Redenção escrita por mjonir


Capítulo 20
Caliel




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A chuva densa impossibilitava minha visão, as árvores altas demais me deixavam em estado claustrofóbico. Galhos chicoteavam meus pés e braços. O chão irregular da floresta me desorientava e meus grossos cabelos castanhos grudavam em minha face. Os pingos gelados da chuva me cegavam. Havia lama em toda parte e meus pés deviam estar enegrecidos assim como a barra de meu vestido.

Eu só sabia pra onde ir, pois uma mão tão gélida quanto a chuva guiava minha cintura enquanto eu empurrava galhos e folhas enormes, tentando de alguma forma possibilitar nossa passagem. Até que um maldito tronco me fez tropeçar e ir de cara ao chão lamacento da floresta. Resmunguei sentindo gosto de sangue em meus lábios e uma dor lancinante em meu joelho.

— Shhhhhh! Droga Diana. – Loki disse me fazendo revirar os olhos.

Pude sentir sua aproximação, e com uma mão em minha cintura me levantou e me virou de frente para ele. Seus dedos gélidos e ágeis inspecionaram meu rosto e retiraram os fios grossos e grudentos de meu cabelo do rosto, passou o polegar por meus lábios – que deduzi que estivessem sangrando – e tentou limpar meu rosto com as mãos.

— Minha cara tá cheia de lama! – Disse fazendo um muxoxo e tentando de alguma forma pressionar meus lábios que doíam muito.

Loki passou para a minha frente enquanto eu tentava de algum jeito arrumar meu vestido para que não arrastasse tanto no chão.

— Por que as mulheres não podem usar calças aqui? – Continuei resmungando enquanto ele empurrava as folhas para que passássemos.

Meus pés doíam e aposto que haviam pequenos cortes porque perdi o pequeno par de sapatilhas na nossa fuga. Thor tinha que aparecer logo agora? Estávamos na calmaria da casinha na clareira, e agora fugíamos como dois criminosos - bom, pelo menos Loki é um, eu não. - O clarão dos relâmpagos me faziam tremer e a chuva parecia ficar cada vez mais gelada nos lembrando o quanto o deus do trovão está irritado.

— Dá pra parar de reclamar e andar logo? - Loki disse entredentes.

Bufei e fui em sua direção batendo os pés com força. Começou tudo de novo, o asgardiano voltou a ser rude, ótimo. Minha paciência não é das melhores no momento, afinal essa coisa que estou vestindo me impossibilita de andar normalmente, parece que estou levando alguém nas costas. Molhado o vestido fica cada vez mais pesado.

Não faço ideia onde estou e nem pra onde Loki está nos levando, mas é nítido que ele conhece o caminho, então tentei ficar despreocupada. Lá na frente pude observar uma grande rocha com um grande lago ao seu lado. Os pingos de chuva castigavam meus olhos, o sono e o cansaço foram me deixando mais lenta.

— Você sabe nadar? - Pude ouvir a voz rouca de Loki através do barulho da tempestade.

Não acredito que teríamos que atravessar aquele lago todo até chegar sabe lá Deus onde. Engoli em seco e fiz um coque esquisito em meu cabelo tentando de alguma forma segurá-lo para que não grudasse em meu rosto novamente.

— Sim, mas com esse vestido eu só vou demorar muito mais e...

Loki puxou meu braço para que andássemos mais rápido e entrou no lago me trazendo junto com ele. A água parecia mais gélida que a chuva e me fez estremecer, parei no lugar onde estava e respirei fundo tentando tomar coragem, faz muito tempo que não nado, e não tenho ideia de qual é a profundidade desse lago.

— Vamos! - Esbravejou Loki me puxando. Neguei ainda parada enquanto ele me puxava pela mão. - Anda logo, Diana! Você quer que Thor nos encontre?

Olhei para Loki, e depois para o lago tentando arranjar coragem.

— Se eu morrer, a culpa é toda sua. - Respondi entredentes soltando sua mão e entrando no lago negro.

A passagem foi extremamente difícil por causa do maldito vestido, parecia que eu pesava 100 quilos. Loki me deixou ir na frente para vigiar a retaguarda, e para minha felicidade o lago não era fundo demais, aliás enquanto eu passava podia sentir o chão esquisito e lodoso que me fazia dar pequenos escorregões durante o trajeto, todavia dedos gélidos seguravam minha cintura mantendo meu equilíbrio.

Finalmente chegamos à margem e eu me sentei ali perto exausta, eu ofegava. Fechei meus olhos e me concentrei somente em minha respiração tentando acalmá-la. Meus cabelos grudavam no pescoço e em meus braços. O vestido azul turquesa colado em meu corpo, parecia mais uma segunda pele.

Abri os olhos quando minha respiração normalizou e suspirei aliviada por ver Sann ainda na bainha dourada. Olhei ao redor, a tempestade tinha se dissipado e havia mudado repentinamente para uma garoa fina que logo se esvaía. Tudo indicava que Thor estava longe, afinal.

Levantei-me e observei a grande rocha que tinha uma pequena abertura, é uma gruta e Loki já não estava aqui fora, deduzi então que estivesse lá dentro. Ao entrar me deparei com musgo no chão por causa do lago. Suas paredes estranhas estavam úmidas deixando o local abafado. O chão irregular fez meus pés vacilarem algumas vezes, mas consegui me segurar tateando as paredes.

Ao fundo pude observar uma centelha de luz, e me apressei para chegar até o local. Loki estava lá próximo a uma fogueira, com uma expressão nada boa. Suspirei e me sentei ao seu lado, tentei de uma forma desesperada arrumar o vestido me deixando mais irritada ainda. Desembanhei Sann e me levantei pegando a parte onde eu ansiava cortar, e fiz um buraco no vestido. Coloquei minha espada novamente na bainha e puxei ferozmente a parte já rasgada deixando o vestido um pouco abaixo de meus joelhos.

Loki me olhou surpreso, e um pouco irritado, pois havia rasgado o vestido que ele havia me dado. Ignorei completamente e observei meu joelho que já não doía tanto assim, mas se encontrava um pouco inchado e ralado, o sangue havia secado e graças a água do lago a lama e sujeira havia sido retirada. O pedaço que sobrou do vestido foi parar direto na fogueira, sorri satisfeita por minha pontaria ser boa e me enconstei na pedra atrás de mim suspirando.

Observei minhas mãos e braços e fiquei feliz por observar só alguns arranhãos que os galhos haviam feito, nada muito preocupante. Já meus pés, não podia dizer o mesmo, as pontas de meus dedos tinham pequenos cortes assim como meu calcanhar, mas logo aquilo melhoraria. Não deixei de ignorar as dores em meus membros pela corrida desesperada e o nado difícil, mas o que eu poderia fazer? Reclamar não melhoraria minha situação.

Loki se levantou de repente e tentou não me observar, como se estivesse incomodado com algo, não disse nada, afinal eu sabia que iríamos acabar discutindo se eu começasse a questioná-lo. Ele se aproximou da saída e observou o céu clareando aos poucos lá fora. Nós passamos a madrugada toda correndo pela floresta até encontrar esse lugar, meus olhos ardiam e meu corpo estava quase se rendendo ao cansaço.

— Você deve estar com fome. - Sua voz repentina me assustou fazendo com que eu abrisse meus olhos rapidamente.

Ele ainda estava de costas para mim com uma de suas mãos segurando em uma parede da caverna. Observei as linhas de suas costas e seus braços pela camisa preta. Os cabelos negros molhados e grudados em sua nuca, eles haviam passado das orelhas. Sua afirmação me fez franzir o cenho, eu queria muito dormir na verdade.

— Para ser sincera eu queria dormir por dias. - Disse bem baixinho, mas tenho certeza que ele ouviu, pois o silêncio dentro da caverna é absoluto.

Escutei sua respiração regular, aquela calmaria toda foi fazendo com que meus olhos se fechassem devagar, todavia lutava bravamente contra o sono. Não podia dormir agora. Loki voltou seus olhos para mim e sua expressão irritada se tornou serena ao me observar, será que eu já havia dormido e estava sonhando?

— Durma! - Respondeu depois de alguns minutos de forma autoritária, ele nunca deixaria de querer controlar tudo.

— Por que está irritado? - Sentei-me com dificuldade. Minha visão e pensamento se encontravam em uma espécie de névoa irritante.

Seus olhos não deixaram os meus, mas não estavam tão irritados quanto antes, sua expressão séria me deixava preocupada. Tudo que ocorreu não é culpa minha, ou é? A névoa me deixava confusa, tudo isso estava me parecendo mais um sonho.

— Eu não tenho culpa nisso, tenho? E...

— Durma! - Loki respondeu impaciente e se aproximou, pisquei meus olhos mantendo-os abertos. Eu queria observá-lo e não dormir repentinamente.

— Mas... Nós precisamos falar sobre isso...

— Você gosta mesmo de falar. - Ele observou franzindo o cenho me fazendo soltar uma risada fraca, meus olhos estavam quase se fechando. - Durma, Diana.

Senti ele se aproximar de leve e se sentar ao meu lado, seus dedos macios tiraram meus cabelos dos olhos. Aquele carinho fez com que eu fechasse meus olhos, lutei para tentar abri-los, mas não consegui. Ainda podia ouvi-lo, e sentir seus dedos acariciando de leve meu rosto.

— Você é um manipulador e tanto... - Sussurrei e ele soltou uma risada pelo nariz.

— Shhhhhhh, durma!

 Suas mãos deixaram meu cabelo e me puxaram pela cintura me colocando deitada sobre o chão gelado da caverna, fiquei feliz por conseguir mexer meus braços ainda e me agarrei nele como uma criança deixando seu cheiro entrar por minhas narinas e acalentar meu sono.

Fui envolvida pela névoa que ficava cada vez mais forte, ela me levou para um sono tranquilo e pesado, sem sonhos, mas com a certeza de que eu me agarrava a algo bom: Loki.

O sol irradiava lá fora, a luz entrava pela caverna e batia em meus olhos. Cobri meu rosto com um resmungo, abri meus olhos que ardiam. Minha boca estava seca e meus membros doíam muito. Olhei em volta. A fogueira não crepitava mais como de madrugada, haviam apenas cinzas e Loki não estava lá.

Lembrei-me de ontem a noite, e quase tive a certeza de que tudo havia sido um sonho e dos mais malucos. Levantei um pouco o vestido e observei meu joelho, tinha um hematoma bem roxo o que me fez suspirar. Tentei me levantar resmungando de dor em meus braços e pernas, parecia que eu havia levado uma surra e tanto.

Quando finalmente me encontrei de pé minha cabeça girou me deixando um tanto desnorteado, segurei nas paredes da caverna e fechei os olhos por alguns segundos respirando fundo. Ao abri-los, pontinhos pretos atrapalhavam minha visão, pisquei freneticamente tentando recuperar-me do mal estar. Minhas mãos soavam frio e tremiam de leve, eu precisava me alimentar.

Enquanto eu respirava devagar a zonzeira foi passando até que finalmente consegui abrir meus olhos e uma centelha de força tomou conta de meu corpo, eu não poderia me entregar facilmente, eu não era tão frágil assim. Voltei para onde havia acordado devagar, ainda segurando nas paredes da caverna e me sentei. Eu não poderia sair por aí e procurar Loki, ele conhece esse planeta, mas eu não faço ideia de onde estou.

Fechei os olhos por alguns minutos - penso eu - e de repente ouvi barulho de passos, franzi o cenho lutando para abri-los e encontrei o asgardiano de costas para mim arrumando algo que não consegui ver.

— Ei - O chamei com a voz fraca.

Ele se virou pra mim e me observou dos pés a cabeça, eu devia estar um lixo e parecendo capitão caverna.

— Você acordou. - Loki disse sério me fazendo revirar os olhos.

— Sim. - Tentei me levantar novamente resmungando pela dor em meus membros. Droga.

— Fique onde está! - E lá estava de novo o gafanhoto autoritário.

Ele pegou algo atrás dele e veio em minha direção segurando meus ombros e me empurrando para baixo de forma gentil.

— E coma! - Ele pegou a cesta que havia visto quando chegamos em Vanaheim e estendeu uma fruta vermelha para mim.

Franzi o cenho, olhei para fruta e para ele que ainda continuava com a mão estendida e olhando para mim. Será que eu poderia me alimentar de frutas de outros planetas? E se eu fizesse isso e acabasse crescendo demais ou encolhendo como Alice no País das Maravilhas?

— Vamos! Não está envenenada. - Loki disse revirando os olhos com impaciência.

Suspirei e peguei a fruta vermelha de suas mãos e dei uma boa dentada fazendo uma careta para ele como se dissesse: Pronto, senhor mandão. Seus olhos impacientes demonstraram uma centelha de alívio ao me ver comendo. Eu mastiguei a fruta devagar ainda receosa de que pudesse me tornar um tipo estranho de bicho, e que minhas orelhas se tornassem pontudas ou que começasse a passar mal, mas nada disso aconteceu, na verdade o gosto é tão bom e doce que levei a fruta até minha boca e dei várias dentadas e suspirei de satisfação.

Loki soltou uma risada baixinha e colocou outra fruta daquela em minhas mãos e pegou uma para si se alimentando também. Depois de dividirmos a cesta de frutas eu já não via mais os pontinhos negros que atrapalhavam minha visão e a dor em meus braços e pernas ficaram suportáveis. A tontura se esvaiu assim que me alimentei e então estava pronta para outra.

(...)

— Nós vamos continuar aqui?

Questionei me sentando ao lado dele colocando meus pés machucados no lago que na madrugada me parecia negro e medonho, mas agora na luz do dia, era tão cristalino que conseguia ver peixes esquisitos nadando lá dentro. Loki olhava para o céu azul e límpido de Vanaheim perdido em pensamentos, quando comecei a falar sua atenção se voltou para mim, mas não seus olhos.

— Não, nós vamos procurar um abrigo decente. - Ele me respondeu sério, o que me preocupou, afinal eu adorava quando ele sorria e conversava comigo de forma despreocupada.

Comecei a me perguntar como chegamos a isso. É difícil imaginar que o homem que queria me matar nas plantações de Asgard hoje me acalentou quando tive um pesadelo, trouxe comida para mim e me deixava daquela forma, inebriada por sua presença e fala. Seus olhares e sorrisos sinceros se dirigiam para mim, somente para mim, assim como toda a gentileza que eu sabia que ele tinha, só estava escondida. Por que ele acabou se importando comigo? O que eu fiz de diferente para conquistar todas aquelas atitudes?

Seus olhos esverdeados se viraram para mim, e aí percebi que eu o estava observando fixamente. Continuei a observar cada traço de seu rosto assimétrico, a pele esbranquiçada, as maçãs do rosto perfeitas com um leve tom avermelhado, os olhos grandes de um tom vibrante de verde. As grossas sobrancelhas assim como os lábios finos vermelhos, cílios cheios e invejáveis. Eu suspirei diante de tanta beleza, seu cenho se franziu e minha mente deu um estalo, ele estava esperando uma resposta.

— Ahn... - Olhei novamente para o lago límpido a minha frente tentando esconder meu rubor e clarear minha mente, sorri como uma idiota e me lembrei de sua resposta e tentei formular uma pergunta cabível. - Vamos voltar para a casa da campina?

Pude sentir seu olhar sobre mim, abaixei a cabeça envergonhada, meus cabelos cobriram um pouco meu rosto assim como meu rubor e fiquei feliz por mantê-los grandes.

— Não! - Sua resposta foi séria, porém tranquila. - Não podemos voltar lá, Thor conhecia aquela casa. Achei que ele fosse estúpido o bastante para não nos procurar em Vanaheim, afinal escolhi esse lugar por ser o mais óbvio possível. Parece que o subestimei.

Seu tom de voz se tornou irritado quando ele falou de Thor e percebi que na madrugada Loki estava frustrado consigo mesmo por não ter sido tão rápido e imaginado que o irmão nos procuraria ali.

— Tá tudo bem, ele não nos encontrou, e espero que não nos encontre. - Disse tentando tranquilizá-lo, mas em um tom brincalhão. - Para onde vamos agora, capitão? 

Voltei a olhá-lo, sua expressão confusa me divertiu e eu revirei os olhos, precisava anotar em meu caderninho de desenhos que asgardianos não entendem as gírias ou referências midgardianas, então não poderia usá-las com eles, mas é óbvio que eu me esqueceria disso em algum momento, ou em todos.

— Você poderia guardar algo para mim? - Loki disse de repente me deixando surpresa.

Franzi o cenho confusa diante de sua pergunta, mas assenti. Ele estender a palma aberta para mim e uma caixa de veludo preta apareceu me fazendo arfar de surpresa. Toda vez que Loki usava magia perto de mim eu me surpreendia, afinal em Midgard essas coisas não são tão comuns assim, claro que existem os shows de mágica e charlatões que dizem ter poderes mágicos, mas não passam de mentirosos.

Peguei a pequena caixa de veludo preta e a abri encontrando lá dentro o colar dourado de Freyja, suponho que Loki havia o pegado quando deixei a carta em sua porta e veio ao meu encontro junto com minha espada, nós estávamos na missão de trazer Frigga de volta e precisaríamos do colar. Tirei a jóia de dentro da caixa e a coloquei na palma de minhas mãos observando a grande pedra carmesim cravejada na corrente dourada.

— Por que não fica com você? Vejo que pode guardar melhor que eu e...

— Eu não posso tocar no colar. - Respondeu atraíndo minha atenção. - Consegui guardá-lo comigo por um tempo dentro dessa caixa de veludo, mas... Estranhamente não era o desejo da jóia ficar em minhas mãos. - Completou com uma centelha de frustração na voz me deixando intrigada.

— Ela não... Desejava? - Perguntei surpresa.

Loki assentiu com a cabeça como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo. Eu não tinha como ficar mais surpresa, afinal eu estava vivendo uma loucura e tanto, não tinha como duvidar de coisas como essas. Se me dissessem meses atrás que em meu aniversário eu iria parar em outro planeta sem ao menos ter pisado em um foguete eu gargalharia dessa insanidade, mas cá estou eu.

Coloquei a jóia dentro da caixinha e amarrei meus cabelos em um coque. Peguei a jóia novamente a coloquei em meu pescoço e olhei para Loki sorrindo.

— Fico lisonjeada que esse colar tenha escolhido ficar comigo. - Disse rindo enquanto ele me observava, pude observar uma centelha de desejo em seus olhos dirigidas a mim e ao colar.

— Lhe caiu muito bem. - Ele respondeu voltando seu olhar para o céu límpido de Vanaheim e se levantando, aquilo me fez dar de ombros, Loki quase sempre agia de forma estranha.

— Então, para onde vamos? - Eu disse me levantando também.

— Nós vamos encontrar Caliel.

Aquele nome me fez franzir o cenho. Loki começou a andar para o lado esquerdo do lago onde dava para a outra extremidade da floresta e eu o segui observando nossa retaguarda.

Entramos na outra extremidade da floresta, e fiquei encantada com a paisagem. O tronco das árvores pareciam dourados com a luz do sol, a quentura aconchegante de Vanaheim me fazia suspirar e esquecer da dor em meus membros. A copa verde das árvores abrigava pássaros azuis com longos rabos penosos, e eles piavam suavemente. O lugar me lembrava as florestas encantadas dos livros de fantasia que eu costumava ler na adolescência, tudo ali me encantava me deixando com uma expressão rídicula no rosto.

Loki andava rápido enquanto eu observava tudo e sentia a energia do lugar, borboletas rosas e azuis voavam por ali e às vezes elas pousavam em mim me fazendo soltar risinhos animados.

Uma pequena ponte dourada nos esperava lá na frente e pude ouvir o leve borbulhar de um rio abaixo da ponte. Loki parecia estar alheio a toda aquela magia que nos rodeava e andava cada vez mais rápido. Estava me sentindo a Branca de Neve dentro da floresta encantada e que a qualquer momento os Sete Anões poderiam aparecer por ali e pedir que eu lhes fizesse uma torta de maçã, ou talvez da fruta vermelha que Loki havia me dado.

— Diana! - O asgardiano estava parado perto da ponte e me esperava impaciente. - Vamos!

Acordei de um transe e observei ao meu redor novamente, tudo é mágico, mas parecia estar tirando meu foco de onde estávamos e do que iríamos fazer. Assenti de leve para Loki e fui ao seu encontro caminhando ao seu lado pela ponte, afinal sua largura é um tanto grande.

Continuamos andando por um tempo indeterminado no mais absoluto silêncio, aquilo estava me corroendo por dentro, mas Loki parecia não estar disposto a ouvir minha tagarelice. Enquanto caminhávamos eu ainda observava ao meu redor tentando memorizar aquela paisagem para em algum momento - se fosse possível - desenhar aquela floresta para nunca me esquecer dela.

Ele parou de repente atraíndo me atenção, empurrou uma leve cortina de folhas revelando uma passagem, me surpreendi, pois se não estivesse com ele a camuflagem das folhas me faria passar desapercebida por aquele lugar. Loki acenou com a cabeça para que eu entrasse primeiro.

Obedeci e entrei pela passagem das folhas observando uma campina brilhante. Minha boca se escancarou surpresa ao observar uma árvore majestosa no meio da campina, seu tronco dourado tinha uma porta delicada o que me deixou mais intrigada ainda. Onde estávamos? A relva extremamente verde dava um tom de encantamento para a paisagem.

Loki passou por mim e subiu os pequenos degraus que davam para a porta na árvore, o segui e fiquei atrás dele com uma centelha de temor pelo que nos esperava ali dentro. O barulho da porta se abrindo fez com que a curiosidade me tomasse e então eu olhei por cima do ombro de Loki e soltei um arquejo de surpresa.

Não podia acreditar na tamanha beleza que meus olhos avistaram naquele momento, eu não conseguia desviar minha atenção. Uma mulher estava parada segurando a porta e olhando diretamente para Loki com um sorriso sedutor nos lábios. Engoli em seco e me senti um tanto humilhada por estar tão maltrapilha diante de todo o explendor dela.

Seus cabelos iam até a barriga em um tom prateado com algumas tranças. O rosto assimétrico com lábios cheios e avermelhados faziam um constraste com sua pele esbranquiçada. Seus olhos grandes e dourados fitavam Loki com uma espécie de adoração, cílios grossos e curvilínios lhe davam uma delicadeza sobre humana. O nariz assimétrico e extremamente fino era arrebitado traziam harmonia para seu rosto. Suas orelhas pontiagudas pontiagudas traziam certo charme o que me fez me sentir o cocô do cavalo do bandido.

Ela estava adornada de pulseiras e brincos dourados e brilhantes, um vestido carmesim desenhava seu corpo cheio de curvas, duas fendas se abriam na metade das coxas relevando suas pernas torneadas. Seus pés estavam descalços com pequenas guirlandas amarradas nos tornozelos. Pisquei freneticamente tentando entender se aquela mulher a nossa frente era real ou apenas uma miragem esquisita.

— Loki - Ela disse num sotaque muito mais arrastado que Loki, sua voz pareciam sinos de vento e me humilharam mais ainda apenas ao dizer o nome dele.

Saí do transe que havia me encontrado ao observar toda aquela beleza e me pus a observar a expressão de Loki. Ele sorria abertamente para ela também sedutor fazendo com que um fogo lento e nada bom começasse a queimar dentro de mim. Eu nem deveria estar ali tão maltrapilha desse jeito, por que ele me trouxe afinal? Preferia mil vezes ficar dentro da gruta que encontramos na madrugada passada.

— Caliel - Ele disse seu nome arrancando risadinhas da mulher a minha frente e eu revirei os olhos com toda essa cerimônia. - Nós podemos entrar? - Perguntou galante.

— Oh, é claro meu querido - Ela respondeu ainda sorrindo. Seus olhos se voltaram para mim e me inspecionaram dos pés a cabeça.

Caliel escancarou a porta e abriu passagem para que entrássemos, Loki se virou para mim e deixou que eu entrasse primeiro, marchei para dentro do tronco da árvore e observei surpresa. É uma casa, dentro de um tronco. As paredes marrons tinham pequenos quadros de fotos com pessoas que possuíam a extrema beleza como Caliel também obtinha.

Uma pequena mesa de mogno estava no centro assim como cadeiras de carvalho dispostas em uma espécie de sala. Na outra extremidade encostado na parede, um fogão a lenha, e em cima dele uma pequena panela de ferro soltava uma fumaça com um cheiro delicioso. O borbulhar de dentro da panela me fazia imaginar que ela estava cozinhando algo.

— Sentem-se meus queridos. - Ela disse doce me fazendo franzir o nariz com toda aquela gentileza.

Caliel puxou uma cadeira de carvalho para que eu me sentasse, puxou outra que ficava um tanto longe para que Loki se sentasse então ela se acomodou ao lado dele. Trinquei os dentes e respirei fundo tentando não pirar e sair dali o mais rápido possível.

— Caliel, minha querida - Loki disse olhando para a mulher e passou um de seus dedos por seu rosto gentilmente. Tossi de leve fingindo uma coceira na garganta e passei a mão por meus cabelos nervosa. - Nós estamos estamos em uma viagem de resgate e precisamos de um abrigo. - Eu nunca havia escutado a voz do gafanhoto tão doce daquela forma.

A mulher riu para ele revelando seus dentes extremamente brancos e perfeitos, tudo nela parecia perfeito demais para o meu gosto.

— Você quer dizer que está em fuga, não é? - Ela o respondeu rindo. - É claro que pode ficar aqui, querido. - Disse me deixando mais irritada ainda, Caliel tinha incluído apenas ele.

Loki e ela soltaram uma risada e então ficaram em silêncio, a mulher tinha colocado seus olhos sobre mim e me fitava intrigada.

— Então, quem é? - Ela perguntou sorrindo de forma doce para mim e eu apenas ignorei.

— Essa é Diana, havia me esquecido de lhe apresentar.

Trinquei meus dentes, minha paciência já se encontrava abaixo de zero. Maldito e maldito. Eu não deveria ter saído daquela gruta nem por mil frutas vermelhas como aquela. Havia esquecido de me apresentar? Aposto que havia se esquecido de minha presença enquanto flertava descaradamente.

 - Muito prazer Diana, sou Caliel. - A mulher sorriu para mim fingindo que não tinha visto que tinha ignorado sua pergunta.

— O prazer é todo meu. - Respondi ácida e sorri para ela falsamente.

Ela riu baixinho e sua atenção foi parar em meu pescoço, o colar de Freyja .

— Oh, eu não acredito que meus olhos de Elfo estão vendo. - Ela disse escancarando a boca pequena e colocando as delicadas mãos sobre o peito. - O colar de Freyja - Seus olhos queimaram de excitação me deixando preocupada.

Ela se levantou da cadeira de carvalho e veio em minha direção fazendo meu sangue congelar nas veias. Seus olhos inspecionaram a jóia e as mãos cobiçadoras vieram de encontro ao colar, no momento em que seus dedos iriam a jóia ela soltou um gritinho fino de dor. Eu olhei assustada para a mão que ela puxou rapidamente e começou a esfregar tentando se livrar da dor.

— Interessante - Ela observou ainda esfrgando os dedos vermelhos como se tivessem sido queimados - Você já tentou tocar no colar? - Questionou Loki que assentiu - E aconteceu o mesmo?

— Ninguém pode tocar nele além de Diana. - Respondeu dando de ombros e eu escondi um sorriso vitorioso.

A mulher me observou minusciosamente, seu olhar para mim não era de ódio e nem incomodado, ela só estava... Intrigada.

— Quem lhe deu esse colar, querida? - Me perguntou intrigada.

Frigga havia me dito para manter sigilo sobre o colar e que somente Loki deveria ficar sabendo, e que eu podia confiar nele, ah claro, estou vendo o quanto posso confiar. Direcionei meus olhos para ele que negou como se dissesse para eu não dizer nada sobre o colar, idiota, eu já sabia que não podia dizer nada.

— É uma longa história - Admiti dando o assunto por encerrado.

Caliel sorriu para mim e assentiu entendendo que eu não iria dizer nada sobre o Brisings e voltou para seu lugar ainda me observando.

— Entendo porquê escolheu ela, Loki. - Disse ela olhando para Loki sorrindo de forma divertida. - Vejo algo de diferente nela. Muito diferente.

Seus olhos me fitavam como se visse por trás de minha alma e soubesse de todas as minhas histórias insanas.

— Eu esperava que dissesse isso mesmo - Admitiu Loki me olhando de forma intensa.

Sustentei seu olhar por alguns segundos e depois revirei os olhos e passei a observar novamente a casa de Caliel, uma escada caracol na extremidade esquerda me chamou a atenção.

— Você deve estar cansada, querida. Venha comigo, vou lhe preparar um banho - Ela se levantou e veio em minha direção segurando uma de minhas mãos.

Caliel me puxou para a escada caracol enquanto Loki continuava sentado à mesa. O mesmo livro que ele estava lendo na casinha da campina magicamente apareceu sobre a mesa e ele se pôs a ler me fazendo revirar os olhos e seguir a mulher.

Depois do banho quente que Caliel havia me preparado eu já estava mais relaxada. Ela também tinha me dado um chá que deu fim as minhas dores musculares e nesse momento escolhia um de seus vestidos dentro do grande guarda-roupa de carvalho.

Satisfeita puxou de lá um vestido verde escuro, quase musgo e entregou para mim.

— Esse aqui combinará com seu tom de pele e também a jóia em seu pescoço - Ela sorriu de forma gentil para mim.

— Obrigada - Sorri de volta. Caliel me tratava docemente, eu não deveria ser mal educada com ela por causa de Loki.

— Não há de quê, querida. Eu adoro receber visitas, principalmente de pessoas tão especiais como você - Respondeu me deixando intrigada, por que ela diz tanto que eu sou especial?

— Por que diz que sou especial? - Rebati curiosa.

Caliel respirou fundo e sorriu para mim enquanto eu me vestia com a peça que ela separou. Um par de sapatilhas pretas estava em cima de sua cama também de carvalho com um dossel magnífico.

— Eu vejo... Algo em você. É extremamente intrigante, mas apenas saberá no momento certo. Na verdade eu não consigo entender o que é, então apenas tenha paciência. - Me respondeu sincera.

Dei de ombros com essa resposta, nem ao menos ela sabia o que era e então não adiantava dar murro em ponta de faca. Depois de vestida, ela penteou meus cabelos e prendeu só a parte de cima para que desse um certo charme. Fitei meu reflexo no espelho e suspirei de alívio por estar ao menos apresentável diante da criatura explêndida que Caliel é.

— Caliel? - Eu a chamei e ela levantou seus olhos para mim. - O que... O que você é? - Senti meu rosto ruborizar por perguntar aquilo, mas eu gostaria mesmo de saber.

— Ah, eu sou um Elfo, um Elfo Branco. Minha espécie é habitante de Vanaheim. - Ela sorriu para mim. - Pronto, está explêndida. Vamos jantar?

Assenti para ela e assim descemos a escada de caracol e encontramos um Loki limpo e bem arrumado nos esperando à mesa.

Posso dizer que a noite fora bem agradável ao lado de Caliel. Ela contava histórias de seu povo e sobre sua família. Fiquei sabendo que a Elfo morava ali por ser uma Feiticeira por assim dizer, ela preferia o termo Curandeira.

— Quer dizer então que vocês se conhecem faz tempo? - Questinei a Elfo sobre Loki e ela assentiu rindo.

— Loki adorava passar por Vanaheim quando Thor começava a ficar ''insuportável'' como ele costumava dizer. Somos bons amigos. - Disse sorrindo para ele.

Ele manteve seu olhar para o prato de sopa que Caliel havia preparado para nós, mas geralmente me fitava quando achava que eu não estava olhando para ele, eu lutava para não ruborizar diante de seus olhares um tanto indecentes.

— Eram bons tempos aqueles. - Loki sorriu maliciosamente para Caliel.

O jantar se resumiu a histórias da Elfo até que meus olhos começaram arder, os dois perceberam o quanto eu estava cansada e gentilmente Loki disse que me levaria para os aposentos que ele geralmente ficava quando se hospedava na casa da Elfo.

Subimos novamente a escada caracol e Loki abriu a terceira porta do corredor revelando um quarto agradável e aconchegante. A cama com o estrado de carvalho e o colchão branco chamaram minha atenção.

— Agora há uma cama decente para que você durma. - Disse Loki gentil e eu apenas ignorei suas palavras.

Retirei as sapatilhas pretas, soltei o meus cabelos e tirei os brincos que Caliel havia me emprestado, coloquei-os sobre uma penteadeira de mogno. Deitei-me na cama e abracei o travesseiro. Loki se sentou ao lado da cama em uma poltrona de carvalho - os móveis dessa casa só são de carvalho? Será possível? - e o livro apareceu novamente em suas mãos, mas ele não lia atentamente, e sim me fitava ali deitada. Revirei os olhos e apertei mais o travesseiro sentindo o cheiro adocicado e gostoso da cama.

— O que há? - Loki perguntou com um sorriso presunçoso no rosto.

Bufei, eu adoraria socar a cara daquele asgardiano metido para ele ver com quem estava lidando, é óbvio que está se divertindo as custas da maldita centelha de ciúmes que eu esbocei com ele e Caliel quando chegamos, mas o que posso fazer?

— Não há nada. - Respondi ácida sua pergunta e virei de costas para ele tentando esconder meu rosto.

Ouvi sua risadinha debochada e bufei mais alto ainda.

— A vista só ficou melhor. - Ele disse ainda rindo.

Sentei-me na cama e peguei o travesseiro ao lado e joguei nele, dessa vez seus reflexos não foram tão rápidos assim e com um baque surdo o travesseiro bateu em seu rosto, mas Loki não se incomodou, aliás sua risada se tornou ainda mais alta.

— Idiota - Resmunguei enquanto ele ria de minha braveza.

Loki pegou o travesseiro que caiu em seu colo, jogou-o na cama que caiu ao meu lado, segurou o livro nas mãos e tirou os coturnos. Arregalei os olhos quando percebi que ele deitaria ali. Ele arrumou o travesseiro com a mão livre e se deitou na cama, posicionou o livro e voltou a lê-lo sem olhar para mim.

Resmunguei novamente e arrumei meu travesseiro me deitando de frente para ele.

— Você poderia ler em voz alta? - Eu perguntei pra ele gentilmente.

Seu sorriso aumentou e ele assentiu começando a ler pra mim o livro que tanto adora.

 

 

 


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