Bicho-papão. escrita por Secret


Capítulo 6
Não importa.


Notas iniciais do capítulo

Adivinha quem vai se dar mal porque passou mais tempo escrevendo que estudando?
Mas vamos deixar o choro para quando eu receber as notas.
Por hora, aproveite o capítulo!
Juro que fiz meu melhor!



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                O bicho-papão encarava Gabriel com curiosidade. Após um momento de hesitação, seu sorriso se alargou e ele começou a andar lentamente em direção ao garoto. Gabriel estava apavorado, aquilo chegava cada vez mais perto, mas ainda era difícil diferenciar sua silhueta da escuridão. Além disso, seus movimentos eram silenciosos e fluidos demais para serem humanos.

                O que mais assustava o garoto era que aquele ser não andava diretamente até ele, e sim o rodeava como um animal buscando o ponto fraco de sua presa. Ele parou atrás de Gabriel, que não teve coragem de virar-se para encará-lo, e estendeu o braço, pegando o biscoito que lhe foi oferecido e roçando seu corpo no de Gabriel no processo.

                Gabriel ficou calado enquanto ouvia o som do biscoito sendo estraçalhado pelas presas daquilo e o de sua própria respiração descompassada pelo pânico que o tomava. Depois tudo ficou em silêncio.

                — Uh... Oi? — O garoto realmente não sabia o que fazer. Ele não achou que chegaria tão longe com sua ideia idiota.

                — Olá. — Foi respondido por uma voz suave praticamente grudada em seu ouvido.

                Após essa saudação o quarto caiu no silêncio novamente. Gabriel pensava seriamente na chance de voltar para a cama e fingir que nada daquilo havia acontecido, mas logo sentiu um par de mãos com garras envolvendo seu tronco e o impedindo de sair daquela posição.

Definitivamente, não havia volta!

—Então... Você é o bicho-papão. — Ele disse mais para si próprio que para o outro, ainda processando o que estava acontecendo.

— Sim. — Ele sentia um tom de divertimento naquela voz. — E você é o Gabriel. — Devolveu a observação óbvia.

Este sentia as garras rentes a sua pele de modo que qualquer movimento mais brusco poderia rasgar seu pijama ou até arranhar sua pele. Pouco tempo depois aquilo apoiou a cabeça no ombro do humano, fazendo com que ele conseguisse ver o brilho amarelado de seus olhos com sua visão periférica.

— P-Por que está fazendo isso? — Gabriel sabia que era uma pergunta idiota. Afinal ele tinha dezesseis anos e aquele ser o havia beijado! Ele não era tão ingênuo a ponto de não imaginar as intenções daquilo, mas tinha a esperança de estar errado.

— Porque eu posso. — O bicho-papão respondeu e levou a boca à orelha de Gabriel, apenas roçando os dentes afiados por ela. Um calafrio passou pelo corpo do garoto, ele já nem lembrava mais como tinha se metido naquela situação estranha.

— Por que... Por que você me seguiu até o quarto do Lucas? — Ele juntou toda a coragem que ainda tinha para perguntar. Se não podia sair dali, Gabriel queria ao menos algumas respostas.

— Porque senti sua falta. — Mesmo que não conseguisse ver o rosto daquilo, Gabriel imaginava o largo sorriso dele ao dizer essas palavras. — Minha vez de perguntar. Por que veio falar comigo? — A voz era suave e tinha um tom brincalhão, como se ele estivesse se divertindo muito com aquilo.

—... Porque... — Gabriel não sabia o que responder. Ele mesmo não sabia o motivo, aliás, ele pensava que não havia um motivo racional para essa ação estúpida. — Eu não sei. — Admitiu. — Só estava cansado de ter medo do escuro.

O garoto se arrependeu instantaneamente de dizer isso, pois assim que o fez o quarto ficou estranhamente quieto. E com certeza o silêncio era mais assustador que o ser que ele temia falando e fazendo coisas estranhas. Após alguns minutos naquele silêncio esquisito, Gabriel tentou se soltar dos braços daquilo e voltar para a cama. Mas assim que o fez, eles o envolveram mais forte e o bicho-papão pareceu voltar à realidade, voltando a falar com Gabriel:

— Por que você tem medo do escuro? Até parece que algo nele vai querer te devorar. — Ele zombou e lambeu a bochecha de Gabriel, rindo da expressão surpresa do garoto. — Mas eu admito que você é bem tentador. Eu te devoraria sem problemas. — Completou com seu típico sorriso.

Gabriel já estava cansado daquilo. Era tarde da noite, ele queria apenas voltar para a cama e ter uma boa noite de sono. Sem medo, sem pesadelos e, o mais importante, sem o bicho-papão. Com um movimento brusco, Gabriel se soltou dos braços da criatura com mais facilidade do que esperava e virou-se para ela, o medo transformado em raiva:

— Me larga! — Ele exclamou enquanto se afastava. — Você é o culpado por tudo! Por minha mãe estar sempre preocupada comigo! Por eu virar quatro noites em claro! Pela minha visita ao psicólogo... Tudo! — Gabriel explodiu. O bicho-papão apenas observava tudo com um semblante estranhamente calmo, talvez até divertido. Quando o garoto se acalmou, ele decidiu que era sua vez de falar:

— Está mais calmo? — Perguntou docemente, ignorando a cena anterior. Gabriel apenas o encarou e continuou quieto, a explosão de raiva o deixou cansado. O outro considerou isso um “sim” e sorriu. — Ótimo. Devia ficar feliz por sua mãe estar cansada, ou com certeza já estaria aqui. Você praticamente gritou. — Continuou tranquilamente.

Gabriel permaneceu quieto. Ele apenas não tinha mais o que dizer, já havia sentido medo, feito perguntas, explodido em raiva... Tudo que ele queria era deitar na cama e, com sorte, não acordar tão cedo. Percebendo isso, o bicho-papão se calou e se aproximou do garoto, quase colando seus narizes:

— Vá descansar. Acho que teve uma noite agitada o bastante por hoje. — Ele sorriu enquanto o encarava com seus olhos brilhantes. — Além do mais, não devia ter medo do escuro. — Comentou. — Afinal, a única coisa aqui sou eu, e eu gosto de você. — Completou enquanto colava seu nariz ao do garoto e, com um último sorriso, desapareceu em meio à escuridão. Gabriel ficou parado no meio do quarto. Sozinho.

Ele hesitou um pouco e, por fim, decidiu apenas voltar para a cama e não pensar sobre isso. Quando acordasse decidiria o que fazer, talvez apenas considerasse isso outro pesadelo. Parecia uma boa solução.

*

— Acorde, querido. Já é hora do almoço. — Gabriel foi acordado por sua mãe. Ele abriu os olhos devagar, incomodado pela luz forte que invadia o quarto.

— Que horas são?

— Quase uma. Você realmente estava cansado, dormiu tanto. — A mulher parecia satisfeita por seu filho ter, finalmente, uma boa noite de sono. — Olha só, dormiu tanto que até babou. — Ela riu enquanto limpava a trilha de saliva seca da bochecha do garoto. Ele se surpreendeu, mas não demonstrou.

Gabriel não havia dormido tanto quanto a mãe pensava, considerando a hora realmente foi para a cama. Além do mais, o travesseiro estava seco. Logo a imagem do bicho-papão lambendo sua bochecha na noite anterior veio à sua mente.

Pois é, parece que ele não podia mais fingir que era apenas um pesadelo recorrente.

Depois do almoço, que, para a surpresa do garoto, não era comida congelada ou marmita, a campainha tocou. Gabriel estava feliz por ter almoçado comida caseira, mesmo que sua mãe não fosse uma cozinheira tão boa, aquilo significava muito para ele. Entretanto sua felicidade acabou assim que viu quem estava à porta: André.

— O que está fazendo aqui? — Ele não fez questão de ser educado.

— Escuta aqui, imbecil, eu não gosto de você e você não gosta de mim. — André também não via necessidade de usar a educação. — Mas, porque você faltou aquele dia na escola e nenhum outro idiota quis fazer dupla comigo, a professora nos colocou juntos para fazer um trabalho. — Ele explicou claramente irritado.

— Não é justo! Eu nem concordei com isso! — Gabriel reclamou.

— Muito menos eu. Mas a professora foi clara: ou fazemos juntos ou tiramos zero.

— Tudo bem. — Gabriel suspirou, ele não podia tirar zero ou sua mãe o mataria, então só restava aceitar. — Entra logo.

André entrou e cumprimentou a mãe de Gabriel de um modo surpreendentemente educado, explicando que fariam um trabalho juntos e se desculpando por não avisar com antecedência que estava vindo. Mas, assim que entrou no quarto e ficou sozinho com o garoto, essa polidez desapareceu:

— Então esse é o quarto da menininha? — André provocou. — Uma graça.

— Diz logo qual é o trabalho. — O outro pediu tentando manter a calma. Por que aquele garoto implicava tanto com ele?

— Biologia. Temos que fazer um esquema sobre a reprodução das plantas.

Gabriel revirou os olhos e ligou o computador. Será que a professora de biologia o odiava? Só assim para deixá-lo com André! Qualquer um sabia que os dois não podiam ficar no mesmo lugar juntos sem uma briga ou discussão. Bem, era melhor fazer logo esse trabalho o mais rápido possível.

André se mostrou uma péssima opção para uma dupla. Ele não conseguia explicar direito o que a professora explicou na sala e, para piorar, irritava Gabriel a cada minuto por nenhum motivo! Ele fez Gabriel de gato e sapato praticamente a tarde toda. E quando o relógio bateu 16h30min e André disse que precisava voltar para casa, eles haviam feito, no máximo, metade do trabalho.

— Você é mesmo lerdo. Não estamos nem perto de acabar! — André culpou Gabriel. O garoto já estava pensando que o outro o deixaria fazer o trabalho todo sozinho e levar a nota sem merecer, mas ele o surpreendeu:

— Volto amanhã à tarde para terminarmos isso, princesa. — Ele zombou.

— Não precisa. Eu posso fazer sozinho. — Gabriel decidiu que essa era a melhor opção. Com certeza seria bem menos irritante.

— Ora, isso não seria justo. — André disse num tom de falsa honestidade. — Além do mais, eu não perderia a chance de te irritar. Ganho meu dia. — Revelou o verdadeiro motivo.

Ao menos ele era honesto, pensava Gabriel. Não que isso melhorasse algo.

Quando estavam no meio da sala, André colocou o pé para que Gabriel tropeçasse.

—Você está bem?— Disse falsamente preocupado, pois a mãe de Gabriel estava na sala. — Devia tomar mais cuidado. — Completou com um sorriso que apenas Gabriel pôde ver e saiu.

— Que infantil... — O garoto sussurrou para si, satisfeito por estar finalmente sozinho.

— Ele tem razão, querido. — Sua mãe sorriu, alheia ao que ocorreu. — Você devia prestar mais atenção, está sempre no mundo da lua.

— Desculpe, mãe. — Não valia a pena discutir. — Vou tomar mais cuidado.

— É bom mesmo. — Ela sorriu e deu o assunto por encerrado.

*

Mais tarde chegou a hora de dormir. Mais cedo dessa vez, pois Gabriel teria aula no dia seguinte e não podia passar das 21h15min no computador, TV ou qualquer outra atividade. Ordem de sua mãe.

Às vezes o garoto pensava até quando seria tratado como criança.

De qualquer forma, ele obedeceu às regras da casa e deitou-se cedo. Ele não sabia o que devia temer mais: ficar sozinho no escuro com algo que talvez o assediasse ou algo igualmente ruim ou a iminente visita de André na tarde seguinte.

Após alguns minutos rolando na cama sem conseguir dormir e sem ver nada anormal na escuridão, o garoto já estava se convencendo que era apenas sua imaginação que havia lhe pregado uma peça na noite anterior. Com esse pensamento em mente, ele adormeceu muito mais tranquilo.

                Mas essa tranquilidade acabou exatamente às 23h47min da noite, quando ele acordou sem motivo aparente. Primeiro pensou que fosse a falta do costume de dormir cedo. Ou de dormir uma noite inteira. Ou apenas de dormir. Então se enrolou no cobertor e fechou os olhos, tentando voltar à paz da inconsciência.

Pouco depois ele sentiu algo pegajoso em sua bochecha e sentiu esse mesmo algo pingando novamente, assim que olhou para cima viu o ser feito de escuridão o encarando com seus olhos amarelos e com a língua comprida estendida. Saliva pingava dessa. Ele estava encostado à cabeceira da cama e parecia realmente entretido observando Gabriel.

Surpreendendo até a si mesmo, o garoto não gritou ou se escondeu entre os cobertores. Ele apenas limpou a saliva de seu rosto com a manga do pijama e se voltou para o bicho-papão:

— Isso é nojento. — Reclamou. Ele sabia que devia sentir medo do ser a sua frente, mas ele simplesmente não conseguia. Depois de gritar com esse mesmo ser na noite anterior praticamente provocando a morte e passar a tarde sendo zombado por André, ele simplesmente não se importava mais.

—... Lamento. — O outro também parecia surpreso pela atitude de Gabriel, sequer mostrou seu sorriso característico. — Você está bem? Está... Diferente.

— É, tudo bem. Tanto faz. — Gabriel não estava animado para conversar com ninguém. Ele só queria dormir e não acordar mais. Assim não teria que lidar com o escuro, ou com André, ou com sua mãe, ou com nada!

— “Tanto faz”? Você realmente respondeu isso para mim? — Enfatizou a última parte. Agora ele tinha certeza que o garoto não estava bem. Gabriel apenas ignorou a pergunta.

O bicho-papão, agora mais preocupado, pensou um pouco. Logo seu largo sorriso branco e pontiagudo voltou a aparecer.

— Sei como te deixar melhor. — Ele se aproximou do garoto, ainda sorridente. Seus olhos com um brilho ainda mais intenso. Gabriel sentiu o conhecido medo retornando, o que aquilo estava pensando em fazer? Mesmo assim, o garoto não se moveu. Até porque não teve tempo hábil para isso. Assim que deu por si, estava prensado na cama com o bicho-papão sobre ele.

O que diabos estava acontecendo?

 


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Notas finais do capítulo

Pessoas com tendências à perversão (conheço pelo menos uma por aqui), eu vou decepcionar vocês no próximo capítulo. Já aviso.
Mas vai ser divertido!
Ok, chega de spoilers.
Espero que tenham curtido. Qualquer reclamação ou observação, só dizer.
Eu realmente não revisei isso!
Eu acho que ficou bom. Espero que não esteja monótono ou previsível!

Ah sim. E minha enquete de "crie um nome para o shipp" rendeu boas risadas!
Sério, vocês são criativos!
Ficamos com:
— Gacho-pão
—Gabrimônio/Gamônio
—Gabpão
—Gabripão/Bichael

Não sei vocês, mas eu curti!
Amo gente criativa!

Ah, antes que eu esqueça: a ideia de paralisia do sono do último capítulo foi da HelenFeCahill. Boa ideia, não? Encaixou tão bem!
Adoro gente que me dá ideias.
E gente criativa.
E gente que cria teorias.
E gente que desenha.
...Enfim, eu gosto de praticamente todo mundo.

Agora que eu já deixei essas notas enormes. Até o próximo!
Foi mal, povo que leu isso, eu só gosto de tagarelar.



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