Dois Solteirões e Uma Pequena Dama escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 9
Capítulo 09 – O Inesperado Acontece




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Ainda durante a madrugada, Emmett abriu a porta do apartamento. Estava finalmente em casa. Nunca havia pensado tanto na palavra lar com como tinha acontecido nas últimas horas. Sequer imaginou que se sentiria desse jeito; louco de vontade de voltar pra casa e cuidar de uma criança. Sua filha. A garotinha de sorriso de covinhas que roubou seu coração.

Era responsável agora por cuidar, amar e proteger uma pequena dama que chegou de surpresa em sua vida, mudando tudo.

Se quatro semanas antes alguém aparecesse dizendo que era pai de uma garotinha de quatro anos. E que se renderia de amores por ela ao conhecê-la, teria dito, sem hesitar, que essa pessoa era louca. Na menor das hipóteses, estava bêbada.

Entrou no apartamento, largando a bagagem ao lado da porta, no chão. O barulho das chaves caindo no aparador fez Edward despertar do cochilo no sofá. Ele se levantou num instante, olhando na direção de onde vinha o som, e então o irmão apareceu em seu campo de visão.

— Ah, é você – falou, e em seguida se sentou, bocejando.

Emmett retirou o casaco jogando-o em cima do encosto do sofá. Teria deixado no cabideiro, mas, com tanta coisa na cabeça, acabou passando despercebido.

— Como minha filha está?

— Graças a Deus está bem melhor agora. Você tinha razão quando disse que o médico era bom. – Edward passou a mão nos cabelos bagunçando-os ainda mais.

— Por que está dormindo no sofá uma hora dessas? Por que não está na sua cama?

— Estou cansadão. Nem vi quando caí no sono. Sequer me recordo o que estava assistindo na tevê antes disso.

O irmão foi entrando. E parou ao pôr o pé no primeiro degrau da escada.

— Ela está em minha cama?

— Está. Mas não está sozinha.

Emmett subiu alguns poucos degraus e parou novamente para olhar o irmão, esperando uma explicação.

— Bella e Rose estão com ela. Como eu disse antes; as garotas vieram mais cedo e acabaram dormindo no seu quarto com a Pétala.

Emmett meneou a cabeça concordando, e continuou subindo. Edward foi logo atrás dele.

A porta do quarto estava aberta. Emmett nem se deu o trabalho de bater. Ainda debaixo do umbral, reconheceu Rose dormindo ao lado de sua filha e a garota que estava saindo com seu irmão, no outro lado.

Deu alguns passos a frente, olhando melhor a filhinha adormecida. Reconhecendo no rosto dela uma palidez que não tinha quando saiu de casa pela manhã. Não se surpreendeu ao vê-la com o polegar na boca e a ovelhinha junto ao corpo, entre ela e Rosalie.

A mão de Rosalie descansava no travesseiro que Pétala usava como estivesse afagando os cabelos da menina quando pegou no sono.

Isabella dormia segurando sobre o peito um livro aberto cujo título saltou aos olhos de Emmett; Tinker Bell - Uma Aventura no Mundo das Fadas. Um dos livros que havia comprado pra ela no dia em que foram juntos às compras. O dia em que quase a perdeu no shopping.

Aproximou-se um pouco mais da cama, do lado em que Rose estava. Edward parou na porta quando ele encostava a mão na testa de Pétala, curvado sobre o corpo de Rosalie. Percebendo com satisfação que a criança não estava mais febril como disseram estar.

Então ouviu o irmão sussurrando: – Vou chamar Bella pra vir comigo pro meu quarto.

Emmett meneou a cabeça, concordando.

— O papai já está aqui – sussurrou pra Pétala, em seguida se afastou, corrigindo a postura.

Na outra extremidade da cama, o irmão falava com Bella.

— Acorda minha linda. Meu irmão já está aqui.

— Oi?... – ela pediu ainda confusa. Os olhos abertos numa fenda.

— Você precisa vir comigo – Edward continuou falando aos sussurros. – Meu irmão já está aqui.

Ele retirou o livro das mãos dela ainda enquanto Bella registrava a presença de Emmett no quarto. O livro foi deixado na mesinha de cabeceira com cautela.

— Acho que peguei no sono enquanto lia pra ela – comentou em voz baixa, já se preparando pra sair da cama.

— Dormiu, sim – Edward confirmou. Ele estendeu a mão, oferecendo ajuda. – Vem, vamos pro meu quarto. – Lá você vai ficar mais à vontade.

Os dois seguiram até a porta de mãos dadas.

— Obrigado, Bella – Emmett murmurou. – Você também, irmão, obrigado. Não sei o que faria sem sua ajuda.

Edward reconheceu no rosto dele gratidão. E meneou a cabeça positivamente.

— Ela é um amorzinho – Bella falou, deixando o quarto.

— Boa noite – Emmett desejou, vendo-os se retirar.

Abaixando o olhar, encontrou Rosalie de olhos abertos. Ela olhava para ele com cara de sono. Porém, gostando da companhia.

— Oi – ele falou baixinho.

A expressão no rosto de Emmett se tornou leve, com um sorriso que trazia as covinhas às bochechas.

— Oi – ela respondeu no mesmo tom de voz cuidadoso. – Como foi de viagem?

— Bem. Apesar de minha ansiedade para estar com ela – E ele moveu a mão indicando a filha.

Sua resposta fez Rosalie olhar a menininha adormecida ao seu lado. E então afastar o braço do travesseiro dela bem devagar.

— Ela está bem melhor agora. Até conseguiu comer a sopinha que preparei. Não voltou a vomitar nem nada, graças a Deus. Nem acreditei quando seu irmão disse que você estava voltando antes do previsto. Não achei que fosse fazer isso.

— Não iria aguentar ficar no hotel sabendo que Pétala estava doente. De toda forma, não iria conseguir pregar o olho. Minha filha precisava de mim. Eu sabia que tinha de voltar.

— Ela chamou por você, sabia?

— De verdade? – ele pediu claramente orgulhoso, olhando a filha adormecida.

— Sim. E eu tive de lembrá-la que você voltaria logo.

— Eu voltei.

— Sim, você voltou – Rose tinha um sorriso no rosto ao dizer isso.

— Trouxe o presente, mesmo ela dizendo que não queria. Não é nada demais. É só uma coisinha que encontrei numa lojinha ainda no aeroporto.

Emmett sentou ao lado dela sem fazer movimentos bruscos. E Rosalie aproveitou para acariciar o queixo dele com as pontas das unhas.

— Como se sentiu voltando pra ela?

— Fazendo a coisa certa – afirmou.

E Rose sorriu para ele. Aquela era a resposta que esperava ouvir.

Emmett se inclinou sobre ela até seus lábios se encontrarem. Passou a mão por debaixo das costas dela, aproximando-os um pouco mais.

— Senti sua falta também – admitiu, logo após o beijo. Seus lábios ainda bem próximos um do outro. A respiração morna roçando na face.

Rosalie respirava ofegante quando ele tornou encostar as costas dela no colchão. Ele tinha esse poder, de deixá-la atordoada e acesa a um simples toque. Ela não sabia quando exatamente isso tinha acontecido. No entanto, era assim.

— Obrigado por ter cuidado dela. – Ele olhou a filha novamente. – Tenho certeza de que foi muito importante pra Pétala ter seus cuidados. E também sua presença. Obrigado por te vindo. Obrigado por ter ficado ao lado dela.

— Hummm... Isso quer dizer que posso passar o resto da noite aqui com vocês? Juntinhos na mesma cama?

— Não só pode como deve – e ao dizer isso, beijou outra vez nos lábios dela. Voltou a se levantar, ficando ao lado da cama enquanto retirava a camisa de mangas compridas. Rosalie estava olhando cada movimento que seus músculos faziam, ele sabia.

Afastou-se e desapareceu pela porta do banheiro. Passado um momento, Rosalie ouviu o barulho da descarga e logo em seguida água correndo na pia.

Ele voltou. E estava usando apenas a cueca boxer preta. Entrou no closet e saiu de lá com uma calça de moletom preta e uma camisa cinza de malha.

Os olhos dela, atentos a qualquer movimento que fazia. Não fosse a criança estar doente, e ele não estivesse tão preocupado, Rose e ele teriam feito amor pelo resto da noite.

Emmett se acomodou no lado do colchão onde antes Bella esteve deitada. Moveu um braço sobre o corpo pequeno da filha, abraçando também Rosalie. Ficando os três juntinhos.

Rosalie passou a mão sobre a garotinha adormecida até alcançar o peito dele, deixando-a descansar ali. Era bom poder tocá-lo, sentir seu calor e rigidez daqueles músculos. Ele apertou a mão dela na sua, depois beijou seus dedos. E então beijou também na testa da filha.

— Nunca pensei que fosse tão bom estar assim... com vocês duas ao meu lado – admitiu em voz baixa. – Por onde andavam esse tempo todo?

— Estávamos esperando você nos encontrar – Rose comentou igualzinho ele, em voz baixa.

Pétala se mexeu, presa no abraço dos dois. Por um instante, tirando o polegar da boca.

— Papai – murmurou com a voz rouca de sono.

— É. É o papai – Emmett falou com ela. – Agora volte a dormir, minha Pétala cheirosa. O papai já está aqui com você outra vez. Boa noite, gatinha... Você vai dormir... – ele cantarolou baixinho perto do ouvidinho dela.

[...]

A manhã chegou fria e cinzenta. Os três ainda estavam juntinhos na cama, com a única diferença que Pétala estava em cima da barriga do pai e não mais entre os dois, no abraço que os unia.

Pétala retirou o polegar da boca. Remexeu-se embaixo do braço do pai, erguendo a cabeça para vê-lo melhor.

Uma mãozinha acariciou o rosto de Emmett. E ele se permitiu abrir um sorriso mesmo estando de olhos fechados. Sabendo a quem pertencia aquela mãozinha macia de dedos curtos.

Ele abriu os olhos. E apesar dos cabelos bagunçados e da cara amassada, Pétala parecia bem melhor do que quando a vira pela madrugada, quando ainda dormia. Fechou os olhos outra vez fingindo dormir.

Pétala beijou seu queixo. – Acorda papai – pediu. A voz infantil ainda com sinais de preguiça matinal.

O pai abriu os olhos e sorriu escancaradamente pra ela. Seus braços a apertaram num abraço carinhoso e logo em seguida veio o beijo estalado na bochecha.

— Bom dia, minha pequena Pétala de flor.

— Bom dia, papai – ela respondeu, se deixando levar pela animação dele.

Emmett olhou bem no rostinho dela. – Você parece bem melhor – mencionou. – Graças a Deus, princesa. – E beijou outra vez na bochechinha dela. Pétala tentou se desvencilhar sem sucesso. E quando ele a libertou, ela finalmente falou de Rose.

— A sua fada dormiu aqui?

— É, ela dormiu sim. Ela estava cuidando de você. Você não lembra? Estava dando uma força pro seu titio.

— Ela deu banho em mim que nem uma mamãe.

— É? E que mais ela fez?

— Fez comidinha. E deixou eu comer aqui na cama até. Ela deu sopinha na boca com a colherzinha. Era gostoso. Eu gostei. E também teve a titia Bella que penteou meus cabelos. – Ela passou a mãozinha nos cabelos reforçando o que dizia. – E também leu o livro da Tinker Bell. Aquele que você comprou no outro dia.

— A tia Bella também é legal, não é?

— Ahã. O titio também. De monte.

— Claro. O titio também – Emmett concordou. E então notou que Rosalie despertava de seu sono, bem ao lado deles.

Pétala abriu um sorriso, ansiosa, esperando que Rosalie notasse sua presença.

— Oi, coração – disse Rose, vendo aquele sorriso doce no rostinho de Pétala. – Que bom que está sorrindo. – Ela se sentou na cama, abraçando Pétala ainda no peito do pai. – Como se sente anjinho? – ainda que fosse notável sua melhora, não pode deixar de perguntar.

— Bem. O papai já chegou – ela comentou como Rose não tivesse visto Emmett chegar de madrugada, nem notado aquele homem enorme deitado ao lado dela na cama nas últimas horas.

Emmett deu risada.

— Você ficou feliz que o papai chegou? – pediu a Pétala. E a resposta foi um balançar de cabeça exagerado e um sorriso que crescia no rosto com covinhas que lhe salpicavam as bochechas.

— Papai trouxe um presente pra você – Emmett revelou.

— De verdade? – a menininha pediu, olhando no rosto dele com a mesma expressão de contentamento.

— Sim, de verdade. Verdade, verdadeira.

— Onde que tá, então?

— Na minha mala. Lá na sala.

Num instante Pétala desceu da barriga dele e se pôs a sair da cama. Eles só perceberam um pequeno vulto amarelo correndo pra fora do quarto.

— Tenha cuidado na escada, Pétala – Emmett alertou imediatamente, elevando o tom de voz. Embora não a tenha visto naquele momento, sabia que obedeceria. Ela tinha realmente ficado com medo de cair outra vez na escada e voltar se machucar.

Aproveitando que tinham ficado sozinhos, Rosalie se inclinou sobre o corpo grande dele beijando-o nos lábios brevemente.

— Eu vou ter de ir embora agora cedo – ela avisou inda enquanto se afastava dele. – Preciso estar no escritório antes das nove. Mas antes preciso passar em casa pra me trocar.

As mãos de Emmett apertaram nas laterais da cintura dela. – Eu levo você.

— Não e necessário, eu estou de carro. Fique aqui e cuide de Pétala. Ela sentiu sua falta.

— Só ela? – Ele apertou um pouco mais as mãos na cintura dela. E Rose se contorceu, sentindo uma fisgada que logo deu lugar a uma onde de calor que percorreu todo seu corpo em segundos.

— Eu também senti sua falta. Porém, não posso fazer o que realmente quero. Tem uma menininha acordada lá embaixo revirando sua bagagem em busca de um presente que lhe foi prometido. E tenho certeza que quando encontrá-lo vai nos chamar para brincar com ela.

As mãos grandes dele se infiltraram sob a blusa que ela usava acariciando a pele de toda sua barriga se encaminhando um pouco mais pra cima. Quando seus dedos encontraram o sutiã, ouviu Pétala chamando do andar de baixo. 

— Papai. Rose. Eu achei o presente. Vem ver.

— Eu não falei – Rosalie lembrou. E tinha certo divertimento em seu jeito de olhar pra ele agora.

— Acho melhor a gente descer – ele concordou. E os dois saíram da cama. Rosalie com as mesmas roupas de ontem à noite. E ele, com a calça de moletom e a camisa de malha. Antes de sair calçou uns chinelos.

Ao alcançar o patamar da escada perceberam que Edward e Isabella já tinham acordado e estavam com Pétala na sala. Certamente já a tinham abraçado e beijado.

A mala de Emmett estava revirada ao lado do sofá. Pétala começava destruir o papel de presente cor-de-rosa com ansiedade. Mesmo tendo ganhado vários brinquedos novos quando chegou pra morar com eles, aquele ainda parecia o primeiro. Bem, de certa forma, era. O primeiro que ganhava depois de uma viagem do pai.

O papel ficou no tapete. E nas mãos pequenas de Pétala estava agora uma caixa contendo seis personagens miniaturas de Frozen – Uma Aventura Congelante. As irmãs Princesas Anna e Elsa, o Príncipe Hans, o bravo Kristoff, o boneco de neve Olaf e a rena Sven.

A garotinha ficou radiante. Seu sorriso de satisfação contagiou a todos. O tio foi quem ajudou retirá-los da caixa. E ela foi logo arrumá-los em cima da mesinha de centro.

— Que bom que ela acordou bem-disposta – o tio comentou, olhando com carinho Pétala arrumar os bonequinhos sobre a mesinha de centro.

— Parece que ela adorou o presente – Bella comentou.

— É só uma lembrancinha – a resposta veio de Emmett. – Depois eu compro em tamanho maior.

— Ela gostou muito, mesmo assim. – Bella olhou para Edward. – Eu preciso ir. Tenho que me trocar antes de ir pro trabalho. Ainda não estou cheia da grana como você – brincou.

— Eu te levo – Edward se ofereceu.

— Estou de carro – começou Rosalie. – E também estou de saída. Se quiser posso te oferecer uma carona.

— Seria ótimo, Rose. Obrigada.

— Tem certeza de que não prefere que eu a leve? – Edward insistiu.

— Não é necessário. Vá fazer suas coisas. Rose me dá uma carona. Nos falamos mais tarde?

— Com toda certeza.

Depois de as garotas darem uma melhorada na aparência no espelho do banheiro social, se despediram de todos e partiram.

Nem Emmett, nem o irmão Edward tinham planos de ir ao escritório essa manhã. Nenhum dos dois queria se afastar de Pétala depois de como ela havia passado a noite de ontem. A secretaria foi avisada, e ficou de passar qualquer ligação importante.

Emmett deu café da manhã pra filha e deixou que assistisse um pouco de desenho animado antes de mandá-la pro banho.

Ouviu a vozinha dela cantando, junto com a tevê, a música de abertura do desenho animado Princesinha Sofia.

— Canta também, titio – ouviu pedir ao tio que cantasse. E quando o tio pareceu pensar, ela insistiu. – Titio canta. Conta comigo.

Para surpresa de Emmett, Edward deixou o celular de lado e cantou em voz alta sem se importar que a música dissesse algo sobre ser uma princesinha. “Princesa quero ser, é tudo que eu vou ser Princesinha Sofia”...

Emmett foi até a sala e entrou na frente deles.

— Dá licença, papai. Você tá frente. Tá frente da Princesinha Sofia. O titio quer ver ela.

— Ele acha que é transparente – Edward cutucou.

— Trança do parente? Que isso?

O tio caiu na risada.

— Que isso titio? Fala pra mim – Ela pôs as duas mãozinhas no rosto dele. – O que é a trança do parente.

O tio não conseguia parar de rir.

Emmett foi se aproximando dela, e quando tentou pegá-la, Pétala se esquivou pro lado.

— Sai papai. Saiiiiii. Eu tô assistindo com o titio.

— Você tem de trocar de roupa.

— Eu gosto desse pijama amarelo. – Ela passou as mãozinhas no tecido, em toda parte da frente, para enfatizar sua resposta.

— Acontece que você precisa tomar banho. Todo mundo já tomou, só falta você.

— A Coraçãozinho não tomou.

— A Coraçãozinho é de pelúcia. E pelúcias não tomam banho assim. Elas precisam de um banho especial e apenas quando for realmente necessário.

— Eu sou uma pelúcia agora. Só tomo banho especial, de vez de quando do necessário.

Edward já estava com dor na barriga de tanto rir. Pétala olhava pra ele de canto de olho, e ria também. Emmett lançou um olhar a ele. Parecendo que iria desistir, mas, de repente, agarrou Pétala no colo.

— Você é uma garotinha de carne e osso como qualquer outra. Precisa tomar banho pra ficar limpinha e cheirosa. Como vai ser minha Pétala cheirosa se não quer tomar banho.

— Eu não tô fedida.

O pai deu um cheiro no pescoço dela fingindo cara de asco.

— Eca.

— Para com isso papai. Eu não tô fedida.

— Sua fedidona – Edward entrou na brincadeira com o irmão.

— Para você também titio. Eu não sou fedidona.

— Então me deixa ver se é verdade ou não.

Pétala se esticou nos braços do pai até alcançar o tio, que tinha se levantado pra dar o cheiro nela. Ele deu o cheiro exagerado, fazendo cocegas nela com a barba por fazer. Pétala sorriu, se contorcendo toda.

— Eu tô cheirosa?

— Sim. Está muito cheirosa.

— Cheiro de quê?

— Cheiro de pétala de flor.

E ela riu um pouco mais, sabendo que era uma brincadeira com seu nome.

O pai a levou ao banheiro social. Ajudou tirar o pijama e quando preparava as coisas para o banho, ela correu para fora do banheiro só de calcinha de algodão.

— Não vou tomar banho – gritou risonha, em meio a sua fuga.

— Pétala – Emmett lamentou. Acabou tendo de fechar o chuveiro e ir atrás dela.

— Titio me esconde – ele ouviu o gritinho fino dela. E quando chegou lá, ela tinha se escondido atrás das costas do tio, em cima do sofá.

— Me ajuda aí, mano – pediu Emmett.

Antes que o tio tivesse a chance de segurá-la e entregá-la ao pai, Pétala deslizou do sofá e fugiu de novo.

— Onde será que está aquela garotinha fujona?! – o tio falou, fingindo-se de desentendido. Pétala gargalhou e saiu correndo pelo apartamento.

— Não me pega. Nem papai e nem titio, não pega – cantarolou, correndo em volta da mesa da sala de jantar.

— Eu vou por um lado e você vai pelo outro – o aviso veio de Emmett, que já seguia para o lugar estratégico.

Edward fez o mesmo pelo outro lado. Ao perceber que estava cercada, Pétala entrou embaixo da mesa. O tio se lançou no chão tentando alcançá-la, mas ela escapuliu de novo, saindo do outro lado, se acabando de rir.

Quando tentava passar pra sala de estar, Emmett a pegou. Ela tomou um susto, mas, muito rápido estava rindo de novo.

— Ô ou – foi o que ela falou, sabendo que não tinha mais para onde correr.

Emmett finalmente conseguiu dar banho nela. Vesti-la com um shortinho de estampa floral escuro, meia-calça branca e uma blusinha de mangas compridas branca com a estampa de um urso panda na frente. Sapatinhos pretos que lambaravam sapatilhas. Penteou os cabelinhos escuros e pôs um arquinho preto com uma flor lateral, na mesma estampa do short.

Nesse meio tempo, o tio montou um teatrinho de fantoches na sala pra ela. Pétala se sentou no tapete, segurando Coraçãozinho no colo, de frente para o pequeno palco onde o tio e o pai seguravam nas mãos pequenos fantoches.

A mini cortina se abriu. Os fantoches começaram a falar um com o outro, de repente, estavam discutindo com aquelas vozes estranhas. Isso fazia Pétala rir cada vez mais.

Foi quando ela se levantava do tapete para pegar um dos fantoches na mão, que a campainha tocou.

Os irmãos ficaram um pouco surpresos já que não estavam esperando por ninguém. Nem mesmo o interfone tinha tocado para anunciar algum visitante.

Edward foi quem se prontificou a ir até lá abrir a porta. Pétala tentava pôr o fantoche na mão pequena quando ele se afastou. Emmett continuava lá, sentado atrás do pequeno teatro. Olhando ora pra porta, ora para a filha com o brinquedo na mão.

A porta foi aberta. Do outro lado sugiram duas pessoas; uma mulher alta, de cabelos escuros presos num coque bem apertado, vestindo um terninho cinza. A bolsa preta embaixo do braço. Uma prancheta para anotações com caneta na mão. O outro era o porteiro. A expressão em seu rosto revelava um pedido de desculpas.

Os irmãos trocaram olhares sem entender o que estava acontecendo ali. A mulher deu um passo a frente, entrando no apartamento deles, com aquele olhar de quem procura por algo errado.

— Bom dia – disse. – Eu sou Eva Turner, do Departamento de Serviço Social de São Francisco.

A tensão em Emmett aumentou. Ele se pôs de pé no mesmo instante. Aquilo parecia ainda mais sério do que imaginava. Preocupado, olhou de Eva para a filha ainda distraída com o fantoche.

Eva deu mais um passo a frente. – Recebemos uma denúncia – declarou.

— Como? Que tipo de denuncia?– Edward olhou pasmo no rosto do irmão.

— Uma denúncia? – Emmett repetiu não menos pasmo que ele. – Quem faria uma denúncia contra a gente?

— Não sabemos senhor...?

— McCarty – ele respondeu. – Emmett McCarty.

— As denúncias são anônimas, senhor McCarty.

Então, ela olhou para Pétala. O tio da menina e o pai se puseram na frente bloqueando sua visão propositalmente como protegessem a criança de um ataque anunciado.

— Ela é minha filha.

— Isso é o que viemos comprovar, senhor McCarty.

Emmett soltou uma risada irônica.

— Temos um policial lá fora, caso o senhor não coopere.

— Um policial, é isso mesmo? – Ele passou a mão na cabeça, sem querer acreditar. – Isso não pode estar acontecendo – murmurou consigo mesmo.

Como que para comprovar, o policial, um homem negro de cabeça raspada, que aparentava quarenta e poucos anos, apareceu na porta e deu um passo a frente. Estava dentro de seu apartamento agora.

— Ele está aqui para garantir que tudo ocorra bem – disse a mulher do Serviço Social.

— Por isso não pude impedir que subissem. Eles tinham uma ordem judicial – o porteiro se explicou em tom de desculpas.

— Nós não fizemos nada de errado.

— Isso ainda nós não temos certeza – insistiu a mulher.

Emmett se voltou para a criança. – Por que não vai brincar um pouco lá em cima, princesa?

— Eu preciso que a criança esteja aqui. Talvez seja necessário falar com ela. – Eva estava se movimentando, chegando cada vez mais na sala, sempre olhando para Pétala.

A garotinha estava agora paralisada, olhando todos eles sem entender o que estava acontecendo. Uma leve sombra de medo pairava seu rostinho.

— Numa primeira visão, ela parece bem – murmurou Eva.

— E por que não estaria? – Edward se precipitou.

Eva apenas ignorou seu comentário.

Emmett tocou o ombro do irmão, um pedido mudo para manter a calma.

Eva deu continuidade ao que dizia.

— Não demonstra sinais de maus-tratos... – e escreveu qualquer coisa na prancheta.

— Maus-tratos? – assombrou-se Emmett. Ele queria acreditar que não tinha ouvido aquilo a seu respeito. – O que pensa que somos? O que pensou que fosse encontrar aqui?

— Não estou pensando nada. Estou aqui apenas cumprindo meu trabalho. A denúncia foi clara; os dois viviam sozinhos, não tinham namorada fixa, muito menos esposa. Eram típicos solteirões que só pensavam em farra. E assim, do nada, apareceram com uma criança. Disseram ter ouvido o choro da criança muitas vezes nos últimos dias.

Emmett esfregou a mão na cabeça, tentando não explodir de raiva.

O irmão chutou o vazio. – Mas que droga – resmungou.

— É claro que ela apareceu aqui de um dia pro outro. Ela vivia com a mãe, minha ex-namorada.  E, além do mais, qualquer criança chora quando se machuca durante uma brincadeira. Ou simplesmente algo não sai como esperado.

Eva fez a típica cara de quem não está dando importância.

— Disseram ter visto um médico subindo pro seu apartamento na noite passada. Ele veio ver a criança? O que ela tinha?

— Sim. Ela teve vômito e febre. Mas já está bem melhor como pode ver.

— Preciso que me dê o número do telefone da mãe. Precisamos verificar sua informação.

— Infelizmente, isso não vai ser possível.

Pela primeira vez o policial tomou a palavra. – Isso é uma recusa?

— Não estou me recusando. – Ele olhou para a filha e depois o irmão. – Edward, leve Pétala lá pra dentro.

Edward se movimentou pegando a criança imediatamente no colo.

— Repito que não podem esconder a criança.

Emmett não conseguiu conter a raiva dessa vez, por isso acabou gritando com Eva.

— Eu não estou escondendo minha filha. Só não quero ter de falar disso na presença dela.

— Está tudo bem – Eva concordou. – Pode levar a criança lá pra dentro.

— Papai... – Pétala chamou assim que o tio virou as costas levando ela nos braços.

— Vá com o titio, princesa. O papai precisa esclarecer umas coisas com essa senhora.

Ele aguardou até que o irmão deixasse a sala com criança.

— Estamos esperando, senhor McCarty – Eva apressou.

Emmett soltou o ar com força, passando a mão no rosto. – A mãe dela está morta – disparou. – Morta. Você entende o que isso significa? Essa garotinha que vocês estão assustando – e ele mostrou com a mão o caminho por onde o irmão tinha desaparecido de vista levando a criança no colo – acabou de perder a mãe. Tem só alguns dias. Precisou mudar de casa e de cidade. Deixou pra trás o único lugar onde entendia ser o lar. Tem ideia do quanto isso é difícil pra ela? Quando chegou aqui estava tão triste...

— O senhor teria como provar o que está me dizendo?

Emmett precisou usar de todo seu autocontrole para não agarrar o pescoço de Eva nas mãos. Não bastava destruir o dia de todos, estava também o acusando de inventar tudo aquilo.

— Agora está me acusando de inventar tudo isso?

— A menos que possa provar o que está dizendo.

— É claro que eu posso provar.  Tenho uma carta escrita e assinada pela própria mãe antes de falecer. Todos os documentos de Pétala estão comigo agora.

Emmett disparou para o andar de cima.

O porteiro falou qualquer coisa sobre ter de voltar para seu posto e se retirou.

Para Emmett a única coisa que importava era encontrar a carta e os documentos, e provar que estava dizendo a verdade sobre Pétala.

O policial e a mulher do Serviço Social ficaram na sala, de pé, com olhos de quem analisa tudo em volta tentando encontrar algo suspeito.

Os minutos correram. Emmett revirou todo o escritório. O quarto e até mesmo o banheiro. Qualquer lugar onde pudesse estar os documentos, mesmo assim não os encontrou. Eles pareciam ter evaporado.

Voltou ao andar de baixo, correndo.

— Senhor já se passaram vinte minutos. Onde estão os documentos e a tal carta escrita pela mãe? – Eva tentou pará-lo, já estava impaciente com toda aquela demora.

— Ainda estou procurando – Emmett rebateu, sem parar para olhá-la.

— É claro que está – respondeu Eva. E o policial olhou no relógio outra vez.

Emmett não reparou em nenhum deles. Estava preocupado demais em encontrar os documentos. Tinha de encontrar. Precisava encontrar. Revirou todas as gavetas da cozinha, sala, banheiro social, armário de artigos esportivos e até mesmo na área de serviço. Deixando por último o quarto do irmão.

— Cara, você precisa lembrar ondou guardou os documentos. Aquela carta é muito importante – Edward comentou em voz alta, mostrando todo seu desespero e raiva.

— Não adianta. Já revirei tudo. Os documentos simplesmente sumiram.

Edward se movimentou pelo próprio quarto, parando na frente dele.

— Se não tivermos como comprovar sua paternidade, eles vão levá-la embora.

Edward se assustou com o empurrão que levou do irmão. Apesar de ser mais um dia frio de outono, Emmett estava com o suor escorrendo no rosto.

— Acha que eu não sei. Olha pra mim, estou com cara de quem está feliz com isso?

Ouvindo toda aquela discussão, Pétala começou a chorar. Estava sentadinha no meio da cama do tio, e olhava pra eles, assustada.

Num instante, os dois estranhos estavam entrando no quarto de Edward. Eva se aproximou da cama pegando imediatamente a menina nos braços. O que a deixou ainda mais assustada.

— O que está fazendo? – Emmett exigiu, elevando o tom de voz. Deu um passo na direção delas, e o policial entrou em seu caminho. Ele recuou sabendo que não podia reagir.

— A criança vai com a gente.

— O quê? – Edward lançou, ainda que soubesse que isso poderia acontecer.

— Enquanto não tiver como comprovar o parentesco, a criança fica sob a tutela do Estado.

Eva se encaminhou à porta de saída, sendo escoltada pelo policial, levando uma garotinha aos prantos nos braços. O arquinho no cabelo de Pétala caiu no chão.

— Papai. Papai. Titio. Titio...

— Não chore filhinha.

Estavam todos na sala outra vez.

— Não quero ir papai.

O policial foi quem abriu a porta pras elas.

— Não chore princesa. O papai vai te pegar de volta. Eu prometo.

O tio entrou em desespero.

— Não podem levá-la sem a Coraçãozinho. – Ele procurou por toda à sala a ovelhinha de pelúcia da sobrinha até encontrar.

Enquanto isso, Emmett os acompanhava até o elevador. Nada podia fazer agora. Resistir o levaria a prisão. Tinha de ser racional. Tinha de pensar em uma saída.

Pétala chorava muito, estendendo os bracinhos pra ele. Implorando seu colo, sua proteção.

— Papai. Titio. Papai...

— Eu vou te buscar filhinha. Seja valente. Eu prometo que vou te buscar. Custe o que custar terei você de volta.

Edward chegou às pressas ao lado dele. – Aqui está a Coraçãozinho... – Mas as portas do elevador se fecharam antes que conseguisse entregar a pelúcia nas mãos da sobrinha. E ele ficou ali parado, destruído, com a pelúcia na mão.

O irmão agarrou a ovelhinha na mão e disparou rumo às escadas do edifício. Descendo os vários lances de escada feito um louco, ofegante.

Quando finalmente alcançou a rua o carro preto do Serviço Social já se afastava levando sua filhinha, que chorava assustada.

Ele ainda correu por quase uma quadra inteira atrás do carro, pedindo que parassem, vendo a filha chorando olhando pra ele pelo vidro traseiro. Sabia que eles estavam tendo dificuldade para mantê-la parada no banco. Ela queria descer e correr para o pai.

Vendo que de nada adiantava todo seu esforço, parou no meio da rua, se curvando com as mãos nos joelhos, respirando pesadamente.

Ouviu o barulho de carro se aproximando, e ao virar o rosto percebeu o irmão ao volante. A porta do carona foi aberta e Edward sugeriu que entrasse.

Emmett pôs a mão na porta. Num instante, estava se acomodando no assento ao lado dele. A respiração ainda ofegante.

— O que faremos agora? – a pergunta veio do irmão, que não tinha a menor ideia do que fazer. Nem por onde começar.

— Falar com nosso advogado.

O carro se pôs em movimento outra vez. Estavam voltando para o apartamento. Precisavam localizar o advogado da empresa. Alguma coisa ele tinha de saber sobre o caso, e se não soubesse que encontrasse um especialista.

 

 


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Notas finais do capítulo

Sill