Equinócio escrita por karoreis


Capítulo 10
Ignorada




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Ali no escuro eu tinha perdido completamente a noção do tempo, talvez tivesse se passado um dia inteiro, ou até dois. Eu havia chorado o suficiente, e as condições me deixaram exaustas, tanto que chorei até dormir por várias vezes. Mas eu começava a me sentir mal ali, e optei por ir embora. Estava de noite quando sai da caverna, havia uma suave garoa, estava muito frio, mas eu não me permitia mais em pensar no meu aquecedor pessoal.

         Eu voltei para casa em passos humanos, eu não tinha pressa de chegar, apenas de sair dali. Eu estava absurdamente perturbada sem saber o que me esperava em casa, mas uma hora eu precisava voltar. Eu não sabia o que era melhor, esperar que ninguém tivesse voltado da caçada ainda, sem ter que agüentar milhares de perguntas. Ou a casa vazia, silenciosa e fria.

         Eu me sentia cansada demais, eu queria sentar ali mesmo onde eu estava para descansar, mas eu já conseguia ver a claridade que vinha da casa, então eu me forcei a continuar andando. Os pés se arrastando, meu corpo molhado tremia de frio, minha garganta seca ardia, naquele momento de fraqueza eu percebi como fazia tempo que eu não caçava.

         À medida que eu me aproximava ouvia vozes, mas nenhuma conhecida, então conclui que era a televisão. Eu estava fraca, sentia dificuldade para respirar, e a visão estava embaçada. Eu não pude sentir maior alivio quando passei pela porta, fechando-a atrás de mim, e respirando fundo o ar quente e aconchegante de minha casa. Sentando-me ali mesmo no chão, o corpo escorregando pela parede, os olhos fechados. Era certo que ninguém havia voltado ainda, do contrário já teriam me acolhido.

         Eu senti uma presença, eu sabia quem era, mas tinha medo de abrir os olhos, e de repente me decepcionar. Eu não sabia como encontraria seu rosto, que sentimentos ele expressaria. Eu estava me sentindo torturada, mas o momento era aquele, não havia para onde escapar, eu teria de encará-lo e teria de pronunciar as palavras que estiveram em minha mente.

         Eu notei a respiração ofegante intercalada com a minha quase insuficiente. Certo, era agora ou nunca. E pra alguém que vive eternamente, não existe nunca. Abri os olhos, e Jacob não estava tão perto quanto eu gostaria. Sua expressão era angustiada, ele estava tão preocupado quanto eu. Mas eu sabia que a preocupação dele envolvia coisas como o que falar para meus pais, onde eu estava com cabeça, ou quem eu pensava que eu era, onde eu estive, e será que eu ficaria doente?

         Será que assim como eu, ele também pensou em como minha atitude foi infantil? O quanto eu tinha sido tola para fazer tudo o que tinha feito? Desde o começo, incluindo a tentativa falha de vingança, até minha fuga inútil.

         Eu tentei adivinhar minha reação durante todo o tempo na caverna, tentei me convencer de qual seria a melhor maneira de ver Jacob. Olhá-lo com os olhos amigáveis era o certo, e não apaixonados como estavam agora. Eu só provava a mim mesma que era cada vez mais impossível ficar longe dele, e eu não suportaria. Me encolhi, encostando a cabeça nos joelhos, e chorando que nem criança pequena, sem tentar sequer evitar os soluços. Todo o esforço que eu tinha tido foi em vão. Talvez eu nunca mais conseguiria olhar para Jacob sem chorar.

         Ele não se aproximou, embora eu possa ter notado que ele se moveu, mas não foi em minha direção. Aquilo me magoou, no momento em que eu percebi que queria que ele viesse e me acolhesse como sempre fazia. Mas ele estava certo, ele estava me preparando para o futuro, próximo demais. Eu precisava me acostumar sem ele sempre por perto.

         Eu entendia agora, e só agora, que ele sempre havia sido mais que uma babá para mim. E eu nunca havia valorizado da maneira correta, eu nunca teria a chance de agradecer, de pagar, igualar, de fazê-lo sentir o que eu sentia. Era uma perda irreparável. Eu consegui me acalmar e tentei levantar, eu estava morrendo de frio, e as roupas molhadas pareciam dificultar minha respiração cada vez mais. Eu me sentia tonta além de fraca. Tudo girou e eu caí no chão.

         Eu já estava sem forças até para chorar, eu mal conseguia pensar. Não sabia o que me doía mais, se era a queda, ou se era pensar em Jacob ali, me vendo naquele estado, ele que tanto cuidou de mim, e agora mantinha distancia. Eu desisti de levantar, apenas me encolhi e fechei os olhos, desejando não abri-los nunca mais.

 


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