Redenção escrita por mjonir


Capítulo 23
A deusa e o dragão




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 O vapor da neve sendo derretida rapidamente dificultava nosso caminho, assim como a escuridão da floresta de gelo. Meu coração batendo descompassado. Loki ao meu encalço me fazendo correr mais rápido. O barulho de patas pesadas no chão causando arrepios de pavor em meu corpo.

A floresta escura não parecia ter fim. Ficava cada vez mais difícil de correr por culpa da camada grossa de neve que insistia em levar meus pés para baixo, e apesar do frio o suor escorria por minha face. Meus pulmões pedindo clemência, contudo, a criatura ainda cuspia fogo derretendo mais neve, e jogando vapor quente em nosso rosto.

Olhei para trás tentando achar Loki na escuridão. Sua ausência fez meu medo ficar maior ainda. Parei de correr e puxei Sann da bainha me mantendo na postura de ataque. Se aquele dragão maldito viesse me atacar eu iria dar um jeito de me defender, mesmo que morresse tentando.

O fogo que o dragão cuspia deixava a floresta escura, por alguns minutos, um pouco mais clara. Observei uma pequena árvore com o tronco grosso cheia de gelo, corri para trás dela e me escondi ali. As patas pesadas do dragão batiam no chão fofo cheio de neve, a respiração alta me dizia que ele estava cada vez mais perto, e Loki onde estaria?

De repente um barulho ensurdecedor fez minha cabeça girar. Olhei em volta, e as árvores pegavam fogo, ele havia me encontrado. Levantei de onde havia sentado e me pus a fugir rapidamente. Um urro de dor saiu por meus lábios ao sentir minha panturrilha esquerda queimar, um galho fumegante havia encostado lá e queimou minha pele. Mas não podia parar de correr.

Outro grito de dor. Cai no chão em cima da neve, meu ombro fora queimado por outro galho fumegante que caiu das árvores. Sann foi parar alguns metros a frente de mim me deixando desesperada, coloquei as mãos no chão me apoiando para tentar levantar. Olhei para trás em desespero. O animal enorme e preto, cheio de escamas com o olhar sanguinário dirigido a mim. 

— Vamos! - Gritei para mim mesma tentando levantar. 

O barulho do dragão se aproximando me deixou desesperada, forcei meus braços para levantar, mas caí de cara na neve com uma dor dilacerante em meu ombro. Lágrimas involuntárias saltaram de meus olhos. Será que é assim que tudo iria terminar? 

Quando havia perdido minhas esperanças, e achava que não poderia ficar pior a neve da copa das árvores começou a cair fazendo uma pequena avalanche juntamente com os troncos que caíam pelas chamas. Eu deveria me levantar e correr, mas minhas forças estavam esgotadas de tanto correr. A cena mais parecia de filmes medievais em que o dragão corria enquanto o caos atrás dele fazia um contraste com o que estava por vir. As queimaduras em minha pele ardiam continuamente, o som da neve caindo e o dragão correndo para me dilacerar embaralhou meus pensamentos, meus ossos viraram gelatina e eu só consegui abaixar a cabeça e fazer uma prece muda para que algo me tirasse dali.

O dragão deu um rugido de dor mais alto que o barulho da pequena avalanche fazendo com que meus olhos se abrissem em desespero. 

''Eu não posso desistir, tem algo de especial em mim.''

Minha mente sussurrou me trazendo forças de onde achava não possuir. Meu ombro e panturrilha anestesiaram-se por algum tempo e eu consegui me levantar somente para ver o dragão rugindo enquanto um Loki enfiava a espada dourada em sua cauda. O outro Loki manipulava toda aquela cena atrás de uma árvore grande, o conhecido sorriso malicioso nos lábios como se estivesse se divertindo com o caos.

Levantei-me mancando, mas sentindo uma inundação de força correndo pelas minhas veias, me apressei e peguei Sann virando para tentar atacar o dragão que grunhia de raiva com tantos Loki's ao seu redor o confundindo, quase ri daquela cena, quase.

— O que está fazendo? Volte agora! - Loki gritou para mim, mas eu não o ouvi indo em direção ao dragão.

Eu não sabia o que estava fazendo. Meu corpo me guiava como se tivesse algo dentro de mim, a força comandava meus sentidos e meus membros. A névoa gelada e conhecida de Loki me surpreendeu e algo pesado tomou minha cabeça, assim como meus braços, pernas e tronco. Ele havia me revestido com uma armadura pequena e dourada que cabia perfeitamente em meu corpo.

Rodei Sann em minhas mãos e observei do dragão enquanto os outros Loki's ainda o confundiam. Ndhogg grunhia e soltava fogo pela enorme boca, mas quando atingia as ilusões de Loki não aconteciam nada. Definitivamente precisava de um plano. 

Olhei para cima e observei uma árvore com uma copa enorme cheia de neve. Uma ideia quase impossível tomou minha mente e corri de encontro com a árvore com um sorriso malicioso no rosto. Se a força maciça que tomava meus braços fosse real e não somente a adrenalina me guiando, talvez desse certo.

— Loki! - Gritei trazendo sua atenção para mim - Continue o que está fazendo, crie mais ilusões para que Ndhogg fique em cima de toda essa neve que caiu.

Ele me olhou de forma confusa, apenas assenti para que ele continuasse com aquilo. Suas ilusões passaram correndo para que Ndhogg o seguisse, e assim o dragão fez me deixando satisfeita. Enquanto todos Loki’s passavam por mim,olhavam-me e piscavam sedutoramente, revirei os olhos e comecei a bater com a espada dourada no tronco grosso. A força fluía de meus braços naturalmente, os cortes foram ficando mais profundos, porém minha respiração se tornava ofegante.

Quando Loki entendeu o que eu queria fazer ele veio até mim. O dragão estava no lugar certo tentando nos encontrar em meio à escuridão com as ilusões em seu encalço o confundindo. Ndhogg cuspiu fogo, mais galhos fumegantes caíram. Loki soltou um urro de dor me deixando preocupada. Soltei Sann e coloquei as mãos em seu rosto.

— Onde foi? - Gritei para ele.

— Vamos empurrar essa árvore logo antes que Ndhogg saia do lugar. - Ele disse com a voz cheia de dor.

O ódio que me consumiu para com aquele dragão me fez soltar Loki e empurrar a árvore com toda a força que fluía dentro de mim. Ndhogg continuava incendiando a floresta para nos encontrar, mesmo assim não recuamos. Loki juntamente comigo empunhou toda sua força deixando os olhos esverdeados num tom carmesim, sua pele começando a mostrar os traços Jotun pela extrema força que exercia.

Empurramos o tronco com o máximo de força que possuíamos. Meu ombro voltando a arder assim como a panturrilha, mesmo assim tentei esconder a dor dentro de mim para que depois me preocupasse com isso, não nesse momento tão decisivo.

Quando a árvore finalmente caiu, foi como se uma nevasca tivesse tomado Niflheim, flocos de neve caíram impedindo nossa visão. O baque do tronco nas costas de Ndhogg me fez pular de susto assim como seu urro de dor, Loki puxou minha mão para que saíssemos de trás das árvores e víssemos o que o nosso trabalho tinha feito.

Fiquei feliz por ver que o dragão estava inconsciente, mas para nossa surpresa, ainda vivo. O cansaço e a dor começaram novamente tentando me empurrar para a sonolência, lutei contra isso tentando tirar o peso de minha cabeça, puxei o objeto esquisito libertando meus cabelos e o segurei na minha frente para observar. O elmo de Loki. Ele havia me revestido com uma armadura dourada e colocado em mim seu elmo. 

O asgardiano não olhava pra mim no momento, e sim para Ndhogg, um pequeno sorriso de satisfação pintava seu rosto fazendo com que uma chama ardesse em mim, eu preferia aquele rosto a todos os retratos dos nove reinos da Yggdrasil.

Loki voltou seus olhos para mim enquanto eu o observava descaradamente, sua mão quente ainda segurando a minha, e o leve sorriso vitorioso que chegavam aos olhos. Seus lábios rosados e a pele branca contrastavam com a cor dos olhos e dos cabelos, como se ele fizesse parte do cenário escuro e cheio de gelo. Como se fosse meu inverno particular.

Muitas pessoas usam o fogo para explicar o desejo ou até mesmo a paixão, mas naquele momento perdida em seus olhos, arrisquei afirmar que o gelo é a única chama que fazia tanto meu coração quanto meu corpo queimar por dentro ao ver toda a sua majestosa beleza. 

— Nós precisamos encontrar Freyja antes que Ndhogg acorde. - Disse me fazendo voltar aos poucos da galáxia em que eu estava só de olhar para ele.

Assenti para ele lhe entregando o elmo dourado. Loki pegou de minhas mãos e o fez desaparecer. 

Enquanto andávamos pela floresta escura, a queimadura em minha panturrilha me beliscava sem misericórdia me fazendo ver pontos negros pelo caminho, tentei manter a atenção somente nas costas curvilíneas de Loki para não acabar me deixando levar pelas ilusões de Niflheim. 

Um barulho de água caindo como uma cachoeira atraiu minha atenção, andei mais rápido até lá, mas Loki não me seguiu, seu olhar preso numa parte cheia de árvores e enevoada. Meu sangue gelou nas veias, será que ele estaria tendo alucinações?

Aproximei-me dele colocando as mãos em seu rosto, sua atenção não se voltou para mim. As faces coradas suavam como se estivesse com febre. Nos olhos uma centelha de medo e ódio.

— Loki - Sussurrei para ele -, olhe para mim. - Puxei sua face para que voltasse a atenção em mim.

Consegui que ele se virasse para mim, mas seus olhos não deixavam a parte escura da floresta. 

— Não é real. - Sussurrei

Ele me empurrou para o chão fortemente soltei um grunhir com o baque dolorido em minhas costas, ele puxou a espada da bainha e apontou para meu peito. Arregalei os olhos de medo.

— Loki! - Gritei para ele.

Desembainhei Sann e me arrastei na neve tentando me levantar.

— Não vai tirar isso de mim. - Ele sussurrou fazendo os pelos de minha nuca se eriçar. 

Sua espada desceu de encontro a minha. Soltei um grito de desespero. Tentei defender-me da maneira que podia, meu ombro protestou. Levantei em um pulo, os olhos dele possuíam ódio e dor, eu precisava fazer com que ele voltasse a si antes que me matasse. 

O brandir de nossas espadas me amedrontava. Até quando eu suportaria seus golpes? Acabaria sendo morta pelas mãos dele? Loki gritava palavras nórdicas que eu desconhecia, mas que arrepiavam os pelos de meus braços. Ele quase retirou a espada de minhas mãos, mas segurei firmemente embaixo para que Sann não voasse e me deixasse sem proteção alguma, definitivamente um escudo me auxiliaria. 

Ele se aproximou de mim e empurrou Sann. Chutei sua perna da maneira mais forte possível, ele se curvou um pouco, mas ignorou a dor. Pressionei sua espada com a minha, e infelizmente ela escorregou de suas mãos juntamente com a minha. Ele as observou no chão, e quando levantou os olhos para mim, achei que tinha me reconhecido, mas não. Sua mão me esbofeteou no rosto, tentei me equilibrar e graças aos treinos consegui, só sabia que não aguentaria uma luta corpo a corpo com ele por muito tempo. 

Loki chutou minha perna me fazendo cair no chão, sem piedade suas mãos puxaram meu cabelo. Soltei um grito desesperado de dor e comecei a me debater tentando proteger meu rosto. Desferi alguns socos em seu rosto.

O sangue escorria por meus lábios, tamanha a força que Loki colocou ao desferir em mim um tapa, eu sabia que ele estava em uma alucinação, mas não deixei de me enfurecer com isso. A partir do momento em que minha raiva crescia a força ficava mais forte e fluía por meus membros. Loki tentou pegar meu braço, mas desviei lhe desferindo um chute, ele cambaleou, todavia ao ver que havia revidado se irou.

Dessa vez conseguiu segurar em meus braços apertando-os com toda a força, minha cabeça apoiada na neve enquanto ele jogava o peso e a ira em cima de mim, tentei me desvencilhar de suas mãos em desespero. Seu rosto perto do meu, o ódio em seus olhos.

— Pare! - Grunhi.

Loki socou meu estômago me deixando sem ar e zonza. Tentei envolver minhas pernas em seu pescoço a fim de deixa-lo sem ar, mas seus braços ágeis me puxaram para cima deixando-me de joelhos na neve. Eu só poderia trazer sua sanidade de volta se conseguisse desnorteá-lo, bater em sua cabeça com algo. Sann estava longe.

Bati em sua cabeça com a minha o mais forte possível, seus braços me soltaram e eu caí no chão. Meu sangue pintou a neve no chão, rastejei para me levantar, a tontura fazendo com que eu cambaleasse. Avistei a poucos metros uma árvore. A figura de uma mulher loira amarrada. Freyja. 

Loki estava no chão com o rosto sobre a neve, resmungava palavras inaudíveis, seus olhos se voltaram novamente para a floresta. Juntei minhas forças e me levantei mordendo a língua para evitar que meu grito chamasse a atenção dele. Cambaleei e me segurei no tronco mais próximo, com uma das mãos pressionei meu supercilio que sangrava. 

O asgardiano não me seguia. Freyja me avistou, os olhos em desespero, ela começou a sacudir os braços franzinos. Grandes grilhões a aprisionando. A água gelada caía como uma cascata. Tentei andar o mais rápido possível, mas Freyja parecia estar cada vez mais longe.

Não vou... ceder. — Sussurrei para o nada.

Forcei minhas pernas a andar e cheguei até Freyja, seu olhar se instalou em meu pescoço, especificamente no Brisings, seu colar.

— Diana? - Ela perguntou.

Eu assenti me apoiando na árvore que a deusa de cabelos longos e dourados se encontrava acorrentada. 

— Precisamos tirá-la daqui antes que... Antes que o dragão volte. - Sussurrei fadigada.

Freyja observou meu rosto cheio de sangue, seu olhar preocupado como uma mãe. Puxei seus grilhões com toda a força que fluía de meus braços. O barulho das correntes se chocando e o esforço fez meu ouvido zunir desconcentrando-me do que deveria fazer.

— Beba um pouco da água da fonte, ela pode ajudar você a se concentrar, e os ferimentos pequenos se curarão. 

Neguei com a cabeça e puxei novamente seus grilhões soltando um grito tamanho o esforço que estava fazendo, sentia que a qualquer momento iria desmaiar e quem sabe nunca mais acordar. Ainda puxando freneticamente um de seus grilhões, suspirei aliviada quando um se soltou com um baque.

Levantei meus olhos, Loki estava chegando perto de Freyja, empunhei minha espada tentando nos proteger, mas seus olhos não possuíam mais a névoa, o ódio e a ira. Bati com Sann no outro grilhão, sem sucesso. Meus braços pediam clemência, meus membros formigavam e minha consciência começava a me deixar na mão. Ainda teimosa, tentei novamente colocar o máximo de forma em meus braços e ataquei o grilhão que se soltou e caiu como um baque.

Suspirei aliviada. Sann caiu de minhas mãos e minhas pernas já não me obedeciam. A água da fonte sobre mim me trouxe um pouco mais de sentido, eu havia caído dentro d’água após libertar a deusa.

Loki se aproximou, tentando segurar meus braços, me sacudi freneticamente afastando meu corpo de suas mãos. Seu rosto tinha filetes de sangue no nariz e também no supercilio, pelo menos eu havia conseguido feri-lo para me defender e impedir que algo terrível acontecesse.

— Afaste-se! - Gritei em desespero

Eu não queria ter dito aquilo, mas estava com medo de que fosse fazer aquilo de novo, que fosse me matar. Seus olhos se tornaram tristes quando eu me afastei de seu toque, pude ver minha expressão refletida em suas gemas verdes, horror e medo pintavam meu rosto ao observá-lo.

Freyja apareceu e começou a retirar minha armadura. O rosto alvo como a neve, olhos escuros, tão diferentes dos de Frigga. Lábios rosados e maçãs do rosto sem cor. 

— Precisamos tirá-la daqui, ela tem ferimentos perigosos. – A voz de Freyja era quase um sussurro para mim, estava quase perdendo a consciência.

Loki assentiu ainda com seu olhar sobre mim, a tristeza estampada neles. A deusa do amor olhou para trás preocupada. Um crepitar de chamas atingindo o céu escuro de Niflheim. Um gorgolejar alto e medonho.

— Ndhogg está voltando para cá. – Freyja disse preocupada.

— A caverna do portal entre os mundos é longe... – Loki terminou a frase, mas sinceramente não entendi. As garras convidativas da escuridão me alcançavam.

Heimdall mnie do domu!— Freyja gritou.

A sonolência me agarrou assim como as cores do arco-íris, até o momento em que tudo finalmente se tornou escuridão e silêncio, eu havia morrido?


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