Sereias apocalípticas escrita por Evil Maknae, RebOS, Laesinha, Ana


Capítulo 13
Facilis descensus Averno


Notas iniciais do capítulo

CAPÍTULO NOVO )o)
Esse aqui é na visão da Rebecca. Não tenho nada pra mais a declarar porque esse capítulo já tem conteúdo o bastante. Então... Boa Leitura -u-



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Caminhávamos no meio de um matagal. A grama era tão alta que cobria o meu corpo todo. Também era seca e caminhar entre ela machucava bastante. Apenas seguimos pelo mato, abrindo caminho com os braços. Do outro lado havia uma enorme construção com teto de vidro. Parecia um shopping, mas ao mesmo tempo não. Era estranha.

Meus amigos seguiam atrás de mim. Por algum motivo, eu estava guiando a trilha. Continuei avançando. Eles estavam em silencio, assim como eu.

O sol estava em cima de nossas cabeças. Meus cabelos estavam quentes e eu só queria atravessar o matagal e chegar até o local para poder beber água.

Quando finalmente chegamos ao fim do matagal, achamos uma área completamente aberta. A grama era baixa e verdinha. A luz do sol não me queimava mais. Ela me dava calma, como uma tarde de domingo. Os portões de metal se abriram. Um garoto cheio de feridas sangrando estava parado com uma arma apontando para mim.

Ele usava uma calça jeans, uma blusa que era pra ser branca, mas estava totalmente melada de sangue. Ele tinha olhos verdes profundos. O garoto olhou para mim e atirou.

A bala atravessou o meu corpo de maneira mágica, sem deixar uma sequer ferida. Eu virei para trás para olhar onde ela tinha parado e então todos os meus amigos estavam caídos no chão, sangrando. Ajoelhei-me no gramado olhando todos que eu amava mortos. Uma lágrima desceu pela minha face.

Senti um toque quente nas minhas costas. Virei. Era o garoto. Ele levantou a arma e apontou para a minha cabeça. Ele atirou; Eu acordei.

 ********************

Levantei em choque. Meu corpo estava totalmente soado. Calcei meus sapatos e peguei o meu facão. Todas as minhas amigas dormiam, ou pelo menos pareciam dormir. Abri a porta cautelosamente e saí do quarto. A casa que nós estávamos tinha uma aparência horrível.

As paredes eram forradas com papéis de parede coloridos e velhos. Estavam descascando, mas ainda dava para ver a quantidade exagerada de cores. O chão era de madeira e rangia pra caralho. Eu tinha que andar muito devagar para não fazer barulho. Os quartos ficavam no segundo andar. Tinham dois quartos e um banheiro. Todos os cômodos eram cobertos de papeis de parede extravagantes. Caminhei pelo pequeno corredor e fui até a escada pequena.

— Puta merda! – apontei meu facão para um corpo que se movia. – Cian, que merda.

— Digo o mesmo. – ele abaixou a arma. – O que está fazendo acordada?

— Eu acabei de acordar. – guardei Boris, o facão maravilha. – Eu tive um pesadelo.

— Saquei. – ele guardou a sua arma. – Sonhou com o que?

— Não quero falar sobre isso agora. – continuei descendo as escadas.

— Ei, espere. – ele desceu e segurou meu braço. – Acho melhor você falar com o Ben.

— O que tem ele?

— Ele secou uma garrafa de Vodka e não parece muito bem.

— Você sabe o que aconteceu?

Cian negou com a cabeça.

— Ok, eu vou lá falar com ele. – puxei meu braço das mãos de Cian. – Era isso que você fazia acordado?

— Fiquei preocupado. – ele respondeu.

— Sei. – sorri. – Se você ficou preocupado com alguém, daqui a pouco vai chover coelhinhos felpudos e algodão doce.

Ele sorriu ironicamente e mostrou o dedo médio. Eu devolvi o gesto.

— Ei, Rebecca. – eu parei de descer as escadas para encará-lo. – Até que um churrasco de coelhinhos felpudos não seria ruim.

— Seu doente. – ignorei e continuei descendo até chegar à sala.

Como todos os lugares, era coberto com papéis de parede. Os móveis eram velhos e empoeirados. No sofá amarelo tinha uma mancha que parecia muito com sangue. A sala era bem grande no final, perto de uma janela bem grande com cortinas verdes, tinha uma mesa grande e redonda de jantar. Sentado virado para janela recebendo a luz da lua estava Benjamin Malikandri, o bêbado barbudo.

Caminhei devagar e com menos barulho possível até o Ben. Quando cheguei perto dele, peguei uma cadeira e coloquei ao seu lado. Ben olhou para mim, deu um gole na sua segunda garrafa de Vodka e voltou a olhar para a janela.

Eu fiquei em silêncio por um tempo, tentando escolher as palavras certas.

— Está tudo bem? –foi o que saiu.

Ben ficou calado, ainda encarando a janela.

— Não adianta fingir que eu não estou aqui.

— É ele. – Ben sussurrou.

— Ele quem?

— As coisas ficaram piores esses dias. Ele continua aparecendo pra mim.

— O que está acontecendo? – toquei no ombro dele. – Quem ta aparecendo?

— O Aldrein. – deu pra ver uma lágrima escorrendo pela sua face. – Está cada vez pior. A cena se repete e ele fala comigo. Eu ouço gritos, vejo o corpo dele morto, eu... Eu não consigo parar essa merda de sensação. – Benjamin colocou a mão na cabeça e parecia que queria apertar até ela explodir.

— Ele apareceu hoje?

— Sim. Desde o momento que eu toquei no nome dele, ele não sai da minha mente. E vai piorando cada vez mais.

— Eu não queria ter feito você falar sobre esse assunto. Desculpe.

— Não, não é sua culpa. Não é culpa de ninguém. – outra lágrima desceu. – Eu o matei.

— Ben...

— É tudo culpa minha. O Aldrein quer o meu sofrimento.

— Ele é seu irmão, por que vai querer que você sofra? – eu não sabia se chegava mais perto do Ben, ou dava mais espaço para ele. – Você se sente culpado e a culpa faz você pensar essas coisas. 

— Você não entende. – ele olhou para mim, com os olhos vermelhos. – Eu poderia ter dado uma chance.

— Ele tinha chance de sobreviver? – perguntei, irritada. – Vocês tinham a porra da cura? Como você ia fazer com que ele não virasse a merda de um zumbi?

— Eu poderia ter dado um jeito.

— Como? Arrancando a perna dele fora? – encarei o Ben. – Todos nós sentimos culpa por algo. Eu poderia ter feito algo para ajudar meus pais? Provavelmente, mas não fiz. Só que eu sei que eles não querem que eu me entregue. Benjamin, eles eram a nossa família. – voltei a olhar para a janela. –Você considerava o Aldrein como sua família?

— Sim. – ele falou, rispidamente.

— Então esqueça essa ideia de que ele quer que você morra. – levantei da cadeira. – Eu não quero parecer insensível, mas não quero te ver abalado engolindo litros de Vodka.

— Eu sei. – ele tentou sorrir. – Obrigado.

— Somos sua nova família, só queremos te ver bem. – respondi e caminhei até as escadas novamente. Ele não respondeu nada. Eu virei para olhá-lo novamente. – Falta tão pouco, não desista de lutar agora.

Subi as escadas com rapidez e não olhei para trás. Quando cheguei ao corredor do segundo andar, Cian estava entrando, abrindo a porta do seu quarto. Caminhei até o meu.

— Curioso do caralho. – entrei no quarto, fechando a porta atrás de mim. 

**************************

Depois de um dia que eu tive a conversa com o Ben, ele não melhorou nada. O dia estava fazendo bastante calor. Desisti de usar uma blusa por cima da outra e usei uma só. Estava literalmente o inferno. Só faltava o capeta aparecer perdido no apocalipse e pedir para fazer parte da família.

No momento estávamos buscando mantimentos pela cidade. Seguíamos umas placas que indicavam um supermercado.

Demorou cinco minutos até avistarmos um enorme supermercado. Entramos no estacionamento, que tinha uns seis corpos mortos no chão e alguns zumbis vagando e às vezes comendo os corpos. Mercado para humanos e zumbis também, que maravilha.

Estacionamos perto da entrada, pegamos nossas armas e saímos do carro. Entramos por um buraco enorme da vitrine estilhaçada. As luzes estavam apagadas, então peguei minha lanterna e iluminei o caminho. Decidimos nos separar pelos corredores do mercado para procurar mais rápido.

Caminhei olhando as estantes. Achei uns sacos de biscoito no chão e coloquei na mochila. Havia um corpo morto no meio do corredor. Ignorei. Havia corpos mortos em todo lugar nessa bosta de país.

Virei a esquina de um corredor pra entrar em outro.

— PUTA MERDA. – peguei a arma o mais rápido possível e atirei.

— O que foi? – Anna surgiu do meu lado. – Ah...

— Esse desgraçado me deu um susto. – peguei meu facão e finquei no peito do zumbi. – Já pegou suas coisas?

— Já. Não achei muita coisa. A maioria estragada.

— Tem a porra de um açougue nesse mercado. – Amanda também apareceu. – Tá fedendo mais do que o pé do Cian.

— Adivinha quem vomitou? – Layx também nos encontrou.

— Você? – perguntei.

— Exato. – ela mostrou o polegar afirmando. – Por favor, não procurem nada no setor de peixes. Tem uma poça sinistra com restos da última coisa que eu comi.

— Valeu por avisar. – Anna agradeceu.

— Vamos cair fora dessa bosta. – Amanda sugeriu. Concordamos.

Peguei meu facão que estava preso no corpo do zumbi e seguimos novamente até a casa que estávamos “hospedadas”. No caminho, a conversa foi para um rumo que até estava sendo bem comentado nos últimos dias: Benjamin Malikandri.

— Não vou negar que ele está bem estranho esses dias. – Amanda acariciava o Cookie.

— Verdade. – Layx concordou. – Está bem grosseiro.

— Alguém sabe o motivo? – Anna perguntou.

— Acho que foi a conversa que eu tive com ele. – falei olhando para baixo. – Ele não teve uma infância muito boa, o irmão morreu e ele se sente uma merda por causa disso.

As meninas ficaram caladas. Ouvi alguns suspiros.

— Eu não esperava que ele ficasse tão estranho depois da conversa. –quebrei o silencio. – Todos nós perdemos a família, mas o Ben se sente extremamente culpado pela morte do irmão.

— E foi culpa dele ou é só uma sensação? – Layx perguntou.

— Eles estavam fugindo dos zumbis e o único jeito de escapar era escalando uma grade. O Ben escalou primeiro, mas o irmão dele, o Aldrein, foi mais lento. – respondi enquanto comia um biscoito velho que peguei no mercado. – Ben não exitou e matou o irmão, prevendo que ele se transformaria em zumbi.

— Nossa, que horror. – Amanda continuava fazendo carinho em seu cachorro. – Ele deve sofrer muito com isso mesmo.

— Ben disse que o irmão aparece nos seus pesadelos... – engoli seco. –Como se quisesse... Levá-lo para o inferno.

O silêncio voltou e desta vez eu continuei calada ao invés de retomar a conversa. O carro ficou assim até chegarmos à casa que estávamos “hospedados”. Enquanto eu e as meninas tínhamos saído para pegar alguns mantimentos, Ivy, Charles e Misha tinham saído para ver se achavam algo interessante, mas já estavam em casa. Cian estava lendo livros e fazendo companhia ao Ben.

Estacionamos o carro na porta da casa e pegamos nossas armas. Saímos com as bolsas com mantimentos e entramos na casa. Cian estava no sofá velho e empoeirado lendo, enquanto Ben estava numa poltrona grande e estranha. Ivy carregava armas com o irmão e Misha estava no sofá ao lado do Cian folheando uma revista.

— Chegamos. – falei. O Ben olhou para mim e depois fechou os olhos enquanto bebia outro copo. – Achamos alguns biscoitos velhos no mercado.

— E o velho e delicioso macarrão instantâneo. – Amanda falou sorrindo.

— Eu já estou com vontade de vomitar de tanto comer essa droga. – Cian fechou o livro e colocou sobre o sofá. – Semana passada eu comi um que estava fora da validade.

— Boa parte das coisas que você come está fora da validade. – Ivy falou.

— O QUÊ? – Ele indagou assustado e com nojo.

— É o preço por morar num apocalipse. – Layx falou sentando no sofá. 

— Vai acostumando seu estômago, princesa. – Amanda foi até a cozinha.

Cian, Layx, Misha, Anna, Ivy e eu também seguimos para a cozinha. Colocamos uns seis sacos de macarrão dentro de uma só panela para dar para todo mundo. Boa parte estava fora da validade, mas isso não importava. Como o fogão não funcionava, Ivy que preparou a comida com uma técnica que ela usava para cozinhar. Muito útil.

Uma água que não parecia totalmente limpa saiu da torneira. Com a fervura os micróbios provavelmente iriam morrer, então estava tudo bem. Pegamos uns pratos empoeirados e limpamos com papel toalha que achamos nos armários. Ficamos conversando até ouvir gemidos altos.

— É o Ben? – Cian perguntou.

— Ele deve estar no banheiro... – levantei da cadeira. – ...vomitando. Eu vou lá.

Peguei o rolo de papel toalha e fui até o banheiro. A poltrona estava vazia, então provavelmente o Ben era o dono dos gemidos. Caminhei até o banheiro principal e abri a porta. Benjamin estava sentado no chão apoiado no vaso e com a boca suja.

Peguei uma grande quantidade de papel toalha e deixei o rolo encima da bancada da pia. Sentei ao seu lado e permaneci calada. Ele respirou fundo e apoiou sua cabeça na parede. Estendi a mão com o papel para perto dele, que ignorou completamente.

— Ben, o que aconteceu? – perguntei.

Ele ficou calado e empurrou minha mão de perto dele.

— Eu já estou ficando irritada com sua merda de atitude. – falei irritada jogando o papel no chão. 

— Não pedi para você vir aqui. – ele respondeu.

— Mas que porra, Benjamin! – elevei o tom de voz. – Nós nos preocupamos contigo e você devolve com “Não pedi pra você vir aqui.” Qual o seu problema?

Ele olhou para mim, chorando de novo.

— Eu não durmo faz quatro dias, ele não sai da minha mente, como você quer que eu me sinta? – ele gritou.

Eu não tinha palavras. A única coisa que eu tinha vontade de fazer era xingar o Ben com nomes que deixariam ele mais traumatizado. Engoli a raiva, respirei fundo e tentei me segurar.

— Como alguém que está perto de achar a Base. – falei. – Ou também pode se sentir como um idiota sentado no banheiro com os lábios melados de vomito. Você escolhe.

— Eu quero ficar sozinho.

— Eu estou me sentindo uma idiota por estar aqui tentando fazer você ficar bem enquanto você fica sendo grosso comigo. – fui até a porta. – Quando eu voltar para a cozinha, não espere mais a minha visita.

Ben suspirou.

— Desculpe. – ele sussurrou.

Parei na porta e virei para encará-lo.

— Não vou forçar você a sentar com a gente, mas só quero constatar que estamos do seu lado.

Cian apareceu na porta atrás de mim.

— Está tudo bem? – ele perguntou.

— Sim. – Ben afirmou.

— Loba Lupa, faz companhia ao Ben, eu tô voltando para a cozinha.

— Loba Lupa? – Cian perguntou confuso.

— Você ta super materno esses dias. Ela amamenta Rômulo e Remo e você amamenta o Ben. – falei sorrindo.

— Vai tomar no cu. – Cian respondeu.

Ben sorriu. Um bônus. Voltei para a cozinha. Meus amigos conversavam, eu também entrei no papo. Depois de um tempo, Cian voltou com o Ben.

Ele ficou um pouco melhor. Ainda não estava totalmente de volta, mas parecia melhor. Estava amanhecendo, então decidimos dormir logo para ir embora naquela noite da casa. Ben ficou lendo um livro na sala. Tinha bebido umas duas cervejas no almoço, mas eu consegui fazer com que ele parasse um pouco.

Fomos até os quartos e dormimos. Um quarto apertado para as meninas e outro para os meninos. Tinha uma cama bem grande de casal, então Layx, Anna e Amanda deitaram lá, enquanto eu e Ivy dormíamos em colchões separados no chão. Os garotos ficaram em um quarto que provavelmente era dividido por dois irmãos. Tinha duas camas de solteiros, que foram ocupadas pelo Cian e Misha. Charles dormiu num colchão no chão e tinha outro para o Ben.

Deitamos exaustos. Depois de um tempo olhando pro teto, finalmente dormi.

              ***************

Acordei totalmente suada. Péssima ideia pegar uma coberta para dormir. Levantei e caminhei silenciosamente para o banheiro. Passei pela porta dos meninos, que estavam em sono profundo. A cama do Ben estava vazia e isso me chamou atenção. Fui até o banheiro e molhei uma toalha com a água que continuava meio suja. Normal. Esfreguei no rosto e nos braços. Talvez isso me ajudasse a refrescar.

Saí do banheiro e olhei rapidamente para o sofá, que estava vazio. O ângulo que eu estava não mostrava muita coisa, então caminhei até a sala.

— Ben? – chamei e continuei caminhando.

Olhei ao redor e vi o corpo do Ben caído no canto da sala. Alguns pedaços de vidro estavam espalhados perto do corpo. Havia muito sangue também. Corri desesperada e ajoelhei ao lado do corpo. Estava de barriga para baixo, então eu virei para cima.

— Não, não, não, não! – coloquei sua cabeça encima do meu colo.

Ben estava com uma garrafa quebrada cravada em sua barriga. Seus olhos já estavam sem vida e sua mão segurava a garrafa. Sangue escorria do ferimento e da sua boca. Meus olhos encheram de lágrimas, era incontrolável. Por um momento uma dor invadiu o meu corpo e a única coisa que pude fazer foi chamar pelo seu nome, mesmo sabendo que era em vão.

— Não, não... – as minhas lágrimas caíam sobre seu rosto.

Meus amigos chegaram provavelmente com o som dos meus gritos.

— Meu santo Deus. – Layx falou.

— O que aconteceu? – Anna chegou. – Meu Deus...

— Mas o que... – Amanda pareceu espantada.

— Ele se... – Misha começou a falar.

— Suicidou. – Completei enquanto chorava.

— Mas por quê? – Charles falou assustado. – O que aconteceu?

— E-Eu cheguei e o encontrei assim.

Ficamos calados por um momento observando o corpo do Ben. Minhas lágrimas caíam incansavelmente. Levantei e fui diretamente para o banheiro. Vi o Cian sentado no sofá da sala com olhos arregalados. Ele não estava chorando, mas parecia muito abalado.

Lavei o sangue do Ben da minha mão e dos meus braços. Olhei meu reflexo no espelho. Parecia mentira, como se eu fosse ouvir a voz dele chamando meu nome e ver ele sentado na poltrona bebendo suas bebidas de sempre. Ver seu sorriso quando olhava para o Impala Vermelho pela janela do carro de Layx. Eu não conseguia acreditar que tudo aquilo estava realmente acontecendo.

A única coisa que eu conseguia fazer é chorar e pensar “Quero o Ben de volta.” E doía em pensar que nunca mais olharia em seus olhos esverdeados com vida novamente. Como alguém que eu conhecia há pouco tempo poderia ter se tornado tão importante? Como se fizesse parte da minha vida?

Isso doía dentro de mim. Não havia como voltar ao tempo e falar tudo que eu deveria ter dito. Layx bateu na porta do banheiro e me fez levantar para me dar um abraço. Não neguei. Mesmo com todos meus amigos junto de mim, era como se eu tivesse um buraco em minha alma que eu não conseguia preencher.

— Vamos procurar coisas úteis no carro dele e... – a voz de Misha falhou. Ele respirou e voltou a falar. – Nos arrumar para sair.

Eu procurei na parte da frente do carro, Layx no banco dos fundos, Anna e Misha no porta-malas. Vasculhei todos os lugares possíveis de colocar algo em espaços que ficam no painel do carro e achei um canivete. Era útil. Abri o porta-luvas e achei um isqueiro e uma carteira de cigarros.

Deixei minha mão dentro do porta-luvas tocando em cada canto e senti algo gelado. Puxei. Era um anel feito de algum material que eu não conhecia, mas devia ser metal. Na parte de dentro tinha grafado “B. M.” com uma letra rápida e grossa.

Benjamin Malikandri.

O anel era muito grande para os meus dedos pequenos, então tirei o meu colar e coloquei o anel junto do meu simples pingente triângulo. Coloquei de volta no meu pescoço e saí do carro.

— O que vocês acharam? – perguntei.

— Um casaco velho, uma blusa cheia de sangue, uns panos, uma faca e... – Misha olhou para as coisas que estavam no chão. – Uma revista de... – Ele folheou. – Bebidas.

— Ah, olha... – Anna falou surpresa, mas depois fez uma cara de decepção. – Mais uma revista sobre bebidas. E o que vocês acharam?

— Papel higiênico, um atlas geográfico, uma garrafa de água e uma blusa. – Layx respondeu.

Respondi por último, mostrando o que eu havia achado. Voltamos para a casa e levamos todas as coisas conosco. Lá estavam Cian, Amanda, Ivy e Charles, com as coisas da mochila do Ben espalhadas pelo chão.

Tinha várias coisas, mas decidimos não ficar com nenhum dos pertences que lembrassem o Ben, como roupas e acessórios. Como Ivy tinha carro, decidimos deixar o Impala do Ben para trás.

Recolhemos tudo e nos preparamos para cair na estrada e encontrar a base. Vi Cian ajoelhado ao lado da parede que o Ben havia morrido e olhei de relance algo na parede. Em sangue, tinha escrito “Obrigado. Amo Voc...”

Uma lágrima desceu pelo meu rosto. Mesmo assim saí de casa e olhei para o Impala Vermelho bem longe de nós. Dentro dele havia pertences, bebidas e Benjamin Malikandri. Caminhei até o carro e olhei pela ultima vez para o corpo de uma pessoa especial com uma blusa com a estampa de “I ♥ Beer”

Colocamos no peito dele um papel escrito: Que seu carinho e carisma nunca sejam esquecidos. O bêbado mais louco e incrível que conhecemos. Amamos você. Adeus, Ben”.

Puxei o isqueiro do meu bolso da calça, acendi o fogo e joguei dentro do carro. O estofado começava a pegar fogo e eu corri para longe. Entrei no Fox preto de Layx e nós seguimos a estrada.

Olhei para trás. O carro explodira.

Toquei no anel que estava no meu colar. Estava gelado, como o coração do Ben e a sua alma.

Respirei fundo e fechei os olhos.

Que as almas levadas para o inferno, algum dia possam ser perdoadas e levadas para o céu.

Adeus.

 


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Notas finais do capítulo

Facilis descensus averno: É fácil a descida ao inferno.
A frase não é da nossa autoria. Crédito ao criador.
Até o próximo capítulo, pessoas.