30 motivos para odiar Benjamin Lacerda escrita por Huntress


Capítulo 14
28 de junho (segunda-feira) – 14º Defeito


Notas iniciais do capítulo

Passando aqui para agradecer a todos os reviews. Sério, gente, amo os comentários de vocês ♥
Também quero pedir desculpas pela demora, tive alguns probleminhas. Fui viajar e, quando cheguei lá, descobri que não tinha internet.
Bom, espero que esse capítulo com mais de 4.000 palavras compense.
Mil desculpas.
Boa leitura ♥



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28 de junho (segunda-feira) – 14º Defeito

Segunda-feira. Dia ruim. Você já conhece essa história.

Assim que cheguei na escola, tive que contar todos os detalhes do meu encontro com Vinícius na sexta-feira para Carol, que me aguardava ansiosamente no portão. Comecei comentando o básico, mas decidi omitir a presença de Benjamin em certo momento, já que não precisava pensar em meu vizinho mais do que o normal. Carol ria e assentia enquanto eu contava e chegou a sorrir ao saber que ele havia me beijado.

Entretanto, alguma coisa estava errada.

Eu não sei, Diário, pode ser coisa da imaginação, porém eu podia jurar que vi Carol vacilar por um momento, demonstrando certa tristeza naquele sorriso. Perdi a reação por um segundo, sentindo meu cérebro trabalhar na desconfiança que crescia em mim. Carol pode ser uma atriz muito melhor do que eu. Aquele deve ter sido seu momento de fraqueza.

Claro que aquilo mudou totalmente o resto da minha manhã e eu comecei a processar a nova informação. Não tinha como ter certeza, mas a culpa que me consumiu ao pensar no possível "e se..." me fez passar boa parte das aulas presa em pensamentos que não tinham nada a ver com Revolução Francesa, Dom Quixote ou Neoliberalismo.

No intervalo, enquanto seguíamos para a cantina, decidi trazer outro assunto – infelizmente, um mais triste – e comentei que minha mãe estava olhando possíveis escolas para o próximo semestre. A cara da Carol quase foi ao chão antes de se fechar e ela fazer biquinho.

— Eu não vou deixar – falou e eu ri, meus olhos já marejando. Isso a fez abandonar sua pose de durona e vir me envolver em um abraço. Eu tinha esquecido quão bom era ter essas conversas fúteis, porém divertidas com as melhores amigas, que têm a função de nos auxiliar em momentos difíceis e ser sinceras pela frente, defendendo-nos pelas costas (nunca o contrário, Diário).

Ela mencionou pouco antes de o professor entrar que Vinícius chegaria amanhã à tarde, vindo para a escola somente na quarta-feira. Não achei que diria isso, mas fiquei feliz por saber que teria alguns dias de folga dele. Seu sumiço nunca foi mais bem-vindo. Precisava pensar sobre Carol. 

O horário seguinte foi com o Sr. Carvalho, o melhor professor de geografia que existe – que conseguiu ter uma aula ainda melhor ao comentar que não teria aula sexta-feira devido às festividades de sábado. Ele é baixo e calvo, com cabelos castanhos nas laterais e sempre faz piadas sobre os assuntos, deixando um palavrão ou outro escapar de vez em quando, mas que apenas nos fazem rir mais.

O segundo horário foi com a Sra. Duarte, minha maestra de espanhol que não me tem como aluna favorita, já que meu nível de espanhol é baixo (lá para os negativos). Se eu me perder em um país latino-americano, por exemplo, só saberei dizer “Buenos días” e “Adiós”, mas é um começo, não é?

Depois, dois horários seguidos com o mais temível professor de todos, o Lima. Sua matéria? Química. Passo a aula tentando entender todas as equações e ligações químicas, que fazem apenas um pouco de sentido em minha cabeça devido aquela “aula” que Benjamin me deu, mas, novamente, precisei afastá-lo de meus pensamentos, já que não queria lembrar de mais uma de nossas brigas durante aquela aula. Só esperava que aquela sua área não estivesse tão machucada.

Mas, em parte, ele mereceu. Benjamin atrapalhou minha saída, não me explicou os motivos, fechou a cara do nada e ainda brigaria mais se tentasse explicar meu ponto de vista na discussão com Mariana. Então, que o Protótipo de Barbie e o Cabeça de Estrume sejam muito felizes juntos e saíam rápido da minha vida para que eu possa achar um garoto que esteja tão desesperado quanto eu para encontrar um par.   

Quer dizer, não. Não quero Benjamin fora da minha vida. Desculpa, eu sou fraca! Tudo o que eu mais queria era meu melhor amigo de volta – e de preferência, solteiro novamente.

Quando deu a hora de ir embora, depois de Carol ir falar com minha mãe no carro sobre odiar essa história de mudar de escola, minha mãe decidiu mudar a rotina e me levar para almoçar no McDonalds. Por um momento, pensei em pegar meu celular e avisar meu vizinho, já que ele ficaria sem comer, mas logo lembrei que nossos almoços juntos não estavam mais acontecendo. Ao chegarmos lá, pedi um Big Mac e um refrigerante qualquer e comemos por ali mesmo. Para terminar o dia diferente, peguei um Milk-shake e fui bebendo enquanto Carla fazia o percurso até minha casa.

Pelo menos, era isso que eu esperava.

Se me perguntassem qual a última coisa que esperava que minha mãe fizesse, eu diria que era justamente o que ela fez. Mais ou menos na metade do caminho, fui perceber que nunca passávamos naquele trecho para ir para casa. Franzi o cenho e me virei para minha mãe.

— Onde estamos indo? – perguntei, erguendo a sobrancelha.

Minha mãe é uma péssima mentirosa - e eu já havia dito isso milhares de vezes. Porém, dessa vez ela apenas tentou esconder um sorriso enquanto batucava no volante ao ritmo da música que tocava, além de cantar alegremente (e errado também, mas isso não vem ao caso). Cerrei os olhos em sua direção, analisando nossa situação enquanto tentava prever seus movimentos. Revendo tudo, pude perceber quão suspeito era aquilo de ter me levado para comer fast-food em uma segunda-feira. 

— Em um lugar – foi só o que respondeu depois de um tempo em silêncio, quando conseguiu ficar séria. Revirei os olhos sem nem tentar disfarçar.

— Nossa, mãe. Você pode ser um pouquinho mais específica? – indaguei e ela riu. Carla ignorou minha pergunta e não me contou, calando-se enquanto aumentava o volume ao perceber que A Thousand Miles começava a tocar. Minha mãe é apaixonada por essa música desde a primeira vez que a ouviu quando assistiu o filme As Branquelas, além de conseguir rir das mesmas piadas depois de anos vendo as mesmas cenas.

Eu tratei de ignorar aquilo, até porque Carla ficaria brava por eu tentar arruinar sua surpresa. Fiquei então mexendo no celular e cantando as músicas enquanto ela seguia seu caminho. Foi então que senti o carro frear e, quando vejo, minha mãe já parara o carro em um estacionamento.

Já deixando minha curiosidade transparecer, soltei meu cinto e olhei ao meu redor. Ao perceber então de onde reconhecia esse lugar, toda minha curiosidade morreu à medida que eu murchava internamente, não conseguindo esconder meu desagrado. Minha vontade maior era pular pela janela do carro e sair correndo em direção ao primeiro ônibus que passasse, mas minha mãe pareceu prever meus movimentos e desligou o carro, travando as portas em seguida.

— Surpresa! – Carla ergueu as mãos e bateu algumas palmas enquanto eu a encarava com minha melhor expressão de “Você só pode estar brincando”. Claro, era uma surpresa, mas não uma agradável.

— Ah não, mãe... Vamos embora – implorei em um resmungo e ela fechou o rosto, balançando a cabeça negativamente.

— Lívia, para de drama. Eu já marquei com o diretor. Vamos – falou, absoluta, já destravando as portas e saindo do carro em seguida.

Deixei o veículo sem me importar com a careta de desagrado exposta em meu rosto e logo comecei a utilizar minhas habilidades matemáticas não tão boas para ver se conseguiria correr sem minha mãe me alcançar, mas nunca daria certo, já que até ela corre melhor que eu.

— E, Lívia, lembre-se de sorrir – recordou-me e colocou um sorriso no rosto, pedindo-me para imitá-la. Fiz, fracamente, mas ela estava de muito bom humor para ligar. Virou novamente para frente e continuou caminhando em direção a uma das construções.

A escola de Benjamin é muito maior e mais moderna, com alguns prédios em tons de vermelhos e outros, brancos, combinando de uma forma que nunca achei possível. Reconheci entre os carros, o modelo preto que deixava meu vizinho em casa na maioria dos dias – isso é, até a chegada do pesadelo chamado Mariana.

Entramos no que percebi ser a secretaria, onde uma senhora de cabelos pintados de preto estava lixando as unhas. O lugar estava repleto de cadeiras velhas e laranjas, além de uma luz no corredor que estava piscando e a água do bebedouro, vazando. Mas o pior de tudo eram as plantas – especificando, os lírios.

Eu sou alérgica a essas flores que parecem me assombrar. Não deu tempo de chegarmos ao balcão onde a senhora estava e logo comecei a espirrar, mas da forma mais baixa possível. Cutuquei minha mãe, apontando em seguida para as flores, e ela tratou de se apressar. Sou alérgica a pelo de cachorro também, mas não achei que nenhum iria entrar pela porta.

— Bom dia – a senhora cumprimentou quando ficamos próximas o suficiente.

— Bom dia – minha mãe respondeu. Eu apenas acenei com a mão e logo espirrei, fazendo aquele som que fazia todos em casa riam porque era fino e curto, lembrando, de acordo com a definição de meu pai, um latido daqueles cachorros pequenos e que tremem muito. Dá para perceber que essa definição é animadora.

Mas se tem alguém que precisa ser lembrado é meu vizinho, porque Benjamin tem o pior espirro de todos. Lembro-me claramente do dia que descobri que ele é alérgico à poeira, justamente quando minha mãe estava aspirando a casa enquanto jogávamos. Benjamin começava a perder toda hora que enterrava o rosto no braço para abafar o espirro.

— Benjamin, você vai melecar sua blusa. Use a mão – falei e ele riu.

— Ai eu sujo a mão e seu controle – comentou e eu revirei os olhos para ele, que não conseguiu segurar e espirrou sem enterrar o rosto no braço, permitindo-me ouvir seu espirro pela primeira vez.

Juro que tentei não rir, Diário, mas foi impossível. Não sei como descrever, mas começou baixou e terminou quase como um grito, com um arranhado de garganta no meio. Depois, Benjamin ainda chacoalhou a cabeça e coçou o nariz, parando em seguida para me encarar, já que estava gargalhando que nem uma louca, deitada no tapete.

— O que deu em você, Lívia? – ele perguntou, rindo ao me ver gargalhar, mas sem entender nada. Levantei-me e enxuguei as lágrimas que escorriam por meu rosto.

— Que diabos de espirro é esse, Benjamin? – perguntei e voltei a rir, enterrando meu rosto em seu ombro.

Aquilo pareceu ofendê-lo.

— Qual o problema com o meu espirro? – indagou, confuso, fazendo aquela ruga aparecer em sua testa. Espirrou novamente.

— É mais fácil perguntar qual não é o problema. Seu espirro é hilário! – ri. Benjamin ficou sério, mas pouco depois começou a rir.

— Você não pode falar nada! Quando você ri, parece que está engasgada – falou e pegou uma almofada, jogando-a no meu rosto. – E faz uma careta quando discorda de algo.

Torci o nariz e revirei os olhos para ele.

— Aí está! Essa careta!

— Já entendi, Benjamin – cortei-o. – Você tem um espirro ruim e eu, uma risada. Podemos voltar ao jogo?

Benjamin deu de ombros, claramente feliz de ter encerrado a conversa sem ser o único a ser insultado. O ego de meu vizinho, apesar de muito grande, feria-se muito fácil.

Ele espirrou mais algumas vezes.

— Caramba, Benjamin. Você está bem?

— Tenho alergia à poeira – esclareceu e eu arregalei os olhos.

Coloquei-me rapidamente de pé e comecei a puxá-lo pela camisa. Sem entender nada, ele se levantou e começou a se deixar ser levado por mim, que o arrastava pela casa.

— O que está fazendo? – Benjamin perguntou.

— Você não pode ficar aqui dentro! Vai que piora e suas vias aéreas fecham e você sufoca e... E... Eu não sei o que fazer! – desesperei-me enquanto o empurrava para o quintal, não permitindo que voltasse para dentro de minha casa.

— Respiração boca a boca é uma boa alternativa – ele comentou, erguendo as sobrancelhas e mostrando seu melhor sorriso safado. Se nessa época eu fosse apaixonada por ele, teria enrubescido na hora. Mas não, a Lívia antiga respondia a todas as provocações do meu vizinho.

— Muito engraçado, Benjamin – falei, fingindo uma risada em seguida. – Se não passar na faculdade de medicina, vire comediante. Você tem futuro.

Meu vizinho riu e revirou os olhos. Era óbvio que eu estava brincando – e ele sabia também –, pois Benjamin é simplesmente apaixonado por medicina e se tornará um ótimo médico (eu tenho certeza disso). Ele fala sobre anatomia e cirurgias com um brilho nos olhos que, se não fosse por meu pavor por sangue, eu estaria considerando ser médica quando crescer.

Nós ficamos ali fora por um tempo, esperando minha mãe acabar a faxina. Ele me perguntou se eu era alérgica a algo e eu expliquei minha situação com cachorros e como fui alvo das mais variadas piadas quando fiquei muito tempo perto do buquê de lírios da minha professora na terceira série e saí com um nariz vermelho e manchas na pele.

E era o que aconteceria se não saísse daquela secretaria naquele momento.

— O diretor está esperando vocês. Por aqui – a mulher falou, levantando-se em seguida e nos chamando.

Guiou-nos por uma das portas espelhadas, permitindo-me ter a maravilhosa visão do meu rosto, com os olhos quase fechados e o nariz vermelho no tom daquelas cerejas de bolo. Além disso, minha respiração estava um pouco entrecortada. Estava com a camiseta do meu colégio, aquele que eu não queria trocar, e uma calça jeans rasgada. Minha mãe podia ter, pelo menos, trazido uma muda de roupa, mas aparentemente aquilo poderia estragar a surpresa de alguma forma.

Ao sairmos – finalmente – da secretaria, a senhora nos levou até uma sala no fundo, com persianas na janela e uma plaquinha na qual estava escrito “diretoria”. Ao entrarmos, uma lufada de ar me atingiu. Essa infelizmente vinha do ar-condicionado que deveria estar ligado em uma temperatura próxima de 0ºC, porque aquilo estava congelando. Um senhor de idade, com cabelos brancos e óculos, estava sentado atrás da mesa, digitando algo no computador. A sala era decorada com fotos de sua família e troféus do time da escola, sendo que reconheci a foto do time de futebol americano, com Benjamin segurando a taça.

O diretor – que se apresentou como Marcelo – começou falando sobre alguns detalhes financeiros, aos quais não dei atenção e comecei a observar as fotos do local e a contar o tiquetaquear do relógio como forma de me distrair. Pouco depois ele pediu para ver meus boletins, parabenizando-me pelas notas, e começou a prestar mais atenção em mim, perguntando o que eu esperava da escola e mais algumas baboseiras. Marcelo era simpático, pelo menos.

Decidiu então nos levar para conhecer as propriedades da escola, comentando sobre os novos computadores na sala de informática e o cadastro que permitia acesso a todos os livros da biblioteca quando quisesse. Mostrou o campo de futebol e comentou sobre as conquistas dos times nos campeonatos, além do grupo de teatro e de matemática. Estremeci. Não participaria de nenhum. Sou péssima em esportes, ficou toda perdida quando tenho que falar em público e não sirvo para contas.

Passando então pelo corredor que abrigava as salas de aulas, não pude me conter e me aproximei da sala que possuía uma plaquinha com os dizeres “terceiro ano”. A parede tinha uma pequena parte retangular com vidro, possibilitando ver o interior sem atrapalhar a aula. Os alunos estavam observando o professor resolver um exercício que eu não sei nem explicar – principalmente porque nem parecia estar em português.

Afastei-me do vidro ao ouvir os passos do diretor e de minha mãe, que se aproximavam, conversando animadamente sobre filhos e essas coisas. Carla analisou o corredor e então prendeu o olhar na porta ao meu lado. Seus olhos se iluminaram.

— Filha, olha. Terceiro ano. Pode ser a sala do Ben! – minha mãe falou, animada. Sorri, em decorrência da sua alegria, tentando fingir animação. O diretor observava a reação dela.

— Se quiser entrar, não tem problema – comentou.

— Não! – disse antes que minha mãe pudesse considerar a ideia e a arrastei daquela porta. – Quer dizer... Vejo Benjamin todo dia, não preciso atrapalhar a aula dele para isso. E essa pode nem ser a sala em que ele estuda.

— Benjamin Lacerda? – o diretor questionou, ainda próximo ao vidro da sala. – Ele é um rapaz espetacular. É capitão do time de futebol americano, mas ainda consegue manter notas muito boas.

Revirei os olhos. Benjamin adoraria ouvir aquilo.

— A sala dele é a próxima – notificou, já caminhando na direção que apontara. Marcelo então olhou pelo vidrinho e se virou. – Ele está apresentando um trabalho agora mesmo.

Nem me dei ao trabalho de responder e me aproximei de Marcelo, ficando na ponta do pé para ver melhor. Benjamin estava falando e gesticulando com as mãos enquanto apontava para algumas informações do PowerPoint lá na frente da sala. O slide possuía as fotos de algumas pessoas importantes do mundo químico, como John Dalton e Rutherford. Mariana estava ali também, mas lia algumas informações no papel, e Daniel recostava apoiado na lousa, admirando o teto. Que trio especial.

Ah, uma explicação, Diário. Eu sei que falei que Benjamin vai fazer dezoito e está no terceiro ano do ensino médio, mas ele não repetiu. Renata já me explicou a história, esclarecendo que eles tiveram alguns problemas (os quais ela não detalhou) e Benjamin entrou um ano mais tarde na escola.

Depois de convencer a mim mesma a deixar de olhar aquela sala, seguimos pelo corredor, sendo que só parei para olhar mais uma sala: o sexto ano, onde a irmã de Benjamin estuda. Perguntei se poderia passar para dar um rápido ‘oi’ e o diretor assentiu.

O rosto de Valentina se iluminou quando me viu abrir a porta. A loirinha saiu correndo de sua mesa e pulou em um abraço que quase quebrou meu pescoço. Minha mãe também a cumprimentou. Tina perguntou o que eu estava fazendo ali e expliquei que estava olhando escolas porque iria mudar, mas pedi que guardasse segredo. Ela assentiu pouco antes de entrar de volta para sua sala.

Depois de ter rodado a escola inteira, o diretor chamou minha mãe para falar sobre descontos e bolsas, claramente tentando ganhar mais uma aluna, e permitiu que eu continuasse a andar pela escola. Agradeci e segui de volta ao corredor do terceiro ano, observando pelo vidro Benjamin assistir, entediado, as apresentações, enquanto escrevia alguma coisa no canto do caderno.

Mariana estava sentada ao lado dele e inclinava a cabeça para observá-lo em média seis vezes por minuto, enquanto Daniel estava de cabeça abaixada, sentado logo atrás do melhor amigo. Eu me senti uma stalker depressiva, que perseguia aquilo que queria e nunca teria, mas também não desistia.

Porém, será que valia a pena?

Veja, Benjamin está vivendo sua vida, sem nem pensar na minha pessoa enquanto eu não conseguia tirá-lo dos meus pensamentos. Ele parecia relaxado e tentava não rir de algo que falaram na apresentação. Meu vizinho fala muito bem em público e isso é muito invejável, o que o faz achar graça de quando alguém não ia tão bem.

O pior era como eu ficava mais triste cada vez que o via, aquele sentimento nostálgico me preenchendo e me fazendo suspirar. Como nossa amizade partiu de invasão de quartos a chutes na virilha e interrupção de encontros? E, pior, como Benjamin parecia não se importar?

Foi então que, envolta em uma coragem que não sabia ter, eu bati na porta e a abri logo em seguida. Várias cabeças se viraram. Olhares curiosos partiram da maioria dos alunos – e dois furiosos partiram do casal do ano. Benjamin e Mariana compartilhavam da mesma cara de poucos amigos. Gaguejei algumas vezes antes de conseguir pronunciar uma frase.

— Co-com licença, professor – falei baixinho e olhei para o homem de cabelo ruivo e barba rala. – Posso falar com um de seus alunos, por favor?

Ele escutou minha pergunta e franziu o cenho, provavelmente perguntando o que uma garota de outra escola iria querer com um de seus alunos, mas cedeu. Percorri os olhos pela sala, vendo rapidamente Mariana e sua cara assassina, e pousando o olhar em Benjamin, que tinha uma mistura de raiva e curiosidade no olhar. Passado alguns segundos, pude perceber que ele arrumava as coisas em sua mesa para vir em minha direção. Rapidamente, pronunciei:

— Daniel, pode vir aqui?

Benjamin travou no lugar e se virou, os olhos verdes exalando raiva. Pela cara que fez, meu vizinho não gostou nada de eu ter chamado o melhor amigo dele em vez dele, e ainda estava processando o que eu tinha acabado de falar. Daniel piscou várias vezes até entender que era com ele que estava falando e logo se levantou, não sem antes se abaixar para sussurrar algo no ouvido do meu vizinho, o que só fez seu ódio aumentar. Ele acompanhou o caminhar de Daniel, quase quebrando o lápis que segurava, e variando o olhar entre o melhor amigo e eu. Assim que passou, fechei a porta, não sem antes receber um último olhar mortal de Benjamin.

— Lívia e sua habilidade de trazer um pouco de alegria para os meus dias – comentou o loiro, dando-me um rápido abraço em seguida. – O que posso fazer por você?

— Trazer alegria? – perguntei, cruzando os braços. Daniel sorriu, mostrando aquelas covinhas.

— Primeiro o estrago na Mariana e agora me liberar da aula de química. Só tenho o que agradecer – respondeu, dando de ombros e recostando na parede. – O que veio fazer aqui?

Ah, sim, eu o havia chamado por um motivo. Daniel parecia completamente à vontade e nada nervoso, como se minha presença ali não fosse nada inesperada. Demorei um tempo para responder, focando meu olhar em qualquer coisa que não fosse seu rosto e mordendo o lábio durante isso. Respirei fundo.

— Eu vim te fazer um convite – falei rapidamente e Daniel ergueu as sobrancelhas.

— Faça – comentou.

— Eu... – comecei, mas parece que toda minha coragem se perdeu ao abrir a porta da sala de Benjamin. – Nada, esquece – falei e iria andar em direção à secretaria para encontrar minha mãe se Daniel não tivesse segurado meu braço.

— Ajuda se eu confirmar que vou dizer “sim”? – perguntou, arrancando um sorriso do meu rosto.

— Eu gostaria de saber se você gostaria de ir comigo ao baile do prefeito. Eu sei que é muito provável que para isso você diga não, provavelmente porque já convidou alguém muito melhor, mas eu estou meio desesperada porque não tenho par, já que achei que iria com certa pessoa, mas esse ser agora tem namorada e...

— Calma, Lívia, respira. Assim – Daniel falou, ainda com aquele sorriso calmo no rosto, e logo começou a inspirar e expirar, fazendo com que eu o imitasse em seguida. – Pronto.

— Desculpa, mas estou realmente desesperada. – comentei, bufando.

— Bom... Eu recebi alguns convites e já estava para aceitar o da Olívia – falou e eu, sem querer, já demonstrei certa tristeza involuntária.

— Mas prefiro ir com você.

Encarei-o assim que disse isso.

— Está falando sério? – perguntei.

— Lívia, acredite em mim, você é, de longe, a melhor opção entre todas.

Corei involuntariamente e ele sorriu ao perceber, mostrando aquelas malditas covinhas que mexem com qualquer uma. Eu já vi fotos das garotas com quem Daniel saía e ele dizer que eu, essa coisinha insignificante que mal sabe chutar uma bola, sou a melhor opção, é um elogio para se levar para a vida – se ele estivesse falando a verdade. Não pude me conter e ri.

— Você estava se saindo bem, Daniel... Até essa última parte. – comentei, rindo, e ele franziu o cenho.

— O quê? Por quê? – perguntou, confuso.

— Fala sério, Daniel. Eu, melhor? – gargalhei sarcasticamente. – É só olhar para mim – falei, abrindo os braços e dando uma volta.

Ele permaneceu calado.

— Eu estou olhando – respondeu por fim e, por um momento, eu fiquei sem resposta ao ver a forma como Daniel me encarava. Senti minha pele aquecer e tive a certeza de estar da mesma cor que meu nariz na secretaria. – Por que simplesmente não aceita que eu quero mesmo ir com você?

Abri a boca para voltar a retrucar, mas me calei. Assenti.

— Tudo bem, tudo bem. Eu entendi que você quer mesmo ir comigo, mas não precisa dizer que eu sou a melhor opção.

Daniel ergueu as mãos em forma de rendição, como se não quisesse discutir, e riu. Acompanhei-o. Era muito mais fácil lidar com ele do que com Benjamin, às vezes.

— Já pode ir se quiser.

Daniel resmungou.

— Não me expulse ainda – pediu. – Me deixa perder mais um tempo de aula, por favor.

— Seu professor vai me culpar – esclareci, segurando-o.

— Não é como ele te conhecesse – retrucou o loiro.

Não, mas isso vai mudar se eu tiver que estudar aqui.

— Só entra logo – mandei e riu, balançando os ombros.

— Primeira garota que nega minha companhia, Lívia – fingiu-se de ofendido. – Você se orgulha disso?

— Muito – provoquei-o e ele me encarou, incrédulo, o que só me fez rir. – Tchau, Daniel.

Ele sorriu e abriu a porta, depositando um rápido beijo em minha bochecha antes de voltar para seu lugar. Isso me surpreendeu e me fez travar por um momento. Pude ter um rápido vislumbre de Benjamin ainda estressado, mas não fiquei para ver. Fui em direção à secretaria e logo ouvi a porta se fechar.

Já no carro, minha mãe começou a comentar sobre o quanto adorou o colégio e como os descontos são bons, mas eu apenas dei de ombros e disse que queria ver outras opções, porque não tinha certeza se queria estudar ali. Ela me perguntou o porquê e eu apenas disse que algumas coisas não me agradavam ali.

Tipo Mariana. E Benjamin. E os dois juntos.

Fiquei o percurso inteiro agradecendo mentalmente por tudo ter dado certo. Chegando em casa, subi para o meu quarto rapidamente e decidi provar o vestido que comprei, como se fosse me ajudar a lidar com o nervosismo. Tinha esquecido quão bonita me senti com ele, que parecia ter o caimento perfeito em mim.

Só espero que Daniel também pense isso.

Lívia.

14º Defeito: Benjamin tem o espirro mais cômico do mundo.

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Notas finais do capítulo

Daniel ♥
Então, o que acharam?
Mais ansiosos que a Lívia para esse baile?