Bicho-papão. escrita por Secret


Capítulo 5
Biscoito!


Notas iniciais do capítulo

Finalmente acabei!
Assuntos mais ou menos importantes nas notas finais. Não perca!
Mas, por hora, só aproveite o capítulo!



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Gabriel acordou em sua cama no escuro.

Ele ficou, ao mesmo tempo, confuso e apavorado.

Ele não devia ter dormido.

Ele não se lembrava de ter dormido!

Já era bem o quarto dia seguido que ele estava acordado sem interrupção, tudo graças à cafeína. Além do mais, mesmo que tivesse pegado no sono, ele estava no sofá. Como agora estava na cama?

O garoto decidiu levantar e preparar mais um copo de café forte, mas ao tentar teve uma surpresa: Ele não conseguia se mover. Nada. Os braços não o obedeciam, nem as pernas, sequer os dedos. Ele estava completamente imóvel.

Gabriel entrou em pânico, mas não conseguia demonstrar isso, nem sua boca se mexia. Além disso, ele tinha o pressentimento de que algo o observava. E essa sensação foi ficando cada vez mais forte, até que uma sombra entrou em seu campo de visão. O simples vislumbre do sorriso predatório e dos olhos amarelos fez seu coração acelerar. Mas a criatura não se deteve à borda da cama.

O garoto tentava espernear quando aquilo começou a subir na cama, mas seu corpo permanecia paralisado. Ele fechou os olhos, desejando que tudo quilo fosse nada mais que um pesadelo. Logo um aperto no peito o fez abrir novamente os olhos. Não era algo que o impedisse de respirar, apenas indicava que havia algo sobre seu corpo.

Ele se arrependeu profundamente de ter aberto os olhos.

Aquele ser estava sobre ele, sentado em seu abdômen e o encarando com aquele largo sorriso. Gabriel observou impotente enquanto a criatura se projetava mais à frente, aproximando perigosamente seus rostos, depois se inclinando para o ouvido do garoto:

— Quatro dias sem dormir. — Constatou. Depois de uma longa pausa, prosseguiu. — Isso não é muito saudável, Gabriel. — Ele deu ênfase ao nome do garoto, parecendo apreciar cada sílaba.

Gabriel arregalou os olhos, mas não conseguiu responder, pois estava incapaz de se mover. Percebendo isso, o outro continuou:

— Foram quatro longas noites sem poder te observar dormir. — Comentou como se não fosse nada. — Também não deve ter sido bom para você, me pergunto como seu corpo não entrou em colapso. — Ele trouxe seu rosto próximo ao se Gabriel novamente, o sorriso aumentando, se é que isso era possível.

A criatura se afastou e sentou-se no peito de Gabriel, causando um misto de falta de ar e medo no garoto. Depois o mirou com seus brilhantes olhos amarelos:

— Não faça isso de novo. — O tom de voz calmo e baixo sugeria um pedido, mas Gabriel sentiu como se fosse uma ordem. — Perder tanto sono não é bom para os humanos. O que foi? Tem medo do bicho-papão? — Ele riu e saiu de cima do garoto, o movimento silencioso e rápido demais para ser humano. Entretanto, quando estava ao pé da cama, virou-se novamente para o garoto e aproximou seus rostos. Gabriel permanecia imóvel, impotente.

— Talvez eu esteja sendo meio apressado. — Sussurrou calmamente. — Mas acho que não terei essa chance novamente. — De súbito, ele colou seus lábios aos do garoto. Apenas um toque leve, sem maior contato.

Gabriel fechou os olhos com força e gritou, surpreendendo-se por conseguir mover a boca. Ele abriu os olhos, vendo-se sozinho no quarto, e testou os demais membros, vendo que estes já o obedeciam. Ouviu o som de passos apressados e sua mãe invadiu o quarto, acendendo as luzes no processo:

— Você está bem?

O garoto hesitou, tanto por não saber o que dizer quanto por ainda estar se reacostumando a ser capaz de mover a boca. Sua mãe repetiu a pergunta e, só então, ele respondeu:

—... Sim, estou bem. Muito bem. — Ele assentiu, mesmo que não tivesse certeza. Mas a mulher não pareceu acreditar:

— Tem certeza? Eu ouvi um grito.

— Foi só um pesadelo, nada demais. — Mentiu.

— Se você diz. — Ela permaneceu incrédula. — Durma mais, deve estar cansado. Depois vamos ter uma conversa muito séria, Gabriel! — O garoto se surpreendeu, pois sua mãe só o chamava pelo nome quando estava brava.

—... Por quê? — Ele perguntou temeroso, tinha certeza que detestaria a resposta.

— Porque eu te encontrei deitado no sofá cochilando ao lado de uma caneca de café preto. Quantas vezes fez isso? E há quanto tempo não dormia?

Gabriel olhou para baixo envergonhado. Ao menos agora sabia como acordou na cama, não no sofá, mas isso não o consolava. Ante o silêncio do filho, a mulher decidiu que ele merecia um pouco de descanso antes desse confronto:

— Durma, querido. Ainda é sábado, pode descansar. Podemos falar sobre isso depois. Ainda é cedo. — Suavizou.

Gabriel assentiu com um leve sorriso. Sua mãe era sempre tão gentil. Ela o deixou sozinho no quarto e ele, vencido pelo cansaço, adormeceu rapidamente. Sem “sonhos estranhos” dessa vez. Quando acordou, já era uma e meia da tarde.

A primeira coisa que percebeu ao despertar foi a voz de sua mãe, ela falava alto e com raiva, praticamente gritando. Assim que ele desceu, porém, ela se despediu da pessoa com quem estava falando no telefone com uma voz mais doce e desligou:

— Boa tarde, meu bem. Dormiu bem? Está com fome? O almoço está na mesa. — Ela sorriu docemente.

— Ah... obrigado, mãe. — Ele hesitou, mas decidiu perguntar: — Com quem estava falando?

—Não se preocupe, querido. Não é nada importante. — Ela garantiu.

Gabriel aceitou aquela resposta e foi almoçar, já sentia seu estômago roncando.

Sua mãe era uma mulher ocupada, estava sempre trabalhando e fazia muitas horas extras. Por isso, Gabriel não se surpreendeu ao ver uma caixa de lasanha pronta na pia. Depois de passar tanto tempo sozinho com o Lucas, já tinha até se acostumado a ter comida caseira recém-preparada numa panela. Mesmo assim não reclamou e comeu com gosto.

Pouco depois do almoço, sua mãe o chamou para finalmente conversarem sobre o que ocorreu mais cedo:

— Então, querido... Há quanto tempo você não dormia? — Ela estava claramente preocupada.

—... Bem... — O garoto pensava seriamente em mentir, mas não conseguiu fazê-lo ao encarar os olhos da mãe. — Quatro dias.

— Entendo... E por que fez isso? — A mulher tentou manter a calma.

Gabriel hesitou, mas acabou contando tudo. Tudo mesmo.  Contou dos pesadelos que teve, contou que Lucas o deixou sozinho para ir às festas, contou que passou a madrugada numa balada por não querer dormir, contou até que não conseguia se mover quando acordou e, por isso, gritou. A única coisa que escondeu foi o beijo que aquele pesadelo lhe deu. Ao menos, ele continuaria repetindo para si mesmo que era um pesadelo.

A mulher, tomada pela surpresa, arregalou os olhos sem perceber e mandou o filho para o quarto, dizendo apenas que precisava fazer algumas ligações. No fim da tarde, Gabriel já estava sentado à frente de uma psicóloga.

Sua mãe era realmente rápida!

Ela lhe explicou o que era a paralisia do sono e o que podia desencadeá-la. Disse que ela é bastante comum e dificilmente se repetiria, também enumerou fatores que podiam causá-la: stress, privação de sono ou insônia e uso excessivo de estimulantes, como o café forte. Gabriel se sentia envergonhado por apresentar todas essas características. Ele quase conseguia sentir o olhar de sua mãe, mesmo que ela estivesse atrás dele.

A psicóloga também mencionou que alucinações envolvendo seres fantasiosos sentados ou deitados sobre a pessoa eram comuns e que ele não devia se preocupar. Ele não disse que “via” o tal “ser fantasioso” com certa frequência, não apenas naquela noite. Gabriel queria apenas que aquela sessão acabasse o mais rápido possível!

Depois da consulta, o clima no carro de volta para casa ficou muito estranho. Sua mãe não sabia o que dizer e Gabriel evitava encará-la. Passaram o todo o percurso em silêncio. Quando chegaram em casa, a mulher perguntou se ele queria conversar sobre aquilo, mas Gabriel usou dever de casa como desculpa e se trancou no quarto pelo resto do dia.

*

Por volta das 18h30min, Gabriel ouvia alguém bater na porta de seu quarto. No começo ele ignorou por pensar que era sua mãe preocupada com ele. Se ele fingisse que estava dormindo e não ouvia, ela desistiria logo, certo? Mas as batidas ficaram mais fortes e uma voz o chamou:

— Ah! Qual é, maninho! Abre logo isso! — Era a voz de Lucas. O garoto estranhou, pois Lucas só devia aparecer de novo no próximo final de semana. Mesmo assim ele abriu a porta.

A primeira coisa que ele viu foi seu irmão com o sorriso de sempre, atrás dele estava sua mãe o empurrando para dentro com uma expressão séria.

— Vocês precisam conversar. — Ela ditou e fechou a porta, deixando os irmãos sozinhos.

Após alguns segundos de silêncio, Lucas se pronunciou:

— Oi! Como está? — Ele sorriu como se fosse uma pergunta casual.

— Por que você está aqui? — Gabriel não estava a fim de enrolação.

— Uau, que direto. — O mais velho brincou. — Bem, a mãe me contou o que aconteceu e eu vim pedir desculpas. Eu não devia ter te levado para a balada nem te viciado em café forte. Foi mal mesmo. — Completou com um semblante forçadamente sério.

— Ah, tudo bem. — O outro sorriu. — Não é culpa sua.

Depois disso o quarto mergulhou num silêncio desconfortável.

—... Então é só isso? — Gabriel perguntou, desejando acabar com aquele clima.

— É, acho que sim. — Lucas concordou e deitou na cama de Gabriel. — A não ser que queira falar mais alguma coisa para o seu irmãozão aqui. — Zombou.

O mais novo encarou o irmão, depois o teto, depois o irmão de novo, até que finalmente decidiu perguntar:

— Ei, Lucas... Como você...? — Ele tentou formar uma frase coerente. — Você já quis começar uma conversa com alguém, mas não sabia como? — Concluiu, uma ideia maluca se formava em sua cabeça.

— Finalmente meu maninho arrumou uma gatinha? — Lucas brincou, mas parou ao ver a expressão brava de Gabriel. — Tá bom, parei! — Levantou as mãos em rendição. — Bem... Eu nunca tive grandes problemas em falar com garotas... — Ele estava hesitante com esse assunto.

— Mas...? — Seu irmão incentivou.

— Promete que não vai rir? — Lucas disse com um sorriso envergonhado.

— Fala logo!

— Tá bem , tá bem! — Ele concordou. — Quando eu era menor, queria ser amigo de um garoto da minha sala, ele era o único que não gostava de mim. — Explicou nostálgico.

— E...?

— Ele realmente não gostava de mim, nem um pouco. Não queria nem papo comigo! Então um dia eu levei um pacote de bolacha para a escola e ofereci metade para ele. Ele aceitou, conversamos e ele é meu melhor amigo até hoje. — Concluiu.

— Essa história devia me ajudar? — Gabriel não entendeu onde o irmão queria chegar.

— Não sei. Provavelmente não. Sabe que meus conselhos são péssimos! Mas, se quer conversar com alguém e não sabe como começar, ofereça uma bolacha. Todo mundo ama bolacha recheada!

— Tem razão.

— Em quê?

— Você não sabe dar conselhos. — O mais novo brincou, seu irmão apenas riu em resposta.

— Então, vai me dizer quem é a gatinha? — Lucas insistiu.

— Estava demorando a voltar nesse assunto... — Gabriel revirou os olhos.

— Quem sabe o gatinho? — Ele continuou a provocação, nesse ponto Gabriel jogou o travesseiro no rosto do irmão. — Ai! Tá bom! Parei! Juro! — Os dois riram.

— Bem, por mais que eu adore passar o tempo te provocando, já é minha hora de ir. —Lucas fez um gesto teatral de despedida. — Tchau, maninho!

— Tchau!

Gabriel continuou com um sorriso bobo no rosto depois que Lucas saiu. Só seu irmão para levantar seu ânimo depois de um dia tão ruim!

Agora o garoto estava com uma ideia louca na cabeça. Isso era algo que ambos tinham em comum, por mais que Gabriel achasse que ele e Lucas eram diferentes e questionasse se eram realmente irmão, em um assunto eles eram idênticos: Bolavam os planos mais sem noção e não sossegavam até colocá-lo em prática.

Antes do divórcio de seus pais, os irmãos ficavam muito de castigo por isso! Eram cúmplices nas ideias mais bizarras.

Mas isso é história para outro dia.

*

Anoiteceu e chegou a hora de dormir. Mesmo que sua mãe não comentasse mais sobre o assunto, Gabriel sabia que ela estava preocupada.

Até porque todo o café que tinha em casa havia “desaparecido misteriosamente”.

Querendo ou não, ele teria que deitar na cama e dormir. Em parte por causa de sua mãe que, mesmo que tentasse disfarçar, fazia de tudo para que ele dormisse. Em parte por causa do “pesadelo” que teve, mesmo que repetisse para si mesmo que não era real, Gabriel não iria desacatar a “ordem” daquela coisa para parar de virar noites em claro.

Melhor prevenir que remediar, não?

Antes de ir para a cama, o garoto pegou um pacote de biscoito escondido, sentindo-se muito idiota pelo que estava prestes a fazer.

Ele deitou-se na cama na completa escuridão, sequer pediu para a mãe deixar a luz do corredor acesa como de costume. Ele passou algum tempo de olhos abertos no escuro, apenas ouvindo os sons da casa. Por volta das 22h40min, quando tinha certeza que sua mãe estava dormindo e seus olhos estavam completamente habituados à falta de luz, ele se levantou.

No canto do quarto, encostado ao guarda-roupa, estava aquilo. Ele conseguia ver os olhos brilhantes o encarando e, quando o ser percebeu que Gabriel o observava, o sorriso branco e afiado também apareceu, mas ele permaneceu imóvel.

O garoto deu um passo à frente, surpreendendo até a si mesmo por arrumar essa coragem, e abriu o pacote que havia levado. Ainda se achava idiota por estar fazendo aquilo, mas se começou, iria até o fim! Os olhos amarelos o encaravam com curiosidade.

— Uh... — ele começou. — V-Você quer um biscoito?

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Primeiro o mais importante: Fanart incrível feita pela Little Hobbit!
Já disse que amo fanarts?
Povo que sabe desenhar, fica a dica!

Segundo: O próximo vai demorar.
E com demorar, eu quero dizer realmente demorar.
Entrei em época de provas.
Vou tentar manter um ritmo, mas não prometo nada.

Terceiro: Enquete!
Qual nome vocês dão para o shipp "Gabriel x Bicho-papão"?
(Fábio Roberto que me deu a ideia, achei interessante)
A pessoa que der a resposta mais legal vai ganhar... Bem, eu não tenho muita coisa para dar, ganha um abraço virtual e eu menciono seu nome no próximo capítulo.

Até mais!



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