FusionTale escrita por Neko D Lully


Capítulo 35
Especial: Um dia de investigação com Carl


Notas iniciais do capítulo

Desculpa a demora, sei que não é o capitulo que vocês esperavam ver, mas além de ter comemorado a chegada de 300 favoritos no SS (337 até agora), tem que comemorar que aqui eu bati meu recorde de comentários, favoritações, numero de capitulos, pessoas acompanhando, sério gente, essa é a fanfic que mais rendeu em questão de leitor para mim e me sinto muito incrível por isso. Obrigada a todos por me fazerem experimentar essa incrível sensação.
Eu acho que o cap é bastante divertido, ficou grande e tenho quase certeza que vão gostar. O próximo prometo ser uma continuação da série. Então divertam-se com esse enquanto podem!



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Especial: Um dia de investigação com Carl

Mais um suspiro, talvez o terceiro em um curto lapso de cinco minutos. Cinco entediantes e insuportáveis minutos sem fazer absolutamente nada, queixo sobre a mesa a sua frente abarrotada de papeis, os quais ele não estava nem um pouco preocupado se estavam a ser amassados ou não, por mais que uma vez ou outra recebesse olhares de reprovação vindas de Diana, uma ameaça clara não verbal de que, se a atrapalha-se em seu trabalho estaria definitivamente morto.

E ele não se importava realmente! Seu dia ficava terrivelmente monótono quando ela não aparecia. Era a única para quem poderia tagarelar sem qualquer ameaça de receber um soco na cara para que calasse a boca. E isso porque ele era naturalmente tagarela, necessitado de uma boa fofoca a qual pudesse não apenas descobrir todos os detalhes como também repassá-los uma e outra vez para qualquer ouvido que estivesse disposto a escutá-lo. E isso, ele sabia bem e não negaria, era uma necessidade latente derivado de seu medo em pensar sobre seus próprios problemas, enchendo sua cabeça e atenção para fatos os quais nada tinha relacionados a ele, tornando-o, de algum modo, apenas um espectador.

Dias os quais não poderia, de alguma forma, suprir essa necessidade, seja ouvindo ou falando, tornavam-se extremamente odiosos!

— Carl, pela milésima vez, se tão entediado está vá procurar algum trabalho para fazer! Frisk está de folga e só vai voltar amanhã, ou seja, você não tem nada o que fazer aqui a não ser empacar mais ainda meu trabalho. E eu já tenho pessoas de mais para fazer isso, não preciso de mais um, então se não vai ser útil pode ir embora!

Carl apenas bufou em resposta, olhos estreitando-se enquanto eram desviados para a janela do lugar.

Era verdade que tinha ido até ali, animado e alegre, para encontrar Frisk e poder assim dizer as boas novidades que tinha conseguido. Ela era a única que se dispunha voluntariamente e de boa vontade a escutá-lo sem reclamar, obviamente ele havia se esquecido completamente que a garota não tinha trabalho naquele dia e, diferente dele que basicamente morava ali, ela tinha uma casa a onde deveria ficar, escola e família para gerenciar. A constatação, porém, veio tarde, caindo-lhe como um balde de água fria sobre a cabeça assim que assomou pela porta do escritório dos mensageiros, encontrando-se apenas com Diana enrolada no meio dos papeis.

Ela, diferente dos outros entregadores, não costumava sair muito. Seu trabalho, na maior parte das vezes, resumia-se na gerencia de encomendas, distribuição de informações e checagem de preços tanto recebidos como a ser pagos. Ela deveria receber e avaliar os relatórios recebidos de cada entregador, os dados mandados pelos comerciantes e negociadores e as informações que deveriam ser repassadas coletadas pelos informantes. Tudo isso ela deveria condensar e repassar para Sans, junto a suas próprias avaliações e anotações sobre o que poderia ter que melhorar e sugestões sobre o assunto. O albino seria apenas aquele a bater o veredito sobre as posteriores decisões.

Por tal motivo ela quase sempre encontrava-se afogada em papeis, mesmo que tivesse diminuído consideravelmente depois que Frisk havia aparecido para ajudar. Ainda era um amontoado considerável de papel espalhado pela mesa, no entanto, bem menos do que inicialmente Carl havia visto naquela sala. A antecessora de Diana também não era das mais organizadas e tinha deixado um bom punhado de problemas para ela.

Outro suspiro profundo e dramático e Diana já estava com cara de quem lhe arrancaria a cabeça.

— Carl, estou avisando, se não vai me ajudar, para fora! Frisk não vai voltar até amanhã e você não pode ficar aqui esperando até ela voltar!

— Mas é tão chato sem ela! - ele amuou como uma criança mimada, olhos subindo para Diana com toda sua indignação pelo momento. Queria porque queria que Frisk estivesse ali para conversar com ele, tudo era tão parado quando não estava... Em pouco tempo era como se a pequena morena tivesse vivido com eles sempre! - Vai me dizer que não concorda!

— É verdade que aqui fica um tanto solitário quando ela não está, Frisk sempre foi uma boa companhia. - o rapaz endireitou o corpo, animado, pronto para exclamar um "eu disse" quando Diana prosseguiu, tom cortante, um pouco mais alto do que originalmente havia começado. - Ainda assim! Ficar reclamando não vai fazê-la largar a vida que tem fora daqui para vir falar com você. Ela tem seus próprios problemas para cuidar.

E foi só então que Carl parou para pensar. Em todos os meses que Frisk esteve trabalhando junto com eles, nunca, em nenhum momento, ela havia falado sobre si mesma, sobre sua família, sua vida fora do que acontecia na gangue. Não que ela fosse uma pessoa fechada, mas Carl não se recordava de nenhuma informação relevante sobre ela. Para dizer a verdade, ele não sabia absolutamente nada sobre Frisk. E para um informante amante de fofocas o qual fazia questão de fazer todos os mais variados tipos de perguntas a pessoa que acabava de conhecer tal constatação era uma afronta a sua reputação e uma surpresa para quem ele era.

E não tinha como encontrar uma resposta para tal. Conversar com Frisk era simplesmente agradável o suficiente para que você fosse permitido falar e falar sem ter medo de ser cortado, julgado ou estar incomodado. Ela simplesmente desprendia uma aura, por assim dizer, que atraia e fazia com que esquecessem de fazer qualquer pergunta, pois parecia que conheciam-na desde muito tempo, uma velha amiga e companheira. Sempre sabia como agira ao redor deles, qual assunto tocar e qual deixar de lado... Ela sabia tanto sobre eles e eles não sabiam nada sobre ela.

— Ne... Diana, você sabe alguma coisa sobre Frisk? Quero dizer, quem ela é fora daqui? - a ruiva deteve seu trabalho por um tempo, dedicando a encarar com curiosidade e confusão o rapaz ainda deitado sobre sua mesa, encima de seus papeis, antes de finalmente se por a pensar.

— Além do que todos aqui já sabem creio que não muito mais. Sei que ela está no terceiro ano do ensino médio, adotada e irmã de Chara, mais nada. - Diana franziu o cenho, esforçando sua mente a buscar mais detalhes, contudo, nada saia do básico o qual todos já estavam informados. Talvez não tivessem procurado mais por Frisk parecer uma garota normal de classe média e tivesse tomado suas próprias conclusões como verdades? - Mas por que está perguntando isso agora, Carl?

— Eu acabei de me dar conta que não sabemos nada sobre ela. Faz meses que ela está aqui e nos contentamos apenas, não que seja ruim, mas ninguém teve curiosidade alguma de perguntar de onde ela veio, quem ela é, o que ela já fez. Nos sentimos confortáveis, falamos com ela como se fosse nossa amiga desde sempre, e isso porque ela sempre soube exatamente como nos tratar. Parece que ninguém realmente ficou curioso sobre ela. - e uma coisa que Carl era definitivamente com toda certeza era curioso. E ainda assim ele nem ao menos teria pensando sobre o assunto se a conversa não tivesse simplesmente caído em tal. A ruiva, no entanto, não parecia tão abalada com o assunto, dando despreocupadamente de ombros.

— Não é como se realmente importasse. Todos temos nossas histórias e nossos segredos. Nunca perguntamos para Frisk e ela nunca sentiu a necessidade de falar nada, e é isso. Tão simples como deveria. - mas Carl não estava satisfeito. Agora que sua curiosidade havia sido atiçada pelo pensamento ele estava decidido a resolver o mistério e descobrir tudo o que podia sobre sua pequena amiga.

— Vou pesquisar! - exclamou determinado, saltando de sua cadeira com punhos bem fechados e braços flexionados.

— Você poderia simplesmente esperar por ela e perguntar diretamente, você sabe. - Diana comentou, dividida entre exasperada e divertida com toda a situação. Ela sempre imaginou que as pessoas com quem convivia naquele lugar nunca bateram muito bem da cabeça. Carl amuou em resposta, beicinho nos lábios e bochechas infladas como uma criança.

— Assim não teria graça alguma e eu perderia todos os créditos. Que tipo de coletor de informações eu seria se fizesse desse jeito? - e com essa declaração ele deixou o lugar, ainda tentando pensar onde primeiro deveria olhar. Talvez devesse perguntar para alguns dos amigos de Frisk que ainda estivesse em atividade naquele dia ou...

As risadas, demasiadamente conhecidas para seus ouvidos sensíveis e preparados, chamaram-lhe a atenção enquanto caminhava para sair da área de mensagens, mesmo com todo o barulho de teclados sendo digitados ou conversas paralelas. Não foi difícil, então, identificar o grupo conhecido de garotas a subir, provavelmente, para o sexto andar. Betty sempre gostou de ficar lá em seus momentos livres, ou tentativas de fuga do trabalho, para espiar as idas e vindas de Sans juntamente com a vigilância de quem entrava e saia de seu escritório. Agora que Frisk estava de folga era bem provável que não prestasse tanta atenção, desde que a pequena decidiu fazer parte da vida cotidiana deles, Betty tinha concentrado todos seus esforços nela.

Carl sempre soube que Betty tinha mais do que uma simples queda por Sans. Era totalmente uma obsessão doentia a qual ele enojava por completo. Nunca tinha ido muito com a cara daquela garota e agora menos ainda, torcendo para que eu chefe fosse esperto o suficiente para nunca cair nas garras daquela mulher problemática. Afinal, por que ele iria querer alguém como ela quando o pequeno Anjo entre eles parecia ter olhos apenas para o grande ceifador do submundo? E tal sentimento sendo, aparentemente, recíproco?  Qualquer um que possuísse olhos e ouvidos poderia muito bem dizer que aqueles dois rodavam entorno do arbusto enrolando para admitir logo a situação e pular para o próximo passo para acabar com toda a tensão sexual a qual compartilhavam.

Carl ainda viveria para ver esse momento, definitivamente!

Retornando ao assunto original e seguindo pelo pensamento de que Carl, com todas as fibras de seu ser, sentia antipatia pela prostituta barata não declarada de nome Betty, evitando-a a todo custo, ele ainda poderia tirar algum proveito em ter a infelicidade de topar-se com ela, mesmo estando, de certa forma, em sua área de serviço. Afinal, inimigos costumavam coletar informação uns dos outros para ter melhores estratégias de ataque, certo? Então, se Betty realmente passou a ver Frisk como uma inimiga a qual deveria lutar contra, fato novamente evidente para todos que possuíam olhos e ouvidos, com toda certeza deveria ter uma ou outra informação a qual Carl poderia não estar informado, por mais ínfima que fosse a chance. Valia a pena a tentativa, mesmo que não soubesse nada de novo sobre seu pequeno anjinho ainda poderia ter uma ou outra informação a usar contra a vadia.

Sorrateiramente, então, ele esgueirou-se até o andar de cima, tentando aparentar o mais despreocupado possível para não chamar a atenção até constatar a devida localização de Betty e seu grupinho no enorme salão do sexto andar. Contudo, mesmo que conseguisse vê-las, ainda estava longe de mais para ser capaz de ouvir sua conversar, sendo definitivamente necessário que se aproximasse de forma que não pudessem perceber sua presença. Todo aquele infernal grupo de mocreias, como gostava de chamar, sabia perfeitamente a quem ele era aliado. Nunca abririam a boca se soubessem que estava por perto.

Seria uma dica para qualquer um que estivesse interessado em colocar-se em um mundo onde qualquer erro, não apenas em um comentário, como em suas ações, poderia levá-lo a uma morte. Era uma dica que poderia ajudá-lo a sobreviver por mais um dia: nunca, em hipótese alguma, coloque todas as suas cartas na mesa. Ter segredos, esconder seu jogo, um pequeno às na manga, poderia salvar sua vida. Era um lei não dita, uma regra dos mais espertos. Mesmo Carl, tão tagarela da forma que era, possuía seu pequeno segredo sujo.

E tudo bem, ele tinha ouvidos treinados e aguçados para escutar conversas alheias, entretanto a verdadeira chave do seu sucesso em obtenção de fofocas estava no pequeno fato de que ele sempre poderia ser um ratinho presente na sala durante a conversa. E sim, era um poder bobo o qual não poderia ser usado para lutas, fraco de mais para ter qualquer tipo de variação a mais, um tanto covarde por só permitir fugas e possibilidades de se esconder, contudo, de forma criativa, poderia ser bem usado.

E ele sabia muito bem como usá-lo.

Encontrando um lugar discreto o suficiente ele tornou-se um pequeno rato de pelo amarronzado, nariz rosado ao igual suas pequenas patas e alongada calda. Um animal bem pequeno, discreto e relativamente rápido, fácil de se esconder e passar desapercebido por olhares desatentos, assim como poderia causar um escândalo se por um acaso fosse pego por olhos assustadiços.

Com toda agilidade que sua forma animal lhe permitia, Carl atravessou a sala, enfiando-se debaixo da poltrona na qual o pequeno grupo de cinco garotas encontravam-se sentadas a conversar. Seus ouvidos atentos sendo perfeitamente capazes, agora, de escutar tudo o que diziam.

— Não seja estúpida, Grate. - resmungou uma das garotas, seu tom visivelmente indicava descrença e deboche. Carl mal conseguiu ver quem era, precisando arriscar-se um pouco mais para fora de seu esconderijo para finalmente conseguir deslumbrar a enorme trança de longos e cheios cabelos negros, pele parda e pernas alongadas finas como um palito, quase não conseguindo diferenciar a canela da cocha. Era Odete. - Ele não consegue ficar um mês sem se envolver com alguém. Deve ter alguma garota que você não ouviu falar, tenho certeza.

— Não fale como se eu fosse idiota e não soubesse como fazer o meu trabalho. Eu confio em minhas fontes então tenha certeza que quando digo que ele não está com alguém a dois meses, por incrível que pareça para você, é verdade. - retrucou Grate, sua tatuagem de cobra enroscada pelo tornozelo exposto a tornando inconfundível mesmo com os diversos pares de pés que o pequeno espião era capaz de ver.

— Ele pode estar interessado em alguém. - propôs outra do grupo. Se Carl não estivesse enganado pelo pouco que conseguia ver da suposta garota, diria ser Alvida. Definitivamente ele não acreditava que mais ninguém fosse realmente capaz de usar sapatos tão chamativos como os que ela costumava usar. Colocar uma melancia sobre a cabeça talvez fosse menos chamativo do que eles.

— Sans? Interessado em alguém? Pff! Por favor! Estamos falando de Sans! Ele não tem mais interesses no sexo oposto do que simples sexo! Todo mundo sabe disso! - Odete novamente zombou. - O mundo acabaria quando ele decidir estar com alguém de verdade. A maior parte das garotas que tem interesse nele sabe muito bem que devem apenas esperar serem mais uma na cama e pronto.

— Insinua que é impossível para mim conseguir tal façanha? - Betty finalmente se intrometeu na conversa , desafiante.

— Por mais respeito que tenha por você, Betty, deve admitir que você é uma das que ele mais evita. A novata, secretária de Diana, o anjinho da nossa gangue, tem mais chance com ele do que você. - oh! E como Carl queria concordar com tal afirmação em voz alta, por mais que se sentisse enjoado em ter algum pensamento semelhante com qualquer uma daquele grupo. Sans poderia ser muito bem do tipo de cara que não conseguia manter-se quieto em apenas uma, mas ele ainda era seletivo o suficiente para, pelo menos, saber qual tipo de garota iria escolher para compartilhar a cama. E, infelizmente para Betty, ela não era seu tipo. Entretanto, colocar Frisk no meio da conversa poderia não ter sido uma grande ideia.

— Não fale sobre aquela vadiazinha perto de mim! Já fico agradecido de não ter que ver aquele falso rostinho inocente por hoje! - sibilou Betty, a perna que mantinha-se cruzada sobre a outra desceu ao chão com força suficiente para quebrar o salto. Carl deveria admitir que a resistência daquele sapato era louvável. - Todos ficam babando nela como se fosse grande coisa! É apenas uma garotinha estúpida que teve a sorte de nascer com um rostinho bonito! Fica se achando toda só porque tem todos na palma de sua mão, sempre com aquelas gracinhas pra cima do meu Sansy! Ela vai ver... Vou mostrar para todos o que realmente tem por trás desse jeito bonzinho dela e jogá-la para baixo como ela merece!

— Sinto muito cortar suas esperanças, mas me vejo obrigada a dizer, Betty, que você não tem força alguma para derrubar essa garota agora.

— Está do lado dela agora, Tiff?! - Carl bufou, por mais estranho que isso pudesse parecer em sua forma animal. Tifane era a mais esperta daquele grupo, se ela estava falando não era simplesmente por apoio ou não. Ela tinha provas, ela avaliava o que sabia e pesava em uma balança de possibilidades. De todas era a que Carl menos tinha antipatia e até hoje não sabia o motivo de ter se enfiado naquele grupo. O melhor que Odete poderia fazer para si mesma era calar a boca e escutar.

— Não me entenda errado, Odete. Eu não estou do lado de ninguém e diferente de vocês não tenho qualquer rancor contra essa garota, apenas estou dizendo fatos. Vocês querendo ou não ela soube bem como entrar aqui e fazer as amizades certas, para não dizer que, ao invés de ficar fugindo do trabalho ela faz o dela perfeitamente e otimizou muito do que antes já tínhamos. Tanto que Diana a colocou como seu braço direito, o que obrigatoriamente a faz hierarquicamente mais importante do que você, Betty. - Carl conseguiu ouvir o grunhido vindo de Betty, assim como o bufo desdenhoso e irritado de Odete. Ainda assim Tiff ignorou e continuou. - Sem contar com isso ela é a favorita de quase todos os nossos contatos, sejam aliados ou comerciantes. Acreditem quando digo que virou uma moeda de negociação colocá-la como a principal entregadora para eles. Ela mesma foi o motivo de termos ampliado nosso mercado depois de ter feito um acordo com a irmã para evitar uma guerra por conta da quebra do suposto acordo com o nosso chefe. É quase como se fossemos aliados agora, ou seja, ambas tiveram o privilégio de começar a intercambiar recursos.

— Tudo bem, ela melhorou esse lado, mas e daí?! - bufou Odete mais uma vez.

— Se você ainda não se tocou de onde vem o dinheiro que você ganha aqui então deixe-me te explicar melhor: Cada comerciante que temos, cada aliado, paga não apenas pela distribuição do produto como também pela proteção. O luxo que temos agora deriva de nosso comercio e nosso território. E se apenas isso não for o suficiente para você posso dizer outro simples detalhe que impede qualquer uma de vocês derrubá-la: Informações. O principal para se ganhar vantagem sobre um inimigo são as informações que você tem sobre ele, Grate não me deixará mentir sobre isso! Quanto mais se sabe, mais chances você tem. O problema é que, o que deu a entender, é que Anjo tem conhecimento sobre a Rainha de Copas e The Reaper fora de suas vidas aqui. Eles se conhecem e a própria existência da garota é uma ligação para eles, por isso, mesmo pessoas de dentro vão encontrar impossível saber qualquer coisa sobre ela, tudo será cortado pela raiz e definitivamente ninguém quer se meter com esses dois. Em seguida vem o pequeno fato de que ela, sem pedir ou procurar, é informada de tudo sobre cada membro. Eles confiam nela de uma forma que nunca vão confiar em mais ninguém e pelo fato de nunca ter ouvido nenhum informação vazar dela, sei bem o motivo deles. Ela é um baú de segredos o qual todos vão proteger, se não pelos próprios segredos é pela confiança e credibilidade que tem nela. Querendo ou não, ela está além do alcance de qualquer uma de nós, para não dizer de mais contatos. Se quer derrubá-la terá que ter alguém acima dela para ajudar.

— Oh, mas eu tenho alguém. - Betty cantarolou divertida, tom muito mais suave do que havia começado. O suficiente para chamar a atenção não apenas das garotas ali, como também do próprio Carl que já começava a acreditar que não obteria nada de útil daquela conversa. - Não sou apenas eu que quero que ela saia da jogada. Essa pessoa tem uma hierarquia maior do que a dela e foi ela própria que cavou sua cova com ele.

— Você não pode estar falando de... - Alvida começou, incerta.

— Ele mesmo. Ralph está pensando em um jeito de derrubá-la sem tocar nos interesses de ninguém. Eu simplesmente tenho como aliado o segundo no comando de nossa gangue.

E Carl deveria agradecê-la por ter deixado essa informação escapar tão fácil. Pobre Betty, não sabia que mesmo dentro da sede as paredes poderiam ter ouvidos e que alguns segredos deveriam ser deixados bem guardados.

Esgueirando-se para longe das garotas, ainda em sua forma de rato, Carl direcionou-se para onde sabia que Ralph ficava quando Sans não estava por perto para vigiá-lo. Ralph, como segundo no comando, tinha normalmente como obrigação lidar com os trabalhos equivalentes aos de Sans quando o próprio albino não estava por perto para resolvê-los, contudo, era bem comum que Ralph negligenciasse tal atividade deixando ainda mais trabalho para o pobre chefe.

Se Carl ainda estivesse bem informado então ele tinha quase certeza que Ralph estaria em uma sala do quinto andar, jogando cartas com alguns de seus aliados. Ele próprio já tinha dado uma espiada na sala de vez em quando, sempre abastecida com bebidas e drogas mágicas, o próprio ar era pesado e sufocante, Carl o odiava. O fazia recordar-se dos bordeis os quais mantinha seu posto quando era mais novo, antes de entrar na gangue. Lugares sujos e sem qualquer tipo de credibilidade onde uma massa de pessoas de todos os tipos e classes uniam-se simplesmente para quebrar as regras da sociedade e fazer seus desejos mais vis.

Carl odiava esses lugares.

Ele adentrou por uma pequena fissura maior entre a maneira da porta e a parede encontrando-se dentro do quarto escuro, com uma simples e quase falida luz sobre uma mesa redonda a qual encontrava-se seis homens sentados, cada um de uma idade diferente, todos com cartas em suas mãos, cigarros na boca e bebidas ao seu lado da mesa. Deveria ser o mais próximo de "paraíso masculino" que aqueles caras conseguiriam chegar, na opinião humilde de Carl. Ele agradecia imensamente por não fazer parte desse meio.

— Tem que fazer alguma coisa Ralph, ele está quase arrumando uma maneira de nos desmascarar. - um dos homens resmungou enquanto calmamente pegava uma das cartas sobre a mesa. Carl nem ao menos precisou se esconder, tendo a certeza que a sala estava escura o suficiente para ninguém conseguir vê-lo. - Espero que tenha um plano.

— Pare de reclamar, Marshall. Ele não tem provas e sem provas não pode fazer nada contra nós. - Ralph respondeu de mau humor, apesar de seu rosto despreocupado a encarar as cartas em sua mão com desinteresse. - Enquanto ele não tiver a garantia certa que pode se livrar de nós, não vai dar passo algum. Ele sabe o que tem a perder.

— Por mais que concorde com você, Ralph, ainda é arriscado. Sans sempre foi um garoto esperto, esconde muito mais do que podemos realmente imaginar. Precisamos derrubá-lo do poder antes que consiga mais, já basta aquela garotinha dando ainda mais credibilidade a ele. - resmungou outro dos homens, mais velhos, charuto cubado em seus lábios, tapa-olho sobre o olho esquerdo ainda sendo possível ver as cicatrizes que provavelmente atravessavam-lhe desde a testa até próximo ao lábio. Nunca souberam seu nome, cada vez aparecia com um diferente, por isso as pessoas passaram a chamá-lo unicamente de Ciclope. exatamente por sua falta de um dos olhos.

— Era exatamente ela que eu queria usar para tirar Sans de seu trono. - a atenção voltou-se para Ralph que, com um sorriso malicioso nos lábios, puxou uma das cartas do baralho, sorrindo travesso com o que tinha em suas mãos. Ou ele estava ganhando ou Carl poderia deixar-se preocupar com sua ideia. - Um anjo e um ceifeiro, o quão irônico isso poderia ser? Seria tão divertido se os dois se enfrentassem...

— Você enlouqueceu de vez, Ralph. A erva que você fumou agora tava estragada por acaso?

— Ainda não cheguei nesse ponto, mas é um bom plano, não acham? Sans pode negar o quanto quiser, mas é evidente para todos que alguma coisa rola entre os dois e a forma como a garota o defende apenas prova tudo. Seria muito divertido se, de alguma forma, conseguisse colocá-la contra Sans. Eu tenho certeza, ele não seria capaz de fazer nada contra, aquele cara é um idiota quando se trata ir contra pessoas que ele valoriza. - o sorriso do moreno tornou-se doentio, olhos sonhadores enquanto abaixava as cartas, todos a escutá-lo. - Claro, eu ainda estou pensando nisso. Esse anjinho poderia ser realmente perfeito se fosse menos desbocada e independente e mais submissa e quieta como mulheres realmente deveriam ser. Ela é o tipo de garota que mais odeio, ainda assim tem seu charme, talvez dê pra concertar.

Tudo bem, Carl já tinha informação de mais, ele poderia ir. Não era como se também Ralph realmente fosse capaz de tal façanha, ele não conhecia Frisk, talvez tivesse conhecimento do tamanho da antipatia que tinha contra ele, mas não sua forte teimosia e sua louvável capacidade de se manter integra e leal apesar dos acontecimentos. Ainda assim existiam magias capazes de tudo e Carl estava começando a ter medo do que a mente doentia a qual Ralph havia se mostrado ter poderia pensar.

Agora que todos os inimigos tinham sido checados, pelo menos os principais, deveria dar um pulo nos amigos. Afinal, apesar das informações terem sido interessantes não era o que originalmente havia vindo buscar. Ainda não sabia nada sobre Frisk, sobre sua vida fora da gangue, quem realmente era e o que fazia. Carl estava ainda mais curioso e , por tal, encontrou-se no primeiro andar novamente em sua forma humana direcionando-se para um pequeno grupo que conversava na parte da recepção.

— Ei, Carl! Você não estava de folga hoje? - Anabelle acenou, sorriso malicioso desenhado em seu rosto enquanto o observava se aproximar. - Já sei! Veio ver o Jeff, certo? Olha cara, sei que vocês dois tem um rolo e tudo, mas vão com calma. Ele já é seu chefe, vão começar a achar que está procurando favorecimento.

— Minha vida romântica não está em pauta! Pare de tentar saber alguma coisa! - Carl reclamou, rubro de vergonha. Jefrey era conhecido também como Olheiro, o responsável pelos informantes da gangue. Para deixar bastante simples, por muito tempo Carl viu-se interessado no homem de pelo menos três anos mais velho do que ele, sondando-o para ter certeza de suas preferências e saber que o caminho estava livre. Foi apenas durante dezembro do ano anterior que ele conseguiu receber alguma indicação de que seu interesse tinha volta e que poderia tentar avançar um pouco mais. Agora? Bem, agora ele já encontrava-se em um ponto onde não sabia mais se estava caminhando para um relacionamento sério ou se manteriam abertos para novas oportunidades aparentes.

Uma coisa era certa, Carl não tinha olhado para mais ninguém depois que começaram. Isso talvez apenas mostrava, não apenas para si mesmo, como para outros, que por sua conta, seria sério.

— Então por que pede tanto a de Anjo? - perguntou Bill com diversão, discretamente entrelaçando seus dedos com os de Anabelle.

— Porque ela eu posso e tenho todo o direito, mas vocês não tem. - o rapaz empinou o nariz, braços cruzados e sorriso zombeteiro em seu rosto, colocando-se como vitorioso e seu argumento fosse irrefutável. Os outros realmente não se importavam, divertiam-se com a cara de seu amigo, entrando em um consenso silencioso que não iria continuar a provocá-lo. - Mas essa não é a questão, estou aqui em uma missão especial!

— Missão especial? - Anabelle ergueu uma sobrancelha, em uma mistura de confusão e interesse.

— É! Uma missão sobre nosso pequeno anjo. - a resposta apenas trouxe ainda mais interesse sobre o assunto. Afinal, por que Carl estaria a procura de informações sobre Frisk? - Vocês nunca chegaram a reparar que ninguém tem o interesse sobre a vida dela fora daqui? Quero dizer, todos temos nossos segredos, mas pelo menos fazemos outros curiosos sobre eles. Com o Anjo não é assim, ninguém teve a curiosidade de saber de onde veio ou quem é, apenas aceitamos o que vemos e pronto. Por isso estou a procura de informações sobre ela!

— Não seria mais fácil perguntar a ela? - Thomas questionou recebendo como resposta o amuar infantil de Carl. Por que todos continuavam a perguntá-lo isso? Ninguém entendia que a graça estava em justamente procurar as informações com suas próprias mãos? Pesquisar e viajar por todos os passos da pessoa até ter tudo o que podia sobre ela?

— Vamos! Vocês devem saber alguma coisa! Diana não tinha nada mais do que eu já sabia! Não é possível que nunca tenham perguntado nada para ela! Como, onde vive, o que quer fazer da vida, por que veio entrar em nossa gangue...

— Ela me disse que era por alguém. - Anabelle interrompeu, a informação caindo em sua mente assim que Carl havia começado a mencionar a pergunta. Isso, contudo, chamou a atenção dos outros. - Estávamos conversando algumas semanas atrás quando o assunto caiu nos nossos motivos de estar aqui. Ela não me disse mais nada além de que era por alguém, eu também não insisti. Ela parecia triste, pensei que seria melhor deixar de lado.

— Alguma possível paixão? - teorizou Bill, olhos caindo da bela mulher a seu lado a qual deu de ombros.

— Parecia ser importante. Enquanto falava ela mexeu com um colar que tinha no pescoço, eu não o teria reparado se ela não tivesse mexido nele, está bem escondido debaixo do cachecol que sempre usa.

— Não! Meu lindo anjinho! Apaixonado por outro! Sinto meu coração se partir em milhões de pedaços! - Thomas exclamou, apoiando-se dramaticamente no balcão da recepção enquanto levava uma mão ao coração, apertando sua camisa com força.

— Você nunca teve uma chance, Thomas. E eu me recuso a aceitar que meu anjinho, amor da minha vida, tem olhos para mais alguém além de nosso chefinho! - o informante bateu o punho sobre o balcão, indignado. Como uma criança ele cruzou os braços, beicinho nos lábios e cenho franzido profundamente. - Vocês veem também, não é? A forma como se olham, a maneira como se tratam, se provocam... É uma tensão sexual tão grande que sinto como se vai explodir a qualquer momento! Deveriam ser ditos como o casal do ano, não, do século! Dizer que tem mais alguém é... é... Impossível! Me recuso! Totalmente me recuso a acreditar nisso!

— Continue dizendo coisas assim em voz alta e as pessoas vão acabar tomando como verdade.

Thomas saltou quase para cima do balcão da recepção, Anabelle ficou tão branca quanto um papel, uma mão levada ao coração enquanto tentava regular a respiração, Bill havia saltado para trás, tropeçando em sua cadeira e indo para o chão de uma só vez, já Carl soltou o maior grito que sua garganta poderia dar em cinco segundos, abraçando-se a Anabelle tão forte que a pobre moça, mesmo com seus próprios problemas em controlar os efeitos naturais de seu corpo pelo susto, viu-se com os ossos amassadas no abraço assustado.

Atrás de onde Carl anteriormente estava encontrava-se Sans, em pé como se sempre estivesse estado lá, sorriso zombeteiro nos lábios a divertir-se com os rostos de cada membro do pequeno grupo. Ele adorava essas reações das pessoas quando fazia isso.

— Sans! Não faça algo assim! Quase nos mata do coração! - Anabelle reclamou, livrando-se dos braços apertados de Carl que relaxou consideravelmente depois de perceber que se tratava apenas de Sans. Lentamente as cores voltavam para seu rosto, respiração voltando a seu ritmo normal juntamente aos batimentos de seu coração os quais sentia na palma de sua mão e nas costelas. - Quando foi que chegou?

— Não há muito tempo. Tinha acabo de entrar quando vi vocês conversando essas besteiras. Quando vai parar de insistir tanto em colocar eu e Frisk juntos, Carl?

— Não pode me culpar chefinho. São vocês dois que ficam o tempo todo se insinuando para o outro com esse "vai, não vai" e vocês sabem como sou um amante de romance. Eu estou quase pirando com essa tensão, então nem quero saber como não se jogaram um no outro e se comeram na frente de todo mundo. E não me olhe com essa cara que qualquer um pode ver que é verdade! - o albino suspirou, exasperado. Não como se ele realmente pudesse negar tal afirmação, nem ao menos ele sabia como tinha conseguido manter seu controle e por mais que sua vontade apenas aumentasse ele não conseguia tirar de sua cabeça aquela infernal garota. E mesmo que realmente quisesse se despejar seu corpo parecia se recusar a ter interesse em qualquer outra mais, isso o estava frustrando. - Oh, aproveitando que esta aqui chefinho, tem alguma ideia sobre a vida que nosso pequeno anjo leva fora daqui?

— E por que esse súbito interesse na vida pessoal de Frisk? - o rapaz desconfiou, olhos a encarar com atenção cada um no pequeno grupo. Carl era o único com um enorme sorriso despreocupado, não reparando realmente a mudança na atmosfera.

— Eu reparei hoje que não sabia nada sobre minha pequena companheira e isso me incomoda. Por isso estou em uma missão pessoal em busca de novas informações sobre ela.

— E por que não pergunta para ela? - foi como tocar em um interruptor. O sorriso de Carl logo caiu e seu rosto tornou-se tristonho, jogando-se dramaticamente em lamentos sobre a bancada.

— Ninguém entende a beleza de descobertas sobre seus próprios méritos! Oh! Que mundo terrível! Sou tão incompreendido, sozinho em meus pensamentos e prazeres! - Sans rolou os olhos em suas orbitas, sem conseguir evitar o sorriso que desenhou-se em seu rosto ao observar as lamurias de Carl o qual agora era consolado por leves tapinhas sarcásticos em seus ombros, dados por Anabelle, a qual mantinha-se a repetir-se "pronto, pronto", em diversão. Todos eram loucos, tão loucos... E apesar da imagem que transpareciam ali, Sans sabia perfeitamente que cada um daqueles sorrisos escondia o assassino por trás, assim como ele.

Sans sempre foi tão desconfiado, sempre viu o pior das pessoas desde que sua mãe havia morrido, ele nunca pensou que mesmo em um lugar tão sujo existiam aqueles que poderiam mostrar um sorriso sincero, fidelidade ou se quer todo o carinho que agora via todos esses pequenos grupos demonstrando para com uma garotinha de apenas dezessete anos a qual recusava-se a ser igual a eles. Ela não sujou suas mãos, ela ergueu-as para aquelas pessoas, deu-as a sinceridade, bondade e gentileza sem temer o que elas poderia fazer. Ele nunca imaginaria que bastaria isso para receber igual tratamento. E talvez nenhuma daquelas pessoas realmente tivessem mostrado aquele lado tão... Normal, deles.

Foi tão estranho e ainda assim tão agradável.

— Tudo bem, Carl. Eu devo saber uma ou outra informação que vocês não saibam sobre ela. - o rapaz saltou de sua tristeza assim que as palavras foram ditas, olhos brilhando em ansiedade e empolgação, como uma criança no natal, prestes a poder abrir seus presentes debaixo da árvore iluminada. - Sabe Mettaton?

— Como não?! Eu o acompanho desde que ainda estava em apenas vídeos na internet! Sou um grande fã e admirador! - Carl respondeu com animação, sendo perfeitamente possível notar a admiração em seu rosto. Sans conseguia reconhecer bem aquele ar de fã o qual Carl desprendia naquele momento, sendo demasiadamente parecido com Papyrus. Quantas vezes tinha visto seu irmão saltar de um lado pra o outro a tagarelar palavras de cheias de admiração, respeito e encanto?

— Bem... Pelo que sei, Frisk é uma de suas amigas mais intimas. Se me recordo bem ele já a chamou para fazer parte de seu programa, aparentemente é doido com ela.

— Mentira! - e Carl encontrava-se em um estado irrecuperável de emoção. E pensar que todo esse tempo teve ao seu lado a pessoa que poderia lhe apresentar seu ídolo! Quando encontrava-se no fundo do posso, expulso de sua casa e a trabalhar bem próximo do que poderia ser chamado de escrevo sexual apenas para arrumar dinheiro para comer, uma das poucas coisas que chegou a realmente animá-lo eram os shows que conseguia ver em suas raras oportunidades de ter um aparelho de vídeo por perto que o conseguiam animar de alguma forma, arrancá-lo para fora de sua cruel realidade para uma boa imaginação recheada de alegrias.

— Ele não deveria morar fora da cidade? Quero dizer, é uma estrela da televisão jovem. O mais normal é que estivesse em algum lugar em Hollywood ou Nova York, não sei. - Anabelle interferiu, tão surpresa quanto Carl. Quem era Frisk na verdade para conhecer tal pessoa?

Sans, por sua vez, deu de ombros.

— Ele não quer deixar Ebott. É verdade que faz muitas viagens ele sempre volta para cá e manter a moradia de seus pais como sua.

— Como sabe disso tudo? Não te vejo com cara de quem seria um fã alucinado de um cara como esse. - Bill comentou surpreso.

— Eu apenas conheço alguém que o conhece e me deu a informação, nada de mais. - e não era como se Sans fosse falar de Alphys, ela já tinha dores de cabeça o suficiente e demasiadas distrações pessoas de seu trabalho para ter mais essa. Isso para não dizer de seu irmão que, apesar de não ter sido anunciado publicamente como o namorado da "grande estrale, ícone jovem", para o grande alívio de Sans, ainda poderia entrar como alvo se a informação escapasse. Mettaton tinha recursos para se defender, Alphys e Pap não.

— Quando Anjo voltar, tenho que falar com ela sobre isso! - e talvez ele levaria uma boa bronca de Frisk por tê-la colocado entre um fã alucinado como Carl e seu ídolo.

— Mas hoje não deveria ser dia dela tirar folga, ela já teve um dia livre anteontem. - Thomas questionou, seus olhos abertos em surpresa. Sua ideia era de subir para vê-la ainda aquela tarde, no dia anterior não teve tempo e estava esperançoso de poder saciar suas vontades de vê-la mais uma vez.

— Ela me pediu ontem para liberá-la hoje também. Problemas de família. - não muito animadores, Sans deveria admitir. Frisk era uma pessoa que facilmente trabalharia até depois de seu expediente, dar-lhe o tempo que precisava para resolver seus problemas era o mínimo que poderia fazer até mesmo como compensação por ter mantido seu segredo de Gaster e Papyrus.

— Mas a família dela parece ser um amor, apesar da Rainha de Copas. Pelo menos da maneira como Anjo gosta de falar às vezes. Como poderiam ter algum problema que a fizesse se ausentar. - Anabelle tinha razão, Frisk tinha família que a amava incondicionalmente, era quase como pensar em problemas no paraíso.

— Família biológica. - o albino resmungou em desgosto, cenho franzindo-se profundamente em uma cara amarga.

— Conhece a família biológica dela, chefinho?

— Infelizmente sim e se eu fosse vocês não perguntavam. Existem coisas que as pessoas não querem se recordar. - e assim ele se foi, deixando todos com a duvida em suas mentes, perguntando-se o que exatamente alguém como Frisk poderia não querer se recordar. Alguém com tal sorriso e tal carisma poderia realmente ter algo de ruim que não gostaria de se lembrar?

Carl continuou em sua busca por novas informações, porém. Ele não tinha conseguido o suficiente ainda e estava corroendo-se por mais, ele sentia que, por mais que Frisk fosse uma garota de aspecto tão normal quanto o possível, existiam fatos os quais definitivamente a tornavam especial, não apenas em sua personalidade, mas em sua história. Então ele decidiu ir mais profundo, talvez encontrando-se com pessoas as quais deveriam ter mais contato com ela em momentos não profissionais.

Enquanto ela encontrava-se na gangue, era de se esperar que limitasse a quantidade de informações que iria deixar escapar, mas fora dela, com pessoas as quais participava de uma troca de informações pessoais constantes, definitivamente ele encontraria alguma coisa. Por isso ele foi inicialmente para Muffet.

Carl já havia escuto Frisk comentar muito sobre tal lugar, aparentemente era uma conhecida da dona e gostava de ajudar em sua arrecadação para a família. Um simples loja de doce a qual, também, tinha um negócio as obscuras com eles, informação a qual Carl deveria garantir em manter em segredo. A questão era que Muffet foi um lugar que Frisk gostou de frequentar antes de entrar na gangue, então provavelmente, em sua lógica, conseguiria ter mais informações do que em outros lugares.

— Frisk? Claro que sei quem é, fufufuf. Uma de minhas melhores clientes! - a dona havia exclamado, apoiando-se sobre o balcão com um sorriso divertido em seu rosto enquanto seus profundos olhos escuros encaravam-no com bastante atenção. Carl não tinha certeza se ela estava brincando com ele ou não, mas estaria atento para qualquer tonalidade de sua voz que pudesse indicar uma possível mentira. - Um doce de menina com seus dois animados amigos da escola. Ouvi dizer de um deles que está tendo problemas ultimamente, além dos típicos valentões da escola que insistem em incomodá-los. Sabia que ela era uma garota bem reservada até poucos meses atrás? Antes de setembro do ano passado ela apenas se comunicava com linguagem de sinais e nunca até então foi possível ver seus olhos, sempre escondendo-os por trás dos cílios enormes. Nem mesmo seus pais sabiam o motivo, ela não gostava de falar Seu rostinho tornava-se tão triste...

Carl foi capaz de conseguir boas informações da mulher. Aparentemente, apesar de todo seu carisma, Frisk não era uma garota muito popular sendo que o fato de não querer utilizar de sua voz aparentemente não tendo contribuído em muito tal fato. Agora, pelo que tinha entendido, as coisas tinham começado a mudar, mesmo com os problemas constantes com um pequeno grupo de arruaceiros da escola que insistia em atormentar os dois amigos da garota. Muffet também comentou quem eram, dois rapaz de personalidades opostas, Napstablook e Tinn.

Contudo, Carl ainda sentia que não era o suficiente. Sim Frisk tinha uma boa vida apesar de seus problemas na escola, os quais aparentemente tinha um bom controle e costumava relevar, ainda assim ele supunha que não era tudo. Uma boa garota, com boas notas, bons relacionamentos, de vida simples e normal, gentil e quieta, mesmo que com o estranho detalhe de ter escondido seus belos olhos e sua calma voz durante tanto tempo e do inesperado conhecimento de que ela conhecia a linguagem dos sinais, ele ainda sentia que faltava alguma coisa por trás de toda essa história.

Afinal, as palavras de Sans ainda não escapavam-lhe da mente.

Então ele foi ao Grillbys, um lugar em que ela não apenas começou a frequentar de forma constante como também a fazer demasiadas entregas. Aparentemente ela tinha ficado amiga da filha do dono, Fuku, a qual também tinha sido indicada pela própria morena para ser a babá do bebê de Diana. Talvez eles soubessem de alguma coisa.

— Frisk? Uma garota tranquila e sociável, nada mais. Por que tanto que saber sobre ela? - o ruivo barman, também dono do bar, Grillby, havia lhe perguntado depois de entrar na questão, uma sobrancelha erguida em desconfiança.

— Apenas sou um amigo que quer saber mais sobre ela. - Carl argumentou em resposta, pequeno sorriso travesso em seu rosto, contudo, Grillby não parecia tão convencido.

— Você é tão desconfiado quanto primo Sans, pai, pelo menos quando se trata de Frisk. Tenho certeza que pegou essa paranoia dele. - comentou em diversão uma bela garota de cabelos esverdeados, um pouco mais velha do que Frisk provavelmente. Ela sentou-se ao lado de Carl com um enorme sorriso e lhe estendeu a mão. - Você deve ser o Carl, certo? Frisk me falou tanto de você que tenho quase certeza que te conheço. Meu nome é Fuku, e esse desconfiado entregando bebidas é meu pai, Grillby.

— É um prazer.

— Então, o que quer saber sobre ela?

E assim os dois trocaram ideias. Carl percebeu que a garota tinha uma boa conversa, mesmo com sua aparência rebelde era gentil e recatada, muito tímida para determinados assuntos e esperta para outros. Toda uma peça. Carl gostou dela.

Ele descobriu que Frisk tinha a intenção de entrar na faculdade para cursar direito, Fuku afirmou que ela tinha um interesse em cargos políticos perto da confecção das leis, onde poderia tentar melhorar a situação dos usuários de magia que continuavam a ser oprimidos em Ebott. Comentou que apesar de morar na parte nobre da cidade ela não fazia distinção entre as pessoas com quem conversava.

Ela também lhe contou como era a relação de Sans e Frisk ali.

Aparentemente Sans também era um cliente assíduo do lugar, muitas vezes sendo visto ao lado de Frisk quando ela também estava ali, conversando com animo leve, divertindo-se como pessoas normais, grandes amigos ou um casal. Ninguém realmente seria capaz de dizer que era o mesmo cliente problemático o qual irritava-se sempre que alguém fazia questão de insultar alguma das situações relacionadas a ele ou quem gostava. Carl estava mais do que satisfeito em escutar, sempre disposto a saber mais sobre seu possível e quase óbvio casal favorito.

Ele também contou a ela como Frisk era dentro da gangue. Suas relações e a forma como quase todos pareciam se encantar com seu jeito meigo de ser. Era impressionante como ela poderia atraí-los para serem amigos confiáveis. Eles, os mais improváveis a serem qualquer coisa semelhante ou próxima a amigos, tinham sido completamente domados por uma garotinha de dezessete anos que recusava-se a levantar um dedo para se defender, mas jogava-se na frente de qualquer briga para ajudar aqueles de quem gostava.

Quando terminou o entardecer começava, o céu encontrava-se pintando de uma mistura de laranja, amarelo, vermelho e lilás, salpicado pelo branco e fofo das nuvens que ainda mantinham-se firmes no céu.

Carl sentiu-se um tanto desanimado, apesar de toda a informação que conseguiu reunir existiam pontos que faltavam, detalhes os quais não compreendia. Parecia que ninguém conhecia os pais biológicos de Frisk, mesmo que eles aparentemente fossem o centro de seu problema, ela sempre foi descrita como a garota alegre e sociável com ares cansados, a gentil e doce Frisk, contudo, seria apenas isso? Ela poderia ser apenas uma garota normal de qualquer cotidiano?

Com um suspiro derrotado ele perambulou pela cidade, simplesmente tentando colocar todos os seus pensamentos no lugar para encontrar uma resposta, talvez uma aceitação. E talvez tivesse simplesmente se distraído de mais, focando-se mais em seus pés do que realmente no caminho o qual seguia, deparando-se por fim perto ao fórum judiciário da cidade. Não era como se fosse estranho, apenas incomum. Pessoas como ele apenas chegavam perto de lugares como esse quando finalmente deparavam-se retidos pela polícia.

Contudo, o que realmente lhe chamou a atenção para o lugar foi a voz familiar que o fez saltar para o primeiro lugar que encontrou para se esconder, observando surpreso a figura pequena a chutar, furiosa, um pobre pedaço de pedra em uma lata de lixo próxima, resmungando qualquer coisa por sobre sua respiração. Definitivamente, de todos os lugares, esse era o ultimo que esperou encontrar-se com Frisk.

E ainda que tivesse cogitado a ideia de se aproximar para perguntar o que estava acontecendo, seus pensamentos foram logo cortados pelo som de passos pesados a se aproximar, voz demasiadamente conhecida chamando pela garota a qual deteve seu momento de desistisse. E Carl observou, surpreso e preocupado, como Undyne, a chefe da polícia e maior problema de todos os membros de gangue nas periferias, a mulher mais assustadora que já tinha chegado a conhecer alguma vez, aproximou-se com pressa da pequena morena.

E tudo e mais um pouco passou pela cabeça de Carl naquele momento. Desde a ideia de que Frisk poderia ter sido pega por Undyne quanto ela já estar sendo escoltada para prisão. Seu coração louco dentro de seu peito enquanto procurava de alguma forma pensar em um plano que pudesse seguir, duvidando se interferia ou se avisava alguém. Ele nunca foi muito bom em tomar decisões em meio ao momento de pressão e agora mais do que nunca ele precisava pensar em alguma coisa! Se Frisk realmente estivesse com problemas com Undyne, Sans o mataria se soubesse que tinha visto tudo e não fez nada! Ele próprio não se perdoaria se deixasse sua amiga tendo problemas bem na sua frente.

Quando ergueu novamente os olhos para a situação, sentiu-se um pouco confuso ao perceber que Undyne voltava, normalmente, para dentro do prédio enquanto Frisk mantinha-se a encarar o céu por um tempo, ombros caídos e deprimidos.  E, finalmente, com um respirar profundo, soltando-o em um longo suspiro, ela deu meia volta sobre seus calcanhares, voltando-se para dentro do edifício também.

Se ela realmente estivesse em problemas por que ao invés de fugir ela entraria no mesmo lugar em que estaria a oficial?

Decidido em descobrir o que estava acontecendo Carl esgueirou-se para perto, transformando-se novamente em um rato antes de rastejar por debaixo da porta e percorrer o extenso corredor cinzento a procura da garota a qual decidiu seguir. Ele pensou ter visto sua silhueta seguindo para a esquerda, então para lá foi, seguindo o corredor o mais próximo da parede possível, para se tivesse que se esconder suas perninhas não o atrapalhassem e assim não fosse visto.

Ao virar a esquina ele deparou-se com a visão de sua amiga novamente, dessa vez com as costas contra a parede com um rapaz moreno a sua frente, corpo tentando ser pressionado contra o dela de forma agressiva, insistente, apesar de suas tentativas frustradas de tentar mantê-lo longe com suas mãos transformadas em punhos. Carl conseguiu ver um pouco de seu rosto, contorcido em uma careta em uma mistura de desgosto e fúria, procurando mantê-lo o mais distante possível ao do rapaz que tentava continuar a se aproximar.

Carl pensou novamente em interferir, notando que Frisk não se sentia agradável com aquele rapaz, contudo, antes que pudesse se mover a garota conseguiu se safar com uma mordida na mão do rapaz, a qual colocou-a tão perto de seu rosto, para em seguida empurrá-lo.

— Puta desgraçada! Quer mesmo que eu deixe seu segredinho escapar? - o rapaz ameaçou, sacolejando a mão tentando fazer a dor passar. Frisk franziu ainda mais o cenho, se é que era anatomicamente possível. - Deveria ser mais cooperativa se realmente não quer que seus pais e a impressa inteira saiba que a linda filha mais nova, queridinha do casal Dreemur, é na verdade uma prostituta de gangue. Nem deveria estar se incomodando tanto, nada disso deveria ser diferente do que já está acostumada. Afinal, com um rostinho e corpinho tão bonito não me admira que foi fácil para entrar.

— Não vai ganhar nada me ameaçando. Você não tem prova alguma além da suas palavras, declarações sem cabimentos ou lógica. - contrapôs Frisk, pose altiva enquanto argumentava, pequeno sorriso a surgir no seu rosto. - Você coloca na mídia tudo isso e vou desmentir, colocando exatamente o que sua família pretende com todo esse estardalhaço, não apenas desmascarando a falcatrua de família perfeita de vocês, como revelando quem você é.

— E quais provas tem? Vamos maninha, você sabe que ao igual que eu você só tem suas palavras. - o sorriso de escárnio apenas tornou ainda mais provocativo o argumento, contudo, Frisk não deu para trás, pelo contrário, um enorme sorriso se desenhou em seu rosto, fazendo o de seu companheiro desaparecer.

— Será mesmo que não tenho provas algumas? - despreocupadamente ela colocou uma gravação em seu celular para tocar, aumentando o volume para que o rapaz pudesse escutar.

"E o que vamos fazer com a garota depois? Não quero sustentá-la depois de todo o trabalho que tivemos para arrancar dinheiro dos Dreemurs, já basta nosso filho e o advogado que tivemos que contratar para o trabalho." a voz no gravador era visivelmente de uma mulher, aparentemente conhecida pela cara que o rapaz colocou ao escutá-la.

"Vendê-la! O que mais?! Viu como ela está?! Podemos abusar dela durante alguns dias e depois entregá-la para algum mercado negro qualquer da cidade, tem muitas ligações aqui com países latinos tenho certeza que alguém pode ser capaz. Daria uma bela puta, não daria?" dessa vez a voz era de um homem, grossa e firme. Suas simples palavras fizeram Carl estremecer, relembrando o pouco que sabia sobre o mercado humano, o mais vil de todos os mercados que conseguiam acontecer por trás dos panos de sua sociedade. Ele fazia questão de não saber mais do que sua existência e seus métodos de comercio, sentia-se enjoado apenas recordar-se de que sabia.

— Onde conseguiu isso?! - o rapaz esbravejou, em uma mistura de vermelho, verde e branco. Seu rosto parecia não querer ficar em apenas uma cor.

— Você deveria ensinar para seus pais que paredes tem ouvidos e eles não deveriam discutir coisas assim tão altas. Alguém poderia escutar. - Frisk debochou, divertida, novamente procurando alguma coisa em seu celular. - E não apenas isso. Você também deveria começar a ficar mais atento aos seus arredores ou alguém pode acabar te pegando em uma de suas... Atividades. - e novamente o rosto de rapaz mudou de cor, quase como um camaleão, uma careta quase permanente agora aprofundando-se em suas feições. - Como eu disse, eu tenho provas, você só tem palavras. Quem vai sair ganhando nessa história?

— Vadia desgraçada, me dê isso! - ele avançou, mãos içadas para tentar agarrar o aparelho, apenas para ter suas tentativas frustradas quando Frisk prontamente o escondeu atrás de suas costas, esquivando-se para longe ainda com um sorriso zombeteiro em seu rosto. Ela realmente não deveria gostar do garoto, afinal, Carl nunca a tinha visto com tal atitude desafiante além de Ralph, o qual ela fazia questão de manter uma boa antipatia evidente. Se bem que ele não poderia muito bem culpá-la depois do que tinha visto.

— Como se eu fosse idiota de te deixar ganhar assim. Você nunca vai ter essas provas e se por acaso eu souber que está ameaçando a mim ou a minha família mais uma vez tudo o que tenho vai parar nos jornais sem que eu tenha que pensar duas vezes. - e cantarolando vitoriosa Frisk saiu deixando o rapaz atrás a resmungar blasfêmias de todos os tipos e tamanhos.  

Carl sentiu-se orgulhoso. Aquelas informações não foram coletadas por ninguém da gangue, ele saberia, principalmente estando tão perto do Olheiro que era informado de todos os projetos solicitados por qualquer membro e Frisk não quebrava regras. Ela as havia recolhido sozinha, juntado e guardado para aquele momento em específico, provavelmente bem sabendo o que teria que lidar. Não era um trabalho de profissional, mas para alguém que dava ares de ingenuidade como Frisk, aquilo era a prova definitiva que ela poderia ser tão ardilosa quanto qualquer um deles.

Não que ele tivesse alguma dúvida, afinal, ela era sua amiga por algum motivo!

Praticamente saltitando em suas patinhas curtas de rato ele a seguiu para fora do lugar novamente, deparando-se, perto da saída, com um grupo de pessoas. Uma mulher e um homem corpulento saíram primeiro, sem nem ao menos olhar para trás, a mulher de nariz empinado e rosto indignado. Questão de poucos segundos depois o rapaz que antes havia incomodado Frisk os acompanhou, lançando um olhar raivoso para a morena antes de desaparecer porta a fora, deixando a garota sozinha com um grupo de quatro, sendo que dois deles, Carl reconheceu como o prefeito e sua esposa, muitas vezes aparecendo em entrevistas sobre novos projetos a entrar em vigor na cidade, para não dizer que era seu segundo mandato. Ao lado deles estavam uma garota da mesma idade que Frisk, quase idêntica a ela se não levasse em conta a cor de sua pele e um rapaz um pouco mais velho, parecido ao casal de mais velhos.

Provavelmente, Carl imaginou, eram os irmãos de Frisk.

E a não ser que ela tivesse mais uma irmã, o que Carl sabia que não era verdade, ele talvez tivesse descoberto, sem realmente querer, a identidade da Rainha de copas...

Ops?

Bem, ele sabia como manter segredos, principalmente aqueles que poderiam colocar em jogo o futuro de sua cabeça, a qual ele preferia que se mantivesse bem posta sobre seus ombros. Ainda assim ele permanecia curioso e, insistentemente, aproximou-se para ouvir a conversa.

— Sinto muito, minha criança, mas terá que passar essa noite com eles. - comentou a esposa do prefeito, semblante triste em suas feições enquanto dizia com uma voz calma, tranquila, acariciando com carinho e pesar o rosto de Frisk a qual unicamente pode suspirar em tristeza. - Realmente sinto muito, não conseguimos negociar isso com o juiz. Ele continua afirmando que apesar da situação eles continuam a ser parte de sua família.

— Eles podem ter me gerado, mas não são minha família, vocês é que são. - a morena afirmou, convicta, apesar de seu evidente desapontamento com a situação atual. - Mas tudo bem, eu sei que vocês tentaram. De qualquer jeito vou continuar a tentar ficar o menos possível lá. Eles não se importam mesmo.

— Apenas tome cuidado, minha criança.

— Não se preocupe, mãe. Eu aceitei passar a noite cuidando de Florenci enquanto seus pais estão fora. Se eu me recordo bem da ultima vez que tive que fazer esse trabalho é provável que passe a maior parte do meu tempo com ele do que naquela casa...

Carl não entendia muito bem a conversa, mas decidiu que seguir fosse sua melhor escolha para colocar todas as informações em seu devido lugar sem ter que especular nada. Ele estava curioso, era uma parte de Frisk que queria cair em cima e nunca pensou que poderia ter acontecido de tal maneira inesperada. Existiam problemas no paraíso, porque Frisk não vivia em um, ela tinha luxos e privilégios, mas ela ainda era uma humana com suas devidas questões as quais atrapalhavam em sua vida. Ele sabia que poderia invadir sua privacidade, mas não conseguia se controlar, ele precisava saber.

Mantendo distância para não ser visto ele acompanhou a garota em sua caminhada, já que ela recusou-se teimosamente a carona que seu pai ofereceu. Carl aproveitou esse tempo que tinha para colocar tudo em sua cabeça no lugar, todas informações que tinha recolhido durante aquele dia.

Em primeiro lugar: Frisk era uma garota de dezessete anos, cursando o terceiro ano do ensino médio e que futuramente queria cursar direito na faculdade de Ebott; adotada pelo prefeito da cidade e sua mulher; tinha dois irmãos, sendo que uma delas era a líder da gangue rival, mais conhecida como Rainha de Copas, provavelmente sendo irmãs gêmeas pela semelhança que Carl conseguiu ver; por conta de alguém, de identidade desconhecida, Frisk tinha entrado na gangue em que estava agora; por algum motivo desconhecido também ela manteve seus olhos fechados e não falava, comunicando-se apenas por linguagem de sinais, voltando a falar e abrir os olhos no inicio de setembro do ano passado, também por motivos desconhecidos; ela aparentemente estava no meio de um julgamento, se ele entendeu direito a conversa era contra os pais biológicos de Frisk, o que explicaria porque Sans tinha alertado para não perguntar, a morena não deveria gostar muito deles.

Ele não estava contando suas amizades também. Frisk estava se tornando, sem querer, uma pessoa influente. Ao entrar na gangue e manter-se em contato com os comerciantes, escutando seus problemas e ajudando Sans em suas propostas de melhorias para atrair e otimizar novos mercados ela pouco a pouco criava contatos. E como seu pai era prefeito, apesar de não ser uma garota que aparentava abusar de seus status para arrumar influencias, ainda era um grande peso nos encontros que poderia ter.

Frisk tinha futuro, querendo ou não, principalmente na política. E sendo a pessoa boa que era, Carl quase conseguia ter esperanças para um bom progresso naquela cidade.

Deteve sua linha de pensamento quando encontrou-se de frente para um edifício, dentro do que ele identificou como as Ruínas. Esse era um bairro quase abandonado, se ele bem se recordava, não esperava que a morena conhecesse alguém de lá, normalmente os prédios eram ocupados por estudantes que vinham de outras cidades, ainda assim, como a própria faculdade fornecia um dormitório, eram poucos aqueles que realmente se dispunham a pagar, mesmo que baratos. A segurança não era muito boa e o bairro ficava muito próximo as periferias dominadas por gangues para que as pessoas realmente se arriscassem.

A faculdade de Ebott era famosa por seu ensino de qualidade, principalmente em magia, e obviamente pessoas mais ricas se motivariam em estudar ali, ainda que preferissem acomodar-se em New Home do que próximo ao perímetro da escola, dentro do bairro das Ruínas.  

Sentiu-se ainda mais impressionado ao perceber que, quem abriu a porta foi um pequeno garoto loiro, enormes olhos verdes reluzentes com uma alegria sem tamanho ao ver quem estava a sua frente. Ele alcançava a cintura de Frisk com facilidade, deveria ter uns nove ou oito anos, apesar de poder estar enganado por seu rosto delicado o suficiente para confundi-lo com alguém mais novo, sendo mais velho.

Animadamente saltou para os braços da morena que o recebeu sorrindo. Carl observou como dois adultos cumprimentavam a morena, rostos sorridentes, bem arrumados e prontos para sair, pareciam ansiosos. Ele não conseguia escutar o que diziam, mas supunha que garantiriam o horário de pagamento, se é que Frisk aceitaria ser paga, e o horário de retorno, provavelmente questionando se ela iria querer uma carona para casa, fato que Carl sabia que sua pequena amiga faria de tudo para recusar.

Ele esperou até que ela finalmente estivesse dentro e os pais do garotinho tivessem partido para poder se aproximar, sua forma de rato sendo o suficientemente pequena para passar pela parte inferior da porta, apertando-se um pouco, mas ainda assim passando. Ele observou como Frisk acompanhava o garotinho até a sala, tão animado como uma criança deveria ser, apesar de Carl bem se lembrar de casos de crianças a reclamar sobre suas babás, achando-se grandes o suficiente para virarem-se sozinhos em casa quando os pais não estavam.

Contudo, ele deveria ter adivinhado que Frisk seria uma babá querida. Mesmo as crianças da gangue animavam-se com ela, a obedeciam por respeito e gosto, tratando-a quase como uma mãe ou irmã mais velha a qual nunca antes haviam tido. Eles a amavam, Carl não poderia negar a beleza que era observá-la lidar com todos, imaginando, de forma inconsciente, como um dia ela poderia tornar-se uma boa mãe. Seu instinto era natural e ela obviamente usufruía dele, divertindo-se de igual maneira com cada criança, nunca tendo má vontade em lidar com nenhuma delas.

E talvez ele realmente tivesse ficado a observar dentro da casa durante todo o tempo que Frisk manteve-se lá. Não por informações, mas por preocupação.

Ela era uma garota bonita, e ele sabia bem que poderia se cuidar, porém o mundo era cruel, vários homens dariam tudo, qualquer coisa, para ter Frisk em sua cama, mesmo que a força. Carl a via como uma irmã, ele não poderia, de forma alguma, deixá-la voltar para casa de tal forma, principalmente ao ter certeza absoluta que nenhum dos dois adultos responsáveis da casa conseguiriam convencê-la a receber uma carona.

Todavia, ele teve um pequeno inconveniente em sua brincadeira de esconde-esconde.

Plantas de todos os tipos e tamanhos, saídas do nado por entre as frestas do apartamento, sem qualquer outra explicação racional se não a manipulação de magia elemental, tentavam agarrá-lo em apertos assustadoramente mortais, forçando-o a bater em retirada em meio a um desespero. Por pouco conseguiu desviar, escorregando pelo chão a deslizar até a porta de entrada, finalmente sabendo o significado de animal acuado, encurralado, muitas vezes tendo sentido as vinhas começando a enroscar-se em suas pequenas patas ou tronco, passando assustadoramente por cima de sua cabeça, por debaixo de suas patas depois de um salto ou até mesmo crescendo por sua visão periférica.

Quando finalmente conseguiu saltar para fora, voltando a sua forma humana em um fôlego curto, rápido e esbaforido ele percebeu seu verdadeiro desespero, tão feliz em estar de volta ao normal como nunca esteve. Definitivamente não foi feito para esse tipo de situação, por isso foi colocado entre os informantes. Preferia mil vezes não ser visto e escapar de fininho do que ter que se colocar entre o fogo cruzado a arriscar sua vida, talvez por isso que situações que exigiam uma decisão ele não era bom. Estar sobre pressão não era com ele.

No entanto, não era por ter estado no efeito do medo durante toda sua fuga que não tinha observado ao seu redor para encontrar o culpado. Ele havia aprendido, em toda a sua vivência no submundo, que a observação poderia não apenas salvar sua vida como uma ajuda para escapar, como também para dar um contra ataque em seguida. Saber quem estava enfrentando e quais eram suas capacidades poderia ser extremamente útil depois que a poeira baixasse, dando-lhe uma vantagem para um possível contra-ataque.

E sim, Carl sabia quem fez a magia.

Não era tão complicado, existiam apenas três pessoas no apartamento contando com ele próprio. Mesmo que Frisk tivesse notado sua presença ela não o atacaria com as intenções assassinas as quais ele sentiu naquelas loucas plantas, não era de seu caráter. Ele tinha certeza, absoluta, que foi o garoto. Não por eliminação, mas também por tê-lo visto.

Era comum em muitos usuários de magia demonstrar de alguma forma visível o uso dela. Sans tinha o olho a brilhar em chamas azuis, enquanto as partes brancas tornavam-se negras. Frisk, por sua vez, incandescia as mãos em um vermelho vivo, para não dizer da mudança evidente de cores em seus olhos, passando de dourados para vermelhos. Cada um tinha sua própria forma de demonstrá-la e por tal era tão fácil de identificá-los, exceto em uma possível luta com mais de um. No caso do garoto tinham sido as veias verdes que desenharam em seu braço de forma discreta, como pequenas e finas vinhas de trepadeiras por sobre sua pele.

O motivo de ter sido atacado? Talvez por ser um desconhecido, contudo, a atitude de uma criança normal nessas situações era informar o adulto mais próximo ou assustar-se e não atacar como se estivesse em uma brincadeira de gato e rato, sem quaisquer trocadilhos. Aquele moleque era encrenca na certa, mas deveria informar Frisk?

Sem um pingo de vontade ou coragem para voltar, Carl esperou do lado de fora, sentindo-se imensamente feliz com sua resistência a manter-se desperto durante toda a noite. Para não dizer de sua experiência com manter-se quieto e paciente em situações as quais exigia aguentar um longo período de tempo sem fazer absolutamente nada. Definitivamente o tinha servido de muito naquele momento.

Se bem havia contado seu tempo, tinha levado pelo menos de quatro à cinco horas para Frisk finalmente ser liberada de seu serviço, assim como o esperado recusando a carona oferecida para colocar-se a caminhar por todo o caminho até o começo do bairro de Hotland. Se ele sabia bem, no entanto, Frisk deveria morar no centro em New Home, qual seria seu motivo para estar ali agora?

Quando ela chegou de frente para uma casa simples, tão comum e semelhante como qualquer outra que tivesse ao lado, já deveriam estar por volta da metade da madrugada. Ele a observou parar de frente para a porta, encará-la com ombros caídos, desanimados e desamparados, mantendo-se parada apenas a observar por alguns prolongados minutos antes de respirar fundo, como se a tomar coragem e apenas então, suspirando pesadamente, impulsionar-se para frente, adentrando pela porta destrancada.

Em confusão Carl a seguiu, novamente voltando a ser um rato, brevemente hesitando na porta ao recordar-se da ultima vez. Ele sinceramente não queria arriscar sua pele novamente, talvez fosse melhor esperar do lado de fora?

Porém, mandou ao diabo qualquer hesitação que anteriormente poderia ter quando escutou algo se quebrando na parte de dentro da casa juntamente ao som de alguém a cair bruscamente. Sem pensar duas vezes mais entrou na casa, encarou ao seu redor na sala de entrada a qual já conseguia ver quantidades absurdas de pilhas de garrafas de todos os tipos de bebidas alcoólicas diferentes, sofás encardidos e velhos, sacos de lixo jogados em um canto qualquer, empilhados pelo que poderiam ser semanas. Tudo estava escuro, ele quase não conseguia ver um palmo a frente de seu nariz, a única luz a qual realmente parecia iluminar alguma coisa no lugar era a televisão ainda ligada, contudo, não parecia ter ninguém a assisti-la.

— Esses olhos! Esses malditos olhos! - uma mulher gritava, tão exaltado quanto sua voz poderia elevar-se, guiando o pequeno rato para cozinha, não muito distante de onde se encontrava, por mais que fosse obrigado a desviar do lixo que ocupava o chão da casa durante todo o caminho. E assustou-se, ao chegar, deparando-se com Frisk ao chão, encostada desengonçada na parede em um canto do lugar, cadeiras ao chão, uma mão na cabeça baixa, cacos de vidro espalhados ao redor enquanto uma mulher erguia-se ameaçadoramente e desengonçada a sua frente, o que parecia ser um pedaço quebrado de garrafa com pontiagudos dentes apontados na direção da garota no chão, ameaçando se aproximar. - Os olhos dele! Olhos do demônio, amaldiçoados! Eu deveria arrancá-los e queimá-los, assim nunca mais terei que vê-los novamente! Sua aberração! Praga que possuí seu sangue! Não deveria ter nascido!

As palavras eram pesadas, Carl recordou-se de ouvir semelhante de seus pais uma vez, antes de ser colocado para fora de casa, seus pelos arrepiando-se por lembrar. Não era algo que você desejava escutar, nem mesmo desejava a seu pior inimigo, pois ninguém tinha culpa de seu nascimento ou das consequências que com ele vieram. A forma como você nasceu, as coisas feitas antes, os motivos por ter nascido, não eram culpa da pessoa, por mais que muitos pareciam não enxergar tal lógica. Jogando uma e outra vez no rosto da pessoa palavras pesadas, dolorosas que poderiam sim machucar mais do que uma ferida física. Pois feridas se curavam, mas a rachadura na alma, não...

Frisk, no entanto, contra qualquer possibilidade imaginada, ergueu a cabeça, olhos destacando-se na escuridão, dourados e belos, enormes. Um lado de seu rosto, o pequeno ratinho percebeu, estava mais escuro que o outro e ele poderia supor, assustado, que se tratava de sangue.

Ela encarou a mulher de maneira desafiante, calada, queixo erguido e olhos faiscando, expressão determinada. Se as palavras a haviam afetado Frisk não tinha quaisquer intenções de demonstrar. Contudo, a mulher pareceu surtar com sua reação, tornando-se ainda mais alterada.

— Pare de me encarar! Pare de me olhar com esses olhos malditos! Eu vou arrancá-los! Eu vou arrancá-los!

E com um chiado esganiçado, um grito estranho talvez, a mulher avançou na direção de Frisk, garrafa quebrado em suas mãos pronta para fazer o serviço. Carl entrou em desespero por meros segundos até observar, impressionado, como agilmente Frisk deslizou para fora do caminho no ultimo momento, aproveitando o impulso da louca mulher para dar-lhe um leve toque em suas costas, empurrando-a direto para a parede a qual acertou com toda a força, rosto amassado contra a madeira antes de desabar sobre o chão rodeado pelos cacos de vidro da garrafa.  

Respirando profundamente, um tanto cambaleante, Frisk apressou-se para fora da cozinha, sem olhar para trás. O pequeno ratinho a seguiu, observando assustado como ela chegava até as escadas para o segundo andar, deparando-se com o corpulento homem que outrora viu sair do fórum durante a tarde do dia anterior. Ele a agarrou pelo pulso com força, erguendo seu braço de tal maneira que a pobre morena quase foi obrigada a ficar na ponta dos pés.

— O que você fez?! Que barulheira foi essa?! - o homem esbravejou, cenho franzindo-se fundo apesar de qualquer outra parte de seu rosto manter estoicamente intacta. Frisk, porém, não respondeu, inutilmente tentando livrar-se do agarre apertado em seu pulso. - Eu fiz uma pergunta! E quando eu faço uma pergunta você tem que responder! Será que depois de sete anos já se esqueceu da regra de que nunca deve-se desobedecer a mim?! Eu controlo essa casa e você está sob o teto dela agora, então você me obedece! - ainda assim, a morena não abriu a boca para falar, teimosamente quieta. - Vadia...

A mão livre do homem subiu para segurar com firmeza o pescoço fino da garota, apertando-a contra a parede enquanto lentamente amassava sua garganta, cortando-lhe a respiração. E Carl realmente sentiu-se enlouquecer naquele momento, sem saber se deveria voltar a sua forma humana para ajudar ou se isso apenas poderia trazer mais problemas para a garota. Ele definitivamente era péssimo para tomar decisões nesse tipo de situação, sua manter tornavam-se um embaralhar de pensamentos que facilmente o levavam ao desespero e o prendiam em seu lugar sem fazer mais nada do que observar.

Tão patético que mesmo naquele momento de necessidade ele não conseguia fazer mais do que manter-se congelado no lugar, corpo tenso de pelos em pé, olhos bem abertos a observar assustados o rosto de sua amiga tornar-se lentamente vermelho.

Em um movimento rápido, porém, Frisk acertou a mandíbula do homem, deixando-o tonto por instantes o suficiente para conseguir escapar, caindo sobre seus pés bambos pela falta de oxigênio e, desviando do brutamontes a sua frente, saltando escada acima, tosse pesada arranhando-lhe a garganta na necessidade latente de ar. Carl a seguiu, como um reflexo de seu pavor, vendo em uma ligeira espiada para trás enquanto corria pelo corredor do segundo andar atrás de sua amiga três mulheres semi nuas assomando-se na porta de um dos quartos e perguntarem o que estava acontecendo.

Que diabos de casa era aquela?

Ao final do corredor tinha um quarto no qual Frisk deteve sua corrida, respirando profundamente enquanto apoiava uma mão em seus joelhos dobrados e outra na maçaneta da porta, pronta para abri-la. Deveria ser seu quarto, Carl supunha, o único lugar onde ela pensaria ter algum tipo de segurança depois de toda essa confusão. Ele próprio precisava de um descanso, seu coração não aguentava mais, suas preocupações estavam ao limite e ele não se imaginava em saindo dali e deixando sua amiga sozinha com todos aqueles perigos por sua saúde, nem na gangue ela parecia ter tantos problemas.

Por mais que não estivesse sendo de grande utilidade ultimamente.

Finalmente ajeitando-se sobre seus pés a garota abriu a porta, apenas para que, como se não pudesse ter um simples momento de tranquilidade, fosse atacada por um vulto rápido que saiu de dentro, avançando sobre ela com agressividade. Quando finalmente conseguiu ajeitar sua visão aos movimentos apreçados e a confusão a sua frente ele percebeu o mesmo rapaz que anteriormente tentou ameaçar Frisk, sobre ela contra a parede, um pedaço de pano em sua mão pressionado contra o rosto da garota que se debatia sem parar.

Levando uma mão para a parede, finalmente colocando sua mente no lugar depois do susto, Frisk usou de sua magia para puxar um grosso pedaço de madeira para fora, empurrando o rapaz a sua frente para a parede do outro lado, dando-lhe movimentação suficiente para cambalear para dentro do quarto. Sua visão estava começando a embaçar, quase não conseguindo manter-se sobre seus pés, ela tinha certeza que tinha cheirado clorofórmio.

Ela nunca agradeceu tanto ter magia. Usuários costumavam ter modificações, por conta da constante influencia das almas em seus corpos, em seus organismos e por tal o efeito de drogas era completamente diferente. Por isso não havia apagado por completo e ainda lutava com sua mente para se manter acordada. A quantidade tinha sido exagerada, mas não o suficiente para ultrapassar a resistência que possuía, pelo menos para um efeito imediato.

Mas ela ainda poderia desabar a qualquer momento.

— Você é uma puta usuária! Eu sabia que estar com aqueles desgraçados defensores de aberrações por tanto tempo apodreceria mais ainda você! - o rapaz havia se levando, apoiando-se ainda um pouco desengonçado na porta, provavelmente tendo machucado uma costela no impacto. Pelo desespero Frisk não realmente mediu forças. - Mas isso não tem importância, você vai apagar e eu vou poder fazer o que quiser com você. Tenho certeza que seus pais vão me agradecer por eu me livrar de alguém que apenas ocupa espaço e é tão inútil como você.

Ele se aproximou, Frisk tentou recuar, contudo seu braço foi preso em um aperto doloroso, puxando-a para frente com brutalidade. Uma das mãos livras do rapaz desceu para sua bunda, massageou de forma descarada enquanto lambia os lábios em apreciação. Ela tentou resistir, mas as funções de seu corpo já não respondia mais com precisão e seu cérebro começava a falhar. Ainda assim conseguia sentir as mãos subindo de seu quadril para a cintura, puxando sua blusa ao ponto de rasgar um pouco do tecido, finalmente alcançando os seios.

Como suas mãos não mais conseguiam ter forças para qualquer atitude agressiva que pudesse ter ele soltou seu pulso, aproveitando que agora tinha mais uma mão para brincar para colocá-la dentro das calças da garota, mordidas sendo deixadas pelo pescoço. Ele teria certeza de aproveitar bem a noite.

Frisk sentiu-se enjoada, ela ainda estava consciente, mas não era como se pudesse se mover para se defender. Lágrimas começaram a escorrer por seu rosto, não acreditando que realmente estava acontecendo, depois de ter escapado por tanto tempo, depois de ter conseguido fugir tantas outras vezes... Ela não o esperava em seu quarto, talvez pelos sustos anteriores, ela apenas foi pega de guarda baixa e agora encontrava-se naquela situação.

Resmungou em desgosto quando ele tentou beijá-la, conseguindo ao menos mordê-lo com força o suficiente para afastá-lo, recebendo em resposta um soco em seu rosto, mandando-a para o chão no qual ficou. Ele montou sobre seu corpo, ela conseguiu senti-lo tentando arrancar suas calças quando de repente o contato se afastou, ela não o mais sentia e não tinha forças para olhar o que estava acontecendo.

Carl tinha sido desnorteado, miseravelmente esteve entre o rapaz lançado para a parede e a própria parede, maçado entre os dois por alguns minutos antes dele se levantar. Ficou desamparado por um tempo e quando finalmente conseguiu voltar a si, depara-se com tal cena.

A fúria não poderia ser dada nome e imediatamente voltou a sua forma humana, pegando o primeiro que encontrou na frente para acertar a cabeça do rapaz sobre sua amiga. E não contentou-se apenas com isso, seria demasiadamente pouco para o que estava acontecendo. Ele acertou mais uma, e outra e outra e mais outra. Mesmo depois que ele parou de resmungar em dor, sangue manchou o que quer que estava usando para acertá-lo, Carl apenas realmente deteve-se quando sentiu-se melhor, cuspindo sobre o corpo inconsciente no chão sem qualquer arrependimento.

Com tristeza ele aproximou-se de sua amiga, cuidadosamente apoiando-a em suas costas para dirigir-se para a janela. Ele não poderia sair pela porta da frente, seria arriscado de mais. E ele tentou ser delicado, ele não sabia quais eram as condições de Frisk por isso não poderia arriscar muito. A levaria para um hospital?

— Carl...? - a pequena resmungou, rosto apoiado em seu ombro. Era um milagre que ainda estivesse acordada. - O-o que faz aqui?

— Depois eu explico meu anjo, primeiro precisamos encontrar um lugar para te levar. - ele avançou pela rua com passos rápidos, olhos atentos a qualquer um que pudesse estar passando. O ultimo que precisava era que alguém chamasse a polícia, seria complicado de explicar e ainda por cima provar. Para não dizer que não tinha certeza se tinha realmente matado o rapaz. - Vou te levar para um hospital, eu não sei o quanto ele te machucou então...

— Não... Eles vão chamar meus pais... Eu n-não quero... Que e-eles saibam... - ela resmungou em protesto, voz arrastada e não mais alta do que um fraco sussurro.

— Mas, meu anjo! Temos que levar você em algum lugar! Não pode ficar na rua! Pode estar machucada!

— No meu bolso de trás... M-meu c-celular... L-ligue para Sans... Ele já... Está esperando... D-deve... Estar preocupado...

Carl ainda hesitou um pouco, pensando se realmente deveria ser uma boa ideia, mas suspirou. Talvez Sans realmente pudesse resolver a situação, Carl apenas não queria ver como ele ficaria depois de saber de tudo o que tinha acontecido. Ele estremeceu pela vítimas da fúria descontrolada do albino, mas não sentiu pena, isso seria o ultimo que faria.

Encontrando um lugar para colocar Frisk, Carl pegou seu telefone, agradecendo que já há bastante tempo conhecia a senha para desbloquea-lo, facilmente encontrando o numero de Sans entre os recentes. Nem mesmo dois toque de chamadas tinham sido dados direito quando a ligação foi atendida.

Droga Frisk, estou esperando você ligar há horas! O que diabos aconteceu?! - esbravejou a voz de Sans do outro lado, visivelmente preocupado. Carl conseguiu esboçar um pequeno sorriso, mesmo que a situação não fosse boa.

— Desculpa chefinho, mas não é Anjo que está no telefone agora.

Carl? Por que o telefone de Frisk está com você, o que aconteceu?

— Não sei se consigo falar algo assim por telefone, Frisk que me pediu para te ligar. Estamos perto da entrada para Snowdin, no bairro de Hotland, teria como dar um pulo aqui?

Chego agora. - e sem pedir mais nada desligou o telefone.

Carl soltou um suspiro, sabendo bem que apenas deveria esperar, por mais que tivesse certeza que ele não demoraria. Relutante, então, ele observou Frisk, avaliando o rosto que começava a ter um dos olhos inchados em um tom de roxo escuro, lábio cortado e bastante vermelho, por mais que apenas pudesse ver por conta das luzes fornecidas pelos postes na rua. Um de seus pulsos encontrava-se inchado e vermelho, provavelmente das várias vezes que o seguraram com brutalidade, em seu pescoço formou-se a perfeita marca de uma mão em sua pele, roupas rasgadas e mal colocadas, cabelos desgrenhados e semblante cansado. Ela ainda mantinha-se acordada, por mais que fosse mais próximo da inconsciência do que nunca antes.

Ela levantou-se quase em um pulo, de repente, cambaleando um pouco com apenas um nome nos lábios, prestes a cair, corpo finalmente cedendo por completo aos efeitos da droga e do cansaço. Carl não precisou se mover, Sans já estava lá, pegando-a nos braços em um abraço gentil, delicado, acalmando-a ao instante.

Seria uma cena interessante de se presenciar se não fosse pelas circunstâncias do momento.

— O que aconteceu? - o albino perguntou em um silvo de raiva, acomodando a garota em seus braços para que pudesse carregá-la, cabeça deitada contra seu ombro, bem próximo de seu pescoço e queixo, enquanto apoiava com os braços tantas costas como as pernas dela. Carl percebeu que ela relaxou consideravelmente depois que ele chegou, finalmente deixando-se levar pelo sono.

— Ela... Estava em um casa... Estranha. Uma mulher louca tentou arrancar-lhe os olhos, enquanto um homem quase a sufocou e parecia que o filho deles tentou... tentou... - não queria dizer, Carl sabia que entre todas as pessoas Sans seria o mais furioso em saber, mas não poderia segurar a informação também. - Tentou estuprá-la. Ele a pegou de surpresa em seu quarto, acho que deve ter tentado usar algum tipo de droga para apagá-la, mas apenas deixou os sentidos confusos e fraca. Eu bati a cabeça, então apenas fui perceber o que aconteceu depois que ele já tinha batido nela e estava tentando tirar suas calças.

— Eu vou matá-lo.

— Seu eu já não tiver feito. O acertei na cabeça com qualquer coisa que encontrei pelo lugar. Não estava se mexendo quando saí. Queria levar Anjo a um hospital, mas... Ela disse que seria melhor chamá-lo.

— Ela não ia querer que os pais soubesse... Obrigado por ligar Carl, eu cuido disso agora.

— Espere, Chefe! Eu... Eu quero saber o que aconteceu. Por que Anjo teve que ir para aquela casa? O que aquelas pessoas tem haver com ela?

— São a família biológica dela. Pelo que sei Frisk fugiu de casa quando tinha dez anos e foi adotada pelos Dreemurs, como acho que você já deve ter descoberto. - Carl apenas dignou-se a consentir. Sans voltou seu olhar para a garota que carregava, delicadamente apertando-a um pouco mais contra ele. - Sete anos e eles apenas voltam a aparecer agora, querendo o dinheiro que os Dreemurs devem ter, usando dela para isso. O tribunal não acreditou nas palavras dela quando tentou dizer sobre os abusos, afinal, ela era muito nova na época, o advogado tentou argumentar com isso e por isso o tribunal arrasta-se até hoje. Foi decidido que, para que Frisk se acostume com a mudança de ambiente caso seus pais biológicos ganhassem, ela deveria passar pelo menos um dia a uma semana ao mesmo na casa deles. E pelo que você pode ver, não são os momentos mais agradáveis da vida dela.

— Aquele rapaz que tentou fazer isso com Anjo então era...

— Seu irmão de sangue. Irônico não? Pensar que a família sem qualquer ligação biológica fosse a que mais se importasse com ela do que aqueles que dividem carne e sangue...

— Por que você não disse antes? Quando eu perguntei? Por que me dizer agora?

— Eu sei que você já foi atrás do que queria e que já encontrou mais do que precisava ver. Apenas estou esclarecendo algumas coisas, sem falar que consigo ver agora como se importam com ela. Frisk tem razão de confiar em vocês. E também porque quero poupá-la das explicações que iria se sentir obrigada a dar a você depois. Quando menos ela se recordar disso, melhor será. Mais alguma coisa?

— Vocês dois... - Carl hesitou, talvez indo longe de mais. Contudo, ele não poderia evitar, Sans estava a tratar Frisk com muito carinho diante de seus olhos, talvez pela situação, mas não parecia exatamente por isso. Algo... Algo estava diferente do que estava acostumado a ver entre eles. Era mais... Profundo, talvez?

Sans, contudo, deixou escapar um sorriso misterioso.

— Boa noite, Carl. - e assim se foi.

No dia seguinte, com relutância indo para o departamento de mensagens, Carl deparou-se com Frisk, sorriso no rosto a agir como se nada na madrugada realmente tivesse acontecido. Diana o cumprimentou, sendo a primeira a vê-lo, chamando a atenção de Frisk para ele, como consequência.

E ela sorriu, um triste sorriso de desculpa que o partiu por dentro. Ela não tinha nada o que se desculpar, ele foi atrás e ele viu o que não devia, mas não se arrependia. Se não tivesse feito, o que teria acontecido com Frisk? Não queria imaginar.

Com passos rápidos ele se aproximou, abraçando-a com força, esquecendo qualquer um que estivesse a encarar, tentando saber o que acontecia.

— Você tem o direito de viver, você é importante e não um desperdício de espaço. Você é incrível e nós amamos você, nunca duvide. Sempre que precisar de ajuda, um ombro para chorar ou alguém para conversar, não hesite em me procurar. Sei que não sou a melhor pessoa do mundo, não sou tão incrível quanto você, mas posso tentar fazer alguma coisa. Ninguém tem que lidar com isso sozinho. - resmungou para a morena, lágrimas quase sendo deixadas escapar em meio ao discurso.

Frisk sorriu com carinho, primeiramente surpresa e em seguida grata. Retribuiu o abraço sentindo-se muito melhor, muito mais leve.

Talvez algumas informações poderiam ser inoportunas, mas quanto mais uma pessoa aprendia sobre a outra, quanto mais fundo se cavava e tentava entender, melhor poderia ser sua relação. Sendo compreensivo tudo poderia se ajeitar e uma vida poderia ser salva.

Frisk sim era determinada, mas ela não negaria nunca que, se não fosse a força que recebia daqueles quem amava, ela não estaria ali agora. Por isso dava tudo de si para concertar os erros que havia cometido e salvar aqueles que deveriam ser salvos, seja de si mesmos como dos outros.


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Notas finais do capítulo

Eu amo o Carl e ele foi um personagem que sinceramente eu achei que seria interessante brincar um pouco mais. Ainda tenho especiais sobre o Gaster e seus tempos de faculdade (miriam, toriel, asgore e grillby também aparecendo bem novos) e ainda quero ver se faço um da Chara, já tenho até algumas ideias.
Bem, espero que tenham gostado, até o próximo cap! Continuem determinados!