Tears in Heaven escrita por Maria Lua


Capítulo 2
My Way


Notas iniciais do capítulo

Olá! Fiquei realmente muito feliz com os comentários do capítulo anterior ♥ alguns leitores conhecidos, e outros novos que realmente me fizeram muito feliz! Por isso resolvi adiantar um pouco esse capítulo que, admito, não sairia por agora. Obrigada!
A música do capítulo é My Way, de Frank Sinatra, mas pode ser a versão do Elvis Presley também. Boa leitura!



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de dezembro de 2015 

"Eles disseram que pode não significar nada, também" 

"Deixe de pessimismo, mãe! Ela se mexeu, significa sim alguma coisa. Olha! Ela fez de novo!" 

"Tudo o que eu queria no mundo é ter a sua força, Amélia... Por favor, pega uma água para mim, sim? Preciso me sentar." 

Os olhos de Olívia palpitavam. Suas pálpebras tremiam com uma velocidade que só fazia aumentar. As duas mulheres que estavam em volta aproximavam-se para verem o exato momento em que, finalmente, Oliver voltaria a enxergar. Ou a fazer qualquer coisa. 

E aconteceu. Ela não sentia seu corpo, apesar de pensar que poderia levantar e sair correndo a qualquer momento. Ao abrir seus olhos pela primeira vez a dor foi tão grande que foi necessário fechá-los de supetão. A luz os invadiu de maneira que ela poderia supor estar cega. Por quanto tempo dormi? Ela se perguntava.  

Tentou, novamente abrir os olhos, dessa vez devagar. Ao fazê-lo, aos poucos a imagem focou. Estava tudo embaçado, mas ela podia distinguir duas figuras em sua frente. Uma garota loira escuro, jovem, e uma mulher de cabelos curtos e loiros esbranquiçados. Essa ela reconheceu. Mesmo sem poder ver os traços dela com uma boa definição, sabia que era a sua mãe.  

"Olívia?", a senhora chamou, jorrando seu hálito na filha que, a este momento, sentia prazer por sentir qualquer coisa. "Oliver, querida, está aí?", ela insistia. Apesar de balançar o braço da menina, a mesma não podia sentir nada, a não ser uma lágrima da mãe que acidentalmente caiu em sua bochecha. Isso ela sentiu com grande potência - quente e úmido. Uma sensação familiar mas completamente nova. 

Os olhos de Olívia imprensaram de novo, fazendo com que a outra garota na sala fosse fechar as cortinas. Isso trouxe imenso alívio, relaxando as pálpebras. Sentiu dor ao perceber que seus cílios, antes, estavam grudados, mas foi um grande alívio. Estava tudo muito dormente em seu corpo - até agora. De repente surgiu uma dor de cabeça inusitada, que a induziu a fazer caretas. Essas caretas, porém, assustaram a sua mãe coruja, que correu gritando por um médico ou enfermeiro. A outra garota segurou, inutilmente, a mão de Oliver, que estava completamente confusa.  

Foca. O que aconteceu? Foca, foca. Ela tentava, e então se lembrou. Foi um longo sono, é claro, mas pôde ver claramente a cena dela na chuva com o Matt, brincando. Lembrou-se da corda, do raio, mas nada a vem na cabeça depois disso. Nem mesmo a dor. Será que ele a atingiu mesmo? Supôs que não. Mas o que acontecera depois lhe era de grande mistério. Analisando imaturamente a área em sua volta, ela pôde definir alguma coisa. Era tudo muito branco. Paredes, chão, teto, roupas. Tudo. As imagens ainda giravam, ainda estavam turvas, confusas, mas ela acredita estar em um hospital. 

Pessoas vieram de uma porta em frente a sua cama – ou maca. Eram três, sua mãe e mais dois. A garota, não muito notada, que estava ao seu lado, se afastou, abraçando a Sra. Waldorf. Oliver jurava que ela e sua mãe estavam chorando juntas. Os outros dois, um homem e uma mulher, se portaram cada um de um lado da cama. A mulher pôs a luz de uma lanterna nos seus olhos, causando-lhe dor imediata, mas que aos poucos foi sendo superada. E, de repente, líquido. O rapaz, enfermeiro, pôs um colírio em seus olhos. Ardeu de início, mas isso trouxe cor ao mundo de Olívia. Agora ela podia ver claramente cada detalhe dos rostos. Sua mãe aproximou-se, demonstrando que estava muito mais velha do que se lembrava. Parecia não dormir e não lavar o cabelo há meses. Seu rosto, incluindo os lábios, estavam pálidos e meio rachados. 

A outra garota não tinha nada de familiar, exceto os olhos. São semelhantes aos de sua família - pequenos, um pouco puxados na lateral e com um azul terno que abrange a genética há gerações. Talvez uma parente distante, desconhecida. 

Sua mãe aproximou-se e beijou sua testa com força. Ela sentiu isso, o que foi de imensa excitação. Era notável que, a sua aparência tão velha e esgotada surgiu por conta de sua preocupação. Oliver não sabia quanto tempo passou dormindo, mas somente pelo fato de ter desmaiado já surgiriam rugas em sua mãe. Ela caiu da corda. Ela, seu pai, sua irmã, o Matt! Todos devem ter sofrido muito de preocupação. Provavelmente foi o mesmo garoto que chamou por socorro, se é que não se feriu com as descargas do raio também.  

Eu estou aqui! Estou bem! Tentava gritar, mas nada saía. Sua língua parecia estar parcialmente paralisada, ao passo que seus lábios sequer tinham desgrudado. 

A mulher, que, pelo jaleco, notou-se ser médica, foi falar com a Sra. Waldorf e a outra garota, enquanto o enfermeiro seguia fazendo exames dos quais Oliver não conseguia associar. Seu corpo estava completamente neutro, como se não passasse de uma máquina. 

Após alguns instantes de ansiedade ao perceber que o rapaz havia aplicado injeções nela, conseguiu focar sua audição - ainda muito fraca – na conversa da mãe. 

"Sra. Waldorf, sei que parece arriscado olhando por fora, mas pode ser um avanço tanto para ela quanto para a ciência em si.", a médica falou. 

"Doutora, eu não ligo para a ciência. Quero tirar a minha filha daqui. Passamos muito tempo dormindo em cadeira de hospital, e queremos o conforto da casa. Ainda há tempo para reconstruir uma vida para ela. Eu só quero isso." 

"Eu sei, e é por isso que te dou essa opção a mais. O composto é praticamente uma adrenalina, porém mais forte, atingindo os músculos de maneira progressiva, mas eficiente. Estamos testando em outros pacientes e, por mais nova que seja essa tecnologia, está havendo muita melhora. Essa semana vamos liberar mais um paciente que passou dois anos desacordado." 

"Dois anos não são dez!", gritou, furiosa, mas logo arrependeu-se de seu surto, falando em tom mais calmo. "Tem certeza de que pode dar certo?" 

"Absoluta. Basta assinar que vamos começar o tratamento o mais rápido possível. Caso contrário teremos que esperar o corpo da Olívia se recuperar sozinho do choque, o que inclui fisioterapia durante uma vida inteira." 

Fez-se silêncio enquanto a Sra. Waldorf assinava o contrato. Oliver estava sem entender, afinal sua visão não as alcançava. Logo todas as três se aproximaram. Sua mãe alisava seus cabelos com o rosto molhado, vermelho e inchado. A garota estava logo atrás dela, da mesma maneira. A médica, por sua vez, sentou-se ao seu lado da maca e começou a dar instruções. 

"Olá, Oli. Por favor, tente não se mexer. Não conseguiria muito, mas por pouco tempo. Você vai entender tudo direitinho aos poucos.", falou, pegando uma seringa. Isso fez com que os olhos de Olívia se arregalassem. Estou bem! Estou bem! Já chega, não precisa disso! "Meu nome é Dra. Bárbara, estou cuidando de você desde que chegou no hospital. Sei que é difícil, talvez você não se lembre do que houve, ou talvez sim, já que cada caso é um caso. Vou injetar esse remédio em você para que possa ficar bem logo, está bem? Você é uma boa menininha. Não vai doer, você está sedada, mas vai fazê-la ficar um pouco agitada. Tente controlar a respiração. Expira, inspira, expira, inspira, e assim por diante. Pode fazer isso?" 

Sem esperar um consentimento, ela o fez. A agulhada não causou dor alguma a Olívia, mas o líquido injetado fez com que ela desejasse amputar o braço. O líquido, que aparentava ser metálico, saiu rasgando e se espalhando em seu corpo com muita rapidez. Logo a dor se dissipou, fazendo-a sentir um formigamento e, por fim, um estalo. Era como se todo o seu corpo vibrasse de dentro para fora, mas sem se mexer. Era como um óleo reparando algo enferrujado. Ao chegar em seu rosto, ela conseguiu abrir a boca. 

E foi nesse momento que chorou. Olívia não sabia por quanto tempo tinha dormido, o que aconteceu de tão grave com seu corpo, mas isso a fez pensar que era como estar nascendo de novo. Seu pescoço podia se mover com certa dificuldade, e por mais que sua garganta estivesse seca e dolorida demais para falar algo, ela balançava os lábios, que agora se hidratavam de suas lágrimas fugitivas. Sua mãe e a garota comemoravam muito, enquanto ela apenas chorava.  

Subitamente foi abraçada. A médica saiu do cômodo completamente despercebida, porque no momento Olívia só conseguia pensar no calor que sentia, e no quão maravilhoso isso era. Os braços de sua mãe a enlaçavam, a passo que recebia vários beijos no topo da cabeça. Logo veio a outra garota. Era tão familiar, seus braços a faziam sentir-se em casa, e só ali, com aquela proximidade de corpo a corpo, vendo seu rosto choroso tão de perto, que Olívia percebeu o inevitável. É a Amélia! 

Seus olhos arregalaram-se ao ver sua irmã, caçula, pequena, ali, tão grande. Como não a reconheceu antes? Ela estava... Grande. Deveria ter, aproximadamente, uns quinze anos no mínimo. Ela não entendia como era possível, mas então olhou para a sua mãe e percebeu que o envelhecimento vinha da parte das duas. Ou melhor, das três. 

Olhou em volta, angustiada, e então viu um calendário grudado na parede. Ajustou os olhos até poder, de fato enxergar o que estava ali todo esse tempo, explícito. 

Novembro de 2015. Não passaram algumas horas, alguns dias, algumas semanas. Ela não cochilou. Ela dormiu.  

"Eu dormi por dez anos", pensou abruptamente. 


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