Equinócio escrita por karoreis


Capítulo 3
Sossego




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A volta para cara era uma das melhores partes do dia. Eu estava de saco cheio da escola, não tinha emoção nisso. A casa estava silenciosa, Emmett, Rose, Alice e Jasper tinham ido caçar. Vovó Esme preparava o meu almoço e de Jacob. Ela havia comprado vários livros de receitas e aprendera a cozinha divinamente para nós. Eu não poupava elogios, nem Jacob. Era ótimo ver o rosto amável de Esme tão agradecido como ficava.

         Depois do almoço tínhamos o horário reservado para as tarefas. Jacob era um caso perdido. Nós fazíamos os deveres. Eu fazia nossos deveres e então tínhamos o tempo livre, depois que Jacob acordasse é claro.

         Ele havia se esparramado no sofá como sempre fazia para tirar a soneca da tarde. Eu guardei os livros e cadernos e o fitei incrédula. Mesmo vendo todo dia, eu ainda estava abismada como ele conseguia ser tão grande. Eu me sentei no chão, as costas encostadas no sofá, fitei a televisão sem interesse.

         - Filha... – a voz de sinos ecoou pela sala, e toda vez que eu a ouvia eu me sentia exatamente como uma criança, que fica na expectativa todos os dias esperando o pai voltar do trabalho. Eu levantei num salto e corri para seus braços que me envolveram duros, mas macios, num rodopio delicado. Colocando-me no chão, mas sem me soltar. Todos os dias eram como se eu o visse pela primeira vez. Eu não cansava, não me admirava em nada que minha mãe tivesse feito tudo o que fez, para se entregar assim a esse amor. Era impossível não amá-lo, e era uma honra que ele amasse de volta. “Onde esta a mamãe?”

         - Ela já vem. – ele disse afagando meus cabelos.

         Meu pai era muito esperto nisso, eu sabia exatamente quando ele tentava esconder alguma coisa de mim, e ele conseqüentemente sabia quando eu descobria isso. Ele riu abafado, e eu não me importei em tentar descobrir o que era, eu só queria ficar ali nos braços dele enquanto ele me dava toda a atenção do mundo.

         - Venha cá. – ele disse enquanto me puxava para a poltrona e me sentava no colo dele. – Qual vai ser a programação de hoje. – ele disse desviando os olhos para Jacob que roncava no sofá, depois riu brevemente.

         - Vocês são horríveis sabia?! – eu disse frustrada. Seus olhos endureceram nos meus, eu quase me senti horrível pelo que tinha dito. Meu pai era maravilhoso. Eu passei meu braço por trás de seu pescoço e toquei-o de leve, lembrando das atitudes de Jacob relacionadas a Thomas. Meu pai riu. “Ele esta fazendo um bom trabalho, qual é a bonificação?” Meu pai fingiu pensar por um minuto.

         - Ainda estamos acertando.

         “Isso é eterno?” eu perguntei incrédula, os olhos arregalados, a boca entreaberta. Ele riu.

         - Até você ter idade para poder fazer o que achar que for melhor pra você.

         “Ah pai. Olha bem pra mim” Ele olhou.

         - Você é linda.

         “Você sabe o que eu quero dizer”

         - Renesmee meu amor, você pode ter um corpo perfeitamente bonito e maduro, mas você só tem sete anos.

         “Ah é? E minha mente tem quantos anos?” Ele suspirou, me endireitou em seu colo e me abraçou forte.

         - Você sabe o quanto eu lutei para poder dar tudo a sua mãe. Todas as coisas que eu não queria que ela perdesse, todas as experiências humanas, que eu julgava tão importante. – “Ela não se arrepende de nada” eu interrompi e ele suspirou de novo, mas continuou. – Eu também não me arrependo de nada do que fiz. Agora.

         Nós nunca falávamos a respeito disso, mas eu sabia como a minha chegada tinha sido difícil. Eu quase matara minha mãe no parto, e isso era horrível. Meu pai me odiava antes de me conhecer, eu machucava minha mãe, eu fazia tudo o que ele tentou evitar durante tanto tempo. Foi ai que ele a transformou. Quando eu estava fora dela, quando eu machuquei a coluna dela sem querer, quando quebrei algumas costelas antes disso, e a bacia. No inicio meu pai era a favor de que minha mãe interrompesse meu crescimento. E hoje, depois de tudo ter dado certo, de estar os três felizes, eu sentia o quanto ele se arrependia por um dia ter apoiado essa decisão. Talvez fosse isso que nos tornava tão íntimos e próximos. Ele se martirizava pelos pensamentos que teve um dia, e eu o amava não só por ele ter cedido a mais uma das vontades de minha mãe, ainda que isso lhe custasse a vida. Mas porque eu tinha a sorte dele ser o meu pai. Entre tantos, eu não queria nenhum alem dele.

         - Eu queria poder te dar seus momentos humanos também. – ele choramingou.

         “Pai, existe uma diferença entre mim e a mamãe. Eu nunca fui humana.” Senti seu corpo se contrair embaixo de mim. “Mas eu realmente não me importo.”

         - Você devia ter tido uma infância Renesmee, como as crianças normais. Devia ter demorado a sentar sozinha, devia ter sentido cólicas e chorado durante a noite, devia ter mordido vários dedos e coisas a fim de aliviar a coceira nas gengivas enquanto seus dentes apontavam querendo nascer. Devia ter demorado pra sentar sozinha, engatinhado, andado. Falar poucas palavras no começo, trocar as letras, errar na pronuncia.

         “Não sou normal pai.” Eu disse lentamente enquanto analisava o efeito que as palavras causavam em seu rosto. Dor. Ele se sentia realmente culpado por eu ser o que eu era.

         - Eu tirei isso de você da mesma maneira que tirei as coisas da sua mãe.

         “Eu não teria aceitado tão bem se não tivesse sido você” e apertei meus braços ao seu redor.

         - O que eu perdi? – mais sinos ecoando.

         Meu pai me virou delicadamente para que eu pudesse abraçar minha mãe. Ela era a mulher mais linda que eu já tinha visto, antes mesmo da tia Rose, que era absurdamente linda. Mas nada comparado com a beleza de minha mãe. Seu rosto sereno, seus olhos tão indecifráveis. Ela parecia frágil, mesmo dentro daquele corpo blindado, seu abraço de pedra me rodou no ar da mesma maneira que meu pai havia feito. Suas mãos penteavam delicadamente meu cabelo, ajeitando cada cacho, colocando cada madeixa em seu devido lugar. Meu pai se levantou e deu um beijo suave em minha mãe, eles se olharam por um tempo e eu peguei na mão de ambos mostrando a imagem perfeita que eu tinha deles, fazendo com que eles notassem como era bonito o amor entre eles.

         - Seu dia vai chegar meu amor. – a voz macia de minha mãe. Meu pai bufou e ela riu. – Edward, você precisa aceitar que sua filha vai namorar um dia.

         Ele fez uma carranca e nós duas rimos.

         - Vamos lá, ela não será sempre a nossa pequena Renesmee. Olhe para ela, como está linda. Você tem sorte por ela ainda não se envergonhar de você na frente dos amigos. – ela disse piscando brincalhona para mim.

         Minha mãe era a melhor amiga que eu poderia ter. Eu sabia que ela se preocupava tanto quanto os outros, e apoiava meu pai nos pensamentos dela. Mas ela queria pensar diferente, ela queria acreditar que sete anos era idade suficiente. Qualquer coisa pra me fazer feliz. O amor era uma loucura, já não tentávamos mais entender as coisas. Era como se ele transformasse as pessoas. Ele uniu duas criaturas que, antes, eram impossíveis juntas. O amor fazia as coisas mais impossíveis. Às vezes era doloroso usar esse amor como uma forma de conseguir as coisas. Eu sei como doía a eles negar alguma coisa para mim.

         - O que vocês estão tentando esconder de mim? – eu perguntei quando lembrei que meu pai era capaz de qualquer coisa para me distrair. Eles riram juntos, e me fitaram sem falar nada. “Já entendi” eu pensei revirando os olhos. Funcionaria melhor se meu pai não pudesse ouvir os pensamentos, ou se pelo menos não contasse tudo pra mamãe depois. Era um complô. Mas estava tudo bem, eu iria superar.

         - Algum palpite pra hoje? – minha mãe perguntou pro meu pai. Ele apenas a encarou e deu seu riso torto maravilhoso. Era o preferido de minha mãe e meu. Era impossível que ele pudesse ficar mais lindo que aquilo. Mas quando ele sorria daquele jeito, anulava todas as propostas do que era impossível.

         - Hoje vai ser normal.

         “Já chega né, se não vão me contar podem pelo menos evitar minha curiosidade? Obrigada” eu pensei emburrada, cruzando os braços e fazendo beicinho. Exatamente como uma criança. Meu pai riu, e minha mãe mesmo sem ter o dom de ouvir meus pensamentos me conhecia o suficiente pra saber o que eu pensava e rir junto. Eu não achei graça, a princípio. Mas era impossível evitar rir, quando o riso de sinos melodiosos alcançava meus ouvidos. Eu ria simplesmente por vê-los felizes.

         Jacob pulou do sofá grosseiramente, se colocando em posição de ataque. Eu jurei que ele iria se transformar ali. Assustou a todos nós, por incrível que pareça, até meu pai estava chocado. Meu coração acelerou com o susto e a respiração estava ofegante, minha mãe me abraçou beijando o alto de minha cabeça, me acalmando.

         - Jacob, o que foi isso? – perguntou meu pai, o tom preocupado.

         - Eu, eu não sei. – seus olhos correram para mim. – Você esta bem?

         - Estou? – eu respondi desconfiada, tão confusa que a resposta saiu como uma pergunta, ergui os olhos para minha mãe que me fitou com seu rosto sempre sereno, ela me deu um sorriso confiante e acenou levemente com a cabeça.

         - Foi... Foi só um sonho, estranho. – Jacob disse esfregando os olhos.

         Então a atmosfera tensa se dissolveu rapidamente, meu pai afagou meu rosto e beijou a testa de minha mãe depois seguiu para fora. Mamãe me deu um beijo e eu fui me encostar ao lado de Jacob que agora estava sentado no sofá procurando algum canal na televisão. Minha mãe saiu atrás de meu pai, embora parecesse estar tudo bem, eu tinha ficado levemente intrigada. Mas era normal meus pais saírem de perto quando Jacob estava por perto, me fazendo companhia de fato. Era sempre assim, eles ficavam comigo quando Jacob dormia, ou precisava ir até La Push. Ficavam comigo quando eu dormia às vezes, como meu pai costumava fazer com minha mãe. Assim como ela eu também tinha uma canção de ninar, e ouvia ela todas as noites, arrisco em dizer que a minha era mais bonita, uma vez que era as duas vozes mais lindas que cantavam para mim.     Aquela foi mais uma noite normal, Esme fez algumas coisas pra comer, enquanto eu e Jacob assistíamos um filme na sala. A temperatura tinha caído bruscamente durante a noite, mesmo eu sendo mais quente que o normal, ainda perdia para Jacob. E naquela noite o calor insuportável da sua pele estava muito adequado. Eu acabei adormecendo ali mesmo. E me lembro vagamente de Jacob me carregando para o quarto enquanto meu pai seguia resmungando atrás.

 


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