Incríveis Aventuras em CASTELOBRUXO escrita por Flávio Trevezani


Capítulo 16
Allario sim, avarador também, só que diferente


Notas iniciais do capítulo

Os jovens alunos saíram das instalações do colégio e seguiram pelos jardins da amazônia, sobre Castelobruxo, em busca de um local tranquilo para que Tião revelasse seu segredo Familiar a seus novos amigos. Mas parece que alguma maldição traquina ronda esses garotos, pois nunca uma simples saída ou uma simples conversa, termina de forma simples.



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Os Garotos caminharam pelos pátios de Castelobruxo, passaram pela margem de pedra que circundava o lago, até atingirem uma das entradas dos Jardins da Amazônia. Os Jardins da Amazônia lembram um gigantesco labirinto de floresta com inúmeras áreas que arremetem praças, além de pátios, coretos e locais utilizados para estudo ao ar livre. A área é tão grande que é possível se perder na região, e de fato foi o que acontecera. Em todo percurso Nicko tagarelava e insistia para que Tião dissesse logo o que tinha de dizer, mas Tião disse que quando chegassem a um lugar tranquilo e seguro ele falaria tudo. E mesmo o local sendo imenso, volta e meia eles se deparavam com um ou dois alunos sentados conversando ou casaisinhos namorando em locais mais reservados. Após alguns minutos caminhando entre praças, pátios e belos jardins naturais que mais pareciam florestas, entre bichos estranhos e pequenas criaturas que pareciam vagalumes maiores em plena luz do dia, que ao serem observado mais atentamente fora possível perceber tratar-se de fadas, fadas das flores para ser mais exato. Entre admiração e curiosidade, eles chegaram às margens do Jardim da Amazônia, consecutivamente, limites da escola. Perceberam mais uma vez que os Jardins eram suspensos, ficavam sobre instalações da escola. Mas era tão verde e florestado, com árvores imensas e raízes rasgando o chão por todos os lados que parecia mais ser uma parte da floresta virgem.

Caminhando por esse limite, que era circundado por um pequenino muro de pedra dourada, fora a altura do solo em que o patamar se encontrava, de uns doze a quinze metros de altura e um pequeno córrego ou canal que circundava as instalações e provavelmente desaguava no lago. Ali, caminhando, eles se depararam a uma pequena escada que descia bifurcada até o solo da floresta, repleta de samambaias verdes e douradas nascendo nas fendas das pedras que a constituíam. Com um portão de ferro preto trabalhado que se encontrava fechado, sem cadeados ou trancas. Claro que curioso ao ver um portão em meio a uma floresta, Nicko quis saber do que se tratava.

— Vocês estão vendo o que eu to vendo? – disse ele sorrindo.

— Acho que sim, ainda não ficamos cegos – disse Ceci achando a indagação do amigo um tanto quanto estúpida.

— Não veem? – disse Nicko empolgado – esse é um dos poucos acessos à floreta selvagem. Meus irmãos disseram haver apenas quatro e nós achamos um no primeiro dia.

— Se são os limites da escola, deveríamos voltar daqui – disse Nina temerosa.

— Concordo com ela – disse Tião – não podemos nos meter em encrenca. Lembre-se disso Nicko.

— E quem disse que quero sair lá fora? Estão loucos? – disse o garoto ainda empolgado e revoltado com tal cogitação – Eu apenas achei muito dracônico galera.

— Dracônico? – indagou Tião achando graça do vocábulo.

— É! Algo grande, algo legal, algo violento – respondeu Nicko.

— Nunca ouvi esse termo na minha vida – disse Ceci.

— Nem Eu – disse Allpa sorrindo.

— Eu já – disse Nina – os garotos da minha tribo falaram isso ontem durante a cerimônia da Andurá.

— Viram – disse Nicko rindo – porque vocês são duas entrouxas desinformadas – então ele se deu conta do que dissera e reagiu – Caramba cara – disse para Tião – foi mal, eu não quis ofender você.

— Não me ofendeu – disse Tião achando graça daquela conversa de garotos bruxos.

— Então vamos embora – disse Allpa – acho que não deveríamos estar aqui e Tião quer nos contar algo, certo? Porque não sentamos em uma das praças do Jardim da Amazônia, são tão lindas e os animais que nela habitam também.

— Pera ai – disse Nicko se aproximando do portão – ele não está trancado.

— E o que temos com isso? – disse Ceci – sabemos que não devemos sair, porque trancar? Têm Caiporas, curupiras, sacis, lobisomens, mulas sem cabeça, pés de cuia, Papafigos, entre tantos outros, preciso de outras razões para não sair?

— Sermos expulsos – disse Allpa.

— Também! – confirmou Ceci – Vamos logo embora daqui.

— Vocês não acham mesmo estranho o portão estar destrancado? – perguntou Nicko chegando mais perto do portão.

— O que vai fazer seu bruxinho estúpido? – perguntou Ceci.

— Só vou olhar – disse ele, mas levou a mão a uma pequena trava que mantinha o portão fechado.

Ao por a mão e perceber estar apenas encostado, ele quis ter certeza de que aquilo estava destrancado de fato e forçou o tipo de tranca que lembrava uma tramela de metal para baixo. Nessa hora, do outro lado do portão de barras de ferro preto decorado com arabescos, havia um patamar de pedra, antes de começar os degraus que desciam para a floresta, passando sobre o riacho que circulava as instalações. No chão haviam muitas folhas secas caídas, ao ele tocar no portão, um vento ascendente surgiu do nada e levantou as folhas do chão numa espécie de redemoinho, que subiu as folhas e logo tomou a forma de uma mulher, feita de folhas e vento e falou numa voz de sussurro:

— Quem deseja passar?

Nicko caiu para trás assustado, após ter ficado estático com a surpresa. Todos se assustaram com a cena, mas o medo realmente surgiu quando duas das árvores atrás deles soltaram suas raízes do chão, como se fossem pés enterrados e se moveram em direção a eles, como se fossem os pegar. Os garotos saíram em disparada, correndo sem direção ou sentido. Por sorte nenhum deles se perdeu, todos acabaram juntos muitos metros, praças e pátios depois, finalmente se deparando ao magnífico campo de Quadribol que ficava no meio da Floresta, a quinze metros abaixo, mas com seus aros a quase vinte metros de altura acima deles ainda. Ofegantes eles se encostaram na mureta de pedra dourada e finalmente alguém disse algo suspirando, enquanto tomava fôlego:

— Que Caiporas foi aquilo? – perguntou Allpa ofegante.

— Acho que foi o guardião do Castelobruxo – disse Nina repirando fundo e claramente cansada da corrida.

— Mas o guardião não era o boiúna? – disse Tião menos cansado que todos, mas ainda ofegante.

— Sim, mas como ele disse – dizia Nina se referindo ao Nicko – tem quatro entradas ou saídas na Escola e aquela é uma pelo que entendi e cada uma tem um guardião.

— Então o Lago seria uma entrada e o Boiúna seria o guardião do lago? – Disse Ceci.

— Isso – confirmou Nina ainda respirando fundo, mas já quase recuperada.

— Tinha que ser o pelúcio do Nickolai – disse Ceci – tinha que ser tão bisbilhoteiro e curioso?

— Só queria ter certeza que estava trancada – disse ele com as orelhas vermelhas, demonstrando ser de vergonha.

— Você não é vidente – disse a Allpa – porque não viu que aquilo ia acontecer?

— Ainda não estou cem por cento da minha clarividência – disse ele ainda mais envergonhado.

— Chega! Importante que estamos bem – disse Tião – e acho que aqui está bom para conversarmos.

— Se aquelas árvores não nos acharem – disse Nina olhando para os lados.

— Se elas não chegaram até agora, sinal que são bem lentas ou desistiram. Nas duas hipóteses, nós conseguiremos nos livrar delas – disse Tião, logo então mudando de assunto pra evitar ainda mais broncas da Ceci no Nicko – Então isso aqui é o campo do esporte que me falou Nicko?

— Sim – disse Nicko levemente empolgado já por tocar nesse assunto – esse é o famoso campo de quadribol de Castelobruxo.

E todos foram para mais próximo da beira da mureta observar melhor o local. Onde saíram era o meio do campo. De um lado havia uma série de arquibancadas de pedra dourada, como tudo em Castelobruxo, que seguia a lateral e curvava ao fundo de um dos lados do campo e seguia até a outra curva. O mesmo acontecia para o outro lado. Como num campo de futebol, o campo de quadribol era um grande retângulo, porém, muito maior que um campo de futebol. Nas duas extremidades havia Três aros, suportados por mastros imensos de trinta metros de altura aproximadamente feitos de madeira, sendo que a do meio era mais alta que as duas laterais. Aos fundos do campo estava a floresta que parecia Maior que uma floresta normal, com Árvores gigantescas, que quase faziam o campo de quadribol parecer um campo de futebol comum. Tião caminhou para o lado e subiu na arquibancada de pedra e sentou-se em um dos primeiros degraus da mesma, seguido de todos os quatro. Eles fizeram um pequeno silêncio, então Ceci quebrou o mesmo dizendo numa voz anormalmente calma e compreensiva para a garota:

— Diga Tião, que segredo é esse que tem haver com essa sua varinha estranha?

Tião retirou do sobretudo de cetim mágico verde, de um bolsão que há em todos as vestes escolares, próprios para as varinhas, sua varinha incomunmente colorida com nuanças de cores vivas e brilhosas.

— Essa varinha não tem núcleo – disse o garoto mostrando a varinha aos amigos.

— Como assim não tem núcleo? – perguntou Nina intrigada.

— Não tem – disse Tião sorrindo.

— Mas isso é impossível – disse Ceci – varinhas precisam de núcleos mágicos para fazer feitiços, se não, não se faz magia.

— Ela é feita de uma árvore mágica especial – disse Nicko – o Baobá rei se me lembro bem. Uma árvore que só aparece de séculos em séculos lá na África, muito difícil de ser encontrada e conseguir tirar um pedaço dela é super difícil, Né Tião?

— Sim – respondeu Tião rindo, ele havia exagerado na descrição, mas em resumo era algo similar ao que Nicko disse.

— Que maravilhoso Tião – disse Allpa sorrindo – você também possui algo especial e diferente afinal.

— Como assim? – perguntou Ceci intrigada.

— Oras! – disse Allpa cordialmente disposta a explicar – Nós sem tribo, no fim das contas somos todos diferentes. Você Ceci Zooliglota, isso não é nada comum. Nicko é um bruxo clarividente, um dom raro também quando real...

— Se de fato ele for isso mesmo – disse Ceci olhando de lado para o garoto e sorrindo maldosamente.

— Eu de uma tribo isolada da floresta amazônica Andina, a terceira da minha família a vir para Castelobruxo, antes disso, meus avós e seus antepassados aprendia tudo de bruxaria em casa. Sem falar nos meus cabelos dourados, eu sou latina Caramba e “tengo los pelos dorados” – disse a garota meio que dançando quando disse a última frase em espanhol, que Tião ouviu em português graças ao anel destravalingua de seu avô.

— Sem falar na animolelia – disse Nicko – que você tem com seu gato animorfo.

— Se eu de fato for felinoeliata Nicko – disse a garota torcendo a boca como quem queria dizer que talvez não seja como seus parentes, uma vez que nunca conseguia se comunicar diretamente com seu familiar.

— Caiporas – disse Nina – vocês todos são mesmo especiais.

— Você também é Nina – disse Nicko – você é meio... – e interrompeu, pois muitos membros da sociedade bruxa, mestiços a outras espécies, são muito descriminadas, logo, sempre é estranho falar sobre, como se chamassem a pessoas de deficiente – você sabe. Você é meio néh, você sabe?

— Pois é. Sou sim – disse a garota envergonhada.

— Porque ficou com vergonha Nina? – disse Ceci – Você é meio gigante. Uma raça forte e poderosa. Não tem que ter vergonha, tem que ter orgulho disso.

— Mas as pessoas acham que por isso eu sou, sabe, burra – disse a garota vermelha.

— Você burra? – disse Tião – Ficou claro na primeira aula que você é a melhor aluna da sala.

— Melhor até que aquele aluno da Iara lá – disse Allpa.

— Claro que não, eu só pratiquei um pouco alguns feitiços com minha mãe, porque eu iria ser educada em casa, então quis começar cedo.

— Deixa de ser modesta – disse Tião – você é ótima.

— E você é grande – disse Nicko – eu daria tudo pra ser grandão que nem você. Caramba, queria ser mais forte.

Ceci bateu na nuca de Nicko como a mãe dele sempre faz. Isso fez todos rirem, inclusive Nina.

— Então esse era seu segredo sombrio Tião? – disse Ceci – Não vejo porque tanto alarde por causa de uma varinha diferente vinda da Africa.

— Também não entendo porque não queria que eu falasse da sua varinha antes Tião – disse Nicko alisando o braço no qual Tião o cotovelou algumas vezes.

— Na verdade – disse Tião meio sem jeito, procurando uma forma de dizer aquilo sem se confundir e assustar os amigos, como professor Olívio o assustou quando o explicou sobre o que significa ser um avarador – o motivo por eu ter essa varinha é que ela é para pessoas especiais, neste caso, pessoas como eu.

— Não entendi – disse Allpa confusa, como todos que ali estavam.

— É que eu não preciso de um núcleo para fazer magia, no caso, por isso ela não tem núcleo, entendem?

— Não muito bem – disse Nicko com uma cara claramente confusa.

— Você seria um avarador Tião? – perguntou Nina ao garoto.

— Sim – disse ele temeroso da reação dos garotos.

Ceci fez uma cara de espantada, porém Allpa sorriu e bateu palmas ao ouvir e Nicko ficou muito empolgado, chegando abraçar Tião rapidamente como quem o parabenizava por isso.

— Que Dracônico Tião – disse Nicko – você é um super bruxo – e riu o garoto com a notícia.

Tião ficou aliviado de ver a reação dos dois amigos, porém, Ceci ficou seria e o olhava com um olhar estranho. Nina não comemorava, mas não tinha o semblante preocupado, apenas estava pensativa com a informação.

— O que foi Ceci – perguntou Allpa a garota – não achou bacana Tião ser um avarador? Afinal, ele pode fazer feitiços sem a varinha.

— É – disse Nina – na verdade, a maioria dos avaradores ainda precisa de varinhas para fazer feitiços, já que o talento da avaração não é tão fácil de ser controlado. Normalmente são feitos motivados por emoções, não são controlados pela mente assim tão fácil.

— Com exceção de uma família – disse Ceci – Como é seu nome completo mesmo Sebastião?

O tom de voz da garota não era empolgado ou amistoso, mas um tanto quanto sério.

— Isso também é algo que eu queria contar – disse ele assustado – eu me chamo Sebastião Silva Matoso... – e o garoto retesou uns poucos segundos e completou seu sobrenome, junto com Ceci – Allário.

— Eu imaginei – disse a garota se levantando e saindo.

— Aonde Vai Ceci? – perguntou Allpa.

Nina perguntou a mesma coisa e ambas se levantaram atrás da garota. Ela então parou já embaixo das arquibancadas de pedra e se virou e esbravejou:

— Eu não tenho porque falar com um ser asqueroso e monstruoso membro daquela família terrível e assassina.

— Espere Ceci – disse Tião – o que foi?

— É Ceci – disse Nicko – ele não tem nada haver com essa família – então o garoto virou e cochichou entre os dentes – você não tem né?

— Eu não – disse Tião nervoso – eu nem sabia sobre esse lado da Família. Meu pai era Allário. Eu nem conheci meu pai. Mas meu tio avô contou sobre a família dele e eu sei que muitos foram pessoas más, mas eu...

— Más? – disse a jovem índia – Pessoas más cortam árvores. Pessoas más jogam lixo na natureza. Pessoas más não respeitam os outros. Os Allários são monstros. Eles mataram grande parte da minha tribo há muitos anos atrás, inclusive meu tamuyá.

— Quem? – perguntou Nicko.

— O avô dela – disse Allpa, mas Tião havia entendido graças ao anel de seu avô.

— Eu não tenho nada haver com essa família – disse Tião – Ceci, eu juro, eu nem sabia que era bruxo há um mês. Soube sobre a família do meu pai há dois dias e eu nem sei o que significa ser avarador. Eu não sei nada na verdade, mas me desculpe por isso.

— Ceci – disse Allpa – escuta ele. Acha mesmo que ele tem alguma coisa haver com aqueles bruxos das trevas que destruíram sua aldeia há anos atrás.

— Ele tem o sangue podre deles – disse a garota com raiva.

— Mas eu nem sabia disso – disse Tião nervoso tentando se explicar – eu juro. Eu nem acredito que alguém possa fazer isso. Porque eles fizeram isso?

— Para roubar nossas terras. Mas nós vencemos, porque somos guerreiros. Mas muitos morreram inclusive meu tamuyá e acabamos tendo que mudar nossa tribo de lugar, para onde ela se encontra hoje. Meu Xiru cresceu com medo. Quase não veio estudar em Castelobruxo após o incidente, mas minha Araya convenceu a ele, para que fizesse em nome do meu tamuyá.

— Me desculpe por isso – disse Tião nervoso – eu não sabia. Isso... Isso foi uma monstruosidade sem perdão.

— Eu também acho – falou raivosa Ceci.

— Ceci – disse Allpa – se você julgar alguém por um erro que os seus antepassados cometeram. Não poderíamos ser amigas e você sabe disso. Não culpe o Tião por algo que ele não fez.

Todos estavam tensos. Ceci continuava parada virada de costas, então Allpa e Nina se aproximaram dela e ela se virou. Seus olhos estavam cheios de água e ela disse tentando não demonstrar tristeza ou fraqueza.

— Eu... – gaguejou a garota de raiva – acho que não consigo.

— Pense bem Ceci – disse Nina – você não pode julgar ele por conta de seus antepassados. Se você fizer isso, será o mesmo que achar que sou meio burra por ser filha de um gigante.

Ceci fechou os olhos, secou as lagrimas de forma superior e tranquila e disse:

— Eu posso até acreditar em você – disse ela olhando para Tião, que estava completamente desorientado com a cena e de olhos bem arregalados - Mas se em algum momento, algum instante eu desconfiar que você esteja mentindo e que não passa de um abaçaí, eu juro que nunca vou te perdoar.

— Eu juro Ceci – disse Tião tenso e com a voz trêmula – eu jamais faria algo assim, tão pouco aceitaria isso. Eu não sabia das atrocidades que a família do meu pai havia feito até pouco tempo. Eu soube que alguns deles tinham sido pessoas ruins no passado, mas não tão ruins assim. Realmente sinto muito, muito mesmo.

A garota então voltou, secou as lagrimas novamente e sentou próxima novamente, mas não muito, seguida de Allpa e Nina, e disse:

— Então você também é um avarador?

Todos nervosos e meio sem reação por toda a cena ficaram calados se entreolhando e então Tião disse:

— Sim, parece que sim, mas eu nem sei como isso funciona.

— Então foi por isso que o professor te chamou na sala – disse Ceci tentando agir normalmente.

— Sim – respondeu Tião – descobri que ele era amigo do meu pai – e depois repensou a resposta, por que ela irá pensar que seu pai era igual a seus antepassados e logo o professor era conivente com aquele tipo de conduta – mas entenda Ceci, eu não conheci meu pai e nem minha mãe. Meu pai sumiu quando minha mãe ainda estava grávida.

— Claro – disse a garota – ele é um Allário!

— Mas minha mãe não acreditava que ele tivesse nos abandonado. Segundo minha avó, minha mãe achava que aconteceu algo com ele. Meu tio avô, Aroldo, irmão do meu avô também. Ele é um dos homens mais bondosos que já conheci e ele tem sido muito bacana comigo nesses últimos dias e ele disse que meu pai não era um homem mal. Eu acredito nisso, eu sinto isso.

— Mas ele sumiu porque Tião? – perguntou Allpa já menos tensa com a situação que acontecera anteriormente.

— Não sabemos – disse Tião começando a ficar levemente emotivo após toda aquela cena com Ceci, afinal, se a família dele era de fato tão ruim como a garota retratou, será que seu pai também era assim? Mas ele continuou a explicar aquilo que ele no fundo acreditava e parecia que sua mãe e sua família, com exceção de sua avó também acreditavam – ele trabalhava com pesquisas, eu acho, eu realmente não sei muito sobre meu pai, porque minha avó não falava muito dele pra mim. Mas, segundo ela e meu tio, parece que meu pai sumiu enquanto minha mãe estava grávida de mim, sem dar notícias, sem sinal.

— E sua mãe não procurou a família dele pra saber sobre?

— Olhe – disse ele pensando se guardava alguma informação, mas resolveu desabafar tudo logo que sabia – Meu avô, pai da minha mãe era bruxo também, mas parece que ele deixou de ser bruxo.

— Ele foi aparatado da sociedade? – perguntou Nicko surpreso com uma cara de assustado.

— Acho que sim – disse Tião.

— Coitadinho! Por quê? – perguntou Allpa.

— Eu não sei também pessoal – disse ele meio confuso – acho que nem minha avó sabe. Minha avó é normal, nesse caso, trouxa ou babaquara que nem vocês dizem.

— Não chame sua avó assim – disse Allpa – ela é uma não bruxa, só isso.

— isso então, não bruxa – disse Tião – e ela não sabe ao certo sobre a história que fez meu avô ser “aparatado” da sociedade bruxa. Mas com isso ele conheceu minha avó e se casaram e tiveram minha mãe.

— E o que isso tem haver com seu pai e toda essa história de ser um avarador Allario? – perguntou Ceci ainda séria.

— É que quando minha mãe cresceu, meu avô achou que ela entraria para escola de Magia e ela não entrou. Com isso ele ficou bem depressivo. E muitos anos depois, meu pai apareceu lá onde moro, para falar com meu avô. Porque parece que meu avô também era pesquisador, algo assim.

E todos ouviam atentos a explicação confusa de Tião, tentando não perder nenhuma parte e ver onde o garoto queria chegar. Assim ele continuou:

— Nesse caso meu pai e minha mãe se conheceram.

— E eles se apaixonaram – disse Allpa com ar romântico.

— Sim – disse Tião sorrindo – e eles se casaram e parece que professor Olívio foi até padrinho.

— Caipóras – disse Nicko meio sorridente achando a história extremamente interessante.

— Ainda não entendi o que isso tem haver com o fato de ser Avarador e Allario, além do fato de seu pai ser um e você ser filho dele – disse Ceci seca.

— Pare de implicância Ceci – disse Allpa a jovem xamã.

— Contei isso, porque, parece que ninguém da família do meu pai foi ao casamento.

— Sério? – indagou Nicko – Que família complicada essa sua ein.

— Essa é a questão – disse Tião – ele nunca apresentou ninguém da família dele para minha avó, avô e minha mãe, pelo que eu entendi.

— Porque ele fez isso? – perguntou Nicko mais para si mesmo em voz alta que para o amigo.

— Talvez porque ele não tivesse contato com a família – disse nina entendendo onde Tião queria chegar.

— Parece que ele não falava disso, acho que ou ele não tinha mais família ou não queria ter – disse Tião – Como disse, soube disso há pouco tempo e não sei nada sobre ele e a família dele. Mas acho que ele não era como esses “Allarios” que meu tio avô falou e que destruíram sua tribo Ceci.

— Talvez não seja – disse ela não muito convencida, pois Ceci tinha uma peculiaridade bem atenuante, ela era durona e teimosa, mas mesmo assim, ela pareceu menos distante e raivosa depois de toda a explicação de Tião.

— Então professor Olívio era amigo do seu pai – disse Nicko – será que com isso nós podemos ter alguma vantagem? Sei lá? Ele é meio que seu “Tio” né?

— O Tião talvez tenha – disse Ceci – nós não e nem seria certo tirar vantagem disso Nicko. Melhor é não fazer nada de errado e precisar tirar vantagem dessa proximidade que Tião tem com nosso professor chefe. Se é que você é capaz de não fazer nada errado – e sorriu levemente a garota.

— Essa é a Ceci que eu conheço – disse Allpa sorrindo, ao perceber a garota menos armada e raivosa.

— Enfim – disse Tião suspirando – é isso. Isso que queria contar a vocês e queria pedir pra não conterem a outras pessoas, porque, talvez mais alguém reaja como Ceci reagiu, entende?

— Concordo com Tião – disse Ceci – pelo pouco que sei, minha tribo e minha família não foram as únicas a serem atingidas pelos Allarios. Melhor não contar a ninguém sobre isso.

Todos meio que concordaram sem questionar, após todo aquele momento intenso que aconteceu após Tião revelar seu segredo.

— Então meu amigo Tião é um Avarador de uma família poderosa e do mal – disse Nicko, sem medir as palavras como sempre – isso vai ser Dracônico! – riu o garoto balançando a cabeça como se aquilo fosse algo bem emocionante.

— Acho que você nunca vai aprender né seu caipora desastrado? – disse Ceci.

Todos riram, inclusive Nicko, após entender o porquê da bronca.

— Acho melhor voltarmos, já está na hora do Almoço e logo teremos a segunda aula – disse Nina se levantando.

— Claro – disse Tião – então estamos combinados. Ninguém fale sobre eu ser um Allario, um avarador e nem que minha varinha é diferente, ok?

— Sim – disseram todos.

— Mas antes, posso tentar fazer um feitiço com sua varinha Tião? – perguntou Nicko curioso como sempre – Você havia me prometido isso quando compramos lá na Biela Amarela.

— Claro – disse Tião sorrindo.

— Se você conseguir no caso – disse Nina curiosa em ver o que aconteceria a um bruxo não avarador se usasse a varinha de um bruxo avarador que era acima de tudo, diferente da maioria dos avaradores normais, uma vez que ser avarador não era nada normal.

— Só não tente aquele feitiço da aula novamente, por favor – disse Ceci se afastando enquanto Tião entregava a varinha a Nicko.

— Fiz aquilo de propósito sua xamã ranzinza – disse o menino empolgado.

Ele pegou a varinha, apontou para o campo e então sacudiu a varinha e disse:

— Lummus!

E uma pequena Luz brotou da ponta da varinha, fraca, mas brotou e todos ficaram surpresos. O garoto riu, seguido de Tião, Allpa e Nina, que sorria, mas tinha o semblante surpreso, assim como Ceci.

— Não parece nada diferente – disse Nicko.

Mas logo a luz do feitiço lummus começou a enfraquecer e o garoto pareceu não estar bem. Seus olhos começaram a fechar e em instantes ele cambaleou e Tião, junto a Nina conseguiram o amparar antes que ele caísse. Nicko desmaiou rapidamente, deixando a varinha de Tião cair no chão. Eles sentaram o garoto na arquibancada e quando começou o deitar ele meio que recobrou a consciência, meio sonolento e confuso.

— O que aconteceu? – perguntou ele.

— Nós que te perguntamos – disse Tião – o que houve? Você estava fazendo o feitiço que aprendemos na aula a pouco e então você cableou e desmaiou.

— Eu não sei – disse Nicko meio sonolento – eu estava fazendo o feitiço e logo comecei a me sentir fraco e sonolento e não lembro bem depois disso.

— Acho que entendo o que aconteceu – disse Nina.

— Eu também – completou Ceci – Acho que a varinha suga a magia interna do usuário, que no caso é um avarador, possuidor de magia própria. Por Nickolai não ser um avarador, sua energia foi sugada deixando ele fraco.

— Caiporas Voadoras – disse Allpa.

— Se ele tivesse tentado um feitiço mais forte e elaborado, talvez ele nem tivesse sobrevivido – disse Nina séria.

— Caramba – disse Tião – então essa varinha tira magia de mim?

— Sim – disse Ceci.

— Essa varinha é perigosa – disse Allpa.

— Me lembre de não te pedir nada emprestado de novo Tião – disse Nicko recobrando as forças e se sentando, colocando a mão na cabeça e sacudindo a mesma como se colocasse o cérebro no lugar.

Seus colegas riram ao perceber que o garoto estava bem. Então ele se levantou, pegou a varinha de Tião no chão e entregou ao mesmo. Tião pegou sua varinha, não sentia nada estranho enquanto tentava fazer os feitiços na aula, talvez de fato a varinha fosse feita para pessoas como ele.

— Você está bem? – perguntou Tião a Nicko – consegue voltar para o salão da andurá?

— Tô sim, acho – disse o garoto meio abatido ainda.

— Se demorarmos muito perderemos o almoço.

— Então o que estamos esperando? – disse Nicko deixando de lado seu semblante moribundo e saindo apressado em direção as pirâmides principais onde se localizava o salão de andurá.

— Parece que ele está bem – disse Ceci – até demais.

Eles riram mais uma vez e todos começaram andar em direção as pirâmides principais do Castelobruxo. Tião ficou um pouco atrás e Nina se aproximou do mesmo:

— Tião – disse a garota com sua voz levemente grossa, mas afinada propositalmente pela menina – acho que seria melhor conversar com professor Olívio sobre isso.

— Porque Nina? – perguntou o garoto curioso.

— Assim como a varinha sugou a energia vital do Nicko, em algum momento, durante um feitiço mais forte e poderoso, ela pode sugar toda sua magia interna e fazer o mesmo com você. Eu não tenho certeza, mas acho que pode acontecer. Deveria procurar o professor Olívio e ter certeza disso, só por precaução – disse a menina seria, com um sorriso tranquilizador no rosto, tentando não deixar ele assustado.

— Acho que você tem razão – disse Tião, pensativo, mas sorrindo para ela, para também não demonstrar a preocupação com começou a sentir naquele momento.

E todos caminharam tranquilos até o salão de Andurá, cercado de floresta, plantas mágicas estranhas, algumas que se moviam, não como as árvores que começaram a caminhar e os perseguir anteriormente, mas mexiam-se como plantas carnívoras a pegar insetos em suas armadilhas, só que sem insetos ou armadilhas. Além das pequenas fadas das flores a voar pelos ares com seu brilho mágico hipnotizante, assim como as mascotes perambulando ou pulando de galho em galho nas árvores majestosas e aves como araras, tucanos, papagaios, corujas e gaviões voando para dentro e fora do Jardim da Amazônia.


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Notas finais do capítulo

Araya - Avó em tupi.
Tamuyá - Avô em Tupi.
Abaçaí - na mitologia tupi, ente maléfico que perseguia os índios, tornando-os possessos.



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