Torna-te Minha Rainha escrita por kalliope


Capítulo 6
CAPÍTULO V {Chá de Maçã}




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As semanas que se passaram seguintes àquele beijo foram as mais profundas e que Aimee já tivera. Foi algo muito turbulento, algo novo para ela, que costumava ser uma pessoa emocionalmente fria, calculista e muito estável.

Como seu trabalho agora era cuidar do jardim, cheio de beleza e silêncio, ela teve muito tempo para refletir sobre si mesma e o que havia acontecido nos últimos meses. Constatou num resumo que sua vida, praticamente do nada, ficara tão intensa quanto uma explosão atômica, e que havia uma desculpa, sim, para tanto estresse psicológico. Primeiro, uma viagem para fora de seu lar confortável em Dartmoor direto para a capital do Reino Unido, depois, uma sequência catastrófica de assassinatos, e então, o beijo de Edward VIII. Numa das menos exageradas analogias, as chances de alguém como Aimee Holder atrair a atenção de um rei seria a mesma de conseguir tocar a face de uma estrela qualquer do universo.

A garota estava caindo fundo em algo que ela não admitia ser paixão.

— Aimee Holder apaixonada? Nunca! Nem em um bilhão de anos! — brigou consigo mesma enquanto aparava um arbusto com uma tesoura de jardim. — Eu vou apenas enganar aquele idiota para conseguir o que quero. Só isso — concluiu, nada confiante.

No centro da cidade, o Big Ben marcava meio-dia. Aimee se contentou com os mirtilos que havia comido pela manhã e não voltou ao Palácio para o almoço dos empregados, como de costume. A carga emocional das últimas semanas a deixou um pouco deslocada das coisas básicas da vida, tais como: o simples fato de sentar-se para almoçar, a apreciação de um fascinante pôr-do-sol ou até mesmo uma conversa com alguém além de ela mesma.

O fato que se não podia negar é que já haviam se passado três semanas e Aimee só tinha visto o rei de longe por uma vez durante um Congresso. Algo chamado saudade estava apertando em seu peito. Mas ela não admitia estar sentindo falta daquele homem. Aimee tinha um orgulho muito forte, porém, tal orgulho foi um pouco abalado no momento em que ele, o rei, vinha cruzando o jardim em sua direção, trazendo um belo sorriso no rosto. A cada passo que ele dava, a garota quase entrava em colapso; não conseguia decidir entre sair correndo para os braços dele ou cravar a tesoura de jardim em seu estômago para vê-lo cuspir sangue e assim reconstruir seu espírito forte de quem não cai de amores por um par de olhos bonitos.

— Pensei que esse jardim fosse proibido para você — verbalizou Aimee, sem fazer nenhum contato visual; seus olhos estavam nas flores, cujas pétalas fracas desprendiam-se ao tocar da brisa.

— Ainda é — ele respondeu, um tanto cabisbaixo. — Precisei sacrificar meu almoço para poder gastar esses poucos minutos com você.

Aimee, desta vez, olhou para ele, largou a tesoura na grama e se aproximou. Sua saia colorida de rosa e amarelo trazia um pouco de terra do jardim, assim como parte de sua blusa, mas isso não inibiu o rei Edward de a envolver cuidadosamente em seus braços e a beijar; dessa vez, foi um beijo de verdade, encrustado na paixão primária que ele tinha dentro de si. Aimee, naquele instante, sentiu seus joelhos enfraquecerem. A sensação de queda livre a tomou por completo, mas não era uma queda natural, é aquela em que alguém chega de surpresa e te empurra para um precipício.

A pobre menina se sentiu confusa demais, não sabia onde pôr as mãos, e muito menos como reagiria depois que ele fosse embora de novo, a deixando sozinha com um turbilhão de coisas para processar. Seus neurônios estavam a mil. Edward tomou-a pelos pulsos e guiou suas mãos até seu rosto, onde ela pode sentir uma barba recém-crescida. Aquilo, de algum modo, a fez relaxar. Depois, por conta própria, ela desceu as mãos até o colarinho dele, onde encontrou o início de uma gravata de cetim, a qual apertou um pouco antes que a falta de fôlego de ambos acabasse com aquele momento.

E por alguns instantes depois disso, Edward segurou o rosto dela em suas mãos e tentou ler sua alma dentro de seus olhos. Aimee julgou aquele olhar irritantemente apaixonado, mas após alguns segundos, se viu presa. Hipnotizada.

— Acho que ficou bem claro aqui que eu a amo — brincou Edward , quase sussurrando as palavras. — E você, Srta. Harper, sente o mesmo? — inquiriu. Sua expressão, agora, era séria.

Aimee respondeu com mais um beijo, tão intenso quanto o primeiro. Depois, colocou suas mãos na nunca dele e sussurrou ao seu ouvido.

— De todo o coração — mentiu.

Edward sorriu de pura felicidade. Segurou o queixo de Aimee e lhe beijou o canto dos lábios. Então, virou-se, e, com as mãos nos bolsos, andou com pressa de volta aos seus compromissos. Era notável seus olhares de preocupação ao derredor, para constar que ninguém havia capturado aquela cena para fins de reprovação.

A brisa que rondava o jardim tocou de forma gélida a pele de Aimee, que simplesmente recolheu sua tesoura do chão e voltou ao trabalho de jardineira. Tudo perfeitamente normal.

Seu sangue estava quente por causa do momento, mas ela sabia que aquilo iria doer depois.

A quietude do jardim só colaborou para dar voz aos sentimentos que tomavam lugar na mente da jovem moça. Catastrófico. Amar era como cometer um delito gravíssimo na ótica doentia de Aimee Holder. Era como se uma força maior estivesse tentando mudar sua natureza por meio de força bruta e tortura.

À noitinha, quando todo o trabalho estava pronto, Aimee entrou na movimentada cozinha do Palácio e sentou-se em um canto isolado para beber uma xícara de chá de maçã, seu favorito da infância. Ah, a infância. Tempos de brincadeiras nos riachos, corridas sem propósito pelos pastos e escaladas em pequenas montanhas rochosas. Tudo ao lado de Oliver, o menino enérgico e sonhador que Aimee tanto detestava, mas não conseguia viver sem. Afinal, quem mais seria amigo da menina estranha e calada, sentada no fundo da sala de aula e que sempre era culpada pela maioria dos acontecimentos bizarros que aconteciam na vila?

— Talvez eu te envie uma lembrancinha assim que conseguir reinar nessa porcaria — ela discursou baixinho, como se Oliver pudesse ouvi-la.

— Está bom o chá? — perguntou uma cozinheira que aparecera de repente. Seu nome era Tereza, uma boa mulher.

— Está sim.

Tereza pegou umas hortaliças de dentro dum cesto que estava ao lado de Aimee e ia-se a cozinhar quando se lembrou de algo relevante.

— Sabe, queria te perguntar. O que fazias com o rei lá no jardim? — indagou, curiosa.

Aimee estremeceu. Largou a xícara em cima de uma mesa e recobrou o fôlego com discrição.

— Como soube? — replicou, sem preocupação aparente.

— Eu estava chegando ao Palácio para trabalhar e os vi de longe — explicou.

Aimee respirou fundo e pensou rápido em um jeito de encobrir o acontecido e proteger a imagem do rei a todo custo. Ela precisava evitar que tudo ruísse por causa de uma fofoca.

— Sua Majestade estava apenas checando os arredores e me encontrou por acaso. Trocamos algumas palavras e só — respondeu, com um ar de veracidade em suas expressões físicas. — Vou para o meu quarto agora. Com licença.

E simplesmente retirou-se, deixando Tereza com uma cruel incerteza sobre aquele fato.

Para completar, Aimee não foi para o seu quarto, como havia dito. Decidiu por conta própria ir colocar os pés na grama macia daquele jardim e reviver cada segundo do beijo em sua mente. Aquilo foi deliciosamente torturante para ela, o que era a parte interessante de estar apaixonado... para alguém como ela. A dor, para Aimee, era um passatempo mágico, e, além de tudo, a única coisa que fazia sentido naquele momento.


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