The Unspeakable Rule escrita por bmirror


Capítulo 9
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Eu...não sei nem o que dizer, pessu. HAHAHA acho que mil desculpas? Eu passei por um bloqueio e aí a vida aconteceu e...bom, vocês devem ter ideia. Eu ainda amo vocês aqui dentro ♥



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Capítulo 8

 

Observo James rir olhando para o seu celular, pelo o que deve ser a décima vez só nesse intervalo.

— Do que é que você está rindo tanto, hein? – pergunto, mordendo o meu sanduíche de queijo. Sirius se aproxima da árvore onde estamos e senta-se ao meu lado. Ele solta uma exclamação de felicidade ao ver a outra metade do meu sanduíche e eu lhe dou. Sei que adora o sanduíche de queijo que eu preparo.

— Ah, Lene me mandou um vídeo hilário ontem à noite – James responde, balançando a cabeça. Eles estão trocando mensagens constantemente desde a festa de Sirius, há duas semanas. Eu reviro os olhos com uma careta, mas quando ele levanta a cabeça, finjo que estou só coçando o olho. – Onde está o meu...ei! Você disse que ia me dar a outra metade.

Dou os ombros.

— Sinto muito, você bobeou demais – falo, sem remorso nenhum.

— Se sobrar algo, eu te dou – Sirius sorri com a boca cheia ao meu lado, mas não tem mais nada em suas mãos que pudessem “sobrar”. Eu o empurro com os ombros, mas ele continua sorrindo.

— Eca, não, valeu – James faz um gesto, agradecendo com a mão. Ele se espreguiça com um urro e apoia as costas no tronco.

 Eu levanto a folha com o resumo de geometria e tento voltar a me concentrar. Desde que fui obrigada a terminar com Cassidy em nome de James, ela parou de me passar as respostas de matemática. Então tenho que estudar sozinha uma matéria na qual não entendo lhufas.

— Lily, quer ir até Birmingham esse final de semana? – Sirius pergunta quando finalmente termina de mastigar.

Nós nos acertamos na semana passada, mas sinto que alguma coisa está diferente. Não sei, parece mais mecanizado. Como se ele me chamasse para fazer os programas porque é a coisa certa a se fazer e eu aceite porque também é a coisa certa a se fazer. Me sinto um pouco desconfortável com esse sentimento às vezes, mas não hoje. Hoje dou prioridade às minhas próprias coisas.

— Ih, não dá. James e Remus vão me ajudar a estudar para a prova de segunda feira – Respondo sem tirar os olhos da folha que seguro.

James engasga ao meu lado com aparentemente nada além da própria saliva. Eu e Sirius viramos o rosto em sua direção.

— Eita Lils, desculpa mesmo, esqueci que tínhamos combinado isso – começa, e eu aperto meus olhos em uma fenda, esperando para ver se ele ousaria mesmo dizer que precisa desmarcar. – É que eu e Marlene combinamos de ir até o Camdem Market. Preciso comprar uma alça nova para o meu violão.

Eu o encaro sem piscar, ainda com uma expressão nula. O sinal do fim do intervalo toca, mas nenhum de nós três se move. Sirius tem uma prova de literatura agora que eu sei, mas ele não parece muito preocupado em voltar para a aula.

— É sério que você vai me trocar por uma alça de violão? – Pergunto, com a folha do resumo imóvel na mão.

Ele dá um risinho torto e apoia os braços atrás da cabeça.

— Não me diga que está com ciúmes – diz, com a sobrancelha arrogantemente arqueada.

Faço uma careta.

— Ah, se manca. – E arrumo o cachecol que começa a deslizar do meu pescoço. Acho uma boa oportunidade de não encará-lo nos olhos porque temo que ele vá ver que na verdade estou me sentindo um pouquinho deixada de lado, sim. Mas nem eu mesma me entendo. Não era isso que eu queria?

Sirius se remexe ao meu lado, procurando algo nos bolsos. Eu começo a guardar minhas coisas porque mesmo que eu tenha o horário livre agora, terei uma prova de geografia em duas horas e estou pensando em usar esse tempo para estudar na biblioteca. Aqui fora está muito frio. O dia amanheceu nublado e embora o clima estivesse agradável na semana passada, hoje já está bem mais gelado e com a cara de novembro. Vi na previsão que a temperatura só ia cair até o final do ano, mas não tem previsão de neve tão cedo. Fico triste porque é a coisa que eu mais amo no natal: observar a neve cair.

— Prongs, você tem um... – Sirius me tira dos devaneios. James o olha com a sobrancelha levantada, mas em poucos segundos parece entender o que o amigo iria dizer e nega com a cabeça. – Ah, é. Esqueci que você parou.

Entendo com clareza o que ele queria.

— Você deveria parar também – falo, fazendo uma cara de indiferença. Ele bufa.

Não comece, Lily.

Prefiro não responder. O cachecol desliza novamente pelo meu pescoço e eu deixo-o cair mesmo. James aproveita a chance de mudar de assunto.

— Posso pegar emprestado? Estou começando a ficar com frio.

Eu o encaro. Ele está usando uma camiseta de manga curta e nada além de um colete térmico. Balanço a cabeça em reprovação.

— Você é doido de sair de casa assim. Depois fica doente e não sabe o porquê.

— Tá bom, mãe.

Ele revira os olhos mas joga um sorriso irônico na minha direção. Eu tento controlar, mas acabo sorrindo de volta. Agora que conheço a mãe dele, acho mesmo que pareço um pouco com ela de vez em quando. O que é bom, porque eu gostei muito da Sra. Potter.

Bem, muito mais do que a Sra. Black (quando eu a conheci, ela não quis encostar em mim e passou o resto do dia trancada no quarto).

— Bom, já enrolei demais. Vou fazer a prova que, no caso, não estou nem um pouco preparado. A gente se vê mais tarde, babe? – Sirius se levantou ao meu lado, espanando a calça. Eu concordei com a cabeça e ele abaixou-se um pouco para me beijar rapidamente. Depois saiu em direção ao prédio de tijolos.

Eu suspiro frustrada, olhando para onde ele estava sentado.

— O que foi? – James pergunta, o semblante sério.

Pigarreio para que ele não interprete errado.

— Não vai nevar até janeiro. Não é triste passar o natal sem neve?

Ele relaxa os ombros e joga o corpo para frente.

— Também não gosto muito. Mas como você sabe que não vai nevar?

Eu aponto para o meu celular, jogado em cima de um caderno. James arrepia o cabelo de uma maneira automática.

— Bom, não sei. A gente não pode perder as esperanças, né? – diz, ajeitando os óculos com uma mão. Eu sorrio e cruzo os braços. – Nunca se sabe se rola um milagre de natal, sei lá. Tem quatro semanas ainda para o inverno resolver aparecer de vez.

— Você está falando que nem Remus. – Sorrio, tirando a parte do meu cabelo que prendeu no tronco atrás de mim.

James pisca em minha direção e fecha os olhos, massageando o ossinho do nariz por baixo do óculos. Ele diz que não está com frio, mas andei reparando em uma coisa nesse último ano que convivemos. Suas bochechas ficam bem rosadas quando está com frio, e isso está acontecendo agora. É bonitinho, porque a pele dele é tão clarinha que parece estar sendo pintada de aquarela.

Balanço a cabeça para voltar à realidade. Que coisa mais estranha de se pensar.

— Vou para a biblioteca. Vou tentar entender um pouco de geografia antes da prova.

Ele abre os olhos e se vira em minha direção.

— Vou com você. Não que eu queira te dar moral, mas porra, aqui tá ficando bem frio.

Eu sorrio vitoriosa enquanto me levanto, jogando a bolsa no ombro e estendendo meu braço para ajudá-lo. Quando também está de pé, andamos lentamente e sem vontade nenhuma para dentro da escola.

— Vamos fazer algo hoje à noite?

— Não dá, eu já combinei de... – James começa a falar e eu reviro os olhos.

— ...Sair com Marlene, já sei.

 

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Sirius ainda não tinha terminado a prova que fazia quando eu terminei a minha, então me preparei para voltar sozinha para casa, porque realmente estava sem vontade de ficar lá plantada sem ter o que fazer. Não sei se é TPM ou cheguei no meu limite mesmo, mas a essa altura do semestre, minhas reservas de paciência se esgotam. Preciso prestar atenção para não acabar descontando nos meus amigos, mas cara, essa frustração é difícil de ser contida. Sabe quando você não aguenta nem olhar mais na cara dos colegas? Pois é. Junte isso com professores exigentes e aquela leve pressão de precisar entrar em uma faculdade ano que vem. Toda a minha energia está sendo concentrada em me impedir de virar um soco em alguém. 

— Ei, quer companhia? - Ouço atrás de mim, e me viro para encontrar um menino com olheiras escuras e o cabelo todo desgrenhado.

— Remus! Que cara péssima. O que aconteceu?

Ele me olha com o semblante sério, mas depois solta uma risada fraca.

— Estou gripado. – E antes que eu abra a boca para falar algo, ele continua: – Sim, eu sei. De novo. E não, mãe, eu não dormi com a janela aberta dessa vez. 

Eu sorrio mas levanto uma sobrancelha questionadora. É a segunda vez que me chamam de “mãe” só hoje. 

— Eu não ia dizer isso – minto – Na verdade ia perguntar se você quer tomar um café. Eu tinha que estudar para a prova de segunda, mas estou sem vontade. E eu sou tão chata assim, é?

Remus dá uma risada rouca que logo se emenda em uma tosse. 

— Da onde é que você tirou isso?

— Ah, não sei. Vocês que me chamam de “mãe” o tempo todo. – dou os ombros, evitando encará-lo. 

— Ok...desde quando ser “mãe” é sinônimo de ser “chata”? Minha mãe é muito legal, tá? E a sua também é. E a do Prongs. E a do Pad… Ah espera, não, a lista acaba aqui mesmo. 

Eu tento fazer uma cara séria para dar dramaticidade à nossa discussão, mas não me aguento. Caio na risada. Na verdade, pode ser maldade isso, mas sinto um enorme alívio de saber que eu não sou a única que acha a mãe do Sirius estranha. 

— É, tá bom, me convenceu – falo, empurrando-o com os ombros. Ele vira para o outro lado e dá um espirro. Pego os livros de sua mão para ajudá-lo. – Você não respondeu. Café? Ou melhor, para você acho que seria melhor um chá milagroso. 

Ele concorda com a cabeça.

— Pode ser. Não vou me enganar fingindo que vou estudar o resto da tarde. É melhor que eu desperdice meu tempo com alguém mais inteligente do que eu. 

 

Andamos pouco tempo até chegar no melhor café da Inglaterra. O Madam Puddifoot’s, ou como preferimos chamar, o Puddifoot. Ok, talvez eu esteja exagerando um pouco. Já tomei cafés melhores. Mas ainda assim, o lugar é muito aconchegante. Cheio de sofás e almofadas. E o chocolate quente de lá...esse sim bate qualquer outro. 

Falo para Remus sentar em uma das enormes poltronas perto da enorme janela enquanto vou pedir o nosso café. Ele me obedece sem reclamar, pois vejo que só essa mísera andadinha já o cansou. Remus precisa mesmo cuidar melhor da sua saúde. 

Peço um chá de hortelã para ele e uma caneca (que mais parece um balde) de chocolate quente para mim. Quando estou me virando para ir em direção às poltronas, quase trombo com uma menina loira e com o nariz vermelho, remexendo na própria bolsa laranja. 

— Emme! Você está aqui! – falo animada – E está terrível. Tá tudo bem?

Ela levanta a cabeça com um olhar meio desfocado e me reconhece. Vejo que o que estava procurando em sua bolsa era um lenço, porque logo o leva ao nariz. 

— Ah, oi Lils. Dão estou dada bem. Acho que tô gripada.

— Bom, pois eu tenho certeza. Até parece o… – olho atrás dela para Remus, ainda sentado na poltrona, olhando para a janela com a maior cara de doente. – Ah…! Agora entendi. 

Ela acompanha meu olhar e balança a cabeça. Percebo que também não nega nada. Chega sua vez no caixa e ela pede a mesma coisa que pedi para Remus: um chá de hortelã. Eu dou um sorriso sarcástico. Já liguei os pontos. 

— Venha, sente-se com a gente. – chamo.

Emme paga o seu pedido e caminha atrás de mim arrastando os pés. Eu ofereço a caneca a Remus e depois sento de uma maneira brusca na poltrona à sua frente.

— Valeu, Lils – Ele agradece e coça o nariz. Depois levanta a cabeça lentamente e engasga em seu chá – Emmeline! Não sabia que estava aqui. 

— Oi Rem – ela diz apertando seu ombro. Eu levanto minhas sobrancelhas ao ouvir o apelido e escondo a risada atrás do meu chocolate quente. Essa não é a hora de deixá-los constrangidos, mas esse momento vai chegar. Ah, se vai. – Vocês dão deveriam estar estudando? 

Nem eu, nem Lupin queremos responder essa pergunta, então só dispersamos com um aceno de mão. Eu mudo de assunto para não ficar nervosa pensando no que eu ainda teria que estudar chegando em casa.

— Vocês viram que não tem previsão de neve até o próximo janeiro?

— Isso é ruim? 

— Claro que é ruim, Emme – me defendo, afundando nas almofadas fofas – A beleza dessa época do ano é abrir a janela de manhãzinha e ver aquela neve lisinha no jardim...sem nenhuma pegada...os galhos de árvore com estalactites recém-formados… E aí colocar uma luva quentinha e um gorro e sair para uma caminhada, os pés afundando naquela superfície macia...

Sou interrompida com uma risada nasalada que reconheço ser de Remus. 

— Caramba, eu não sabia que você gostava tanto do inverno assim. Sei lá, eu nunca pensei muito na neve. Mas eu gosto da ideia de um “Natal Branco”, como naquela música do Bing Crosby. “I’m dreaming of a white Christmas…”

— Isso. É exatamente isso que imagino quando penso no natal. – Sorrio satisfeita. Dou mais um gole no chocolate quente, e caramba, como isso é bom. Tenho pena de quem passa a vida inteira sem descobrir a maravilha que é o chocolate quente do Puddifoot. 

— Eu dunca  liguei para deve— Emmeline dá os ombros. – Da verdade, acho que às vezes até atrapalha um pouco. Ter que limpar a calçada o tempo todo, e dão poder sair de casa…

Fecho a cara.

— Emmeline, se não vai concordar comigo pode ir sentar em outra mesa. 

Ela ri e os dois se encaram com cumplicidade. Eu balanço a cabeça e olho para a janela. A única coisa que eu não gosto do inverno é que escurece muito cedo. Na verdade ainda estamos no outono, mas lá fora já está ficando escuro cada vez mais rápido. 

Meu celular vibra no meu colo e eu viro a tela para ver se é alguém importante me mandando alguma mensagem. Mas é só a operadora me avisando que meu saldo está acabando. 

Suspiro e Emme olha para mim com o lenço pressionado no nariz mais uma vez. 

— Onde está Lede? Dão a vejo desde a festa do Sirius. 

Dou os ombros. 

— Eu também não. Quer dizer, eu a vi outro dia, mas só porque nos encontramos na rua. Ela só tem saído com…

— Ah sim, com o Prongs. Ele me falou.

Arqueio uma das sobrancelhas. 

— É mesmo? E o que ele tem falado da Lene? – Pergunto, mesmo sabendo que é um tiro no escuro. Esses meninos têm um código de silêncio que chega a dar nos nervos. 

Remus dá um gole dolorosamente demorado. Acho que é de propósito.

— Nada de mais – diz, limpando a boca na manga do casaco. Tenho certeza que vi um sorrisinho debochado ali. – Ele só disse que ela é uma boa companhia. Acho que você acertou nessa.

Sorrio sem mostrar os dentes e acabo suspirando novamente (dessa vez foi inconscientemente). Levo minha caneca aos lábios, mas não chego a beber. 

— Pois é né. Sou boa nessas coisas. 

Remus se mexe no lugar e Emme cobre o rosto para espirrar. Eles estão realmente péssimos. 

— Bom, e onde está Sirius? Ele gostou da festa, afidal? – Ela pergunta depois de se recuperar.

Eu paro por alguns nano segundos para notar que não tinha pensado em Sirius até agora. O dia todo tenho martelado na minha cabeça que estou sendo trocada pelos meus melhores amigos mas não pensei minimamente onde estaria meu namorado. James tem razão. Estou começando a ficar obcecada em cuidar da vida dos outros. 

— Ahn, gostou sim. Ele disse que não queria festa, mas no final curtiu pra caramba. 

Remus concorda com a cabeça. 

— Ah, essa coisa dele não gostar de festa é balela. Ele sempre curtiu, só gosta de parecer durão e misterioso. Mas é o primeiro a sair dançando quando tem álcool e música – ele solta uma risada, mas só Emmeline o acompanha. Eu realmente não sabia disso. Mas de qualquer maneira, não estamos nem a um ano juntos. Esse foi o primeiro aniversário dele que eu presenciei. Eu não teria como saber, não é mesmo?

— Por que ele simplesmente não admite que gosta de festas? Isso de ficar fazendo um personagem é tão…

Eu ia dizer “chato” mas o olhar atento do Lupin me faz recuar. Acho que ele não ia gostar de ouvir a namorada do amigo chamando-o de chato. 

— ...complexo, sabe? Difícil acompanhar. 

— Sim. – Concorda sem muita convicção. Não sei se ele realmente pensa assim, talvez já esteja acostumado com o amigo. Remus tem essa aura que parece que ele sempre sabe um ponto a mais do que conta para os outros. Não sei, parece que ele já descobriu o sentido da vida e quer que os outros descubram por si mesmos. 

Eu não sei nem o que vou fazer na faculdade, quiçá saber qual é o sentido da vida. Todo mundo parece tão tranquilo com o futuro. Quer dizer, Remus vai ser professor, diz isso desde que eu o conheci. James nunca me contou o que quer estudar, mas não aparenta estar tão preocupado com isso. Agora, Sirius… Ele parece que não quer crescer. Às vezes me pergunto se vai mal nas provas de propósito, para ficar um ano a mais na escola. 

Balanço a cabeça. Que coisa terrível de se pensar de alguém! Devo estar mesmo de TPM, porque ultimamente estou muito impaciente com o meu namorado. Coitado, ele não merece isso. 

O café começa a ficar menos barulhento, o que é sinal de que daqui a pouco eles vão fechar. Levanto a cabeça para informar os outros dois disso, mas percebo que eles engataram numa conversa animada entre uma tosse e outra. Eu não vou perder nada se ficar quieta por um tempo. Acho que preciso refletir mesmo. 

Então eu deixo eles conversarem em paz e saboreio meu chocolate quente até a última gota. 

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No dia seguinte, minha cabeça parece que vai entrar em erupção de tanto estudar para a prova final de História que tenho na próxima semana. Remus geralmente me ajuda nessa matéria, mas mandei uma mensagem há mais de duas horas para ele e ainda não me respondeu. Eu perdôo porque do jeito que ele estava acabado ontem... Resolvo dar um tempo dos livros e entro no computador para me distrair.

Mesmo tendo passado mais de duas semanas do aniversário de Sirius, as pessoas ainda estão postando fotos. Foi uma festa boa para todo mundo e me sinto incrivelmente orgulhosa por ter sido uma das responsáveis. Dou um sorriso enquanto aperto o botão de “curtir”  em uma foto que Dorcas postou há poucos minutos. Eu estou com uma cara absurda de bêbada, mas pelo menos estou claramente me divertindo.

Vou descendo a tela sem prestar muita atenção, até passar o olho por uma coisa que me interessa muito. A imagem de um pequeno Paul McCartney me encara na frente de um palco cheio de gente. Só pode significar uma coisa. Vai ter uma sinfonia em homenagem aos Beatles no próximo sábado e solto uma exclamação de felicidade – já vi vídeos dessa orquestra e sempre morri de vontade de ir!

Não acredito que eles estão na cidade bem nesse próximo final de semana. Queria ter tido um pouco mais de aviso para me preparar (até porque não tenho certeza se vou ter passado em todas as minhas provas do semestre e posso acabar precisando fazer a reposição de nota), mas vamos ser sinceros? É a primeira vez que não consigo me importar muito. Não posso perder essa oportunidade.

Pego meu celular e ligo para Lene uma, duas, três vezes. Queria perguntar se ela iria comigo comprar os ingressos. Queria muito que ela fosse comigo, mas sei que não assistiria a orquestra porque detesta música clássica. E eu já a obriguei a fazer tanta coisa comigo… eu deveria dar um descanso. 

Tento ligar para Sirius, mas ele também não atende de primeira. Reviro os olhos e olhando para a tela do computador, tenho uma ideia. Decido chamar as meninas da rua para irmos ao shopping porque sinto que não saímos o suficiente.

Como sempre, Dorcas  me atende no segundo toque. Ela está sempre com o celular na mão.

— Quem quer me acompanhar na bilheteria do shopping para comprar ingressos de uma orquestra? – pergunto melodicamente, tentando transformar o programa em uma coisa atraente.

— Fala sério, Evans – ela responde com uma risada descrente.

— Podemos tomar Frozen Yogurt também – Completo, sabendo que ela não recusaria. E estou certa, Dorkie faz um barulho de animação e diz que vai avisar as meninas para nos encontrar. 

Pego minha bolsa e vou andando mesmo. O shopping fica perto de casa, não mais que dez minutos de caminhada. Pouco depois, aceno para Dorcas e Mary que andam em minha direção, uma ao lado da outra no corredor iluminado. Dorcas tira o óculos escuros do rosto para me cumprimentar.

— Onde está Sirius? – pergunta, afastando-se para Mary me dar um beijo na bochecha.

Dou os ombros distraidamente e falo que não sei onde ele está.

— Bom, eu estava com a esperança de que você estaria com ele – ela funga em minha direção – e que ele estaria com aquele amigo bonitão. James.

Rio, entendendo sua frustração.

— Foi mal, Dorkie. Também não faço ideia de onde James esteja. – Continuo em um tom mais baixo: – Provavelmente está com Lene em algum lugar.

Mary inspira ruidosamente. Sua boca se abre num sorriso antes de falar com um tom afetado, como se isso fosse a informação mais relevante do século.

— Mentira, que babado é esse? – Ela é a única pessoa que conheço que ainda fala “babado”. – Então deu certo na festa mesmo?

— Quando perguntei, Lene desconversou total – Dorcas dá os ombros. – Ela disse que eles só conversaram, mas não sei. Não comprei muito.

— Exato – falo, voltando a andar ao lado delas. Vamos passando as vitrines que já estão decoradas para o natal. Sempre preferi olhar vitrines do que entrar na loja. É um programa muito mais legal – Ela não disse sim e nem disse não. Mas conheço ela. E conheço James. Eles estão escondendo algo, com certeza.

Dorcas solta um muxoxo ao meu lado, enganchando o braço no meu.

— Perdi a minha chance, droga.

Vamos passeando meio sem rumo, rindo de tudo e falando basicamente sobre garotos. Sinto um pouco de falta disso porque ultimamente só tenho andado com meninos. E bem, Lene nunca ligou muito para esse tipo de papo. Subimos as escadas rolantes, bisbilhotamos as lojas em liquidação e paramos para comprar o yogurt que prometi. Emmeline nos encontra na praça de alimentação, com o mesmo cachecol que usava antes, e embora sua aparência esteja muito melhor do que estava ontem, ainda dá pra perceber que ela ficou derrubada com essa gripe. Mas ela sorri e é como se não ligasse de estar doente. Continuamos nossas conversas banais por um tempo, consigo fazer Mary confessar que acha nosso colega Amos bonitinho e sou obrigada a ouvir detalhes que não pedi do último encontro de Dorkie com um cara que conheceu num desses aplicativos.  

Quando finalmente chego ao quiosque que é a bilheteria, o assunto já mudou para o nosso futuro. Parece que ultimamente estou caçando mais problemas para lidar, porque não consigo parar de pensar no que vai ser do próximo ano. Dorcas e Mary estão no último ano e querem entrar para a Faculdade de Direito de Oxford. As duas fazem um cursinho complementar de tarde que está levando-as à loucura.

— Não sei direito o que quero fazer – falo, batendo com a colher de plástico nos lábios. Elas parecem tão certas do que querem à tanto tempo que começo até a me sentir mal por não saber o  que quero.

Binha conselheira profissional diz que o primeiro passo é explorar seu talento datural— Emme diz, afastando os cabelos dourados do ombro com uma das mãos. Sua voz ainda está muito fanha.

Franzo o nariz.

— Acho que não tenho nenhum talento natural.

— Claro que tem. Você é comunicativa – Mary intervém. Dorcas concorda com a cabeça.

— Determinada.

— E sabe dar ordens como dinguém— Emmeline pisca em minha direção.

Dou uma risada honesta, olhando para as três. Elas se divertem com a ideia de me ver mandando em todo mundo, mas talvez isso realmente seja um talento oculto que eu tenha. 

— Então...Negócios, talvez?

Dorcas coça o queixo teatralmente.

— Ou pode tentar Direito, conosco. Você se daria bem.

Humm, não sei. Talvez elas estejam certas. Abro a boca para responder, mas minha vez no caixa chegou, então abano a cabeça e peço os dois ingressos com uma voz mais animada do que gostaria de transparecer.

 

 

Algumas horas depois, volto para casa e guardo meus ingressos muito bem guardados na gaveta do meu criado-mudo. Tento falar com Sirius mais uma vez, mas vai direto para a caixa postal. Então decido que é hora de parar de enrolar, abro meus livros novamente e tento estudar mais um pouco.

Estou tentando decorar a dinastia Tudor quando meu celular toca no último volume, me dando o maior susto do mundo. Ponho a mão no coração para sentir as batidas rápidas enquanto atendo.

— Oi – falo, ouvindo um barulho alto de música do outro lado da linha – Sirius. Tá me ouvindo?

— Oi babe— a voz dele se sobrepõe – Você me ligou? Tinha um monte de ligação perdida aqui.

— Liguei. Onde você está?

— Eu e os meninos viemos dar uma volta no centro. Você está no viva-voz.

Ouço Remus, James e Peter dizerem “oooi Lily” e sorrio.

— Oi, pessoal. Vocês não deveriam estar estudando, não?

Alguém resmunga e tenho certeza que é Peter. Sirius ri.

— Não estava planejando fazer isso até amanhã. Por quê, vai me dizer que você está estudando no momento...?

Dou uma engasgada antes de responder.

— Bem, falando assim parece que não tenho vida social nenhuma.

Eles riem do outro lado.

— Pois saibam que eu acabei de voltar do shopping. – Me defendo – fui comprar uma coisa com minhas amigas. Acho que um de vocês está beeem familiarizado com uma delas. Ela se chama Emmeline.

Remus começa a tossir desconfortavelmente na linha e eu rio sentindo o doce sabor da vitória. Acho que ele não contou pra eles que tomamos café juntos ontem. Eu fui embora bem antes deles se mexerem das poltronas, então não tenho ideia do que aconteceu depois que eu saí. 

— Que legal, babe. Comprou o que?

— Ah, sim. Era o que eu queria te contar. Comprei ingressos para nós de uma sinfonia em homenagem aos Beatles na semana que vem. Demais, não acha?

Ouço simultaneamente um barulho que parece um rosnado de frustração e alguém engolir o ar com animação, mas conheço Sirius a tempo suficiente para saber que esse último barulho não tem nada a ver com a voz dele.

Você está de brincadeira — acho que James aproxima o rosto do telefone, porque sua voz fica bem mais alta – Qual é a orquestra? Meu pai me levou em uma quando eu tinha seis anos e foi a coisa mais legal da minha vida. Eu preciso levar ele nessa também.

— Que gracinha. E incrivelmente nerd— brinco, sorrindo para meu próprio reflexo na janela. – É a Orquestra Regional de Manchester. Eu comprei hoje, no shopping. Talvez se você correr ainda consiga também. Mas viu, vê se compra lugares bem longes do meu porque não sei se conseguiria beijar Sirius na frente do seu pai.

— Você não vai nem perceber que estamos lá – ele responde com uma risada. Depois continua para Sirius: – Vire aqui. Você vai ter que me levar no shopping imediatamente.

Ele responde fora do alcance da ligação com um “ah, cara, agora?” e James deve ter feito uma cara muito convincente porque depois ele diz “ok”.

 – Bom, Evans, vou levar esse infeliz no shopping e depois passo aí. A gente vai se falando.

— Ok. Tchau – respondo, tirando o celular do ouvido depois de ouvir o estalo de final da chamada.

Volto a olhar para o meu livro, tentando lembrar quem veio depois de Henrique VIII, mas é analisando uma gravura de um homem careca, baixinho e gordo que percebo que a reação de Sirius não foi exatamente a que eu esperava. Fiquei focada na de James e esqueci de perguntar ao meu namorado o que exatamente ele tinha pensado sobre isso. Eu deveria ter percebido que essa foi a primeira pulguinha que surgiu atrás da minha orelha.

Talvez eu devesse me preparar para ter que convencê-lo.  

 

 

Estou pintando as unhas enquanto navego em um site para descobrir minha vocação (até agora já tive dois resultados para a carreira de direito e um para a carreira educacional – o que acho bem interessante para ser honesta) quando eles voltam a dar notícias, tocando a minha campainha incessantemente.

EU NÃO CONSEGUI COMPRAR ESSAS PORCARIAS— James passa pela minha porta, meio se jogando para dentro da casa, meio se desmanchando no chão. – Eu não acredito. A mulher na minha frente comprou o último ingresso. Lily me vende os seus, eu imploro.

— Nos seus sonhos – respondo com um sorriso de pena. 

Sirius abaixa o rosto para me cumprimentar e revira os olhos com um sorriso.

— Qual é cara, já falei que pode ir no meu lugar – ele ri, passando por mim e se jogando no sofá verde puído.

Viro a cabeça em sua direção rapidamente, o que faz o meu cabelo ricochetear no meu rosto. Sirius levanta os olhos com uma expressão curiosa.

— Como assim? – pergunto, cruzando os braços. Essa é a confirmação que eu precisava – Você por acaso não quer ir?

Ele bufa teatralmente.

— Ah, não comece, por favor. Eu não disse isso. Foi uma brincadeira. 

Remus para de andar na metade do caminho. Acho que queria sentar ao lado do amigo no sofá mas percebe que não deve ser uma boa ideia no momento e resolve ajudar James a se levantar.

— Bom, na verdade disse sim. Disse “pode ir no meu lugar”. E não pareceu estar brincando.

Ele me encara sem piscar e por um segundo acho que vai dizer uma coisa completamente diferente, tentando apaziguar a discussão iminente, mas apenas responde:

— É só que não gosto muito de música clássica.

James faz um barulho de indignação completamente exagerado e aponta para Sirius.

Como você se atreve a rebaixar “Beatles: Alive” a uma simples “música clássica”?

— Ah, sei lá, cara. Você entendeu. – ele fala impaciente. Estou tão frustrada por essa reação que sinto um negócio dentro de mim crescendo sem controle. Me seguro para não chorar porque isso seria humilhante. Estou exagerando? Talvez. Deve ser a TPM falando mais alto de novo. Mas é pedir muito que seu namorado queira te acompanhar num programa que você está louca para ir?  – Enfim, se quiser muito ir, nós vamos.

Sinceramente, estou bem cansada de ter que ficar convencendo Sirius a ceder e fazer os programas que eu quero. Perdi as contas de quantas vezes fui vê-lo competir naquele parque de skate. E mesmo quando estou morrendo de vontade de ficar em casa e ele quer ir para algum bar só pra gente ter onde se agarrar, eu vou. 

Sinto uma vontade louca que não sei reconhecer se é de chorar ou dar um soco bem dado na cara do Black. Acho que essa é a prova de que não estamos tão resolvidos da última discussão afinal, porque eu geralmente sou mais tolerante quando ele encrenca com alguma coisa. Mas hoje tudo parece a gota d’água. 

Pigarreio antes de continuar para ver se as coisas melhoram um pouco aqui dentro. Estou respirando com tanta força que sinto minhas narinas se expandirem. Devo estar com uma cara assustadora. Me viro para o garoto ao meu lado que agora ajeita os óculos no rosto com um olhar assustado.

— Potter, pode ficar com os ingressos. Provavelmente vocês vão aproveitar mais, mesmo. – Não o olho nos olhos, e muito menos a Sirius. James arrepia o cabelo sem saber muito o que responder.

— Ah, pelo amor de Deus, Evans eu não...— Sirius começa, evidenciando que ele está tão impaciente quanto eu. 

— Eu...quer dizer, eu iria e...Lils...– James balbucia entre nós dois. 

— Ótimo. – Corto, querendo subitamente que eles saiam da minha casa o quanto antes. 

Subo as escadas de dois em dois degraus sentindo o meu rosto pegar fogo de raiva. Vou ajoelhar ao lado do meu criado-mudo, mas estou me movendo com tanta brutalidade que parece que posso destruir todos os móveis só com um peteleco. Meu olhar recai sobre o porta retrato com a foto de Sirius e por um impulso meio levado ao ódio o derrubo no chão com um gesto. Sinto meus olhos lacrimejarem. É de raiva, tenho certeza. Tento abrir a gaveta meio sem jeito e ela não cede. 

— Merda...de...gaveta - reclamo entredentes, chacoalhando-a. Puxo com um safanão e ela desemperra, mas ouço um “creck” e tenho certeza que quebrei algo. O envelope com os ingressos está bem em cima, como tinha deixado há apenas algumas horas. 

Minha intenção era levar o envelope lá embaixo e jogar de uma maneira triunfal e dramática, mas mudo de ideia porque não quero que ninguém me veja chorando por um motivo idiota como esse. Então deito rapidamente na cama, enfio a cara no travesseiro e grito o mais alto que consigo. 

Alguém abre a porta do meu quarto, mas não levanto a cabeça para ver quem é. 

Não sei quanto tempo fiquei gritando sozinha, nem se a pessoa que entrou no meu quarto escutou tudo. Mas quando alguém acende a luz, me viro para olhar e me deparo com Petúnia me encarando do batente. 

— Eu...hum, seus amigos foram embora. – Ela diz, com uma feição visivelmente desconfortável. Geralmente ela escolhe esses meus momentos de vulnerabilidade para implicar comigo, mas hoje devo estar parecendo uma louca, porque seu olhar é de preocupação. 

— Ok, obrigada – fungo, tentando retomar uma feição mais normal

— Aquele Black disse que te liga quando você se acalmar

Eu pisco sentindo os cílios molhados batendo uns nos outros. Quem ele pensa que é para falar uma coisa dessas?

— Eu vou matar ele. 

Petúnia ri, mas estou realmente irritada. 

— Não sei o que você vê nele – Bom, está aí a provocação que eu estava esperando. Mas não tô nem aí. Minha impaciência está direcionada a Sirius que não consegue nem respeitar meu momento de raiva. 

— Olha, honestamente, hoje eu também não sei te responder isso. 

Ela dá os ombros e sai do meu quarto, deixando a luz acesa. Eu enfio a cara embaixo do travesseiro e grito mais um pouco. 

 




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Notas finais do capítulo

Não desistam de mim! ~♥



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