Os dias tinham se passado rápido em Asgard e eu não estava levando Loki em nosso passeio rotineiro. Ele apenas me via treinar arco e flecha logo cedo e somente afastava seus olhos de mim quando Lady Sif começava seu turno juntamente com as crianças.

Meus braços estavam na posição certa e mantive os olhos cravados no alvo até que soltei a flecha, elas iam na direção que as atirava. A cada vez que eu treinava podia sentir que minha pontaria estava se aperfeiçoando.

Ouvi uma vozinha familiar gritando meu nome de longe, tentei não me desconcentrar e soltei mais uma flecha. Inclinei meu rosto em direção a voz que me chamava incessantemente. Um lampejo dos cabelos vermelhos e cacheados de Allya entrou em meu campo de visão e eu sorri, ela passou correndo e se chocou contra minhas pernas as abraçando e soltando seus famosos gritinhos:

— Tia Diana!

— Oi, meu amor. – Disse de forma maternal e passei as mãos por seus cachos ruivos.

— A Tia Lady Sif disse que hoje não vamos ter treino, mas eu quero aprender a atirar arco e flecha igual a você. – Ela fungou fazendo uma careta de tristeza que a deixou muito mais fofa.

Senti os olhos de Loki em minha nuca. Ele se encontrava sentado na parte coberta do pátio, suas mãos continuavam presas, porém dessa vez para frente como no primeiro dia. Desde que o gafanhoto chegou me lançava olhares tediosos e até suspirava. Eu sabia que não tinha nada que pudéssemos fazer de diferente em Asgard me deixando mais incomodada que ele.

— Allya, eu não posso te ensinar agora a atirar. O que acha de darmos uma passeada com o Loki? – Soltei rapidamente dando um sorrisinho para ela.

Eu não sabia se Loki gostava de crianças, mas é meio difícil não simpatizar com uma princesinha dessas. Ela assentiu rapidamente pra mim ainda abraçada às minhas pernas. Deixei meu arco em cima da mesinha de mogno para apanhá-lo depois e peguei a pequenina no colo me virando para ir de encontro ao asgardiano.

Seus olhos estavam cheios curiosidade ao me ver com a pequena no colo. Fiquei com medo de sua reação, ele poderia gritar ou tratar-me mal na frente dela e assustá-la. Me importava demais com Ally para que visse todo o mau humor que Loki sempre demonstrava.

Cheguei mais perto esperando que começasse a surtar ou fosse embora, porém ele simplesmente fitou Allya em meu colo e abriu um sorriso pequenininho. Cheguei mais perto. A pequenina pulou para o chão me deixando surpresa e foi de encontro a Loki, ela fez uma pequena reverência a e sentou-se em seu colo.

Meus olhos quase saltaram das órbitas ao ver que Allya mantinha contato físico e ele nem se importava com isso, na verdade estavam os dois cheios de sorrisinhos. Minha indignação ficou estampada em meus olhos e Loki soltou uma risada baixinha.

— Como você está, pequena Allya? – Disse ele voltando seu olhar para a ruivinha. – Faz um bom tempo que não nos vemos.

— Sim, príncipe Loki. – Disse ela sorrindo e colocando a mãozinha pequena no rosto dele, o sorriso de ambos aumentou. – Estava com saudades de conversar com o senhor.

Ele soltou uma risadinha e entraram em uma espécie de bolha só deles. Troquei o peso do corpo para mostrar como estava incomodada em ficar de fora, se soubesse que a Allya o conhecia já teria feito planos de usar minha princesinha como uma ponte para conseguir a atenção de Loki, e assim seguir com o que tinha prometido.

Observando os dois ali sentados juntos, rindo, conversando e Allya mantendo contato físico com ele, acariciando seus cabelos e passando a mão por seu rosto e também dizendo quase sempre o quanto ele estava bonito, pude ver mais ainda algo de bom em Loki. Ele precisava de pessoas que o compreendessem apesar de ser tão insano quanto um sociopata.

— Ei, ainda estou aqui! – Disse rindo e soltei um pigarro.

Allya voltou seus olhinhos extremamente azuis para mim e pulou do colo de Loki, ela veio até mim esticando os braços em um pedido para que eu a tomasse nos braços, e sem exitar o fiz.

— Já conhecia o Príncipe Loki, tia Diana. Nos conhecemos em um baile no palácio, eu tinha me perdido da mamãe no pátio e ele estava lá, me levou até ela depois de conversarmos sobre livros. Ele gosta muito de ler assim como eu. – Ela disse colocando um dedinho na boca.

— Ah! Isso é muito legal, Ally. – Sorri. – Então quer dizer que o Príncipe gosta de ler? – Perguntei levantando uma sobrancelha.

Loki fitou meus olhos e assentiu tentando esconder um sorriso. Hmmmmm… Estávamos progredindo e eu devia tudo isso a Allya que o deixou tão sorridente e de bom humor. O tédio parecia ter se esvaído.

— Príncipe Loki, nós podemos passear com a tia Diana? – Disse a ruivinha me deixando orgulhosa por ser tão espontânea e estar me ajudando muito.

Ele pareceu ponderar e então decidiu se levantar, o que me deixou mais surpresa ainda:

— Poxa! – Não consegui disfarçar minha surpresa.

Seus olhos se voltaram para mim e eu virei o rosto para Ally tentando esconder minha surpresa por ele ter cedido assim tão fácil. Achei que minha companhia só o trazia irritação e pude perceber hoje que depois da intervenção da pequena ruiva seu humor foi transformado.

Andamos pelo pátio até finalmente chegar perto do lago que havia em Asgard, e que era o meu lugar favorito. Passamos pela árvore que tinha frutas parecidas com maçãs, brilhantes e carmesins. Observamos toda a extensão dos campos de plantações enquanto eles dois conversavam sobre alguns livros que Allya tinha lido. Aquilo me animou, afinal eu também amava ler.

— Eu até entraria no assunto de vocês e citaria os livros que mais gosto, porém são todos midgardianos. – Soltei um risinho.

— Você também se interessa por livros, Diana?  – Loki disse fitando meus olhos.

Já disse o quanto meu nome ficava convidativo em sua voz?

— Sim, sempre fui viciada em leitura, desde pequena. Meus pais me incentivavam a ler o tempo todo.

— É uma pena você não saber ler em runas, porque os livros de Asgard são esplêndidos. – Ele sorriu fitando o céu de forma sonhadora.

Estava me sentindo extremamente leve e feliz por estarmos levando uma conversa civilizada, diferente das outras vezes em que ele ameaçava de me matar e eu respondia de forma mal educada, afinal eu apenas revidada o que ele jogava em meu rosto.

— Acho que você poderia me ensinar, não é? Já que vamos passar bastante tempo juntos. – Soltei uma risada e Allya me acompanhou.

Ela era como um filtro de emoções entre eu e Loki, era óbvio que a traria para ficar conosco mais vezes. Ele olhou para Ally e ela assentiu o encorajando a me ajudar a ler em runas.

— Isso é o que veremos. – Disse me dando uma piscadela.

Tudo bem, então quer dizer que o asgardiano paga com a mesma moeda? Quando ele me propôs o acordo e alegou que eu não tinha nada a perder eu havia respondido a mesma coisa, afinal eu não podia aceitar algo vindo dele, não sabia se Loki era confiável.

Fitei seus olhos e comprimi os meus em forma de julgamento:

— Acho que já ouvi isso antes.

Ele assentiu me dando um sorriso largo e mais uma piscadela. Meu coração foi à Marte e voltou retumbando.

Lady Sif apareceu como um fantasma atrás de mim e de Allya, ela pediu para que a pequena fosse para casa, pois sua mãe já estava preocupada. Pensei que poderia continuar o passeio com Loki, todavia Sif queria minha ajuda com os preparativos para um suposto baile que ocorreria daqui uns dias.

Percebi que Loki havia ficado tenso quando fora mencionado ‘‘preparativo para o baile’’ e seu humor mudou completamente. Seus olhos demonstraram tristeza me deixando desconfortável com aquela situação, ele parecia estar se divertindo tanto.

Infelizmente não pude sondá-lo e tentar de alguma forma o animar, pois Sif me puxou para o palácio dando apenas a chance de me despedir.

☆

— Tudo bem, Thor, irei ajudar a Sif com os preparativos, pode deixar. – Disse batendo continência e eles me olharam como se eu fosse maluca. Revirei os olhos.

Sif, Vostalgg e Frandall saíram da sala de jantar me deixando a sós com Thor, a pedido do mesmo e assim me lembrei do que deveria fazer.

— Thor, hmmm… Hoje descobri que o Loki gosta de ler e em meus passeios com Aaron pelo palácio vi uma biblioteca, será que eu poderia levá-lo lá? – Torci o nariz ao lembrar-me de Aaron e da última vez que nos vimos.

— Vejo que as coisas estão andando, fico feliz por isso Diana e é claro, pode levá-lo até lá. Acho que isso tornaria tudo bem mais fácil para você.

— Mas Odin não ficará bravo com isso? Ele não parece concordar muito conosco.

— Pode deixar que disso cuido eu. – Ele disse sorrindo para mim.

Ergueu sua caneca com hidromel em um pedido para que eu brindasse com ele, ergui a minha e o fiz sorrindo para ele.

☆

Encontrei Loki no dia seguinte na frente do palácio e pedi para que ele me seguisse. Seu olhar estava distante, meio entristecido, todavia quando me olhou não senti mais o olhar gélido de sempre.

Enquanto andávamos um ao lado do outro em direção à biblioteca pude perceber o quanto ele estava desconfortável com aquelas algemas, eu deveria ter pedido para que os guardas as tirassem mesmo que eu tivesse muito medo dele tentar me matar de novo.

— Por que estamos indo para a biblioteca? – Ele me questionou parando de andar.

— O passeio de hoje é lá. Eu queria mesmo conhecer a biblioteca, mas Aaron nunca me trouxe aqui. – Disse sorrindo, acenei com a cabeça pedindo que ele me seguisse.

Ao chegar lá fiquei completamente extasiada ao perceber os milhares de livros que existiam ali, eu sempre quis ter uma biblioteca só minha, enchia as paciências de minha mãe para comprar livros atrás de livros, todavia quando comecei a estudar Física eu não tinha mais tempo para ler ficção.

— São tantos livros… Isso é incrível. – Eu disse ainda extasiada pela paisagem.

Passei pelas prateleiras cheias de livros e tentei encontrar algum que conseguisse ler pelo menos o título… Fora uma tentativa em vão.

Virei minha atenção para Loki que se encontrava na porta da biblioteca analisando minha reação.Sseus olhos estavam se animando aos poucos, aquilo realmente era um bom sinal.

☆

— Aquele ali, midgardiana. – Ele rugiu entredentes. – O da esquerda, você não tem senso de localização?

Revirei os olhos, estava muito bom pra ser verdade, Loki andava muito gentil comigo e estava esperando que ele me tratasse daquela forma.

— Calma! – Vociferei. – Essa estante é enorme, tenha paciência!

Ele começou a resmungar baixo me deixando ainda mais irritada, o livro que ele queria estava a minha esquerda e um pouco mais alto do que eu poderia pegar.

— Estava muito bom para ser verdade. – Disse alto.

Ele voltou sua atenção para mim.

— O quê? – Disse se fazendo de desentendido. Bufei.

— Você sendo gentil comigo, não posso me acostumar com isso, afinal você é mais bipolar do que minha antiga melhor amiga escolhendo roupas.

Ele soltou uma risada alta o que me fez voltar o olhar para ele, a raiva me consumiu, estiquei-me ao máximo e peguei o livro que ele queria, desci da escada alta de madeira morrendo de medo de cair e bati o livro na mesa onde ele se encontrava.

— Aqui está!

Ele analisou o livro sem nem dizer obrigada e fez um sinal para que eu o abrisse. Resmunguei baixinho e o fiz, afinal suas mãos estavam presas. Da próxima vez em que viéssemos para cá teria que soltá-lo.

Ele manteve sua atenção total ao livro, comecei a suspirar e batucar na mesa impaciente e ele voltava seu olhar para o meu de uma forma meio sarcástica.

Loki estava com aquela carinha pra mim, pois ainda lhe devia uma resposta sobre o trato.

— Tudo bem, midgardina. O que foi? – Ele disse sorrindo.

— Eu sei que você está me evitando porque quer uma resposta.

— É mesmo? E que resposta eu quero? – Ele levantou as sobrancelhas me olhando com aquela cara do tipo‘’não me diga’’.

Sinceramente minha vontade de quebrar a cara desse asgardiano metido de nariz em pé é muito maior do que ajudá-lo. Desde que o conheci me desperta esse sentimento e tantos outros que nem eu mesma sei como lidar.

— Você está sim esperando uma resposta e deixe de se fazer de desentendido! – Respondi irritada.

Ele revirou os olhos, era óbvio que o asgardiano estava esperando que eu tocasse no assunto. Ele propôs o acordo uma vez e quem deveria aceitar era eu, como o mesmo disse, não é ele que precisa da minha ajuda, todavia é o que veremos.

— Tudo bem, Senhor orgulho, eu aceito sua proposta. – Disse passando a mão nervosamente pelo cabelo e olhando para qualquer lugar da sala, menos para ele.

— Não me parece muito segura disso, nem me olhou nos olhos. – Pude ouvir uns resquícios de risada em sua voz.

— Eles me confundem, me deixam nervosa… – Epa, mas o que diabos eu estou falando? Pigarreei. – Quer dizer, eu disse que aceito, no entanto não faço ideia se posso confiar em você. – Voltei meu olhar para o seu.

Loki me olhava se divertindo com meu embaraço e por ter confessado que ele me deixava confusa e nervosa.

— Decida-se logo, Diana. – Sua voz arrastada fez meus pensamentos se embolarem.

Seus olhos se mantinham nos meus me fazendo entrar quase em uma hipnose, minha respiração ficou descompassada. Ele estava me pressionando a decidir logo. Péssima ideia da parte dele. Quando decidia algo no calor do momento sempre me ferrava depois e bom, eu já estou completamente ferrada mesmo, o que posso fazer?

— Tudo bem… – Grunhi. –Decidi confiar em você.

— Péssima ideia a sua… – Disse sorrindo. Meus olhos se comprimiram e o ameacei mentalmente. – Porém lhe dou minha palavra de que vou ajudá-la a sair de Asgard.

— Quero que você prometa mais uma coisa. – Era insanidade a minha, mas fazer o que? Ele assentiu para que eu continuasse. – Prometa que vai se esforçar para não brigarmos mais, afinal não temos diálogo se quisermos nos matar a todo o momento.

Ele revirou os olhos e ponderou o que eu disse.

— Prometo tentar não te matar. – Seus olhos se iluminaram e ele sorriu.

— Então não aceito proposta nenhuma. – Minha voz subiu uma oitava.

Sua risada ecoou pelos meus ouvidos, ele estava se divertindo com tudo aquilo. Cruzei os braços claramente estressada com tudo aquilo.

— Tudo bem, Diana. Prometo não perder a cabeça, só não seja tão teimosa, tudo bem?

— Vou pensar no seu caso. – Respondi em um muxoxo.

Ele suspirou e franziu o cenho.

— Garota você é uma incógnita, por que tão difícil?

— Se eu fosse fácil não teria graça… – Soltei uma risada ao ver que estava irritando ele.

Alerta vermelho!

Loki estava começando a ficar irritado.

— Bom… Tudo bem, eu aceito sua proposta, eu decidi confiar em você…

— Sim, eu já disse que é uma péssima ideia.

— Você me deu sua palavra, terá que cumpri-la Loki de Asgard. – Vociferei.

— Vou pensar no seu caso, Diana de Midgard. – Ele riu.

Grunhi alto, ele sempre virava o jogo me deixando extremamente irritada. Sentei-me à mesa com ele e puxei o livro que ele estava lendo alguns minutos atrás. Comecei a folheá-lo e franzi o cenho tentando entender aquelas ‘’mandingas’’ que diziam ser uma língua.

— Aliás, obrigada. – Ele disse baixinho.

— Hein?! – Levantei meus olhos rapidamente para ele.

— Você ouviu, não vou dizer de novo. – Disse entredentes.

— Pelo que? – Fiz uma cara debochada.

Ele bufou e levantou as mãos com as algemas passando devagar entre as sobrancelhas, respirou fundo algumas vezes, parecia estar tomando coragem.

— Por me trazer aqui. – Ele foi direto, sabia que não receberia um agradecimento digno de cenas de cinema, mas foi gratificante mesmo assim.

Meu sorriso aumentou iluminando todo meu rosto. Pude observar quando ele abaixou a mão, sua face estava um pouco corada, seus olhos fitaram os meus e o lampejo de diversão continuava ali.

— De nada, asgardiano.

Minhas bochechas doíam pelo sorriso enorme que sustentavam, seus lábios se inclinaram em um sorriso torto que fez meu coração retumbar cada vez mais forte, é… Aquele asgardiano ainda me faria cometer loucuras.