Filhos do Império - Chapeuzinho Vermelho(Livro Um) escrita por Ally Faro


Capítulo 26
Capítulo Vinte e Seis - Explicações e Decisões


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem.
Divirtam-se!



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Charlotte olhou Kyle por um longo momento e depois gargalhou, soltando uma série de impropérios que ninguém imaginou que ela conhecia.
          Alfred aguardou, já a vira irritada antes, mas naquele momento ela estava tão surpresa que a irritação não se mostrava muito presente, o que o deixava mais preocupado e ansioso.
—Feiticeiros? —Ela questionou com uma risadinha irritada. —Achei que isso não existisse. Pensava que era uma forma de assustar as crianças e os idiotas, para mantê-los longe de confusão.
—Não, eles existem a séculos. —Kyle informou.
—Cala a boca. —Não havia sinal da moça gentil que todos conheciam.
           Charlotte, pela primeira vez desde que chegara ao Vale Vermelho, estava se mostrando realmente, notou Alfred.
          Kyle se surpreendeu com aquela irritação e grosseria repentina, sua própria irritação parecia ser contida por uma força invisível, se era a influência de Charlotte, ele não saberia dizer. Contudo o que o estava irritando mais, era ver que Alfred não parecia nem um pouco atingido pela mudança de humor da menina e que ela permitia que ele permanecesse ao seu lado.
—Eu preciso de... —Ela falou, se erguendo novamente.
—Um banho e colocar uma roupa. —Alfred falou, com o leve tom de provocação que ela conhecia bem, indicando o vestido de dormir que ela usava.
         Char não se deu ao trabalho de retrucar, somente questionou onde poderia conseguir roupas e um lugar onde pudesse troca-las. Um banheiro lhe foi indicado e ela aproveitou para um rápido banho, achando uma calça escura, uma camisa de mangas compridas branca e ao canto um par de botas de couro.
          Alfred a viu sair do banheiro, estava vestida de modo semelhante ao primeiro encontro deles, no primeiro dia de viagem, a diferença estava nas cores, já que dá primeira vez ela estava toda de negro.
—Não sei que horas são e não me importo realmente com isso. —Ela alertou, olhando diretamente para Kyle. —Mas eu preciso de ar e o primeiro imbecil que tentar me impedir não ficará nada feliz.
—Você não pode sair. —Kyle lhe informou.
          Alfred viu aquela chama acender nos olhos dela, os tornando um tom mais claro de verde e demonstrando o perigo e raiva que havia ali.
—Eu não sou mais sua prisioneira, Kyle. —Ela falou com uma altivez que colocaria um imperador a seus pés.
—Você nunca foi...
—Sim, eu fui. —Ela o cortou. —Mas não sou mais, agora você é quem está amarrado a mim.
          A amargura e fúria em sua voz eram tão pesadas que Kyle pareceu sentir o ar ficar denso.
—É noite. —Christopher falou. —Não vejo porque ela sair pode vir a ser problema.
          Kyle se mexeu desconfortável na cadeira e se colocou de pé.
—Tudo bem, vamos.
          Charlotte ergueu a sobrancelha e deu um riso anasalado.
—Você não vai sair comigo, Kyle. —A voz era fria. —Eu não quero escutar sua voz por agora, não até eu ter questões a serem respondidas.
          Charlotte decidiu que deveria mudar de estratégia para o jogo, já que ele era bem diferente do que ela imaginava.
           Alfred viu Kyle fechar as mãos em punho e encarar a menina, que o olhava de frente, sem medo algum.
—Você não pode sair por aí, é contra as regras...
—Eu sou da Elite, não é? —Os olhos prata endureceram quando ela o questionou. —Não é?
—Sim. —Ele estremeceu.
—As pessoas da Elite podem ser proibidas por Lobos de fazer alguma coisa?
         Kyle sentiu o rugido em sua garganta.
—Não. —Saiu entredentes.
—Então você não pode me dizer o que fazer. —Ela lhe deu as costas. —Alfred, você vem comigo.
—Ele não vai sair com você! —Kyle rugiu atrás dela.
           Charlotte percebeu a mudança no ambiente. Christopher se virou completamente para onde Kyle estava, Alfred o encarava, mas apesar da raiva nos olhos, não disse nada.
—Como se chama para o Lobo que comando os outros, Alfred?
         Os dois se encararam e Charlotte percebeu o que ele lhe contava e o pedido de desculpas que havia ali.
—Alpha. —Ele informou.
—Você pode contrariar uma ordem minha? —O silêncio se fez pesado. —Eu fiz uma pergunta e desejo resposta, Kyle.
           Charlotte não faria o papel de moça amável e gentil, ela simplesmente representaria o que era, Christopher percebeu. Sua filha nunca fora o exemplo de amabilidade que todos poderiam imaginar, mas ele nunca a vira ser tão dura quanto naquele momento.
           Char sabia onde estava se metendo, o que lhe dava vantagens e obviamente envolvia mais perigos.
           Confrontar Kyle naquela situação era o correto a fazer, pelo menos enquanto ela que segurasse as cartas.
—Não. —Rugiu outra vez. —Mas ele não vai.
—Lobos. —Ela deu um sorriso perigoso e se virou para encarar Kyle. —Eu sei que Alfred e meu pai lhe devem respeito. —Era a primeira vez que ela citava Christopher daquele modo. —Você tem, normalmente, autoridade sobre eles. Afinal é o Alpha da matilha.
—Desde quando você sabe? —Christopher quis saber, surpreso.
—Que você é um Lobo? —Virou a cabeça para o homem e ele assentiu. —A pouco tempo.
           Char não diria que fora o olhar de Alfred, aquelas conversas silenciosas que eles aprenderam a ter, que lhe dera essa informação.
—Como? —Ele parecia realmente curioso.
—Conversaremos depois. —Ela esclareceu. —Agora eu realmente preciso de ar, não vou aguentar ficar nenhum minuto a mais presa e se Kyle quiser me deter, principalmente me deter de levar Alfred comigo, é bom que ele aja agora. —Ela encarou Kyle novamente. —E eu posso garantir que não é sua ordem que vai me deter.
—Ele me deve satisfação e obediência.
—Ele deve obediência, não subordinação. —Retrucou. —Alfred, você é obrigado a respeitar a ordem dele ou a minha, nessa situação?
            Alfred conteve o sorriso quando fora encarado por Kyle e Char, mas a menina notou a diversão nos olhos dele.
—A sua. —Ele informou. —A Elite tem prioridade sobre uma ordem, independente da ordem do Alpha.
—Ótimo. —Ela decidiu. —Você tem muito a me contar agora, de qualquer maneira.
           Alfred colocou as mãos nos bolsos e assentiu.
—Acho que você vai precisar daquilo. —Christopher informou, indicando a capa vermelha, pendurada no canto do quarto. —Tá frio lá fora.
           Charlotte ainda não tinha pensado sobre o pai ser um Lobo e nem queria encarar isso ainda, mas o olhou e viu aquele mesmo olhar de quando ela tinha 10 anos e pegou uma febre terrível, aquele cuidado e preocupação, o fazendo ficar sentada ao lado de sua cama por duas noites seguidas, lhe contando histórias até que ela dormisse.
          Char se odiou por recordar disso, já tinha tanto o que pensar, não precisava de algo que a deixasse sensibilizada, então somente assentiu.

 

Alfred a viu fechar os olhos e receber a brisa fria e um leve sorriso surgir.
—Você tem um caso de amor muito sério com o vento. —Alfred implicou e ela sorriu levemente, abrindo os olhos.
—Você não faz ideia.
          Alfred viu a chama dos olhos da menina começarem a apagar.
—Vem, vamos sair daqui.
      O silêncio imperou durante a caminhada para lugar nenhum, até que Alfred entrou em uma ruela qualquer e após muita andança, eles se viram na entrada da Floresta, fazendo o coração dela disparar.
—Alfred... —Ela sussurrou e ele a encarou.
—Char, eu posso deixar que você vá, mas não posso garantir sua segurança lá. —Ele informou, vendo os olhos dela fixos nas árvores. —Mas se permanecer aqui, você poderá descobrir o que quer e eu sei que você tem milhares de perguntas.
         Charlotte suspirou e o encarou de volta.
—Você tá me dizendo que eu posso ir embora? —Ele sorriu. —Você morreria de saudade de mim. —Provocou.
—Sempre se achando mais do que é, Chapeuzinho. —Retrucou e sorriram.
          Charlotte sentou no chão, apoiando a costa em uma árvore e o rapaz sentou de frente pra ela.
—Alfred... —Char mordeu o lábio e ele ergueu a sobrancelha. —Se eu sou uma... Feiticeira...
—É estranho dizer isso em voz alta, não é? —Questionou.
—Tanto quanto dizer ser um Lobo?
         Alfred ouviu a gentileza na voz dela e sorriu.
—Fui mordido na noite em que eles mataram a minha mãe.
—Eu imaginei. —Ele assentiu.
—Achei que as cicatrizes fossem me entregar quando estávamos viajando. —Ele falou.
—Não era o Dante que era um Lobo, não é mesmo?
—Não.
Char assentiu.
—O que aconteceu exatamente, naquela noite?
         Alfred abaixou a cabeça e respirou fundo.
—Eu não podia falar pra você o que eu era, então pedi a ajuda para o Dante...
—Ele sabia?
—Dante era da Elite.
—Era um Feiticeiro? —Ela ficou confusa, por um curto instante.
—Apesar do que as histórias contam, Feiticeiros não são só aqueles dotados de magia. —Ele ainda não a encarava. —Existem os, como Dante, que possuem conhecimentos de ervas, de todos os tipos de ervas. Alguns mais poderosos, que podem usar e até, em raríssimas exceções, controlar os elementos...
—Quando você fala sobre elementos, está dizendo água, fogo, ar e terra?
—Também. —Concordou e voltou a encara-la.
—E o que você pediu a Dante?
—Alguma coisa que a fizesse dormir.
—Você colocou no vinho. —Ela comentou, sem a raiva que ele achou que viria.
—Sim. —Concordou. —Quando o acidente aconteceu com a Caravana, eu sabia que não conseguiríamos sair da Floresta a tempo, então vi que precisava manter você inconsciente quando a Lua Cheia viesse, claro que em algum lugar seguro, mas ainda assim inconsciente.
—Aí você batizou meu vinho. —Ele concordou com um aceno.
—Então depois que você dormiu, pedi a Dante para cuidar de você e sai da caverna, me distanciando o máximo que deu antes da transformação, para tentar deixar você e Dante o mais seguros possível.
—Mas não deu certo. —Ela suspirou. —Eu não durmo durante a Lua Cheia porque realmente não posso. —Informou. —Eu normalmente acabo no meio dos Lobos, fora do campo de proteção, digamos assim. Quando durmo eu caminho para eles, nunca entendi o motivo. É por isso que eu necessito me manter alerta, as raras vezes que ocorreram, eles quase me devoraram.
          Alfred suspirou e assentiu.
—Eu deveria ter pensado melhor. —Bufou. —Eu não sei muito bem o que aconteceu, mas quando voltei a ser eu, estava próximo a caverna e corri pra lá. —Ele passou as mãos no rosto. —Quando cheguei estava uma bagunça, só vi os sacos de viagem que estávamos usando, no outro lado. Na entrada da caverna estava o que sobrou do corpo de Dante. —Ele suspirou e olhou para dentro da Floresta. —Não sei o que aconteceu, só posso supôr. Mas acho que ele cochilou e quando acordou não viu você, então atravessou o lago e... Em algum momento foi encontrado por um Lobo. —Ele se calou. —Sabe o que me irrita? —A encarou. —Eu não sei se fui eu quem o matou.
          Charlotte assentiu, não havia nada a ser dito naquele momento.
—Eu também não sei exatamente o que aconteceu, só lembro de ter acordado no meio da Floresta, bem longe da caverna, então tentei retornar, mas acabei chegando tarde demais, havia um Lobo lá dentro. —Deu de ombros. —Depois fui perseguida e no meio disso cai de um despenhadeiro. Não sei como sobrevivi, só lembro de acordar no quarto da casa de Kyle.
—É estranho não ser dono da própria mente.
          O silêncio se fez presente por quase cinco minutos, mas havia muito a ser conversado.
—E como você e Christopher se encontraram? —Ela quis saber.
—Nos conhecíamos desde Ventanis, mas eu era uma criança na época, mesmo quando vim parar no Vale Vermelho ainda era muito novo. —Narrou. —Mas seu pai me reconheceu e me ajudou, por causa da amizade que ele tinha com meu pai, sempre me aconselhando. —Deu de ombros. —Ele foi um tutor, até onde da pra um Lobo ter. —Os olhos castanhos estavam mais frios que o normal, o que era estranho pra Char.
—Eu poderia matar você por não ter me dito que ele estava vivo. —Havia mágoa na voz dela.
—Eu sei. Mas o segredo não era meu.
—Eu sei. —Ele a olhou, mas ela olhava para o lado.
—Depois que vi que você tinha sumido, decidi andar a sua procura, no segundo dia encontrei Christopher, contei o que havia acontecido e então decidimos, depois de uma série de xingamentos e ameaças da parte dele, procurar mais um pouco. —Informou. —Mas já estávamos muito tempo longe do Vale e precisávamos vir informar que permaneciamos vivos. Então decidimos que viriamos até aqui e depois voltaríamos para Floresta, pelo menos pra achar seus restos. —Suspirou. —Só que quando chegamos fomos até Kyle, seu pai é o segundo em comando da matilha. —Char fez careta, mas não disse nada e nem o olhou. —Eu fui até a cozinha, porque realmente precisava comer algo e seu pai saiu a procura de Kyle... Bem, depois disso você sabe o que aconteceu.
         Charlotte ouviu o sussurrar do vento e virou para Alfred.
—Como é se transformar? —Ela questionou, mudando levemente a direção da conversa.
—A consciência apaga, pra ser bem franco. —Informou.
—Então qual a necessidade de um Alpha?
          Alfred já havia feito aquela pergunta várias vezes antes.
—A Elite diz que tudo no universo precisa de um líder, pra conseguir guiar o resto, para o bem ou para o mal, mas isso mantém o equilíbrio das coisas. —Ele deu de ombros. —Apesar da consciência humana adormecer, nós ainda estamos vivos, por tanto temos instintos naturais.
—Se alimentar. —Ela sussurrou.
—Se alimentar. —Ele concordou. —O Alpha, segundo as teorias da Elite, serve para manter a ordem. Podemos caçar, mas é ele que vai definir onde e o que, e nós o seguiremos.
—A vida é baseada em instintos, independente da raça. —A voz da menina estava distante até mesmo pra ela. —E os instintos nos obrigam a sobreviver.
—As vezes eu penso que os Lobos só externam os sentimentos que os homens já tem, mas mantém escondidos. —Alfred comentou. —Todos somos feraz, só sabemos esconder, alguns melhores que outros, mas no final você faria qualquer coisa para se manter vivo.
             Charlotte pensou sobre aquilo.
          Homens são feraz, mas fingem que não, as feraz não precisam fingir. Pensou ela.
           Alfred e Char passaram a madrugada toda sentados em silêncio. Ele analisando a Floresta e ela escutando o vento.
           Alfred não disse, em momento algum, que precisavam ir embora e se esconder na casa de Christopher novamente. Char até pensava que ele esperava que ela decidisse por entrar na Floresta e voltar a Ventanis. Mas a verdade é que os dois estavam presos demais aos próprios pensamentos, para ver o tempo passar.
—Eu quero conhecer a Elite. —Falou, quando a manhã clareou.
         Alfred voltou os olhos para ela e encontrou os dela, novamente cheios de fogo. E ele realmente pensou que ela poderia queimar o mundo com aquele olhar.


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Notas finais do capítulo

E ai? Curtiram?
Deixem seus comentários.
Beijos e até o próximo capítulo.



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