, como conseguiria ser emancipada? — Ela retorquiu, cruzando os braços. — Use a lógica! O que você tem na cabeça? Algas?!

— Você está me chamando de burro? — Percy fez uma careta e Annabeth até teve vontade de rir, se não estivesse desesperada por dentro.

— Escute, eu realmente preciso ir pra casa. — se obrigou novamente a manter a calma, respirando fundo e falando baixo. — Sinto muito se causei problemas pra vocês, mas eu realmente preciso ir. E, Tyson… — Ela se virou para o amigo, sentindo o coração apertado e ciente que estava perdendo uma das pessoas mais doces que conheceu. — …Eu entendo se você não quiser mais me ver, não quero você nessa bagunça que é minha vida.

— Annabeth, você é minha amiga. — Tyson enfim se pronunciou em um tom baixo, parecendo magoado. — Sempre vai ser.

Annabeth sorriu para ele, mas podia ver nos olhos de Percy que ele não aprovava a resposta do irmão. Ela também não poderia julgá-lo, poderia?!

— Deixa meu irmão te levar. — Tyson pediu usando seu tom preocupado e seus grandes olhos verdes pidões. — Ele não vai deixar nada de ruim te acontecer, ele é legal.

— Isso é algo que eu tenho que resolver sozinha. — Annabeth repetiu, realmente não querendo que os Jacksons soubessem mais.

— Por que não quer que eu te leve? — Percy questionou, parecendo notar que a recusa de Annabeth tinha muito mais a fundo do que o receio dele ser desconhecido e o medo de envolver mais Tyson naquela confusão. — O que você esconde?

— Nada!

Tardiamente Annabeth percebeu que falou rápido demais e que aquilo era um péssimo sinal. Percy ergueu a sobrancelha e deu um passo na direção dela, todo vestígio de sorriso sarcástico sendo substituído por traços de desconfiança.

— Vamos, eu te levo. — Ele repetiu, de uma forma que deixava claro que não aceitaria recusa. — O carro está estacionado nos fundos, seu pai não vai te ver.

— Annabeth, por favor.

Ela sabia que não tinha escolhas. Os olhos de Percy diziam que se houvesse mais um “não” ele tiraria aquela história à limpo e Annabeth tinha medo de como ele faria isso.

Por fim, ela suspirou, balançando a cabeça afirmativamente para os irmãos Jacksons. Tyson a presenteou com um sorriso e um abraço preocupado de despedida, pedindo que Annabeth explicasse tudo no dia seguinte. Ela assentiu, dizendo a si mesma que não o faria.

A senhora Jackson a interceptou na cozinha, perguntando o que tinha acontecido — e Annabeth ficou feliz por, pelo menos, ela não ter visto a confusão— e Percy apenas respondeu que Annabeth não se sentia bem e que a levaria para casa.

Isso forçou Annabeth a dizer que estava com enjoo, o que não era mentira, e aceitar inúmeros conselhos sobre chás e medicamentos que ajudariam no problema, além de um pacotinho com doces azuis.

— Temos que ir, mamãe. — Percy beijou a bochecha da mulher. — Eu também só estava de passagem, vou aproveitar que é caminho e dar uma carona pra ela.

— Você sempre está de passagem! — A senhora Jackson brigou, lhe dando um tapa nos bíceps. — Poderia ficar para o jantar pelo menos um dia!

— Sabe que isso não vai acontecer. — Percy retorquiu um pouco seco, mas beijou a mãe na bochecha novamente, também aceitando um pacote de doces.

— Dê um pouco para seu primo, ele é uma formiguinha.

— Pode deixar.

Annabeth ficou feliz quando saiu do estabelecimento, mas não pode deixar de olhar para o lado esperando ver o carro do pai enquanto era guiada para o modelo de luxo que Percy dirigia, o embrulho no estômago piorando quando ele enfim deu a partida, um pouco mais lento que ela queria.

— Então, vai me explicar a história toda? — Percy perguntou assim que Annabeth lhe disse o endereço que ficaria, uma quadra acima da lanchonete de Thalia.

— Não é da sua conta. — Annabeth retrucou sem medir o tom, ainda em modo de defesa um tanto agressivo.

— Isso pode afetar meu irmão, então, sim, é da minha conta. — Percy Jackson retorquiu com aquele maldito sorriso arrogante e sacana, fazendo-a bufar, mas dando-se por vencida.

— Meu pai não aceita o fato de que eu saí de casa. — Ela deu de ombros, observando as casas passarem rapidamente pela janela. Felizmente, não havia nenhum sinal do volkswagen amarelo. — Só isso.

— E por que saiu? — Ele continuou, claramente não se dando por vencido.

— Porque não nos damos bem. — respondeu seca, contando mentalmente as poucas ruas que faltavam.

— E por que não se dão bem?

— Porque não nos damos! — Replicou uma oitava mais alto, cruzando os braços e o fuzilando com os olhos ao se irritar mais com o interrogatório. — Não tem ninguém da sua família com quem não se dá bem?!

Percy apertou os lábios e ficou calado, prestando atenção no trânsito sem querer responder. Annabeth respirou fundo e tentou relaxar no banco macio, mas o medo ainda a estava deixando ansiosa e elétrica.

— E você está morando sozinha? — Percy voltou a perguntar quando pararam em um sinaleiro. Seu tom estava mais baixo e não havia nenhum sinal de sarcasmo, era apenas uma pergunta que poderia parecer inocente, como se estivesse puxando assunto. Mas Annabeth sabia que não era.

— Moro com dois amigos. — Ela respondeu ao conter também o tom, tentando soar amigável e esconder a parte receosa em responder. — Eles cuidam de mim.

— Então talvez fosse bom eu conversar com eles, contar o que aconteceu. — Percy sugeriu ainda usando o tom de antes, o falso tom de leveza e preocupação com ela. — Tyson vai se sentir melhor se souber que tem alguém te protegendo e eu também.

Annabeth engoliu em seco. Era esse seu medo desde o primeiro momento em que ele havia sugerido a carona. Percy contaria para Luke e Thalia o que havia acontecido, contaria da volta de Frederick e Annabeth teria que partir, teria que voltar a fugir pelo país sozinha, sem ter nenhum lar ou alguém para lhe amar ou amparar.

Ela não podia deixar disso.

Foi por isso deu um endereço perto da lanchonete de Thalia, não o de casa. Mas, ainda assim se Thalia soubesse ela contaria para Luke, Thalia sempre contava e confiava plenamente em todas as decisões de Luke.

Thalia não poderia saber, ou Luke também saberia.

— Tudo bem, mas eles são vão te dizer o que eu já disse. — Annabeth respondeu por fim, engolindo o pânico e torcendo para que seu tom tenha sido convincente o suficiente.

Em poucos minutos Annabeth observava a rua familiar perto da lanchonete que Thalia trabalhava. Era a rua em que a loira passava todos os dias ao voltar da escola, a rua que tinha alguns prédios residenciais que escondiam pequenos becos estreitos e escuros que davam para a rua da lanchonete.

— É naquele ali, com as portas duplas. — Annabeth apontou para um dos edifícios, com vários carros estacionados à frente, obrigando Percy a fazer uma baliza complicada em frente.

Annabeth puxou o cinto de uma vez, antes que Percy terminasse de ajustar o carro completamente. Agora não teria como ele avançar com o carro e nem poderia deixá-lo daquela forma, ou causaria um acidente.

— Eu vou lá em cima chamar eles, espere aqui. — Ela mentiu, a mão trêmula abrindo a porta de uma vez, agradecendo mentalmente por não estar trancada.

Seus all stars mal tocaram o chão e ela começou a correr, sem sequer olhar para trás, enfiando-se nos becos estreitos e cheios de lixo, mal consigo ouvir o grito tardio de Percy ao perceber como havia sido enganado.

E, numa grande ironia, Annabeth correu do tal príncipe sem perder nenhum sapato, só parando quando chegou a cafeteria de Dionísio, avançando pelos fundo onde só Will e Thalia tinham acesso a entrada.

 

(...)

 

Luke Castellan não se sentia bem naquele dia. Havia alguma coisa o incomodando, uma sensação estranha em sua mente que o fazia olhar para a porta da loja a cada cinco minutos, com a certeza de que havia alguém ali. Mas não havia.

Então ele apenas tentava ignorar, verificando mais uma vez o fluxo de caixa, tentando se concentrar nos números antes dos olhos azuis focarem nas janelas, com a certeza de que estava sendo observado, mesmo que não conseguisse ver nada.

Ele bufou, deixando de lado os papéis e as canetas, abrindo a porta de uma vez para flagrar quem o perseguia, no entanto, não havia ninguém ali parado. A rua em que a pacata loja estava parecia movimentada naquela hora, dando a seu stalker a chance perfeita de se misturar a multidão, deixando-o ainda mais estressado.

Havia alguém o observando, tinha certeza. Como ou porque era difícil saber, mas ele descobriria, tinha certeza.

Voltou novamente para o balcão, sentindo-se ainda incomodado, agitado. Percorreu os olhos pelo local abarrotado de objetos simbólicos, muito dos quais ele já desconhecia o significado. Lembrava-se da mãe lhe mostrando alguns e o que faziam, como eles afastavam o mal e atraíam coisas boas. E lembrava-se como isso não parecia funcionar bem para ela.

Ou talvez fosse porque ele sempre trocava os amuletos, colocando nas portas símbolos que atraíam energias ruins e fazendo todos os rituais que sua mãe sempre lhe dizia para não fazer. Talvez por isso tantas coisas ruins aconteciam com eles, porque ele havia provocado.

Apertando os lábios, Luke decidiu revirar a memória em busca dos ensinamentos da mãe e do que havia feito de errado, desmanchando símbolos e trocando objetos de posição, vez ou outra anotando para pesquisar depois como deveria corrigir.

Colocou uma cabeça de alho atrás da porta, sal grosso em volta das janelas e portas e até virou o pequeno elefante sobre o balcão em busca de afastar o mau olhado e energias negativas, querendo se livrar do seu perseguidor.

Por fim, sentou-se ao balcão com um dos livros pesados e empoeirados que havia pertencido a sua mãe, buscando novas formas de atrair boas energias e repelir quem quer que estivesse querendo lhe fazer mal.




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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e eu adoraria receber comentários ou recomendações!
Obrigada por lerem!