Dois Solteirões e Uma Pequena Dama escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 1
Capítulo 01 – Presente Inesperado


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal.
Mais uma short-fic. Espero que vocês gostem. Eu realmente estou adorando trabalhar nela.



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Os irmãos Emmett e Edward estavam longe de querer compromisso com alguém. Gostavam mesmo era da liberdade que o estar solteiro proporcionava. As muitas festas, as viagens e as várias garotas com quem saiam. Fugindo sempre que o assunto era casamento. Entre os conhecidos, a quem diga que os irmãos McCarty fazem parte do grupo dos solteirões convictos da cidade. É possível que estejam com a razão, afinal.

Aquela era apenas mais uma noitada numa das varias casas noturnas de São Francisco, na Califórnia – conhecida pela sua neblina fria do verão, íngremes colinas, eclética mistura de arquitetura vitoriana e moderna e seus marcos históricos famosos, como a Ponte Golden Gate, os bondes e Chinatown.

Lá estavam os dois McCarty, diante o balcão do bar, cercados de mulheres bonitas. Música alta e bebida alcoólica, a combinação perfeita para os irmãos que só pensavam em se divertir, a sua maneira.

Flertavam com as garotas e bebiam sem se preocupar, enquanto dançarinas de pole dance se apresentavam sob a luz quente que iluminava o interior da boate.

Ao fim da noite, como sempre acontecia cada um saía de lá na companhia de uma garota. Muitas vezes acabam levando ao apartamento onde viviam. Mesmo assim, nenhuma delas jamais foi convidada a ficar para o café da manhã. Ou tinham a chance de voltar outra vez.

Agora, lá estava Emmett. A água do chuveiro descia barulhenta e escorria pelo ralo. O vapor deixando tudo ao redor embaçado e úmido. Ele mantinha a cabeça posicionada sob os pingos grossos se demorando no banho. Em mais uma manhã fria de outono.

Ao sair de dentro do boxe, percebeu que sua última conquista deixara um batom na bancada de mármore da pia. Alcançou o objeto com a mão numa breve avaliação. Fazendo pouco caso o atirou dentro da lixeira de inox.

“Elas sempre deixam alguma coisa”, pensou ele.

Houve até quem já tivesse deixado langerie no passado. Devo ressaltar que a peça intima tivera o mesmo fim que o batom. E quando alguma dizia querer seus objetos pessoais de volta, a resposta era sempre a mesma; dizia não ter visto. O que era somente mais uma desculpa para não voltar receber a mesma garota duas vezes no apartamento.

Com uma toalha felpuda branca amarrada a cintura, ele fez a barba com todo cuidado, pensando na noitada que teve. Depois de aplicar a loção pós-barba bateu com as mãos de leve nas maçãs do rosto. Deu uma risadinha que bem poderia ser definida como cretina, demonstrando seu grau de satisfação.

Vestiu-se com uma cueca boxer branca e uma bermuda de sarja cinza. Calçou uns sapatênis pretos e, então, desceu os dois lances de escada pensando em ir até a cozinha.

O apartamento era uma cobertura com duas suítes. Uma no andar superior, outro no térreo.

Toda sua decoração em cores escuras e sóbrias.

O sofá da sala de estar era em couro preto. A mesinha de centro não tinha nada além de revistas sobre o tampo de vidro. A tevê de plasma gigante ficava plugada a um vídeo game de última geração.

A escada que levava ao segundo piso tinha o formato em L, com longos degraus em madeira de lei. Num de seus lados, a parede branca, no outro, uma proteção em vidro temperado totalmente transparente. Ao primeiro patamar, na parede central, havia um enorme quadro de Marilyn Monroe em preto e branco.

Uma das paredes da sala de estar era totalmente em vidro, com uma bela vista para o centro da cidade. Porém, as longas cortinas escuras quase sempre estavam posicionadas para bloquear a luz do dia.

O quarto de Emmett ficava localizado no andar de cima, onde também havia um pequeno escritório. Suas portas ficavam de frente uma para a outra. Ambos os cômodos tinham janelas de vidro com vista pra cidade.

Quando chegaram para morar ali, anos atrás, Emmett conseguiu ficar com o quarto no andar de cima tirando a sorte no palitinho. O irmão não se opôs, tinha achado aquela forma de decisão justa. Talvez, eles não fossem tão maduros quanto pensavam ser.

Na sala de jantar havia uma mesa com seis cadeiras cujos assentos eram de espaldar longo e de material preto. Uma linda lareira elétrica. A espaçosa cozinha conjugada. O balcão de mármore escuro formava uma ilha ao centro dela, com suas banquetas de assento em couro preto, dividindo os cômodos.

No balcão da própria cozinha, na mesinha de centro da sala de estar e no escritório se encontravam pilhas e mais pilhas de revistas masculinas.

Edward jogava vídeo game na tevê gigante da sala. O barulho ensurdecedor, a imagem tão grande quase quanto numa sala de cinema.

Emmett passou pra cozinha no momento exato que o irmão passava de fase no jogo.

— Cacete! – exclamou Edward, empolgado. E virou-se pra trás, segurando o joystick com animação exagerada. – Isso foi demais! – Esse era outro que desfilava pelo apartamento só de bermuda essa manhã. A diferença de que seus pés estavam descalços. Com o aquecedor funcionado, parecia perfeito.

— Deixou café pra mim? – o irmão perguntou, elevando a voz, por detrás da ilha que o balcão da cozinha formava logo após a sala de jantar.

Sem de fato olhar para ele, Edward respondeu em voz alta.

— Ainda deve ter um pouco aí em cima.

Emmett lançou o olhar por toda a bancada, enquanto o irmão diminuía o volume da tevê na sala. Parando na cafeteira, que estava vazia.

— Cara, você tomou todo o café – ele se queixou. Sua voz soou com insatisfação, talvez até irritabilidade.

— Você sabe que sou viciado nesse negócio que chamamos de café – a resposta veio de Edward, outra vez sem se dar ao trabalho de olhar para o irmão atrás da bancada.

— Vídeo game e mulher – os dois disseram juntos. E Emmett se pôs a preparar outra jarra de café pra ele. Quando terminou de comer foi até a sala e expulsou o irmão do vídeo game, tomando seu lugar no sofá.

Era domingo. Passava do meio-dia quando acordaram por isso o almoço, duas pizzas, foi entregue já no meio da tarde. Agora, as caixas se encontravam vazias sobre a mesinha de centro abarrotada.

Emmett soltava arrotos que bem podiam ser confundidos com fenômenos da natureza.

— Eu consigo fazer melhor – Edward desafiou, achando aquilo o máximo.

— Essa eu quero ver – Emmett aceitou, depois de mais um de seus arrotos assombrosos e uma risada que fez seu corpo chacoalhar.

Depois de se concentrar, Edward enfim soltou o maior arroto que ambos já ouviram.

— Coitada de nossa mãe, morreria de desgosto se nos visse arrotando desse jeito. Feito dois selvagens.

— Ainda bem que ela vive bem longe daqui – a resposta foi de Emmett. E quando estava prestes a pegar o controle da tevê, o interfone tocou na parede da cozinha. Edward foi quem foi até lá para atender.

— Quem era? – Emmett se viu pedindo antes mesmo de o irmão retornar à sala.

— O porteiro avisou que tem uma mulher lá embaixo, na portaria. Ao que parece quis saber se ainda morávamos aqui. Pelo visto é caso antigo – completou, coçando a cabeça, parecendo desconfiado, preocupado talvez.

— Disse o nome?

— Não. Mas o porteiro achou melhor a gente descer.

— Droga! – se queixou Emmett. – Justo agora que eu ia assistir ao jogo dos Lakers. Desce você sozinho, cara. Resolve isso aí.

— Por mim tudo bem. Agora, se for gata, serei eu o primeiro a ter visto. O que impede você de dar em cima dela. Já conhecesse as regras.

No mesmo instante, Emmett saltou do sofá. Agora, usando também uma camisa branca de mangas compridas.

— Não tenha tanta certeza disso – lançou às pressas.

E Edward catou a camisa cinza, também de mangas compridas, no encosto no sofá e a vestiu depressa.

Os dois saíram direto para o elevador numa corrida louca. Quando as portas se abriram no térreo, esbarraram um no outro ao tentarem sair ao mesmo tempo. Parando ofegantes diante o balcão do porteiro.

O homem de cabelos grisalhos, de aproximadamente quarenta e poucos anos de idade, vestindo uniforme, estava sentado em sua cadeira confortavelmente atrás do balcão.

— Cadê? – disseram os dois.

— Já foi embora.

Os irmãos ficaram nitidamente desapontados.

— Era bonita pelo menos? – pediram os dois, praticamente ao mesmo tempo.

— Bom, sim. Mas...

— Mas o quê? – Edward se precipitou.

— Ela deixou uma coisa para vocês – o porteiro olhava agora para além das costas deles, um sofá marrom, de costas para o balcão, estrategicamente posicionado de frente para o jardim de inverno.

Os irmãos McCarty olharam naquela direção, não encontrando nada diferente do já que viam todos os dias.

— Mas ali não tem nada – arriscou-se Emmett a dizer.

— Isso é o que parece. Vão até lá e vejam vocês mesmos, com seus próprios olhos, do que estou falando.

Desconfiados, os dois caminharam até lá. Um de cada lado do sofá, como que esperassem encontrar uma bomba pronta para fazer tudo ali ir pelos ares.

Pararam um ao lado do outro, dando de cara com uma garotinha que não devia ter mais que quatro anos de idade, sentadinha com os pés pendurados. Quase toda sua roupa era cor-de-rosa: os tênis, meia-calça grossa, jardineira florida, casaco e touca de tricô. Somente a blusinha por baixo era branca. O outono tinha mesmo chegado com tudo àquela parte do país. A mochila da Barbie com rodinhas estava encostada ao sofá.

Ela segurava como fosse um escudo protetor uma ovelhinha de pelúcia branca com tutu cor-de-rosa e um lacinho da mesma cor na cabeça.

Após um momento em silêncio, olhando a criança, Emmett falou em voz alta como que quisesse se livrar do problema, qualquer que fosse ele afinal.

— Você viu primeiro!

— Não – Edward rebateu. – Eu vi que foi você quem viu.

Os cabelos castanhos da garotinha eram na altura dos ombros e se encontravam soltos sob a touca de tricô rosa. Os olhos escuros, vidrados nos dois, com curiosidade e medo. Havia algo como tristeza, também.

— É uma criança – lá estava Edward falando outra vez.

— Nossa que descoberta. Você é um gênio. Eu nunca teria descoberto se não fosse por você – Emmett ironizou.

— Será que ela morde? – novamente era Edward falando.

— É uma criança, não um cachorro. Seu idiota.

O porteiro, querendo que eles resolvessem logo a situação da criança, se viu na obrigação de perguntar.

— O que pretendem fazer a respeito disso? Ela não pode ficar aí pra sempre.

— Chamar o Serviço Social – Emmett foi quem respondeu. Começando a ficar apavorado. – Não podemos ter uma criança com a gente sem saber sua origem. Podemos ir presos por isso.

O irmão moveu a cabeça concordando.

— Escuta. A doida que largou essa criança aqui, não disse nada? – Edward perguntou. – Simplesmente largou a criança aqui e deu no pé? É isso?

— Ela disse algo sobre estar fazendo um favor. Disse também que estava trazendo a criança porque o pai mora aqui, na cobertura. – E o porteiro olhou para eles como que quisesse saber qual deles era o pai da criança.

— O quê? – os irmãos quase gritaram.

— E disse mais – continuou o porteiro. – Disse que ele vivia na cobertura com o irmão e seu sobrenome era McCarty. Ou seja, um dos dois é o pai, só nos resta saber qual. – E lá estava outra vez o olhar acusatório nos olhos dele, encarando os irmãos.

— Eu não sou – Edward se esquivou muito rápido.

— Como pode ter tanta certeza? – Emmett se apressou. – Até onde sei você não é nenhum santo.

— Não costumo me esquecer do uso do preservativo. Isso deve significar alguma coisa.

O porteiro estava de pé atrás do balcão agora.

— Vocês dois tem certeza de que querem mesmo discutir esse assunto na frente dela – disse.

Os dois olharam com atenção a garotinha que parecia triste e ao mesmo tempo assustada.  E então alguma coisa passou a mudar dentro de Emmett.

Ele se abaixou diante do sofá e começou falar com a criança com cuidado.

— Ei, lindinha, você tem alguma carta ou bilhete com você? – pediu.

A garotinha se demorou, olhando pra ele antes de abrir o zíper do bolso grande da mochila. E de dentro de um envelope de papel pardo retirar uma folha de papel dobrada ao meio.

Emmett recebeu aquela folha de papel, com um leve aroma de flores, desconfiado. E, então, olhou o irmão como que dizendo que iriam descobrir nesse instante quem era aquela criança realmente.

Ele desdobrou a folha de papel com todo cuidado, e começou a leitura silenciosa.

“Antes de tudo, é preciso que saiba o quão difícil está sendo pra mim ter de escrever esta carta. A despeito disso, preciso registrar essas palavras.

Eu sei que você deve estar tomando um grande susto agora. Mas, não foi maior do que tomei quando descobri que estava grávida. E outro maior ainda há dois anos quando descobri um câncer no pulmão. Estou morrendo e não poso cuidar dela, a joia mais preciosa de minha vida.

Eles me deram apenas alguns dias, por isso se você estiver lendo isso agora é porque, provavelmente, já terei partido.

Dei instruções a uma amiga que levasse minha pequena até você. Assim como pedi que não esperasse, para o caso de você se recusar a ficar com ela. Por favor, não a entregue ao Serviço Social. Ela é sua filha, e agora está sozinha no mundo. Seja um bom pai para ela. Esteja certo de que jamais abriria mão de minha garotinha, caso não estivesse morrendo.

Eu disse a ela que seu papai era um homem bom. E também muito bonito. Um príncipe como nos contos de fadas, como ela gosta de ouvir. Apesar disso, sei que deve estar assustada e triste agora. Ela é uma criança doce e muito sensível ao que acontece ao seu redor. Por favor, por tudo o que mais ama não a machuque de nenhuma forma. Esteja certo de que todo amor que der a ela será recebido de volta em dobro. Ela irá admirá-lo e você será seu primeiro amor. Seja um exemplo pra ela, do que é correto. Do que um homem pode ser. E no futuro, ela saberá fazer a escolha certa.

Ela tem medo de escuro, por isso deixe sempre uma luz acesa no quarto dela a noite antes de dormir. A ovelhinha de pelúcia que ela carrega com tanta devoção nos braços é seu objeto de transição. Nunca tente separá-los a força. Se acontecer de ela não saber onde o deixou, seja compreensivo e a ajude encontrá-lo. Quando ela disser que ele está com medo, esteja certo de que o medo, na verdade, é dela.

Você deve está me odiando agora. Tudo bem pode fazer isso. Está no seu direito. Só não deixe esse ódio respingar nela.

Diga a ela todos os dias de sua vida, mas, sobretudo, em datas especiais, como seu aniversário, natal, formatura e casamento, o quanto eu a amo e gostaria de estar ao lado dela. Que de certa forma, eu estarei, basta ela acreditar. E eu estarei pra sempre no coração dela.

Seu nome é Pétala. Como as pétalas das flores. Sua certidão de nascimento e outros documentos importantes estão na mochila, no mesmo envelope que esta carta.

Fui egoísta, sim, a queria só pra mim.

Cuide dela, Emmett. E se puder um dia me perdoe.

Callie”

 

Emmett estava petrificado. Tinha saído, sim, com uma moça chamada Callie. Tentava se lembrar de quanto tempo fazia isso, mas, seu cérebro parecia em pane. Só conseguia se lembrar de que foi a única garota com quem saiu mais de uma vez. E ela desapareceu de sua vida de uma hora pra outra, sem dar nenhuma explicação.

Deixou de olhar a carta para olhar com atenção a garotinha sentada no sofá a sua frente. Algo estava acontecendo dentro dele, podia sentir.

Edward já não aguentava mais tanta esperava, por isso decidiu interromper.

— Então? – soltou em voz alta. – Ai diz ou não diz qual de nos dois é o pai?

— Acho que sim – Emmett mencionou, ainda em estado de choque.

— Como assim, acha que sim? Diz ou não diz? Estou com a impressão de estar com principio de infarto, então diz logo o que descobriu ai antes que eu morra – Edward alertou. Estava morrendo de medo.

Emmett enfiou a mão dentro da mochila retirando de lá o envelope pardo. De dentro dele retirou a Certidão de Nascimento da criança. Percebendo outros documentos como havia sido mencionado na carta. Carteira de vacinação, papéis da maternidade em Connecticut onde Pétala tinha nascido. Históricos médicos. Além da própria carta.

— Aqui está – disse ele, olhando a carta em sua mão. – Leia isto. Aí diz tudo o que você quer saber – falou ao irmão.

Porém, Edward parecia prestes a desmaiar. – Dá para você me tirar dessa agonia? – exigiu antes de qualquer coisa. – Diz logo o que descobriu.

— Pode parar de querer morrer, o pai dela sou eu. Aqui está – anunciou, entregando ao irmão a carta que segurava. – Leia isso.

Edward começou a ler sentindo a cor voltar ao rosto e o coração normalizar as batidas.

— Obrigado Deus! Estou te devendo essa – falou sem pensar. Grato por ter se livrado da responsabilidade de uma paternidade surpresa. E, olhando para o irmão, sentenciou. – Você está é ferrado. Muito ferrado.

Mas Emmett, no entanto, não deu a mínima para suas palavras. Estava ajoelhado de frente para a garotinha sentada no sofá com os pezinhos pendurados. Enxergando-a totalmente diferente agora. Buscando sinais no rosto infantil que lembrasse seus traços. Porém, Pétala tinha mais traços físicos da mãe que propriamente dele. Os cabelos escuros lembravam muito os dois. Já a cor dos olhos, era inteiramente herdados de Callie, escuros como a noite.

— Oi – ele saudou, com cuidado como que temesse assustá-la ainda mais. – Qual o seu nome?

A garotinha nada respondeu.

— Eu sei que você está assustada, mas, acredite, vai ficar tudo bem. Eu sou o seu papai, sabia?

Claro que ele já sabia o nome dela. Estava na certidão de nascimento, assim como na carta escrita a punho pela própria mãe da criança. Estava apenas tentando uma comunicação descontraída.

— Talvez eu possa adivinhar seu nome – prosseguiu. A menininha olhou pra ele com interesse. Um jogo de adivinhação podia ser bem legal, afinal. – Okay – disse ele –, você pode me mostrar algo que se pareça com seu nome ou que tenha sua inicial? A primeira letra sabe?

A garotinha, antes assustada, se remexeu no assento se preparando para descer do sofá.

— Ah, você quer descer? – Emmett então a ajudou.

Edward olhava os dois como se fossem a coisa mais extraordinária no mundo todo. Admirado com a receptividade do irmão mais velho agora que sabia ser o verdadeiro pai da criança.

Emmett seguiu a garotinha com o olhar. Ela parou de frente para o jardim de inverno. Encostou o dedinho indicador ao vidro e olhou para Emmett, esperando que começasse com a adivinhação.

— Vidro? – Ele fez falsa cara de espanto. – Não, seu nome não pode ser vidro. Isso não é nome que se dê a uma garotinha.

E ela bateu com o dedo no vidro, enquanto sacudia a cabeça, negando.

— Flores – arriscou ele novamente, olhando as flores do outro lado do vidro, como se não soubesse. – Já sei, o seu nome é Flor.

Outra vez ela negou com um movimento de cabeça.

Emmett coçou a própria cabeça, fingindo pensar. – Hummm... Espinho? Não, uma coisinha linda como você não pode se chamar espinho.

E ela continuou pressionando o dedinho no vidro, querendo que ele adivinhasse seu nome.

— Poxa, que difícil – ele lamentou.

A garotinha insistiu, mostrando dentro do jardim de inverno as flores brancas e rosas.

— Já sei! – ele falou animado.

A menininha ficou nas pontas dos pés, aguardando a resposta, ansiosa.

— Seu nome é... – E ela sacudiu as mãozinhas. – Seu nome é... Pétala. Igual às pétalas das flores. Poxa, você é mesmo muito esperta.

Pétala abriu um sorriso e, de repente, nada era igual na vida e no coração de Emmett. As covinhas que ele trazia no sorriso desde o nascimento pareciam ter saltado pras bochechas de Pétala.

— Irmão – lá estava Edward, espantado com a semelhança no sorriso dos dois –, ela é mesmo sua filha.

— Sim, ela é. – A resposta de Emmett veio risonha. E seus braços se abriram esperando pela garotinha. Pétala correu pros braços dele, igualmente risonha. Ele percebeu, no aconchego do abraço, o cheiro de xampu infantil e giz de cera.

Pétala parou olhando com atenção as bochechas dele, lembrando-se de a mãe ter dito certa vez que eles tinham o mesmo sorriso.

— Prazer em conhecê-la Pétala. Você se lembra do meu nome? – ele pediu.

Ela balançou a cabeça. – Eu esqueci.

— Okay, não tem problema. Eu me chamo Emmett. Emmett McCarty. – Ele olhou, então, para o irmão. – Está vendo aquele ali, com cara de quem viu um fantasma? Ele é meu irmão caçula. Seu tio, Edward. Ele tem esse cabelo assim, todo bagunçado, mas é completamente inofensivo. Não faz mal a ninguém. Você vai gostar dele. Ele é um cara legal.

— Ela até que é engraçadinha – comentou Edward. Ele estava mais à vontade agora. – Você não faz xixi nos móveis, faz?

— Não, não faço – ela respondeu, abandando a cabeça com gosto.

— Já disse que ela não é um cachorro, seu idiota.

O porteiro meneou a cabeça, como que dizendo “aonde esses dois foram se meter”.

— Vem, vamos subir – Emmett avisou, se pondo de pé com Pétala nos braços.

— Coraçãozinho – ela alertou, em um desespero repentino, esticando os bracinhos na direção do sofá onde esteve sentada antes.

Emmett olhou no sofá, reconhecendo no bichinho de pelúcia a ovelhinha descrita na carta de Callie.

— Sua ovelhinha, claro. Não podemos esquecê-la. – Ele pegou a ovelhinha e entregou nas mãos dela.

— Mochila – Pétala pediu, ainda mostrando com a mão seus objetos.

— Não se preocupe, o seu tio vai levar sua mochila lá pra cima.

Eles se encaminharam ao elevador. E o porteiro ficou a imaginar aqueles dois tentando cuidar sozinhos de uma criança. Será que conseguiriam? Era esperar pra ver.

Pétala ficou o tempo todo nos braços de Emmett, dentro do elevador. Seu olhar indo do rosto de um ao outro. Talvez tentando entender aquelas pessoas. Quem eram, na verdade. Será que eram mesmo confiáveis. No entanto, ela acreditou que sua mamãe não a mandaria pra um local ruim. E, se Emmett era seu papai e Edward seu titio, então era possível que estivesse em segurança.

Imediatamente, ao entrar no apartamento, Edward saiu correndo para recolher todas as revistas de mulher pelada espalhas pela superfície dos móveis.

— O que faço com isso? – gritou ao irmão mais velho.

— Sei lá. Guarde em um local de difícil acesso. Ou as queime na lareira.

— Você ficou doido? Isso aqui é quase uma relíquia.

Emmett pôs Pétala sentada no sofá, somente então se virou de frente para o irmão.

— Faça como quiser. Só resolva isso.

— Mas é claro que eu vou querer guardar. É cada uma – Edward se queixou. E saiu da sala levando nos braços uma pilha enorme de revistas. – Jogar fora. Que ideia mais absurda.  Esse cara só pode ter ficado doido.

Emmett fez pouco caso. E começou recolher as caixas de pizza vazias e os copos de cima da mesinha de centro. Sem as revistas, ficou completamente vazia. Um pouco suja, é verdade.

— Está com fome? – ele perguntou a Pétala.

Ela meneou a cabeça, concordando. – Ahã.

— O que você quer comer?

— Biscoito e leite.

Emmett seguiu para a cozinha. Pelo menos leite e biscoitos isso deveria ter. Pétala saltou do sofá indo logo atrás dele.

— Ah, você quer vir comigo? – ela balançou a cabeça outra vez, afirmando sua vontade. – Okay – disse ele. E pegou em sua mão pequenina. – Leite com biscoitos é uma delícia. – Pétala concordou novamente com a cabeça. – Talvez eu devesse comer um pouco também. O que acha?

Ela deu uma risadinha tímida. Emmett a ergueu do chão colocando-a sentada na banqueta diante do balcão lotado de coisas.

Pegou os biscoitos no armário e o leite na geladeira. Deixou tudo sobre a bancada e foi pegar os copos. Serviu os dois, e despejou todos os biscoitos do pacote numa tigela de cereal.

Pétala ficou olhando os copos por tempo demais, avaliando. Emmett ficou a olhar dos copos para ela, sem saber o que tinha feito de errado.

— O que foi? – pediu.

— Tem que ser copo de tampinha. A mamãe não deixa no de vidro. Pode quebrar e fazer um dodói.

— Ah, sim – disse ele, compreendendo. – Eu não tenho um copo de tampinha agora. Mas posso comprar um depois. – Ele olhou em volta, nos armários da cozinha. – Espera aí. Eu tenho um copo que pode servir pra isso. Ele não é de vidro. Eu vou pegar também um canudo pra ficar mais fácil pra você tomar o leite.

Momentos depois, enquanto comiam os biscoitos com leite, Edward retornou.

— O que você fez cara? – resmungou, olhando incrédulo o copo que Pétala tomava o leite. – É o meu copo de Star Wars. Ninguém pode usar nada de minha coleção de Star Wars. Você ficou maluco?

— Ela não pode usar os copos de vidro. É perigoso, pode quebrar. E é só um leite, que mal pode haver? O copo não vai derreter.

Edward passou a mão na cabeça, inconformado.

— Eu estou é ferrado. Estou perdendo minhas coisas para uma criatura que transborda cor-de-rosa. E que chegou só tem cinco minutos. Mantenha essa criaturinha longe do meu quarto. Da minha preciosa coleção.

Pétala abraçou a ovelhinha de pelúcia junto ao peito, ressentida. Antes que eles pudessem pensar em qualquer outra coisa a dizer, estava chorando.

Emmett lançou um olhar indignado ao irmão. Edward entendeu que havia exagerado.

— Me desculpe Pétala – pediu. – Eu nem gostava desse copo tanto assim.

Apesar do ressentimento e do medo, Pétala encostou a boca ao canudo. Soluçou e olhou para Edward, imaginando se ele ainda estaria bravo. Abaixou o olhar e começou tomar o leite, voltando a se sentir segura.

— Isso. Toma o seu leitinho neném, e depois vai dormir. – Ele firmou o olhar em Emmett. – Você me paga – sussurrou sobre o ombro.

— Deixe de ser chato. Sente aqui e coma um pouco desses biscoitos com a gente. Domingo à noite, leite com biscoitos, quem diria – desabafou. – E sabe o que é pior? Eu estou gostando. Estou gostando mesmo.

— Eu não. E nem tenho por que estar. A filha é sua, afinal.

— Isso é sério, Edward. Você é meu irmão, não pode me deixar aqui sozinho com uma criança. Não pode me largar sozinho nessa, mano. Eu não tenho a menor ideia do que fazer se ela ficar doente. Se chorar.

— Bem, a parte do chorar nós acabamos de descobrir. É só dar pra ela o que ela quer e pronto. O choro para.

— E se ela fizer cocô? Quem vai limpá-la?

— E eu sei lá. Tudo o que sei é que estamos ferrados, irmão. – E, então, ele se sentou na banqueta ao lado de Pétala. – Acho que vou tomar uma dose desse leite aí – disse. – Quem sabe eu não me esqueço do problemão que você nos meteu.

— Sem querer acabamos de nos tornar Dois Solteirões e Uma Pequena Dama. – Declarou Emmett, depois de um gole de leite que o deixou de bigode branco. – Como será nossas vidas de agora em diante? Isso nós não podemos saber.

 – Não, não podemos – concordou Edward. – Porém, estou certo de que não será nada fácil.

— Um brinde a nossa vida nada fácil – Emmett ergueu o copo de leite e o irmão fez o mesmo. Pétala olhou para eles sem entender o porquê daquilo.

— Ela é uma garotinha. Eu não tenho a menor ideia do que é cuidar de uma garotinha – foi o que Edward falou, durante o brinde com copo de leite.

— E acha que eu sei?! Nunca fui pai antes, muito menos de menina.

Emmett tomou todo o resto do leite de um só gole. Bateu com o fundo do copo no balcão como se estivesse na mesa de um bar. Suspirou. Olhou para Pétala e afagou seus cabelos finos e escuros. Pensando que agora era tarde demais para voltar atrás. Precisava encarar a paternidade que lhe caíra de paraquedas. Todas as dúvidas, medos e incertezas que vinham junto com ela. E seu irmão, Edward, não tinha escolha a não ser ajudá-lo.

Dias movimentados estavam por vir. Eles sabiam disso.

 

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Alguém curtiu?
Se quiser deixar um comentário, eu ia adorar :)
Beijo, beijo
Sill
PS: Devo atualizar "Um Lugar Para Ficar" ainda nessa semana.