P.O.V Nick

—Doce, doce, doce.

A vida é um doce, vida é mel

Que escorre da boca, feito um doce

Pedaço do céu...

Cantava aquela canção infantil da Zuba Meneghel a cachorrinha Poodle , antiga apresentadora de programa infantil  enquanto colocava, com cuidado,   confeitos, jujubas , pirulitos de bengalas numa casa de bolo pão de ló recheada de foundant de  chocolate .

Acordar de um pesadelo num refúgio tranqüilo nos braços da minha cenourinha e com seus irmãos calorosos e hospitaleiros , e  ajudar um amigo-raposo com bolos  seria minha definição de ter achado o meu lar. Estava recém-desperto tentando domar todos os meus demônios que estão presos em meu estômago . E para responder a sua pergunta : não era a fome, obrigado por se preocupar com minha saúde .São os maus pressentimentos que temos , de que algo ruim está para acontecer.

Cantar enquanto cozinhava era o meu remédio para não dormir enquanto ajudava o raposo Gideon Gray que tinha uma voz esganiçada engraçada enquanto cantava comigo. Ele me fez rir muito naquela cozinha da confeitaria quente e abafada . Aquela raposa era admirável . Em vez de fechar as portas do seu comercio e ficar dentro de sua casa se entregando no desespero ou chororó, ele abriu a confeitaria como se fosse um dia normal, como se o roubo não havia atrapalhado em nada ; e com um sorriso gentil enquanto atendia todos que entravam.

E eu soube do próprio Gideon que tinha que abrir porque hoje iria ocorrer o festival da cenoura,e sua loja era o destaque da culinária regional de Tocas. E a Gazelle iria cantar, pela primeira vez , naquela região.

Dava para ver o quanto todos estavam empolgados com isso, principalmente a Cenourinha e os seus irmãozinhos coelhos.

Enquanto isso, a Judy se esforçava em ajudar os especialistas – ratos Bernardo e Bianca em encontrar pistas, marcas de patas ou digitais na cena do crime, e que nos ajudasse em nossa missão.

Nada , por enquanto.

Já falei o quanto eu detesto a minha roupa de policial, não é?

Por isso estava vestido confortavelmente com a minha camisa verde gravata roxa e asminhas  calças como dos velhos tempos . Embaixo de um avental de cozinha tomado de farinha ,condimentos e chocolate.

Investigamos, juntos,todos os empregados de todos os departamentos , até os da administração . E  todos tiveram álibis que confirmavam aonde estavam quando ocorreu o crime. Nenhum deles estava sob investigação. Era como achar uma agulha no pareio.  Chefe Bogo estava furioso. Parecia que precisava urgentemente de um tecido vermelho para arremessar para longe de tão neurótico .

— Quem em sã consciência iria  querer roubar um lugar cheio de ...de... DOCES?!

—Eu roubaria .- disse de boca cheia , Benjamim Garra Mansa abocanhando um sonho de doce de creme enorme da própria confeitaria  . Meu deus ! Como um animal como ele poderia ser tão porquinho?! E guloso.

Senti uma pata de um urso de bengalas sobre o meu ombro, que descobri mais tarde  que seu nome era Gaston,  interrompendo meus pensamentos:

  -Agente Wilde ...desculpe interromper , mas senti cheiro de  lama, muito forte ,  embaixo de sua bancada de trabalho.  

—Lama ? – perguntou Gideon parando de colocar as gotas de chocolates sobre os biscoitos e vindo para ver o que estava acontecendo.

— Vamos empurrar a bancada para descobrirmos o que está aí embaixo, ok?

Eles acenaram com a cabeça concordando. Nós pegamos as três pontas da mesa de metal.

—1, 2 e 3. Puxar!

Quando puxamos não vimos lama... Vimos que se tratava de um buraco feito por suricates... ou ....

Havia rastros de pegadas ali que se pareciam com ...patinhas de filhotes.

Comecei a sentir falta de ar. Reconhecia essas pegadas ! Minha pressão estava ficando baixa . Cruzei meus braços para ver se esquentava um pouco ou melhorava como eu fazia quando estava na Tundralândia . A cabeça latejando como se alguém estivesse batendo uma panela dentro.  Talvez foi por causa do esforço em erguer aquela bancada pesada de metal... Não sei.

Minha falta de sono começou a cobrar o preço em meu corpo. Eu tinha que dizer quem havia roubado Gideon , mas , a minha voz não saia . Nem me lembrava mais de quem eu era ou do que se tratava tudo isso.

Comecei a ver o chão chegando perto dos meus olhos.

—Nick? Oh meu deus ...Nick ! – gritou desesperada a minha flor violeta peluda.

O chiado se intensificou. Muitas vozes ficaram falando e gritando ao mesmo tempo.

Só sei que quando vi estava desfalecendo sobre o piso gelado. Mas antes de sofrer a queda fui amparado pelos braços peludos do urso Gaston .

E cai num involuntário estado de sono.

******************

É o sonho que eu sempre tenho : estou num quarto de hospital com paredes brancas e  cheirando a produtos de limpeza muito forte , com a luz do alaranjada do sol entrando entre as vidraças da janela.

Nunca fica muito claro quem estou visitando-  se é um dos meus pais, não sei, - mas o que eu sei é que Desta Vez é uma pessoa que não deveria estar ali nesse quarto.  Lutando entre a vida e a morte. Algumas vezes vejo outros animais vindos no quarto deixando pequenos ou grandes arranjos de flores.

Escuto o constante pingar da bolsa de soro e de sangue fazendo a passagem até a veia da criatura . O aparelho que sempre informa os batimentos apitando calmamente.

Lágrimas caem no meu rosto e entrando em meu focinho. E escuto nitidamente as lágrimas caírem num boque de rosas que está em meu colo.

Quando eu era um filhote de nove anos , meu apelido era Sr. Lágrima -nos – olhos de tanto chorar na frente de todos os meus agressores do colégio .

Estou soluçando enquanto tento chegar perto do leito , e ver o rosto daquela criatura que está deitada naquela cama . 

Suspiro exaltado pelo susto que levo. Judy?!  A minha única e verdadeira amiga.  Não pode ser!  Mordo os meus lábios tentando segurar o grito que quer sair dentro de mim. Mais lágrimas brotam dos meus olhos .

Sinto que fui partido em um milhão de pedaços enquanto olho aquela expressão serena e inocente do rosto dela como dissesse que não precisava mais transformar o mundo no lugar melhor. Havia tantas palavras que queria dizer para ela não desistir de viver, mas não encontrava voz para dizê-las . Eu queria tanto que soubesse o quanto adorava ver ela dançando junto com a música da Gazelle – Try Everything ...queria que ela acordasse e me abraçasse bem forte levando toda essa dor,esse pesadelo para bem longe.

Alguém pode salvar , Alguém pode salvar minha...

Alguém pode salvar minha alma suja e pesada desse pesadelo?

Por favor, alguém ....

Será que se eu rezasse aos deuses ...eles deixariam Judy viva aqui comigo?

Tarde demais! Estou ouvindo um barulho irritante. Pipiiiipiiii.

Ninguém se importa comigo a ponto de salvar  a vida da única amiga que amei , e que me transformou em sua presa.

NÃO!- grito enquanto ouço todos os vidros daquele cômodo se quebrando com a minha voz enfurecida e quebrada .  E de repente  , um tornado me puxa no meio de seu redemoinho e tenho a sensação de que estou caindo outra vez.

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Acordo abrindo os olhos vendo que estou embaixo de árvore todo suado desorientado ao ouvir o farfalhar das folhas tocadas pelo sopro do vento.

Mas não estou deitado no tronco maciço. Estava deitado no colo de uma... é  uma coruja?!

—Graças ao Grande Corujão! Você deixou a Judy e os outros preocupados, sabia?

Sua penugem aonde havia dormido era inteiramente branca como cristal, enquanto as suas costas eram marrons. Seus olhos eram azuis como safiras límpidas. O seu rosto era do formato de coração e a voz dela era agradável e calma. Não fiquei com medo dela. Ela fugia do estereótipo das corujas serem frias e superiores.

 - Quem? Quem é você?

— Sou Saphira. E  também sou médica . Tive que tirar você daquele lugar abafado e espantar os seus colegas policiais daqui , pois  estavam muito preocupados. O que aconteceu para você passar mal desse jeito?!

Não foi nada fácil ter que explicar tudo a ela, mas fiz o melhor que pude em descrever o meu pesadelo. Ela me ouviu , não ouvir apenas com os ouvidos , mas prestar a atenção e entender-me  como um animal sensível e sábio  . E ela não me interrompeu e não disse nada até eu terminar de falar toda a cena e os meus sentimentos  .

—... E então é isso.

—Nick, eu vou lhe dizer uma coisa ,  você não aprendeu nada com os seus sonhos?! Pois é uma questão de se proteger ou ser eliminado!

O quê ? Ela disse eliminado?

— Se você ama tanto a Judy por que era ela naquela  cama de hospital?! – Ela tinha razão. Judy vivia sempre usando um colete à prova de balas sempre que saiamos da DPZ.- Quem estava naquela cama era uma parte de você, meu caro.

—Eu? – disse em voz alta. – Mas por quê?

— Digamos que você sempre   sai do DPZ com essas roupas de civil normal, sem nenhuma proteção. O que aconteceria se houvesse um tiroteio, agora ? Olhe bem atento e com o nariz no vento, pois os bandidos irão querem fazer seu funeral. Você por acaso já pensou como a Judy sentiria se você ficasse ferido...ou pior?

Era verdade. Eu  estava tão acostumado em sempre pensar no  meu conforto e não na minha proteção ou na minha cenourinha .

—Sim,você tem razão .A senhora é uma coruja diferente das historias que lia quando pequeno. - disse depois de um longo silêncio engolindo o meu orgulho.

— Poderia me dar a sua pata?

—Por quê ?

—Deixe-me ver o seu destino.

—Hmmm.... Uma linha longa da vida . E está diz que é charmoso e sábio . Mnnn... que engraçado!

—O quê?

—Eu não vejo nenhuma linha...

—Linha do quê?

—Linha de traiçoeiro . Nenhuma linhazinha!- Fiquei admirado com a adivinhação dela . – Agora olhe para a minha asa, acha que sou fria?

—Fria? Não, não , não! É agradável e calorosa nesses pouco tempo que estamos juntos e ...

—E uma coruja. E talvez Bellwether e toda a população de Zootopia estejam errados sobre o medo e o preconceito vencer todos nós.

P. O.V Judy

Não estava muito longe da árvore aonde Nick e aquela médica- coruja estavam conversando. Eu não queria admitir, mas estava com ciúmes da atenção que Nick estava dando e recebendo dela. Aquela conversa estava fazendo o meu pé bater muito rápido .

Ainda bem que meus colegas Lobato , Delgado e Francine  estavam com a escuta debaixo da árvore , mas para minha alegria ou tristeza estava quebrada.

—O que a coruja disse? – perguntou Benjamin , curioso .

— Que a Bellwether , a ovelha negra era macho e que escondia os chifres no topete fofo de algodão . – respondeu o lobo Lobato tentando escutar a conversa com os fones de ouvido.

—Hahaha... não falei. Paga, Francine. – O guepardo estende a mão para receber a grana do elefante rosa.

— Ohhh ...droga. – diz Francine chateado enquanto entrega os seus cinco dólares para o Benjamim .

—Otário !

O que eu estava fazendo ali? Por quê eu estava sendo levada pelo sentimento de ciúmes ?!

Era melhor deixar ele ...

Mas antes de virar as minhas costas vejo a grande ave abrir as suas asas e alçar vôo . E Nick vem em minha direção correndo, correndo como se não visse mais ninguém além de mim.

Ele me envolveu em seus braços longos , peludos e quentes.

—Desculpe-me, você estava certa . Eu devia usar a minha roupa de oficial todos os dias ... eu , realmente, sou só uma raposa boba.

Aquilo me fez rir por dentro, e fora. Mas não estava entendendo nada o que ele disse. Será que era algo que a coruja disse?!

— E eu também sou só uma coelha boba cheia de ciúmes.- resolvi admitir também.

— Não se preocupe , eu conto tudo para você em quarenta e oito horas, ok?

—Ok. 

Por quê ele sempre parece ler os meus pensamentos .