" Querida Alex, 

Quem lhe fala através desta é seu pai. Depois de muito conversar com meus superiores e eles constatarem que você está no curso de feiticeiros aprendizes com um desempenho satisfatório, me deram a permissão para entrar em contato contigo regularmente, a partir de hoje. Não é ótimo?!

Bem, sendo sincero, eu gostaria de poder conversar pessoalmente e de te contar como fui chamado para trabalhar no Departamento Ultrassecreto de Magia; explicar corretamente porque meu cargo me faz ser tão afastado; e matar toda a saudade enorme que eu sinto de ti. Mas infelizmente isso ainda não é exatamente possível. A boa notícia é que já me adiantaram que em breve devo receber uma liberação para te encontrar pessoalmente. Ainda não há uma data estabelecida, porém, tenho esperanças de que não vá demorar muito. Não sabe a falta enorme que você me faz.

Por que está tudo escrito de maneira tão formal para mim? Porque tem um editor aqui do meu lado, garantindo que eu não vá dar nenhuma informação confidencial. Eu dito a carta e ele digita. O cara fez doutorado em letras e tem TOC de escrever assim; ou seja, nunca vai deixar a carta redigida de maneira espontânea. Fazer o quê? Se essa é a condição para me comunicar com minha filha é lógico que eu aceito.

Fique tranquila que não terá ninguém lendo aquelas que você me mandar, além de mim, pois o editor é apenas para as cartas escritas por quem tem acesso às atividades do departamento. Isto é, se você quiser me responder... Pois depois de todos esses anos em que sumi, e te larguei com sua mãe (morrendo de raiva de mim) entendo se não quiser falar mais falar comigo. Mas se puder, ficarei extremamente feliz em trocar correspondências. Saber tudo que se passa aí contigo, como está sendo a experiência como feiticeira...

Realmente acho que não há pessoa que tenha ideia de como foi duro me separar de ti. Só posso te garantir que foi por um bem maior. Saiba, que fiquei muitíssimo feliz quando descobri que também é uma bruxa e que seu tutor é meu irmão. Sempre soube que se algo desse tipo acontecesse nossa distância iria diminuir.

Aproveite a estadia aí, pois acredito com certeza que Jerry está cuidando muito bem da minha princesinha. Responda (se quiser) para o endereço no envelope da carta, nem que seja só para me xingar. Pode ser através de um correio comum. Todas lhe serão entregues através do serviço de entrega mágica, que deixa a correspondência exatamente em baixo do seu travesseiro num estalar de dedos. Mas como desconfio de que ainda não está cadastrada no correio bruxo, não há problema em utilizar o método comum para resposta. Temos nossas maneiras de receber cartas dos não-mágicos.

Beijos do seu pai que te ama muito,

Kelbo Russo“

Foram tantos os sentimentos que Alex teve ao terminar de ler a carta, que nunca saberia nomear a sensação de ter lido aquilo, após anos afastada do pai. Além,claro, de um único telefonema corrido e mal explicado.

Correu imediatamente para a mesa de cabeceira que havia ao lado da cama e começou a escrever uma resposta para Kelbo. O quanto que era próxima dele antes de partir, e a maneira como ele se despediu e se explicou nessa carta, sempre dizendo que tudo que fez era para um bem maior e que a amava muito, faziam-na não sentir a mínima raiva de Kelbo. Além do que, na época em que ele sumira, por ter visto como o casamento de seus pais estava desgastado ela até ficou razoavelmente contente por seu pai ter se libertado de Megan. Mesmo sem vê-lo mais; saber que ele estava mais feliz e que ela nunca mais precisaria assistir às recorrentes brigas dos dois  já era, para si, uma coisa até boa.

No dia seguinte, quando voltou de entregar sua carta em resposta no correio, estava com o humor muito melhor. Tanto que, apesar de ainda meio zangada com Justin, ao lhe encontrar lendo um caderno com suas anotações de feitiços, até lhe pediu emprestado. Óbvio que ele estranhou o súbito interesse por estudos, mas como não estava afim de atrapalhar a onda de bom-humor incomum, acabou emprestando.

Na tarde seguinte, porém, ele entendeu que não era só felicidade repentina a causa daquilo. Alex descaradamente faltou à aula de magia para ir na tal festa de Gigi, impedir que ela zombasse (mais uma vez) da cara de Harper. E logicamente, para também poder dizer “quem estava certa aqui? ”. Para isso ela usou o feitiço de super orelhas, e o da verdade, que estavam entre as anotações de Justin, para poder ouvir tudo que a loira fofocava e fazer ela confessar essas fofocas em público, respectivamente. Alex tentou ao máximo fazer isso tudo escondida mas o fato é que ela tinha realmente muita sorte por não ter revelado seus poderes a nenhuma pessoa comum ainda.

Só que o que ela não contava é que chegaria mais uma carta de seu pai, justamente enquanto estava ausente. Max e Justin estavam na toca, arrumando suas coisas após a aula, quando um papel entrou voando por uma grande janela misteriosa que havia no cômodo, com vista para uma fumaça alva. Os dois se espantaram com aquilo, e tentaram pegar para ver o que era, mas acabaram se esbarrando e deixando o papel continuar voando.

— Ah, que droga! Eu não consegui pegar! - Exclamou Max.

— Que estranho. O que será que era aquilo? – Perguntou Justin com seu jeito questionador.

— Parece um tipo de aviso de outro plano...

— Você está certo! Essa janela deve ser um portal do universo mágico!

— Ah, "quéisso", eu sei que eu sou bom mesmo... Espera, o que você disse?!

— Sim, eu já li a respeito disso em “Os Lugares Mágicos”, um livro de Helena Granger que peguei emprestado com meu padrinho outro dia. Ah, ela é uma mulher muito respeitada entre vários bruxos, por ser a criadora do feitiço Vingardium, que serve para levantar objetos. Queria conhecê-la um dia. Mas, enfim, de acordo com o que diz em seu livro, todas as tocas têm acesso à um lugar secreto no espaço, onde só se pode chegar por meio de magia. É nesse lugar que todos os órgãos de controle mágico se situam. Por esses mesmos portais também é possível se comunicar com outras tocas, trocando mensagem ou até mesmo, conseguindo acessá-las.

— Caramba, eu estava certo! E foi super sem querer... Aliás... Nem sei por que disse aquilo. Papai e mamãe sempre me disseram que eu só era bom com piadas, mas aí está a prova do quanto fui subestimado! — Disse Max com um tom de voz de quem estava se achando. Justin riu, revirando os olhos.

— Bah, o que importa é que descobrimos onde fica nosso portal. Quer dizer... Em todo esse cômodo só há uma janela que dá para uma névoa! Foi burrice minha não ter percebido isso antes. Desde que conheci Alex, eu tenho tido uns comportamentos tão... Ah, esquece. Podemos nos divertir agora.

— Opa, divertir?! Como?

— Vamos mandar uma carta por aí e ver o que acontece! É uma chance de testar como funciona a comunicação entre feiticeiros!

— Já sei o que eu vou escrever! — Comentou Max, com uma cara travessa.