Filhos do Império - Chapeuzinho Vermelho(Livro Um) escrita por Ally Faro


Capítulo 15
Capítulo Quinze - Vale Vermelho


Notas iniciais do capítulo

Demorei? Sei que sim, sinto muito, porém eu estava com um terrível bloqueio criativo e não tava conseguindo escrever nada, mas agora estou de volta /
Divirtam-se!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/690080/chapter/15

Os dias se arrastavam enquanto Charlotte permanecia em seu confinamento no quarto de hóspedes de Kyle, que desaparecera desde o dia que ela acordara ali, entretanto Kitty era uma visita regular e que particularmente Char já não tinha mais paciência, de tanta pergunta que a velha fazia sobre o cordão.
Charlotte escutara passos do lado de fora de seu quarto, estava a tantos dias trancada que começava a desenvolver uma certa claustrofobia, era agonizante olhar para as paredes e saber que não poderia sair dali a hora que quisesse, mesmo a janela estava trancada e não dava passagem para o vento entrar. Ela se jogou na cama e sentiu uma leve pontada na costela, entretanto nem isso a incomodava tanto quanto a vontade de sair e respirar ar puro, deixando o vento lhe acariciar a pele.
Uma semana devia ter se passado desde que recobrara a consciência, naquele lugar, os machucados estavam sarando bem e ela se sentia mais forte e saudável, apesar de tudo.
Char ouviu quando alguém mexeu na maçaneta da porta, que estava trancada pelo lado de fora. A garota abriu os olhos no momento em que Kyle entrou, sorrindo tranquilamente ao ver a carranca da outra.
–Não estou de bom humor hoje. —Alertou ela. —E nem sei porquê de me dar ao trabalho de falar com você, já que desapareceu nos últimos dias.
–Sentiu minha falta? —Ele perguntou em um tom divertido.
–De não ter cortado sua garganta na primeira vez que nos vimos? —Ela devolveu o sorriso.
–Você realmente parece ter acordado com um péssimo humor.
–Sem dúvida alguma, por tanto acho melhor aquela velha irritante não tentar me infernizar, eu não serei nem um pouco gentil.
–Acho que ela também não está com bom humor pra você hoje. —Ele ainda sorria, como se fosse conhecedor de um segredo que ela não era.
–E que diabos você tá fazendo aqui? —Ela o encarou severamente.
–Você precisa se acalmar. —Zombou.
–Fique trancado contra a sua vontade, aí você venha criticar o motivo de eu querer matar alguém.
Charlotte viu o rapaz sorrir e assentir.
–Então vamos ver se posso te acalmar um pouco. —Ele sorria de modo divertido e ela ergueu uma sobrancelha.
–O que você pode propor que faça a minha raiva daquela velha maluca passar?
–O que me diz de darmos uma fugida?
Charlotte quase que diz 'sim' imediatamente, entretanto recuou um passo e o encarou, aquilo poderia ser uma armadilha.
–Você não vai se encrencar com a Velha? —Questionou como quem se importa.
Charlotte o encarava com intensidade, fingindo uma preocupação inexistente, entretanto sabia que deveria jogar aquele jogo, independente do quão perigoso fosse.
–Deixa que depois me resolvo com ela. —Sorriu. —E de qualquer forma, isso não é algo que eu deixarei ela descobrir por hora, não se puder evitar. —Sorriu. —Vamos logo.
Charlotte pensou seriamente em recusar, mas se aquele convite fosse uma armadilha, ela descobriria de uma vez, não poderia evitar e de qualquer modo, saindo daquele quarto, talvez arranjasse uma maneira de fugir.
–Vamos.
Char seguiu Kyle pelo pequeno corredor da casa e assim que ele abriu a porta, ela sentiu a lufada de ar noturno entrar e beijar seu rosto, o que a fez fechar os olhos e suspirar de prazer, ela saiu para a noite, o vento estava gelado de uma forma agradável e que ela sentira falta, nos últimos dias. Char notou as casas todas de pedras acinzentadas, enquanto andava pelas passagens de terra batida, estavam todas trancadas e parecia não haver ninguém fora de casa aquele horário.
–Que horas são isso? —Questionou encarando Kyle, mas era notório a melhora em seu humor.
Kyle a encarou intrigado, fora somente o vento tocar seu rosto e ela pareceu relaxar instantaneamente.
–Deve ser por volta de uma ou duas da madrugada. —Char abriu levemente a boca, mas assentiu.
Formavam um par estranho caminhando pelas vielas do lugar, ela muito rígida e ele completamente relaxado, mas atento a tudo a sua volta. Caminhavam lentamente pela rua, quando a menina olhou para uma grande casa de pedra, do lado esquerdo da viela em que andava e parou de supetão. A faixada de pedra da casa estava toda arranhada, como se tivessem tentando afiar as garras ali.
–Lobos? —Quis saber ela, indo em direção a casa.
–Ninguém disse que era seguro morar no Vale Vermelho. —Kyle se defendeu, dando de ombros.
Charlotte tentou puxar na mente se já ouvira algo sobre o Vale Vermelho, informação que Kyle acabara de dar e nem parecia ter percebido, não recordou de nada relevante, mas guardou a informação, a usaria no momento certo.
Char ergueu a mão e tocou em uma das valas na pedra, era um corte profundo e longo, sentiu o mesmo calafrio de quando tocara a janela do seu quarto, em sua casa na Vila, depois de ser observada por um Lobo, parecia um tempo tão distante que a fez suspirar.
–É por isso que todas as casas são feitas de pedras? —Ela o encarou e percebeu o brilho feroz no cinza dos olhos dele.
–Se não fosse assim, não sobraria ninguém no Vale. —Assegurou e chamou com um aceno de cabeça.
–Entendo. —Disse ela, o seguindo.
–O Vale Vermelho só sobrevive graças as casas de pedra, que entram em constantes reformas. —Informou. —Caso não fosse isso, os Lobos já teriam devorado as pessoas normais ou sabe lá o que. —Deu de ombros.
–Onde exatamente estamos? —Perguntou levemente.
–Bem ao sul de Mirelis. —Char se perguntou quanto tempo levaria para chegar a Mirelis a pé, a cidade de sua avó e seu destino inicial.
–Quanto a sul?
–Muito. —Disse ele. —Pra muitos o Vale não passa de um mito, dizem ser impossível viver aqui, principalmente nas noites de Lua Cheia, mas nós conseguimos manter o equilíbrio das coisas. —Suspirou. —Obviamente não é fácil, principalmente buscar mantimentos para tantas pessoas.
Kyle estava estranhamente cooperativo, lhe dando todas as respostas que ela pedia, o contrário de seu primeiro encontro.
–Quantas pessoas vivem aqui?
–Umas duzentas a trezentas pessoas, talvez. —Deu de ombros. —Pelo menos as que vivem aqui de fato, porque muitos de nós saímos para as Cidades ou Vilas, vivemos transitando entre lá e aqui.
–E como funciona o Vale? —Char interrogou e ele a encarou sorrindo.
–E isso te interessa por quê? —Ela deu um pequeno sorriso de canto.
–Só curiosidade. —Ele assentiu.
–Como todas as Vilas vivem? —Ele questionou de volta.
–Política ou economicamente? —Devolveu ela e ele riu divertidamente.
–Você pergunta demais.
–E você nunca me responde. —Bufou.
–A certos mistérios que devem ser conservados. —Charlotte sentiu os pelos dos braços e nuca arrepiarem.
–E alguns necessitam ser desvendandos. —Replicou.
–Tudo ao seu tempo.
Charlotte mordeu o lábio inferior e continuou a segui-lo, não podia perder a calma e nem fazê-lo ficar em completo silêncio.
Kyle parou em frente a maior estrutura do lugar e tirou a chave do bolso, abriu a porta e gesticulou para que ela entrasse.
–Que lugar é esse?
–Vamos.
Char sentiu a língua queimar e a raiva pesar em seus ombros, mas suspirou e entrou, ele a guiou por um corredor lateral e depois subiam uma longa escada. Nesse meio tempo Charlotte observou que a estrutura toda era do mesmo material de tudo que ela vira no Vale Vermelho, pedra cinza e maciça. Kyle abriu uma porta no alto da escada e deu passagem pra ela. Eles estavam no topo do prédio e tinham uma visão ampla de quase todo o Vale, Char se surpreendeu, era um lugar bonito mesmo na pouca luz que a madrugada lhes oferecia.
–Eu não ia colocar você em nenhuma armadilha, se era o que estava pensando. —Comentou ele, seguindo para a beira do telhado e ela suspirou, seguindo para seu lado.
–E quem disse que estava pensando isso? —Ele riu.
–Então você é sempre desconfiada?
–Em grande parte do tempo. —Disse fingindo um sorriso divertido.
–Esse prédio é dividido em dois pavimentos. —Informou. —A diretoria do Vale, que é mais uma Assembléia do que qualquer coisa. —Deu de ombros. —E a biblioteca, que está abaixo de nós, nesse momento. —Ele sorriu.
–Uma biblioteca?!
–Exato. —Sorriu abertamente. —Devemos ter por volta de uns 200.000 livros.
Charlotte se surpreendeu. Eram raras bibliotecas em Cidades ou Vilas pequenas, principalmente com uma quantia grande de livros. A Vila de Char, Ventanis, continha uma pequena e somente com cerca de 10.000 livros, sendo que tinham muitos mais residentes do que ela sabia existir no Vale Vermelho.
–Uau. —Se admirou e talvez tenha sido uma das únicas reações verdadeiras em frente ao rapaz.
–Os fundadores do Vale se encarregaram de nos deixar alguns exemplares bem especiais. —A encarou sorrindo. —E conforme a, digamos, direção do Vale foi passando para as seguintes gerações, foram atualizando. Muitos livros considerados proibidos pelos Monges estão nas nossas propriedades.
Charlotte sabia que há algumas décadas, os Monges haviam queimado milhares de exemplares, de todos os lugares, que achavam ter qualquer espécie de bruxaria e segundo eles, religiões pagãs.
–Você deve estar brincando comigo.
–A Deusa do Vento, deve ter em torno de mil anos. —Char arregalou os olhos e o encarou. —E está na sessão religiosa.
A Deusa do Vento, a Deusa pagã que deu origem a Vila Ventanis, a quem Char ouvira histórias diversas na infância contadas por seu pai, mas que eram proibidas e depois de sua morte, nunca mais ouvira ninguém falar.
–Você deve estar armando algo, os Monges queimaram todos os exemplares desse livro ou de qualquer religião considerada pagã, quer dizer, A Deusa do Vento foi um dos primeiros a ser proibido. —Ela riu. Recordava bem do pai contando sobre milhares de histórias que viraram pó em fogueiras por causa do Monges. —Vocês terem esse livro é algo...
–Incrível? Magnífico? Espetacular? —Chutou e ela sorriu.
–Você deve estar brincando.
–Não estou brincando. —Sorriu. —Posso mostrar, não hoje, mas...
–Irei cobrar. —Prometeu.
–Faça isso. —Ele riu.
–Mas por que não hoje?
Charlotte o viu sorrir e olhar para o horizonte, ela olhou na mesma direção. O Vale Vermelho se concentrava em uma área extensa e, a distância cercados por árvores, lembrando muito a Vila, não parecia que estavam cercados pela Floresta. Char viu uma espécie de praça não muito distante dali.
–Quantas crianças vivem aqui? —Questionou e ele riu.
–Você pergunta muito.
–E você não responde nada. —Sorriu.
O silêncio se fez presente de modo quase natural, mas ainda assim era inquietante. Kyle a intrigava, ela sentia como se o conhecesse de algum lugar, entretanto não conseguia saber de onde. Sem falar que sempre que ficava muito tempo em silêncio, recordava que Alfred e Dante estavam mortos.
–Nós já nos conhecemos? —Ela questionou de supetão e ele sorriu.
Char se viu refletida no cinza de seus olhos, a faziam recordar prata derretida.
–É uma boa pergunta, será que já, Char? —Charlotte não se apresentara a ele, mas sabia que Kitty devia ter passado seu nome adiante.
Charlotte o encarou, aquela voz era familiar, assim como a sensação de estar com ele, mas não conseguia saber de onde.
–Você não é de grande ajuda. —Ele riu.
–Não, não sou.
Ela balançou a cabeça negativamente e ele riu de novo, a fazendo sorrir.
–Me diga somente uma coisa. —Pediu e ele a encarou, aguardando. —Por que não posso sair daqui?
Kyle parou de sorrir e os olhos endureceram. Char notou que era a pergunta errada e necessitava recuperar o bom humor de antes, a menina deu um passo a frente e parou a centímetros dele, a ponta de suas botas quase tocavam as dele, ela ergueu os olhos verdes e o encarou intensamente.
–Char...
–Ao que parece você não irá me responder. —Ela deu um sorriso pequeno. —Então me prometa que nossos passeios noturnos continuaram, tudo bem?
Char viu Kyle observar seus lábios, percorrer seu colo e por fim fazer o caminho de volta a seus olhos, o cinza voltara a ficar como prata derretida e ele sorriu.
–Prometo.
Charlotte ficou na ponta dos pés e beijou de leve o rosto dele, o que o fez ficar rígido por um momento.
–Obrigada. —Sussurrou no ouvido dele e se afastou novamente.
Kyle a olhava fixamente e os lábios estavam entreabertos levemente, o que a fez sorrir e passar a mão esquerda no cabelo com tranquilidade. Agora ela havia chamado completamente sua atenção, não só porque ele queria provoca-la como antes, mas porque ela começava a jogar.
Char notou que aquele seria praticamente um jogo de gato e rato, contudo ela não pretendia ser a presa. Ela decidiu que se Kyle queria jogar, deveria estar preparado para uma adversária que odiava perder e que faria de tudo para tê-lo na palma das mãos, independente do quanto necessitasse levá-lo aos extremos e limite.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E ai? Curtiram?
Deixem seus comentários.
Beijos e até o próximo capítulo.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Filhos do Império - Chapeuzinho Vermelho(Livro Um)" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.