Morte aos Lobos escrita por Beatriz Rozeno


Capítulo 21
Capítulo 20 - Direções


Notas iniciais do capítulo

Dois capítulos em dois dias seguidos, pode? Pode!!
Verifiquem se estão lendo na ordem, não quero ninguém abrindo a primeira notificação que apareceu e acabar recebendo spoiler, hein? kk
Tenham uma boa leitura!



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Após diversos minutos correndo, ela se permite olhar para trás por apenas um segundo. O número de moribundos a perseguindo diminuiu consideravelmente, mas não via nenhum de seus amigos, e muito menos seu irmão. Percebeu que os seres atrás de si pareciam perdidos, provavelmente tentando descobrir em que direção ela seguiu, já que o vento espalhou o cheiro por todas as direções. Ainda assim, não diminuiu o passo até alcançar uma parte descampada da floresta, que terminava em um grande penhasco. Ao olhar para baixo, viu a calma nascente de um rio. Jamais pularia. Seguiu pela direita, e permitiu-se caminhar, pois nenhuma das pragas estava à vista.

Cerca de cinco minutos de caminhada depois, ela enxergou um grande declive à sua frente, que cobria uma grande parte do rio e terminava na floresta lá embaixo. Decidiu descer e esperar pelos outros. Deu alguns passos e segurou-se na vegetação, já que o terreno estava escorregadio por conta da chuva do dia anterior. Um uivo de arrepiar a alma ecoou pelo vale, e parecia vir de algum ponto atrás dela. Acelerou o passo, e escutou gritos acima. Passou a correr no instante em que viu uma daquelas coisas vindo em sua direção.

Tanto ela quanto o Jack tropeçaram nos próprios pés e rolaram morro abaixo. No instante em que atingiu o chão plano, tentou se levantar e acabou soltando um grito quando se apoiou na mão direita. Ao identificar onde a garota estava, o ser grotesco largou-se em cima dela. Debateu-se desesperadamente tentando se livrar da coisa, até que seus joelhos a empurraram, dando tempo suficiente para que ela levantasse e corresse.

Pegou uma de suas facas que ficava no lado esquerdo do cinto e continuou a correr. Deu uma olhada para trás e viu seu agressor farejando o chão. Parou por um segundo e verificou suas pernas. Havia um corte na sua panturrilha direita, provavelmente causado enquanto ela rolava na vegetação. Infelizmente havia sido profundo, e vinha deixando rastros de sangue enquanto ela corria, mas não podia parar para fazer um curativo. Correu o mais rápido que seus ferimentos lhe permitiam — saber do corte na perna fez com que ele doesse ainda mais —, até que sua respiração começou a falhar. Parou e viu o Jack ainda em seu encalço, e decidiu parar e tentar matá-lo, mesmo com suas habilidades questionáveis. Quando preparou-se para por um fim nele, escutou um grito gutural, não muito longe dela. Sem saber o que fazer ou o que pensar, ela correu para uma direção qualquer e continuou adentrando a floresta.

Mas ela, diferentemente da praga, ainda é humana. Seu corpo dá sinais de exaustão e ela passa a correr muito devagar em relação ao seu perseguidor. Quando a garota menos espera, o moribundo a alcança, e ela sente suas garras rasgando-lhe o braço esquerdo. Ela gira nos calcanhares e sua faca faz um corte na praga. O sangue de ambos marca o local enquanto eles enfrentam-se no chão.

De um modo inexplicável, ela consegue se levantar. Corre enquanto o ser procura seu rastro em meio a todo aquele sangue, e ele não demora a conseguir. A garota escuta a corrente de um rio, e une todas as suas forças para chegar até ele, para enfim despistar a coisa. Quando alcança o leito do rio, a praga chega quase ao mesmo tempo. Ela usa uma grande rocha para se apoiar enquanto o Jack corre até ela. Com a raiva e a dor explodindo em sua alma, ela enterra sua faca no crânio do ser, que cai para nunca mais levantar.

Nesse instante, gritos ecoam pela floresta. Estes tão cheios de selvageria, que a fazem agir rapidamente. Remove a mochila das costas e tira do bolso da frente um pacote de ataduras, e os abre nervosamente com as mãos trêmulas. Enrola os ferimentos da panturrilha e do braço da melhor maneira que pode e volta a correr, enquanto joga a bolsa de volta à costa. Corre em uma direção aleatória — não faz ideia para onde está indo —, querendo apenas ganhar distância dos possíveis perseguidores.

Depois de um tempo correndo, sua visão começou a lhe pregar peças, indicando a tontura, possivelmente causada pelo cansaço. Mas não podia parar. Tirou os óculos, que estavam muito mal colocados na sua face, considerando que talvez estivessem muito embaçados, mas mesmo assim ainda via pontinhos à sua frente. Chegou a uma larga estrada, olhou para ambos os lados, mas não viu nada e nem ninguém. Sem forças para absolutamente nada, desabou no chão, procurando controlar a respiração. Desejava fechar os olhos e dormir, mas aguentou o quanto pôde. Ao longe, ela escutou o leve barulho de motor, que foi aumentando conforme o veículo se aproximava. Ela distinguiu um carro preto vindo até ela, e esticou o braço o máximo que conseguiu para pedir ajuda. O veículo parou, e alguém — ela achava que era uma mulher — desceu dele rapidamente, correndo para socorrê-la.

Ela não conseguia visualizar o rosto de sua salvadora, mas deixou isso pra depois porque tudo o que mais queria era sair dali. Somente por um milésimo de segundo, sua mente pensou que talvez fosse estúpido confiar em alguém assim, mas ela abandonou o pensamento. A mulher também dizia algo, mas ela não se concentrou em ouvir. Seus ouvidos apenas se apuraram quando os gritos das pragas se repetiram, dessa vez mais perto. A moça pegou os óculos de sua mão para que pudesse apoiá-la em seus ombros e levá-la até o banco traseiro do carro, onde ela finalmente conseguiu fechar os olhos e descansar.

Tentou pedir para pararem e esperar seus amigos, mas não conseguia falar. Escutou duas portas batendo, uma seguida da outra, depois o som do motor sendo ligado. A mulher disse mais alguma coisa, mas ela não conseguiu compreender, pois já estava desmaiando.

Abriu os olhos subitamente, tentando lembrar onde estava. Encontrava-se deitada no banco traseiro de um veículo, coberta por dois grandes lençóis. Achou um exagero a quantidade de tecido, mas, assim que se sentou, percebeu o quanto estava frio. Então, pouco a pouco, as coisas começaram a fazer sentido para ela. Estava exausta depois de ter sofrido graves ferimentos e foi resgatada na beira da estrada por alguém que, aparentemente, era uma mulher. Instantaneamente olhou para seus machucados: cobertos e provavelmente limpos, já que as ataduras estavam livres de manchas de sangue. Procurou pela tal mulher e a viu no banco do motorista, dormindo. Olhou pela janela do veículo no instante em que a tempestade começou. Não demorou muito para que a motorista acordasse com o barulho da chuva e percebesse pelo espelho retrovisor que sua passageira estava acordada. Ela olhou para trás, assustada, como se tivesse tido a impressão de que a garota misteriosa jamais acordaria.

A mulher, que mais parecia uma adolescente, tinha os cabelos ruivos e incríveis olhos azuis. E a jovem tentou lembrar-se da última vez que viu alguém ruivo, mas nenhuma lembrança lhe veio à mente. A jovem da frente lançou-lhe um sorriso reconfortante, dando uma nova vida ao seu rosto. E, nossa, como ela era bonita. Seu nariz e boca pequenos, porém bem alinhados, lhe davam a sensação de que você nunca tinha visto alguém tão perfeito antes.

— Finalmente você acordou — disse ela com uma voz melodiosa.

— Quanto tempo eu dormi?

— Dois dias. Acho que você teve uma concussão.

Ela não se lembrava de ter batido a cabeça, mas talvez tenha sido no asfalto da estrada, quando caiu com tudo no chão.

— Mas está tudo bem — avisa. — Você parece recuperada.

— Obrigada — consegue dizer. — Por ter cuidado de mim.

— Sem problemas.

Ela faz uma breve pausa antes de perguntar:

— Aliás, qual é seu nome? Sabe, é estranho fazer de tudo para manter viva uma pessoa da qual você não sabe nem o nome.

— Carol — responde sorrindo. — E o seu?

— Gwen.

— Bem, Gwen, obrigada por tudo. Sério mesmo. Talvez eu estivesse morta se não fosse por você — disse Carol.

— Tudo bem, até que foi fácil cuidar de você.

Elas trocaram um sorriso amigável, mas repentinamente o sorriso de Carol sumiu de seu rosto. Thiago e os outros.

— O que foi? — indagou Gwen.

— Me diga uma coisa, estamos perto de onde você me encontrou?

— Não, eu segui viagem durante os dois dias — informa. — Precisava encontrar um posto de gasolina, já que meu estoque está acabando.

— Eu preciso voltar! Meu irmão e meus amigos, eu havia me separado deles depois que uma horda nos perseguiu — disse nervosamente. — Eu preciso voltar agora!

— Carol, acalme-se!

— Você tem gasolina suficiente pra voltar?

— Eu acho que sim, mas...

— Então vamos agora — interrompeu Carol. — Eu preciso encontrá-los.

— Veja bem, essa tempestade... ela está ameaçando cair há horas, o céu ficou tão fechado que eu não saberia dizer se era dia ou noite. É muito ruim dirigir agora, precisamos esperar.

— Mas eles podem...

— Carol, se eles realmente se importam com você, eles não irão embora daquela região sem te encontrar. Vamos esperar a chuva passar e depois voltamos, simples assim.

Carol passa cerca de um minuto pensando no que Gwen acabara de dizer. Eles não iriam embora sem a encontrar. Iriam? Não... Thiago e Amy, eles jamais iriam sem uma resposta. E Bob... Eles haviam jurado que sempre ajudariam um ao outro, e havia também o fato deles terem se tornado verdadeiramente amigos. Terry, Julie e Zac, eles também não desistiriam de procurá-la, porque seria o que ela faria se isso acontecesse com eles. Gwen estava certa, elas deveriam esperar. E Carol genuinamente torcia para que sua teoria estivesse correta.

Mais um interminável dia se passou, e a chuva continuava a cair torrencialmente. Quando finalmente deu uma trégua e a neblina se assentou, Carol pediu fervorosamente que Gwen dirigisse de volta. Mal podia esperar para ver os amigos. Apesar do fim da tempestade, o céu não se abriu e o frio permaneceu cortante, obrigando ambas a usar qualquer tipo de tecido para se esquentar. Mas a ansiedade era tanta que Carol passou a ignorar o frio depois que seguiram viagem.

— Você pode ficar com a gente, sabe? — pede Carol. — Eles são ótimas pessoas, e excelentes sobreviventes.

— Eu adoraria. É chato ficar tanto tempo sozinha.

— Bem, então seus problemas acabaram.

No início da noite, Gwen convenceu Carol de que deveriam parar para dormir e continuar no dia seguinte, de manhã bem cedo. Obviamente Carol protestou no início, mas Gwen, como a mais velha e mais racional, fez com que ela concordasse. É claro que Carol mal pregou os olhos à noite. Acordou Gwen antes mesmo de o Sol nascer, e a fez comer enquanto dirigia.

Mais uma vez, o céu permaneceu escuro e vazio, sem dar sinais de quando voltaria ao normal. Por volta de meio dia, elas tiveram de encher o tanque, acabando com o último galão de Gwen. E ainda tinham mais algumas horas de viagem. Carol fez de tudo para fazer o tempo passar. Deu uma lida em seu caderno, limpou a arma que Terry havia lhe dado e também seus óculos, conversou com Gwen, comeu algumas coisas e tirou uma soneca. Mas os minutos arrastavam-se do jeito mais preguiçoso que ela já presenciou. Às quatro horas da tarde, a gasolina acabou.

— Estamos muito longe? — Carol pergunta.

— Não muito. Se formos rápido, alcançamos o ponto onde te encontrei em até meia hora.

Uma árvore próxima chama a atenção de Carol. Ela ajeita os óculos e se aproxima. Duas palavras escritas de qualquer jeito fazem seu coração pular: “Carol Jones”. Abaixo de seu nome, uma discreta seta indica que ela deve continuar pela estrada.

— Eles estiveram aqui — diz ela. — Estão me esperando.

Corre para o carro e nota mais duas árvores marcadas com o seu nome e a pequena seta. Pega sua mochila, que ela já havia deixado pronta, e segue a instrução da árvore.

— Ei — chama Gwen. — Me espera.

Gwen agarra seus pertences, fecha tudo em seu carro e apressa o passo para alcançar Carol. Depois de dez segundos andando, ela não consegue resistir e começa a correr. Sua cabeça lateja, o que comprova que ela não está cem por cento recuperada, mas ela não para de correr. Não demora muito para que ela veja um trailer parado na estrada e, em seu teto, duas pessoas estão sentadas de frente uma para a outra. Ela tem certeza: São Thiago e Amy.

**

Ontem e hoje voltamos um pouco mais cedo de nossa busca, totalmente sem esperanças. Há exatos cinco dias, Carol está desaparecida. Nós evitamos falar na frente de Thiago, mas todos achamos que ela morreu. É de endurecer o coração ver Thiago e Bob chorando pelos cantos, e é pior ainda ficar parada sem fazer nada. Nós procuramos em toda a região num raio de, mais ou menos, vinte quilômetros. E nenhum sinal dela. Eu e Thiago estamos montando guarda hoje, sobre o trailer, esperando a noite cair. Olho para Thiago. Ele se deteriorou muito nos últimos dias. Parou de comer, e está muito magro. O olhar vazio e a barba começou a crescer o fazem parecer dez anos mais velho.

— Queria ao menos encontrar seu corpo. Ela devia... ter sido enterrada adequadamente — diz ele.

Seu mórbido comentário me pega de surpresa. Se até mesmo Thiago desistiu... Lembro da promessa que fiz a Bob, de que a encontraríamos e de que eles dançariam muito juntos. É uma pena eles não...

— Meu Deus! — diz Thiago. Ele está olhando fixamente para a estrada, e eu acompanho seu olhar.

É difícil de acreditar, mas Carol simplesmente está vindo em nossa direção. Ela está chorando, é evidente, mas um grande sorriso lhe atravessa o rosto. Thiago segura na lateral do trailer e se joga no asfalto, correndo de qualquer jeito para alcançá-la. Corro para a escada que leva ao interior do trailer e passo correndo por Julie, Terry e Zac, parando ao lado de Bob, que está sentando em uma das poltronas.

— Ela voltou — é tudo o que eu consigo dizer.

Bob corre para fora, tão desajeitado quanto Thiago, e eu vou atrás dele, seguida pelos outros. Uma alegria enorme me enche o coração quando vejo Thiago agarrado à Carol, chorando tanto que vejo seus ombros tremendo. Percebo que eu também estou chorando. Noto uma pessoa atrás de Carol, carregando duas mochilas e sorrindo até não poder mais. Thiago agora larga a irmã e eu me aproximo enquanto ela e Bob estão se abraçando. Escuto ele dizer:

— É tão bom te ver de novo.

— Igualmente — responde ela em meio às lágrimas.

Quando eu finalmente consigo abraçá-la, começo a soluçar. Eu realmente não estou preparada a perder mais ninguém.

— Nunca mais nos assuste assim — digo. Ela não responde e afunda o rosto no meu casaco, desabando em lágrimas.

Pesadas gotas de chuva começam a cair do céu, e todos nós corremos para dentro do trailer.


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Notas finais do capítulo

Eu pensei seriamente em dividir esse capítulo em duas partes, mas achei melhor não pq isso sempre me confunde. Ficou um pouco grande? Ficou! Mas acredito que valeu a pena.
Me avisem sobre erros ortográficos pq já são três da manhã e eu ainda tô aqui, caindo de sono, então não verifiquei direito.
Eu amei escrever esse cap e acho que ficou bom, e espero que tenham gostado também!
Sobre esse gif: CAROL EU TE AMO!!
Amo vcs e obrigada por tudo ♥
Até o próximo!!
Abraços, Beatriz ♥



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