Dépendance escrita por KarenAC


Capítulo 17
Capítulo 17 - Devaneio


Notas iniciais do capítulo

Postando tarde porque não tive tempo antes ;___;
Espero que gostem ^__^



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Perder-se também é caminho.

Clarice Lispector

 

Ladybug jogava o corpo sobre os prédios sem pensar duas vezes, deslocando-se mais rápido do que lembrava ser capaz, os músculos antes doloridos cedendo ao esforço. Ela precisava chegar rápido. Rápido.

Seus olhos bateram no prédio que servia para o esconderijo de Chat e do alto já conseguiu ouvir altos estrondos e a voz de Plagg gritando, ecoando no ar frio da madrugada. Ela deixou-se cair ao lado dele no beco, recolhendo o ioiô na cintura.

“Eu disse pra Tikki que não era pra você vir!” os cabelos de Plagg estavam desalinhados, o rosto retorcido em uma expressão de pânico.

“Você achou que eu ia ficar lá esperando?” Ladybug respondeu urrando, sentindo a garganta seca pronunciar as palavras roucas.

Plagg esfregou as pontas dos dedos na cabeça com força, bagunçando os cabelos, e Ladybug imaginou quantas vezes ele já não tinha feito aquilo nas últimas horas para chegar naquele estado. Do lado de dentro da garagem, um estouro de metal soou.

“O que foi isso?” ela perguntou, colando o ouvido no portão.

“Eu não sei. Isso já aconteceu umas dez vezes. Não sei o que ele tá fazendo.” Ladybug notou que suor brotava no rosto de Plagg, deslizando entre as rugas da testa até chegar ao queixo enquanto ele fixava os olhos no portão “Chat, abre isso!” ele socou o portão com os dois punhos fechados, o metal grosso sacudindo sob os golpes.

“Saiam daqui!” ele urrou do lado de dentro, e Ladybug arregalou os olhos com o tom irreconhecível na voz dele “Vão embora! Vocês não podem me parar!” o tom era tão agressivo que quase soava como uma ameaça.

“Chat! Abre esse portão!” Ladybug copiou Plagg, batendo com as laterais dos punhos no portão. Sons de objetos quebrando foram ouvidos do lado de fora, e Ladybug e Plagg se olharam com olhares extremamente preocupados.

“Você tentou a entrada de cima?” Ladybug perguntou, virando-se para Plagg.

Ela lembrava quando estivera no segundo andar da garagem como Marinette que havia uma entrada no teto, que Chat provavelmente usava mais seguido do que o portão para não chamar tanta atenção para o beco.

“Tentei, eu sempre entro por lá. Tá trancada.” Plagg respondeu, gemendo enquanto olhava para as câmeras no topo do portão.

“Eu vou entrar!” ela disse para Plagg, tomando distância e olhando para cima, onde a janela de vidro do andar superior podia ser vista.

“Não! É melhor esperar ele abrir, a gente não sabe como ele tá!” Plagg segurou o braço dela, a respiração ofegante e as pupilas dilatadas na direção dela.

Plagg, mais do que ninguém, sabia como Chat ficava quando estava fora de si, e que grande parte das vezes ele se tornava violentamente incontrolável quando contrariado.

“Não me interessa!” ela falou ignorando o toque de Plagg sobre o braço e pegando o ioiô com a mão direita, medindo a distância até a janela com o olhar preso no alto “Eu quero saber o que tá acontecendo com ele.”

Plagg olhou para a expressão decidida no rosto dela, e soube que não conseguiria convencê-la do contrário. Talvez, só talvez, ela fosse a única pessoa no mundo capaz de trazer Chat Noir de volta à razão, de tirá-lo daquela onda de pânico que saber a identidade dela havia lhe causado. Era irônico como a mesma pessoa que havia engatilhado aquela situação era a que poderia, com sorte, resolvê-la.

Ladybug girou o ioiô no ar, atirando-o em direção ao parapeito da janela do segundo andar, onde o objeto de ferro enroscou e se prendeu. Ela puxou duas vezes pelo fio, testando a estabilidade, e correu para a frente, pegando velocidade para pular. As plantas dos pés encontraram a parede e ela começou a escalar, segura pelo fio do ioiô que contraía com a subida. Sentia os olhos de Plagg abaixo, preso nas costas dela, mas não se virou para olhá-lo.

Ela chegou ao relevo na beirada da janela, pousando com as pernas dobradas embaixo de si e colocou as mãos em forma de concha contra o vidro da janela, tentando enxergar o lado de dentro. No canto distante, na abertura da escada, uma fraca luz subia, mas o cômodo era pura escuridão. Ladybug girou a cabeça procurando uma brecha no vidro que pudesse indicar a presença de uma tranca, mas os vidros pareciam todos inteiros, sem aberturas. Ela suspirou pesadamente. Não tinha outro jeito, teria que quebrar a janela.

Ela cobriu o rosto com o antebraço e jogou o ioiô no vidro que se despedaçou à sua frente, os cacos sendo jogados para o lado de dentro do prédio. Com o cotovelo, fez uma abertura maior à sua frente, conseguindo finalmente um espaço bom o suficiente para atravessar. Ela contorceu o corpo rapidamente para entrar, e na pressa uma ponta de vidro ainda presa na janela rasgou a pele do seu rosto, logo abaixo da máscara. Ela desceu dentro do cômodo, levando a ponta dos dedos até a bochecha direita que ardia, mas o sangue se misturou ao vermelho do uniforme, e ela ignorou.

Ladybug atravessou o segundo andar da garagem, correndo para a escada de ferro no canto do lugar. Seus pés então diminuíram o ritmo, descendo hesitantes pelos degraus em caracol, os passos atingindo o metal que reverberava, enquanto sua mão direita deslizada pelo corrimão liso de ferro. A luz do andar de baixo era fraca e inconstante. As lâmpadas piscavam e zumbidos preenchiam o ar junto com um forte cheiro de fio queimado. Quando ela chegou à última volta da escada, levou as mãos à boca em choque.

Nenhuma das cinco grandes mesas da garagem estava no lugar. Duas estavam viradas de cabeça para baixo em um canto, em uma delas faltava três patas que estavam caídas mais à frente; outras duas empilhadas uma sobre a outra, e a quinta, maior de todas, que abrigava o grande monitor, estava dilacerada em dezenas de pedaços. Os monitores zumbiam, caídos no chão, espalhados em um caos de vidro e peças. Os armários estavam tombados, os conteúdos espalhados por todo o lugar. Líquidos de cheiro forte se misturavam, vazando pelo chão em pequenas poças, alguns de seus recipientes ainda pingando.

Ladybug caminhava em meio ao caos, as mãos ainda sobre a boca, a respiração ficando ofegante a cada detalhe que seus olhos captavam. Pedaços do reboco da parede arrebentados; uma das lâmpadas fluorescentes pendurada pelos fios ainda acesa; fios coloridos faiscando da saída de um dos monitores caídos que ainda insistia em funcionar, a tela preta piscando palavras de cabeça para baixo. Ela baixou as mãos do rosto, sentindo a garganta apertar. O lugar parecia o cenário de um filme de terror.

Ladybug ergueu os olhos e viu Chat Noir de costas, com os braços apoiados no portão pelo lado de dentro, os ombros largos alinhados dentro do uniforme negro, o corpo inclinado na superfície de metal.

“Chat?” a voz dela saiu baixa, mas ecoou pela garagem como se ela tivesse usado um alto-falante, batendo nas paredes e voltando para os ouvidos dela várias vezes. Ainda assim, ele não se moveu.

Ela se aproximou, observando a posição dele em pé de costas para ela, as pernas firmes, os antebraços apoiados no portão, a cabeça baixa. Ele nem parecia respirar, e aquilo a fez engolir a seco. O que estava acontecendo com ele?

“Chat, sou eu.” ela tentou de novo, agora mais próxima, a mão erguida prestes a tocá-lo no exato momento em que um monitor que ainda não havia tombado caiu no chão, reverberando um estrondo por dentro da garagem.

Ladybug se encolheu com o barulho, e quando girou o rosto para procurar a origem do som, sentiu algo pular sobre si e derrubá-la no chão. Com um baque surdo, a nuca dela atingiu o concreto frio com força, sua visão escurecendo. Sentiu um grande peso sobre os ombros, e quando sua visão retornou ao normal e ela olhou para cima viu Chat sobre ela, um joelho de cada lado do corpo, as mãos segurando-a com força e apertando seus ombros contra o chão, mas em meio a tudo, o que mais a aterrorizava era a expressão que ele tinha no rosto.

Chat Noir a olhava friamente sob a máscara, os olhos semicerrados, o semblante de uma tranquilidade implacável, como se ela fosse apenas um objeto sendo analisado, medido. Uma onda de terror a preencheu quando ela percebeu que ali, naquele momento, ela não o reconhecia, e ele não reconhecia ela.

“Chat-“ ela tentou começar, mas ele apertou os dedos nos ombros dela, fazendo-a silenciar.

“O que você quer aqui?” a voz dele era rouca e imponente. Ele murmurava, mas nos ouvidos dela as palavras chegavam como urros.

“Eu vim te buscar.” ela procurava no olhar dele algum sinal de reconhecimento, mas não encontrava “Você não pode-“

“Ninguém vai me dizer o que eu posso ou não posso fazer.” as palavras saíram no mesmo tom de antes, uma ordem que não deveria ser desobedecida “Ninguém.”

Ladybug franziu a testa. Algo estava acontecendo, algo estava tomando conta dele, e ela não conseguia dizer o que era, não conseguia saber o que era, mas aquele definitivamente não era o Chat Noir que ela conhecera naqueles últimos dias.

“Chat, por favor.” ela tentou se erguer, mas as mãos dele eram fortes e firmes e ela sentiu que ele abria as garras na direção do ombro dela, agulhas entrando no meio das fibras do uniforme.

Lembrava do dia em que estivera ali como Marinette, como ela a provocara no andar de cima, cercando-a sobre a cama, fazendo-a sentir-se frágil, mas ela conseguia sentir que ele não faria mal para ela, conseguia acreditar na bondade que havia no coração dele. Porém ali, olhando as pupilas fendadas que a olhavam como uma ameaça, Ladybug não sabia o que fazer. De um minuto para outro, ele se transformou de parceiro em perigo. E, pela primeira vez desde que havia conhecido ele, sentiu medo de verdade.

“Eu não sei quem você é.” a frase dele atingiu Ladybug como um soco no estômago, doendo mais do que as garras dele que agora começavam a alcançar a pele de seus ombros.

“Ladybug? Você tá bem?” Plagg gritava do lado de fora, as batidas insistentes no portão sacudindo o metal em trovoadas.

“Você sabe. Você sabe. Não faz isso comigo. Você sabe.” a respiração de Ladybug começava a ficar ofegante e ela sentia as lágrimas de angústia acumulando nos olhos.

“Eu não sei. Como você me achou? Como chegou aqui?” os olhos de Chat brilhavam em um misto de insanidade e fúria.

“Você tá me machucando.” Ladybug gemeu, sentindo os ombros sendo esmagados com a força dele e as garras contráteis começarem a beliscar sua pele.

“Fala!” ele bradou “Quem mandou você?” ele aproximou o rosto dela, os dentes rangendo em uma fúria crescente, a sombra do capuz enegrecendo mais ainda o olhar quando ele deslizou as mãos dos ombros para o pescoço dela “Quem?”

 

Mate.

Ela é perigosa.

Você precisa.

Mais uma vez.

Só mais uma vez.

 

Ladybug arregalou os olhos ao sentir as mãos dele cercarem seu pescoço, os dedos pressionando cada vez mais. Ela tentou falar, tentou pedir mais uma vez para ele lembrar dela, mas o choque a paralisou, apagando o pouco de raciocínio que ela ainda tinha.

 

Pela Marinette.

Faça pela Marinette.

Mate.

Mais uma vez.

Pela segurança dela.

Só mais uma vez.

 

Ladybug olhou para o rosto dele tão próximo e soluçou, as lágrimas descendo pelo rosto e molhando a máscara que começava a grudar na sua pele. Ela estava perdendo Chat Noir. Em algum canto da cabeça dele um gatilho tinha sido puxado, carregando-o para um lugar distante cheio de dor e medo, onde ele precisava lutar pela própria vida. Onde não podia confiar em ninguém, acreditar em ninguém.

Ladybug estava assustada, absurdamente assustada. O medo lançava calafrios pelo seu corpo e ela começava a sentir os tremores se acumulando nos membros, o ar começando a faltar aos poucos, mas cerrou os dentes e franziu a testa, compassando a respiração para manter-se sob controle, fungando para conter o choro que sacudia seu peito. Não porque queria, mas porque precisava. Porque ele precisava. Ela não conseguia imaginar o que ele devia ter passado para seu corpo reagir ao choque daquela forma, para virar uma ameaça aos olhos dele, mas sabia que em algum lugar lá dentro, ele estava com muito mais medo do que ela. Ele precisava de alguém, e ela estava ali. Não falharia com ele.

Suspirou, sentindo uma paz inexplicável tomar conta do seu peito. Levantou o antebraço até onde conseguiu e descansou a mão no rosto de Chat com carinho, sentindo o toque da pele quente sob seus dedos frios.

“Volta pra mim.” ela sussurrou quase sem ar.

No momento em que Ladybug o tocou, Chat Noir piscou, arregalando os olhos e lançando as sobrancelhas para o alto enquanto a soltava devagar. A mão dela começou a tremer contra a pele dele quando o viu retornar aos poucos, a expressão dele transformando-se vagarosamente de confusão em terror. Chat jogou o corpo para trás quando percebeu onde estava, e a mão de Ladybug que estava no seu rosto ficou suspensa no ar, esfriando aos poucos enquanto o olhar dela fixava no teto. Uma enorme sensação de alívio tomou conta dela quando a pressão sobre seus ombros diminuiu.

“Ladybug?” ele chamou por ela. Ele estava de volta. Havia voltado para ela.

Ela estava deitada, as costas gelando sobre o concreto, os tremores piorando mais e mais , mas ela sabia que o que sentia não sentia frio. Não era nada, a não ser medo. Mas não medo por si mesma, e sim medo de que ele se perdesse para sempre naquele lugar dentro da cabeça dele e não voltasse nunca mais.

Ladybug sentiu os olhos começarem a marejar, as lágrimas acumulando e escorrendo pelas laterais do rosto sem controle, e os soluços que antes ela tinha prendido na garganta agora sacudiam seu corpo violentamente. Ela colocou as mãos sobre os olhos, o pavor e a angústia preenchendo cada canto dentro dela.

Chat Noir estava em pé na garagem, os olhos girando ao redor, fitando com horror a destruição que o cercava, até que os soluços de Ladybug o levaram de volta ao presente. Ela estava deitada no chão, as costas das mãos cobrindo o rosto, o choro fazendo-a tremer.

 

Ladybug.

Meu Deus.

Marinette.

O que foi que eu fiz?

 

Ele correu até ela, ajoelhando-se e pegando-a nos braços, sentindo o corpo gelado contra o seu aquecer-se devagar, as mãos dela agarradas no seu uniforme como se ele fosse desaparecer a qualquer instante. Ele a enlaçou nos braços, o rosto dela umedecendo seu peito em um choro desesperado.

“O que foi que eu fiz?” a voz dele estava trêmula, hesitante, ele tinha medo de saber a resposta “O que foi que eu fiz com você?”

Ela ergueu os olhos, os lábios entreabrindo como se ela estivesse prestes a falar, mas só o que ele ouvia era o pranto entrecortado. Ela afundou o rosto no peito dele e ali ficou, os soluços sacudindo ambos. Chat inclinou-se para trás passando os dedos pelos braços de Ladybug, procurando ferimentos, até que sua mão alcançou os ombros e ela se encolheu. Ele apertou os olhos e quando viu as aberturas no uniforme dela brotando sangue trancou a respiração.

“O que...” ele aproximou a ponta dos dedos trêmulos do ombro direito dela, a respiração ofegando “O que eu...”

Ladybug ergueu os olhos devagar para o rosto de Chat, o pranto se acalmando conforme o corpo dela ia se aquecendo junto ao dele, e viu os olhos verdes franzidos pousados sobre o ombro dela.

“Tá tudo bem.” Ladybug murmurou entre soluços e ele fitou os olhos dela, os dedos ainda pairando sobre o ombro machucado “Não dói mais.” ela mentiu. Sabia que a dor dele naquele momento era muito maior do que a dela.

“Como eu-“

“Chat, não era você” ela chamou, as costas da mão direita secando o próprio rosto enquanto a voz dela se tornava tão baixa quanto um sussurro “Não era você.”

Chat Noir aproximou-a mais junto ao próprio corpo, os braços em torno dela como se nunca mais quisesse largá-la. Cerrou a mandíbula com força, sentindo a cabeça latejar e um gosto amargo invadir sua boca. Ele não merecia ela. Nem Ladybug, nem Marinette. Não merecia nenhuma delas. E ainda assim, ali estava ele, desejando ter as duas em sua vida.

“Chat, eu não consigo respirar.” a voz de Ladybug soou abafada e Chat percebeu que a estava abraçando com muita força.

“Desculpa!” Chat expirou a palavra, relaxando os braços ao redor dela e viu um sorriso sem jeito no rosto de Ladybug enquanto sentia os próprios lábios subirem timidamente “Você tá bem? Tá com dor?”

“Não, tá tudo bem.” ela já não mentia, o corpo aquecido contra o dele estava anestesiado em um misto de cansaço e alívio.

O olhar atento de Chat Noir caiu sobre o rosto de Ladybug e as sobrancelhas se curvaram quando notou o arranhão na bochecha dela. Ele levou a mão levemente até o corte já seco, acariciando-o com o polegar.

“O que foi que eu fiz com você?” ela nunca havia ouvido tanta dor na voz de uma pessoa, um tipo de dor tão profunda que o próprio coração dela quebrou.

Ladybug viu a expressão perdida no rosto dele, a angústia vazando por baixo da máscara negra, e levantou a mão devagar, colocando-a sobre a dele e sorrindo levemente.

“Fui eu mesma que me machuquei, na hora que entrei, e...” ela fez uma pausa e ergueu os ombros enquanto respirava fundo, relembrando os últimos minutos “Eu quebrei a sua janela, desculpa.”

Chat Noir segurou um sorriso. Ela estava ali machucada, arriscando a própria vida para ajudá-lo e se desculpando por causa de um vidro. Como ele demorara tanto tempo para perceber que ela era a Marinette? Quantas garotas mais seriam capazes de reagir àquela situação daquela forma?

“Chat, você não pode ir.” Ladybug afastou-se dele devagar, as palavras suplicantes, as mãos ainda agarradas ao peito do uniforme dele “Você não pode ir atrás deles.”

A expressão de Chat endureceu ao ouvir as palavras dela, lembrando-o do real motivo de ambos estarem ali. Ele não poderia arriscar que a Papillon encostasse nela. Anos vivendo dentro do inferno que era a Farfalle, anos passando por tudo o que passara para ter certeza que Marinette ficaria longe daquilo tudo e ali estava ela, a máscara sobre os olhos dizendo que ela fazia parte do grupo que corria o maior risco de todos.

Chat Noir cerrou os punhos. Ele queria contar para ela, tudo o que havia acontecido. Tudo o que sentia, o que pensava. Cada medo, cada tristeza, cada aflição. Tudo. Queria arrancar a própria máscara e entregá-la nas mãos dela, para que ela fizesse o que quisesse com aquilo. Mas ali, naquele momento e naquele lugar, mais do que nunca, ela era tudo o que ele tinha, e perdê-la seria o mesmo que voltar para o fundo do poço.

Chat Noir sabia que Marinette não estava pronta para aceitar Adrien. Ele tinha certeza absoluta daquilo, porque cada vez que olhava para o rosto de Marinette, via ali a busca por respostas, a busca por histórias do passado que ele ainda não era forte o suficiente para contar. Ela merecia saber, mas não estava pronta para ouvir, assim como ele não estava pronto para contar. Chat fechou os olhos sentindo o peito apertar só em pensar nas consequências. Ela o rejeitaria, recusaria sua ajuda, perderia toda a confiança nele e o afastaria. Os dois tinham muito a perder para ele arriscar a segurança dela em troca de um capricho próprio.

“Eu não vou, mas com uma condição.” ele então respondeu afastando-se devagar dela, os corpos separando-se hesitantes.

“Q-qualquer coisa.” Ladybug respondeu, sentando-se com os olhos esperançosos na direção ele.

“A partir de agora, eu quero saber tudo o que acontecer com você. Não importa o que seja, quero saber tudo. Cada passo, cada decisão. Seja da Ladybug ou da Marinette.” ele hesitou em chamar o nome dela, mas assim que o fez, sentiu alívio ao ver o olhar dela abrandar “Eu quero saber onde você está, o que está fazendo, tudo.”

“Isso é invasivo demais.” Ladybug falou torcendo o nariz.

“Eu sei, mas a Papillon é pior.” Chat Noir franziu a testa “Eles não vão medir esforços para saber cada um dos seus passos. Não quero arriscar.”

“Eles disseram que eu tenho até o final do mês, Chat. O que eles iriam querer comigo antes disso?” ela inclinou a cabeça levemente, esperando a resposta dele.

“Deixa eu ver se adivinho, ele disse pra você que ‘a Papillon é muito compreensiva?’” Chat baixou o rosto e Ladybug arregalou os olhos quando viu o sorriso doloroso no rosto dele “É, eu já ouvi isso mais vezes do que consigo contar. Você acha que é verdade, Ladybug? Acha que os caras capazes de fazer o tipo de coisa que aconteceu hoje à noite lá no teatro podem ser considerados compreensivos?” ele terminou de falar em um murmúrio, e ela silenciou, sem palavras para responder.

“Não, eu acho que não.” ela sussurrou, envergonhada da própria ingenuidade ”É só que o cara no teatro me disse que se quisesse me matar, já o teriam feito, e me pareceu verdade.”

“Tem coisas muito piores do que a morte nesse mundo, Ladybug. Muito, muito piores.” ele a olhou novamente, quase suplicante “Você tem o meu número. Me promete que vai manter contato o tempo todo.”

As palavras de Chat Noir reverberaram nos ouvidos de Ladybug tão dolorosamente que ela não conseguiu discutir. Os olhos dele a fitavam de uma forma tão intensa que ela sentiu um calafrio subir pela nuca. Ele sabia. Sabia exatamente cada uma das coisas que existiam no mundo que eram pior do que a morte. E sem pensar, no próximo segundo, ela estava sacudindo a cabeça positivamente, concordando com as condições dele.


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Notas finais do capítulo

Muito obrigada por sempre lerem e comentarem, gente ♥