Remember Me escrita por Miaka


Capítulo 7
Reconhecimento


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! ♥ Como sempre, muito obrigada por todos que estão lendo, acompanhando, comentando! É o que me motiva a prosseguir a história que espero que estejam gostando! ♥



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O clima de tensão era evidente na expressão de todos aqueles que foram reunidos em um dos salões menores do palácio imperial de Kou.

O primeiro príncipe, Ren Kouen, havia ordenado que fossem reunidos todos aqueles que estiveram em contato com o chefe parlamentar de Sindria durante sua estadia no país. E, claro, as notícias voavam e todos já tinham conhecimento de que aquele homem estava de volta ao palácio há uma semana, retornando gravemente ferido - e que fora trazido pelas mãos do próprio príncipe.

Todos os que ficaram a cargo de cuidar dos ferimentos de Ja’far não sabiam o que se passara com o conselheiro do país do extremo-sul. Além do mais, os responsáveis pela emboscada haviam sido mortos por aquele que deveria ser sua vítima. Sendo assim, não havia nenhuma hipótese de Kouen sequer estar envolvido no dito “acidente” que ocorrera com Ja’far.

Porém, com a nova possibilidade que havia surgido com seu despertar, o príncipe precisava instruir seus súditos.

— Acho que está se precipitando. - comentava Koumei, que seguia os passos apressados de seu irmão, tropeçando nos próprios pés.

— Não há razões para se preocupar, Koumei. - sem encará-lo e focado em seu caminho, o ruivo afirmou.

Pararam diante das portas duplas que o levariam àquele lugar onde já eram esperados. O mais velho encarou o rosto que era marcado pela severa acne que o segundo príncipe sofria. Koumei estava realmente sério ao encará-lo e Kouen, cruzando os braços e soltando um longo suspiro, decidiu lhe dar atenção antes de cometer algo que, segundo o mais jovem, era imprudente.

— Meu irmão, já pensou na hipótese de esse homem estar mentindo quanto à amnésia?

Perspicaz e astuto como era, Koumei estava certo em levantar tal hipótese.

Mas não. Kouen havia visto com seus próprios olhos a terrível crise que Ja’far tivera há algumas horas. O desespero e a dor estampados em sua expressão. Não havia como fingir daquela forma, tinha certeza do estado delicado em que ele se encontrava..

— É completamente improvável isso, Koumei. Eu vi quando Ja’far acordou completamente desorientado.

— Lembre-se de que antes de ser empregado do Sinbad, aquele homem já foi um temido assassino! Um dos mais perigosos de toda Sham Lash!

— Como você disse… - Kouen esboçou um sorriso despreocupado. - já foi— ele enfatizou o tempo verbal. - É passado! Não há como ele ter fingido daquele jeito. Estava completamente fora de si!

— Pode ser um ótimo ator. - foi a vez do mais jovem cruzar os braços. - Meu irmão e rei… Eu realmente gostaria de entender porque está tão obsessivo em manter aquele homem aqui.

E de todas as palavras que Koumei havia dito, aquelas eram as que deixaram Kouen mais desconfortável.

Inevitável não voltar a suspirar, cerrando os olhos. Talvez por que, em seu âmago, nem mesmo o primeiro príncipe tinha ideia do porquê estar fazendo aquilo. Ou até tinha, mas tal possibilidade soava tão ridícula para ele.

— Koumei… - ele voltou a abrir os olhos rubros. - Vamos fazer Sinbad vir até aqui, trazendo seus generais, declarando guerra contra nós!

O mais novo piscava, ainda inconformado com as atitudes tão impensadas de quem costumava ser tão analítico quanto ele mesmo.

— No momento em que Sinbad romper as regras que ele mesmo criou para sua Aliança, os países que pertencem a ela ficarão contra Sindria! Naturalmente se aliarão a nós e expandiremos o nosso território. É nosso objetivo, certo?

E por mais que Kouen permanecesse tentando reafirmar que seus objetivos políticos e militares eram o que o guiavam em suas atitudes mais recentes, Koumei via em seus olhos que havia muito mais do que o mero interesse de unificar o mundo. Porém, nem seu próprio irmão havia notado o que estava acontecendo consigo mesmo.

— Bem, já está na hora.

Franzindo o cenho, o ruivo adentrou aquele salão, sendo acompanhado de seu irmão mais jovem. E assim que notaram a presença do primeiro príncipe, todos os presentes trataram de se curvar em respeito a ele.

Kouen seguiu até a bancada que ficava no centro de um alto tablado de madeira, que o deixava acima de qualquer um ali presente e, encarando aqueles olhares apreensivos, limpou a garganta antes de começar a falar.

— Espero que estejam todos aqui.

— A-Alteza. - um dos servos ergueu um pouco a cabeça para se dirigir a ele. - Conferi e todos que estiveram junto ao Ja’far-sama se encontram presentes.

— Ótimo. - o ruivo assentiu. - Bem, muitos não sabem, mas o conselheiro de Sindria, que esteve conosco e agora está convalescendo em nossas instalações é um velho conhecido meu.

Koumei imediatamente arregalou os olhos ao ouvir aquilo. Mais do que nunca, agora ele se questionava quais eram as reais intenções de seu irmão.

Teve de disfarçar a surpresa, escondendo parte do rosto por trás do leque que sempre trazia consigo, enquanto continuava a escutar o que Kouen tinha a dizer.

— Apesar de ter nascido em Parthevia, o conselheiro de Sindria e eu fomos grandes amigos e ele nos auxiliou muito a construir o império forte que temos hoje. - prosseguiu. - Mas, por obra do destino, ele acabou caindo em uma cilada que foi tramada pelo rei Sinbad, esquecendo-se de mim, de todos nós e de tudo o que nosso país representava para ele. Mas Ja’far voltou a nós e, após um choque, novamente está sem suas lembranças.

Todos pareciam extremamente surpresos e apiedados com aquela história.

Koumei chegava a rir daquele teatro com os lábios ocultos pelas penas escuras. Se pensava que Ja’far poderia ser um bom ator ao fingir uma amnésia, seu irmão era um profissional na arte de mentir.

— Portanto, quero que o tratem adequadamente como o conselheiro e chefe parlamentar de Kou que é o cargo que ele sempre mereceu e estou lhe dando agora que ele voltou a nós. Como apenas vocês estiveram em contato e já sabem de quem se trata, espero que informem também aos demais sobre a situação de Ja’far.

—---xxxxxx---

Lentamente abriu os olhos, surpreendendo-se com a escuridão que havia ao seu redor.

As chamas fracas de apenas dois candelabros iluminavam aquele lugar. Onde estava?

Sentando-se cuidadosamente, ele percebeu que não estava no mesmo quarto - que mais parecia a cela de uma prisão - de quando acordou antes, lembrando-se da forte dor que o torturou a ponto de fazê-lo desmaiar.

E justamente quando aquele homem tentava ajudá-lo a se lembrar de seu passado e havia mencionado que era conselheiro de um lugar chamado Sindria. E só de se recordar daquele nome, ele podia sentir sua cabeça voltar a latejar.

Sabia que se começasse a se desesperar, teria outro surto como antes. Precisava se manter calmo e tentar se lembrar de tudo, por mais que estivesse tomado pelo desespero.

— Olha sóóóóó!

A voz que cantarolava vinha daquele que, subitamente, adentrou o lugar pela janela.

Ja’far arregalou os olhos, assustado, ao ver aquele rapaz flutuar para dentro daquele quarto. Quem era aquela pessoa?

— O franguinho acordou! - divertido, Judal pousou diante da enorme cama. - Mas é duro na queda mesmo, hein?

E apesar de ele ser extremamente sorridente, por que o coração de Ja’far estava disparado?

Mesmo sentado à cama, ele apertou os lençóis que o cobriam em um instinto defensivo e, receoso, não deixou de encarar os olhos vermelhos dele. Seria um bruxo? Como conseguia flutuar daquele jeito? E por que sentia um forte aperto em seu peito ao vê-lo? Será que o conhecia?

E notando a aflição e falta de reconhecimento no rosto do conselheiro de Sindria, o magi cruzou os braços, contorcendo os lábios.

— Então é verdade! Não se lembra de nada, mesmo?

Ainda temeroso, Ja’far balançou a cabeça negativamente. Será que aquele homem poderia ajudá-lo como o anterior e lhe fornecer informações sobre quem era e o que fazia ali?

— V-você me conhece? - o conselheiro desviou o olhar ao indaga-lo.

— Há! É claro que sim! - o moreno apoiou os punhos nos quadris. - Você é o Ja’far, o franguinho covarde do Si…

— JUDAL.

Bem a tempo.

Kouen estava diante da porta entreaberta e, felizmente, havia interrompido a fala do sacerdote, que sorriu de canto ao ver o príncipe ali, então afastou-se da cama de Ja’far.

Esse, por sua vez, ao reconhecer o ruivo, sentiu seu peito ser preenchido por um intenso alívio. A presença daquele chamado Judal lhe trazia uma estranha inquietude e… medo.

— Não perturbe o Ja’far. Ele precisa descansar.

— Calma, calma. - Judal agitou as mãos informalmente. - Estava apenas entretendo ele.

— Ótimo, mas agora quero que se retire.

Judal arqueou as sobrancelhas ao encarar Ja’far, que permanecia calado, antes de caminhar até a porta, cruzando seu caminho com o do ruivo. Foi quando tocou o ombro do mais alto e sussurrou.

— Estou ansioso para ver como vai preencher essa casca vazia, Kouen.

O primeiro príncipe nada respondeu. Nem ao menos encarou aquele que ainda acenou para Ja’far antes de se retirar. O alvo permaneceu sem reagir enquanto o ruivo fechava a porta e caminhava até o agora conselheiro do Império Kou, sentando-se na poltrona que havia ao lado daquele leito.

Diferente do que acontecia com Judal, Ja’far não se sentia intimidado pela presença daquele homem, por mais que tivesse um bom porte e parecesse uma autoridade naquele lugar. E, de fato, ele era a segunda maior autoridade ali.

— Como se sente?

— B-bem… - Ja’far gaguejou.

— Sua cabeça não dói mais?

— Um pouco… - os dedos apertavam os lençois.

— Você sofreu uma pancada muito forte na cabeça. Ficou em coma por uma semana.

Ja’far arregalou os olhos ao ouvir aquilo.

Mas não era o suficiente.

Mesmo que seu passado estivesse completamente em branco, ele sabia que havia muito mais do que aquilo a ser revelado.

— C-como isso aconteceu?

Kouen mordeu o lábio inferior e suspirou. De certa forma sentia pena, afinal, conhecera Ja’far sendo uma pessoa extremamente dinâmica e agora ele parecia, como Judal havia dito, uma casca vazia.

— Foi um acidente. - era a maneira simplória e que evitaria algum erro, que poderia usar para explicar.

— Disse que eu vim… que eu era - consertou a si mesmo - conselheiro de um lugar chamado S… Sindr… - ele rapidamente levou a mão à fronte, sentindo aquela dor intensificar. - Argh, que droga!

— Não se esforce! - Kouen ordenou, tocando a mão que o alvo tinha sobre o colo. - Eu… Tsc, bem, eu disse o que… você acreditava ser.

Anh? - Ja’far piscou, retomando o foco.

— Ja’far...

Sentindo a mão ser envolvida pelas duas de Kouen, os olhos verdes foram encarados pelos do ruivo que parecia, até mesmo, se emocionar.

— Não se lembra mesmo de nada?

Ja’far apenas balançou a cabeça negativamente.

— Sua idade? Onde nasceu? Meu nome?

Ele permanecia a repetir aquele gesto.

Nada. Ja’far não se lembrava de absolutamente nada.

— Não se lembra nem do que vivemos juntos?

Foi inevitável ruborizar.

Do que aquele homem estava falando? O que havia vivido ao seu lado?

— M-me desculpe, mas… eu sinceramente não sei… nem quem você é.

— Entendo… - ele parecia cabisbaixo.

— Me desculpe. Eu… juro que estou tentando me lembrar! - Ja’far estava frustrado.

Kouen balançou a cabeça negativamente, querendo demonstrar que não havia problema quanto à confusão pela qual Ja’far passava. Tentava criar o ambiente mais confortável e tranquilo para ele. Enquanto isso ele não podia crer no quão conveniente tudo aquilo estava sendo.

Foi quando voltou a encará-lo e o ex-conselheiro de Sindria não desviou seu olhar. Afinal, precisava ser corajoso. Precisava ouvir quem era e resistir àquilo, por mais que seu corpo parecesse estar rejeitando seu passado.

— Eu sou Ren Kouen, Ja’far. - ele se apresentou. - Sou o primeiro príncipe do Império Kou, o país ao qual você jurou lealdade!

—---xxxxxx---

Sinbad acordou em um sobressalto, levantando a cabeça antes apoiada sobre a mesa.

Os olhos dourados estavam arregalados ao sacudir a cabeça para os lados para perceber que havia adormecido durante o trabalho.

Bastante assustado ele notou que a noite já havia caído. O coração ainda estava acelerado, a mente atormentada pelo sonho recorrente.

E constatando ter sido traído mais uma vez por seu subconsciente, Sinbad suspirou, apoiando a fronte nas costas de suas mãos. Tão distraído que estava o rei mal percebeu quando Masrur, acompanhado de Yamuraiha, adentrou seu escritório.

— Sin-sama? - o fanalis parecia surpreso ao vê-lo acordado

— Hm? - o moreno ergueu o rosto para encará-los. - Masrur? Yamuraiha? O que fazem aqui? - afinal, pela hora as alas administrativas do palácio já deviam estar vazias.

— Pipirika pediu ao Masrur para levá-lo aos seus aposentos quando viu que tinha adormecido aqui. - a maga explicou. - Sente-se bem, majestade?

— Sim, não se preocupem. - ele massageou a nuca. - Pipirika devia ter me acordado! - “Evitaria que eu tivesse novamente aquele pesadelo”, ele completou mentalmente.

— Parece bastante exausto. - Yamuraiha comentou. - Por que não sai para se divertir com os rapazes hoje?

— Não, não. Como você disse, Yamu, estou muito cansado e… depois da reunião, eu prometi a mim mesmo que não beberia uma gota de àlcool até que Ja’far voltasse. - decidido, ele afirmou. - Aliás, conseguiu entrar em contato com ele?

Yamuraiha se esforçou para manter a expressão tranquila ao ser questionada por sua majestade. Masrur, por sua vez, desviou o olhar.

— Na verdade eu ainda estou tentando! Eu realmente acho que ele está chegando, majestade, e se estiver tão próximo, com certeza aos arredores da barreira, não conseguiremos comunicação. - a maga forçava seu melhor sorriso.

— Entendo...

Sinbad estava, de fato, sem forças para notar o nervosismo nas palavras de Yamuraiha. O melhor a fazer, definitivamente, era ir dormir. E com aquilo em mente, o rei afastou a cadeira e se levantou para, em seguida, estalar as costas.

Era extremamente estranho ver seu rei ir dormir tão cedo, mas era compreensível quando pensavam que Sinbad estava fazendo de tudo para que os dias passassem rapidamente. A ansiedade pelo reencontro com Ja’far transformara completamente seu rei e aquilo só servia para angustiar mais a maga.

— Quer que eu o acompanhe até seus aposentos, Sin-sama? - o fanalis indagou.

— Não, não se preocupe. - ele esboçou um sorriso. - Boa noite, Masrur e Yamu! Bebam por mim! Só não se esqueçam da reunião amanhã de manhã.

— Boa noite, majestade!

Os dois generais exclamaram em uníssono enquanto viram seu rei se retirar daquela sala. E assim que se viu a sós com o ruivo, Yamuraiha deixou a fraqueza que a tensão trazia a seus joelhos fazer com que caísse sentada na cadeira onde Sinbad outrora estava. Os dedos entrelaçados sobre seu colo tremiam, demonstrando seu nervosismo.

— Você devia contar a ele, Yamu-san. - Masrur disse sem esboçar qualquer emoção.

— Não tenho coragem! E, aliás, pode ser mesmo um defeito do ítem mágico que construí! Sou… péssima no que faço mesmo. - ela tentou ironizar suas próprias habilidades e como ela gostaria de estar certa.

— Ja’far-san pode ter esquecido o artefato mágico em Kou.

— Só pode ter sido isso, Masrur. Porque… há mais de uma semana, ele está lá e Ja’far-san não nos atende. Espero que…

Yamuraiha impediu a si mesma de completar, como se não pudesse tolerar nem a mínima hipótese de ter acontecido algo ruim com seu amigo.

Mordendo o lábio inferior, a maga sentiu a mão pesada do robusto homem tocar seu ombro, confortando-lhe. Esperar era tudo o que podiam fazer.

—---xxxxxx---

Ja’far estava atônito com as palavras de Kouen. Então, segundo o que o primeiro príncipe havia dito, ele era seu guarda-costas pessoal durante a infância, pertencendo ao grupo assassino Sham Lash, o que explicava ele não ter uma família, porém, gostaria de se lembrar do período em que esteve com eles também.

— Éramos muito mais do que servo e príncipe, Ja’far. - ele prosseguia. - Você era… digo, você é muito especial para mim. - o ruivo explicava sem entrar em detalhes. - Mas, infelizmente, por conta daquele homem… nos separamos.

Anh? - o alvo arregalou as esmeraldas. De quem Kouen falava?

— Não vamos falar sobre isso agora… Não quero fazê-lo se esforçar mais.

— Não, por favor! - Ja’far insistiu. - Me conte! Por que nos separamos?! Eu… eu fui para longe daqui? Me conte… a… alteza. - ele gaguejou ao se referir àquele homem como seu príncipe.

Abaixando a cabeça, sentindo o rosto corar ao chamá-lo assim, Ja’far foi surpreendido pelo toque firme daquela mão masculina em seu queixo.

O príncipe o forçou a encará-lo e o ex-conselheiro de Sindria engoliu a seco. Ou melhor, aquele que agora Ja’far via em si mesmo: o ex-assassino que se tornara guarda-costas de Ren Kouen.

— Kouen. Me chame de Kouen. - ele repetiu e Ja’far apenas assentiu antes de suspirar para prosseguir. - Você foi tirado de mim, Ja’far… por um homem repugnante.

O alvo piscou ao ver como o ruivo rangia os dentes ao falar daquela pessoa.

— Quem é ele, Kouen? - tremendo, Ja’far indagou.

— É o rei do país ao qual você estava servindo, Ja’far… Ele o fez acreditar que éramos inimigos! Por isso estava naquela cela… - ele pausou por um instante. - Eu… pensava que teria que te manter preso até fazê-lo se lembrar de tudo. - era a melhor explicação que Kouen podia dar.

— S-Sindria… - ele finalmente conseguira falar, gaguejando um pouco, sem sentir aquela dor lancinante.

— Sim. Você… perdeu a memória e aquele homem o colocou contra mim, usou você de todas as formas e até mesmo… - foi a vez de Kouen desviar o olhar, como se aquele tópico o constrangesse. - tinha uma relação íntima com você.

Ja’far arregalou os olhos, o rubor tomando conta de seu rosto. Aquilo não era possível.

Se por um lado sentia a angústia de, subitamente, ter conhecimento de uma vida que ele não lembrava ser sua, sentia agora o asco de pensar que havia sido usado assim por alguém, como um objeto. E ao ver que Kouen sofria ao pensar naquilo, sentia-se ainda mais culpado.

— N-não, não deve ter chegado a esse ponto! Eu nunca…

— Você não teve culpa, Ja’far! Você não queria isso, tenho certeza! - o ruivo o interrompeu. - Aconteceu exatamente como agora. Você perdeu a memória, mas… naquela época caiu nas mãos daquele miserável! - Kouen levou a mão até a curva do rosto do alvo e acariciou aquela região. O rubor se intensificou no tão pálido. - Pobrezinho, sofreu tanto...

Sem saber como reagir, Ja’far só conseguia acatar a história que aquele homem lhe contava. Como haviam sido cruéis com eles, afinal, haviam lhe tirado de Kouen e… havia sido usado por seu próprio algoz.

Sentia seu coração apertar, como se fosse sufocar. Precisava saber quem era, por mais que aquele homem, que parecia ter passado por tanto, quisesse evitar o seu sofrimento.

— Kouen, me diga quem é, eu preciso saber! Qual o nome dele? Eu… eu quero tentar me lembrar! Se… se me lembrar, talvez… eu lembrando do que ele fazia comigo, eu…

Shhh!

Notando a exasperação do alvo, Kouen o puxou para perto de si, afundando os dedos nos fios esbranquiçados de um trêmulo Ja’far, que parecia lutar para respirar, tomado pela aflição.

— Acalme-se! Já se esforçou demais por hoje…

Ja’far balançava a cabeça negativamente. Precisava lembrar e a frustração de ter seu passado vazio e aquelas informações soltas parecia lhe corroer.

Apoiado ali no peito do príncipe, ele cerrou os olhos. Lembrava-se da sensação familiar, sentindo-se protegido ali. Será que costumavam ficar assim? Porém, o perfume masculino forte, impregnado naquelas vestes pesadas, não lhe remetia a algo que parecia adormecido em sua memória debilitada.

Kouen, por sua vez, tinha o queixo apoiado na cabeça do alvo. Sem ter sua expressão revelada a ele, sorria vitorioso. Como queria lhe revelar o nome de Sinbad e instigar Ja’far a odiá-lo, desprezá-lo. Mas era muito cedo para aquilo e sabia o quanto aquilo afetaria Ja’far, que já estava extremamente abalado com tantas “revelações” daquele passado que fora plantado em sua mente.

— Meu irmão?

A porta se abriu e revelou Koumei, que parou imediatamente onde estava ao surpreender Kouen abraçando o conselheiro de Sindria, ou melhor, o que sobrara dele. O desagrado ao observar aquela cena era nítido no rosto do segundo príncipe.

Era uma ótima oportunidade para testá-lo. - o estrategista pensou consigo mesmo.

— Pode entrar, Koumei. - Kouen sorriu com malícia para o mais jovem, indicando a ele que tudo estava conforme seus planos. - Lembra-se do Ja’far? Ele está se recuperando. - completou.

Koumei não esboçou um sorriso sequer quando o rapaz lhe encarou. Nitidamente Ja’far não o reconhecia e aquilo ficou evidente ao fitá-lo. Os olhos verdes cresceram, confusos ao ver aquele homem que se parecia tanto com Kouen.

— Vim chamá-lo para jantar. - ele afirmou, como se ignorasse o apontamento do outro.

— Ja’far pode vir conosco, o que acha? - propôs.

— N-não. - o alvo gaguejou. - Minha cabeça ainda doí um pouco, obrigado…

— Mandarei os criados trazerem seu jantar, então. Creio que realmente ainda não deve sair da cama.

Afastando-se e saindo daquele abraço, Kouen se levantou.

Ja’far permanecia um tanto quanto apático, a ponto de nem notar o momento em que o homem que acabara de entrar naqueles aposentos depositou aquele artefato mágico sobre a cabeceira da cama.

— Este é Koumei, Ja’far, meu irmão mais novo. - Kouen apresentou. - Vocês costumavam se dar muito bem. Vocês tem a mesma idade. - ele se lembrou da conversa que tiveram na noite anterior à partida do conselheiro de Sindria.

— P-prazer… - ele não sabia como se portar.

Koumei nada respondeu. Apenas suspirou, afinal, ainda tentava engolir aquilo que considerava um traço de insanidade de seu irmão mais velho. Estava sendo difícil para ele aceitar aquilo.

— Vamos logo, estou com fome.

— Antes de dormir venho ver como você está, Ja’far.

O ex-conselheiro de Sindria nem ao menos ouviu as palavras de Kouen. Estava completamente perdido em devaneios, tentando absorver e se lembrar de algo referente ao que aquele homem havia lhe dito.

Assim que Kouen e Koumei se retiraram dos aposentos que agora pertenciam a Ja’far, o mais velho parecia indignado ao se dirigir a Koumei.

— Por que deixou o artefato de comunicação ali?

— Eu que pergunto porque seu prisioneiro está num dos quartos de nobres. - Koumei cruzou os braços. - Meu irmão e rei, o que estou fazendo é testando aquele homem,

Hm? - tentando se acalmar, Kouen cruzou os braços. - O que quer dizer?

— Ja’far continuará sendo vigiado enquanto estamos fora. Se ele estiver mentindo, com certeza tentará entrar em contato com Sindria.

— Eu não acredito que ele esteja mentindo… - o primeiro príncipe farfalhou os fios avermelhados.

— Melhor nos prevenirmos. Senão estaremos com um agente duplo passando informações nossas para Sindria.

— Tem razão… - Kouen suspirou.

Ja’far permanecia pensativo. Será que o homem ao qual Kouen se referia era aquele cuja silhueta aparecera em seu sonho? Como havia parado em outro país e tinha sido enganado de uma forma tão suja? Certamente era alguém extremamente impiedoso para agir assim.

Mas precisava se acalmar e… acreditar em Kouen.

Afinal, naquele momento em que não tinha nada, sentia-se completamente vazio e perdido, ele foi o único que estava ali para lhe estender a mão. E como se sentia seguro ao seu lado. Aquele instinto, Ja’far tinha certeza, não era em vão.

Porém, enquanto refletia sobre tudo o que o príncipe daquele Império havia lhe dito, ouviu um estranho som que se repetiu uma, duas, três vezes.

Seguindo o barulho, chegou até aquele estranho objeto que estava sobre a mesinha de cabeceira. Uma forte luz brilhava a cada toque. Ele se perguntava o que significava aquilo enquanto observava o objeto.

— Ja’far?

Os toques, subitamente, foram interrompidos por aquela voz que chamara seu nome.

Uma voz que Ja’far não reconhecia, mas que fez uma batida de seu coração de falhar.


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Notas finais do capítulo

Mais um capítulo que vocês devem estar querendo me caçar depois de terminar assim! Hahaha! Mas não fiquem assim, semana que vem tem mais! E aproveitando para falar de Escape, que devo postar ainda essa semana também! ♥ Muito obrigada por lerem e lembrem-se que comentários, críticas, elogios, tudo é sempre muito bem-vindo e respondido com muito carinho! - mesmo quando demoro! hahaha! ♥



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