Fazia quase um mês que Ben Kenobi e Luke Skywalker foram viver na arenosa Tatooine. O homem começava a se acostumar com a tediosa rotina de acordar, cuidar de Luke, e um pouco da pequena fazenda, meditar e de vez em quando conversar com seu antigo mestre. Raramente o homem ia a cidade, e nas raras ocasiões em que ia, geralmente para comprar comida de bebê para Luke, voltava o mais rápido possível. Chamar muita atenção não era sua intenção. O imperador sabia que ele não estava morto, e mesmo Tatooine estando fora dos domínios do império, era melhor manter a descrição.

            Ainda assim, Kenobi começou a chamar atenção justamente por não querer chamar atenção! Haviam boatos sobre o eremita que morava no meio do nada e que só saia para comprar comida de bebê. Alguns eram engraçados e outros ridiculamente idiotas, mas nenhum deles chegava perto da verdade.

            Ele se preparava para dormir, e como em todas as noites antes dessa Ben finalizou suas meditações e foi checar se Luke estava dormindo. E como em todas as noites, ao constatar que seu futuro aprendiz descansava Kenobi deitou-se, fechou os olhos e começou a se revirar na cama sem de fato poder descansar.

            De repente, o homem ouviu uma voz familiar, muito familiar. Ela era baixa no começo, tão baixa que o homem se quer entendia o que ela dizia, e achou que estava alucinando com o calor ao qual não estava totalmente habituado. Mas então o som foi aumentando e aumentando até tornar-se um grito.

“Obi-Wan! ”

            A voz chamou. Kenobi cuidadosamente pegou seu sabre de luz que estava dentro de uma caixa de madeira ao lado da cama e foi em direção à voz. E quando encontrou o responsável. Tudo o que pode pensar foi em ligar o sabre de luz, para o aponta-lo na direção do rosto daquele espirito azulado que não era o de Qui-Gon.  

—Quem é você?

—C-Como assim? Não me reconhece mestre? – Perguntou o espirito que tinha a aparência de Anakin. Ele tentou se aproximar, mas Ben o ameaçou com o sabre de luz.

—Que tipo de brincadeira é essa? Vou perguntar mais uma vez. Quem é você?

—Sou eu, Anakin.

—Anakin Skywalker não pode estar aqui.

—Obi-Wan, sou eu.

—Prove.

—Durante a guerra dos clones nós sempre dormíamos próximos. – Kenobi ergueu ainda mais a arma.

—Todos sabem que os jedis ficam juntos por questões de segurança.

—Sim. Mas uma noite não conseguimos dormir, e você, mestre, me contou algo que ninguém além de mim sabe. – O homem engoliu seco.

—O que eu te contei?

—Sobre como você quase foi para o lado negro quando seu mestre Qui-Gon morreu. Sobre como você odiou Darth Maul por tê-lo assassinado. Sobre como se não fosse por um garotinho loiro, ex-escravo cujo destino passou a depender de você, o lado negro teria te tomado da maneira mais avassaladora imaginável. – Kenobi gelou instantaneamente, aquilo parecia impossível, surreal.

—Co-Como? Como pode ser um fantasma? Você está vivo.

—Não, eu morri, mestre.... Levei os últimos três para entender que não importa se o corpo está vivo, porque é o espirito que importa. Eu morri, e nem me lembro como, só de quem fez isso. – Bem encolheu os ombros.

—Do... Do que você lembra?

—A última coisa da qual tenho uma lembrança completa é de você me dando as costas e indo para Utapau. Eu não queria que você fosse, por alguma razão aquilo me deixava horrivelmente desconfortável. Desespero, é, aquilo me deixava desesperado, eu queria ter segurando seu braço, ter gritado para que você não fosse embora, ou ao menos que me levasse junto, mas não fiz nada disso, deixei que fosse.

—E depois disso? Mais alguma coisa?

—Só flashes.

—Conte-os.

—Você entrou na nave, e foi para longe. E então.... E e-então. – Anakin abaixou a cabeça, parecia envergonhado de algo. “Envergonhado de mim. Talvez.... Talvez ele soubesse, afinal. ”— Eu não lembro do que aconteceu nas próximas horas. Foi como se eu tivesse adormecido, e quando acordei sentia uma dor lancinante vinda das minhas pernas e dos braços. Sim, foi isso. E a dor era tão forte que eu não conseguia pensar em mais nada a não ser em chorar, em gritar, até na morte. E com meus olhos já embaçados pelas lágrimas que nunca caiam, olhei para cima, sentia que quem fez aquilo comigo estava lá, bem a minha frente, mas eu deveria estar errado, porque tudo o que vi foi você... E.... E Você chorava, e me olhava com pesar, de uma forma que nunca havia me olhado. Me senti sujo, nojento, asqueroso. Queria berrar por ajuda.... Eu.... Eu estava com medo, e se quem fez aquilo voltasse e você tivesse o mesmo destino? E se.... E se.... Nós dois morrêssemos lá? Não, eu não queria morrer, eu queria viver, ao menos.... Viver o bastante para te pedir perdão por o quer que eu tivesse feito, porque tudo o que importava naquele segundo era que parar aquela dor e a tristeza em seus olhos, mas eu apaguei de novo.

—Anakin eu... – Anakin não deve ter o ouvido pois continuou a falar.

—A próxima coisa da qual me lembro e de flutuar no nada, não havia mais dor, nem você, nem luz, nem escuridão, só eu.... Eu e o frio que atravessava meu corpo como uma lâmina.... Eu e o nada. E aquilo era estranhamente assustador e libertador. E então depois eu estava aqui, e eu vi esse menino no berço, e eu soube.... Eu soube que ele era o meu filho. Tentei pega-lo nos meus braços, mas não consegui. Eu me desesperei e gritei, pude sentir que você estava aqui, e eu gritava e gritava seu nome, mas nada.... Nada acontecia. Ninguém me ouvia. – Anakin parecia completamente imerso em seu relato seus olhos marejavam, e suas mãos estavam fechadas em punhos, mas ele não estava com raiva, Ben saberia se ele estivesse. Era apenas tristeza, apenas solidão. – E foi assim por três noites seguidas, já estava perdendo as esperanças, até que você finalmente me escutou. Mestre... Obi-Wan.... Meu irmão, meu amado irmão. O que aconteceu? O que eu fiz? Por que eu morri? Quem é essa criatura horrenda que me matou? Que-Quem é.... Quem é Darth Vader? Por que quando fecho meus olhos tudo que escuto são gritos, não só de homens, mas de mulheres e de crianças? E os gritos eles são tão altos... É..... É enlouquecedor! Me ajude! Por favor me ajude! – Anakin chorava desconsoladamente. Suas lágrimas eram miragens, percorriam seu rosto e desapareciam antes de tocarem o chão. Pareciam evaporarem. Assim como tudo naquele planeta escaldante.

            De repente as lágrimas que caiam dos olhos de Anakin começaram a se tornar chamas que o consumiram por completo enquanto ele gritava de dor. Então, depois de estar completamente deformado pelo fogo, ele virou-se e sorrindo para Ben disse: 

—Qual o problema, mestre? Não sou mais seu irmão? Achei que você me amava. 

            Kenobi acordou mais uma vez, coberto de suor e sentindo seus olhos arderem. Aquela era apenas mais uma noite. Apenas mais um pesadelo. Apenas mais uma madrugada que o homem passaria acordado, sem conseguir fechar os olhos, pois os gritos ensurdecedores de seu amigo sendo tragado pelas chamas eram mais que o bastante para mantê-lo acordado, por mais cansado que ele pudesse estar. 

Aquela era apenas mais uma noite, mais uma noite ruim, na qual Ben mais uma vez dirigiu-se ao berço de Luke. Apenas mais uma noite na qual ele disse para o pequeno Skywalker as mesmas palavras de sempre. 

—Ele era apenas uma criança. - Dizia Ben com o corpo tremendo e as lágrimas quentes embaçando sua visão. -Como eu pude... Como... É minha culpa... Eu... Eu... Eu sou um monstro, e não importa quantas vezes eu mude de nome, isso sempre... Sempre vai me perseguir. Me perdoe, por favor, Luke, só peço que me perdoe. Poque a verdade é que eu nunca.... Eu nunca vou me perdoar, por tudo o que fiz a você é sua irmã. 

Aquela era apenas mais uma noite. Apenas mais uma noite de muitas outras onde o dito eremita Ben Kenobi desejava que as histórias que espalhavam sobre ele na cidade fossem verdade. Apenas mais uma noite onde tudo o que ele mais queria era ser apenas um homem louco que só come comida de bebê.