FusionTale escrita por Neko D Lully


Capítulo 25
Detalhes Despercebidos


Notas iniciais do capítulo

Yoooo.
Cara, to super com vergonha por não ter terminado os capitulos que queria (especial e o capitulo vinte e oito), mas minhas semanas não estão tranquilas, eu tenho que me concentrar nos estudos (não sei quem foi o louco que inventou de juntar quimica com fisica e avacalhar tudo que aprendi no ensino médio. Obrigada Bhorn!) Mas não se preocupem que o ultimo que quero e deixar essa fanfic sem postar.
Próximo capitulo será duplo! Uhu! E quero já ter terminado o vinte e oito, porque os próximos serão mais fáceis. Por que? Uma dica: tem uma pista no primeiro cap que postei a história ;).
Sem mais delongas, vamos ao cap!



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FusionTale - Detalhes Despercebidos

Mais duas redefinições.

Mais duas vezes que os acontecimentos haviam retrocedido e Frisk foi forçada a recomeçar. Ela não mais se importava, era verdade, suas atitudes eram quase automáticas e mecânicas, respostas decoradas sempre sincronizadas no momento certo, movimentos programados não exigiam quaisquer força de pensamentos para serem exercidos durante algum momento devido.  Frisk começava a sentir-se um robô programado, vivendo repetidas vezes o mesmo momento para concertar um erro que afetaria todo o futuro. Mas que erro poderia ser esse? Toda a linha do tempo estava perfeita, o que ela poderia fazer para mudar? Para tornar melhor?

Ela estava cansada, seus olhos acumulando bolsões negros evidentes mesmo em sua pele morena. Seu corpo exigia o permanecer no conforto de sua cama, consciência pesada e exaurida pela constância de acontecimentos que tornavam tudo extremamente entediante e monótono. Mesmo sua entrada na gangue, o qual não era nem um pouco tranquila, ficou sem o apimentar do medo e da adrenalina o qual foi movida no inicio. Surpresas já não eram mais surpresas e a vida continuou com aquele mesmo ar parado, sufocante... Uma mentalidade de prisão e falta de controle.

 Seja como for ela novamente estava junto com Undyne, próxima ao mês de julho, treinando em pleno sábado na parte da manhã. Era um daqueles dias em que Frisk pegava uma "folga" de suas atividades na gangue para aliviar a tensão em sua casa e manter suas duas vidas tranquilas. Lá ela era o Anjo, a segunda no comando dos entregadores e possível paquera do chefe da gangue, levando em consideração o tanto que eles haviam flertado um com o outro durante o período em que havia ingressado naquele mundo de marginalidade. E talvez fosse impressionante e um grande orgulho para a morena o fato de ter conseguido resistir as insinuações e tentativas de Sans de levá-la para sua cama. Ela lutava contra o desejo e paixão por ele, lutava contra si mesma e a ânsia de se deixar levar.

Ali, no entanto, ela seria apenas Frisk, a garota do terceiro ano do ensino médio, a amiga, irmã ou filha perfeita a qual todos queriam ter. Tranquila e quieta, que muito provavelmente estava passando por alguns problemas e mudanças de atitude repentinas as quais nenhum deles poderiam explicar. Frisk gostaria de contar, seu desejo era que todos pudessem simplesmente entender o que ela passasse e assim tivesse ajuda, mas não era possível. Por que? Oras, porque ela já tinha tentado! As redefinições já tinham extrapolando a contagem de cinquenta,  Frisk já tinha esgotado suas opções de tentativas, já tinha recorrido a Gaster, a Sans, implorou a Chara, Asriel, chorou com Papyrus, Mettaton, Undyne... Não existiam formas de parar e o melhor a fazer era aceitar e deixar levar.

De qualquer forma lá estava ela, mais uma vez com Undyne, correndo com pesos em seus tornozelos e em seus pulso entorno de uma área dentro do centro policial, dedicada exatamente ao treinamento de novos recrutas. Como Undyne tinha uma boa patente e aquele não era um horário de uso dos policiais em treinamento elas poderiam muito bem usufruir de seu espaço durante algumas horas.

Não era a primeira vez, nem mesmo a segunda. Talvez a terceira na qual Frisk tinha como peso em suas costas a entrada em uma gangue, um segredo o qual nunca poderia confidenciar a sua amiga ruiva. Era um dos detalhes os quais Frisk imaginava que apenas Sans precisava saber, afinal, ela nunca saberia como explicar seus motivos.

Seus exercícios, ou melhor dizendo, torturas, apenas tiveram seu fim quando suas pernas já não passavam de gelatina e seus braços estavam tão doloridos que amputá-los parecia uma boa escolha. Undyne nunca pegou leve e, apesar de todas as vezes que treinava com ela, Frisk nunca se acostumaria, sempre se sentiria em um campo de treinamento militar ou em uma guerra por sua vida, mas bem sabia que esse seria o jeito da ruiva de fazer as coisas e até então mostrava seus resultados.

Frisk tinha percebido, talvez na sua segundo redefinição na gangue, que mostrar suas capacidades físicas poderia ser uma das melhores maneiras de ganhar respeito dentro de um lugar onde a sobrevivência era a ordem máxima. Desde então seus treinamentos nunca foram tão bem vindos em toda sua vida.

Exausta, banhada em suor e necessitada de pelo menos um dia inteiro sem mover-se por um instante se quer, Frisk se deixou cair em um banco qualquer disposto perto da pista de corrida, respiração ainda acelerada e descompassada chegava a arder em sua garganta, puxando o ar por sua boca, ressecando todo o canal, forçando Frisk a molhar a boca não apenas uma vez. Undyne sentou a seu lado, enorme sorriso orgulho em seu rosto fino, depositando, sem pensar, um tapa no ombro da pobre morena a qual rangeu de dor.

— Está melhorando bastante, punk! - elogiou, recebendo apenas um fraco sorriso tremulo como resposta. Undyne era uma mulher firme, impulsiva e poucas vezes percebia alguma coisa, pois não tinha o costume de prestar atenção aos detalhes. Mas qualquer um, em qualquer lugar, atento ou desatento, poderia facilmente perceber o estado cansado e robótico que Frisk tinha assumido. Ela era péssima em mentiras, péssima em tentar mostrar o que não estava lá e, por tal, acabava por transparecer bem suas intenções ou estado de espírito. Undyne suspirou, rosto deixando o sorriso para cair em um expressão séria. - Ei, punk. Tem alguma coisa te incomodando?

Undyne soube de Frisk a primeira vez quando Asgore e Toriel vieram a delegacia ainda quando era uma novata, nem ao menos saída da faculdade ainda, sustentada por seu pai, um grande oficial renomado na cidade. Os dois procuravam pedidos de adoção, aparentemente uma estranha garota, muda, assustada, sem um lugar para morar, havia escondido na garagem deles durante uma noite de inverno rigoroso. A pobre quase morria de hipotermia quando a encontraram e a abrigaram em sua casa, deram-lhe comida e uma cama para dormir. Aparentemente ela não tinha pais, ou pelo menos não queria falar sobre eles e por tal decidiram adotá-la. Era uma garota simples, retraída, pouco se aproximava deles por enquanto.

Sete anos se passaram e pela segunda vez Undyne soube da garotinha adotada do atual prefeito. Frisk tinha se aproximado dela pedindo, da melhor maneira possível, um treinamento para ajudá-la em sua forma física, alegando ser uma fã de seu trabalho e ter, pelo menos, a capacidade de se defender dos valentões que a assediavam na escola. E, Undyne, como toda bem feitora, ainda sentindo-se devedora de um favor a Asgore por todo o apoio que ele havia dado a brigada policial, a seu trabalho e o de seu pai, mesmo com o crescimento massivo de gangues, aceitou a proposta, reservando alguns dias após seu expediente para ajudar a garota.

Meses se passaram e Undyne criou um vinculo com a pequena, percebendo sua dedicação e seriedade com relação ao tema, dando tudo de si, determinada a aprender. Descobriu possuidores de amigos em comum, aproximaram-se e se ajudaram mutuamente, a amizade surgiu e agora, depois de tanto ouvir os lamentos de preocupação de Papyrus, Undyne se viu obrigada a interferir no que quer que seja que estivesse acontecendo.

No entanto, assim como foi comentado, Frisk não estava muito disposta a cooperar.

— Estou bem, Undyne. Por que? - os olhos dourados ergueram-se para encarar, com ares inocente, a ruiva que erguia-se por sobre sua cabeça, mesmo sentada.

— Bem... - ligeiramente incomodada pelo olhar, Undyne hesitou. Ela não sabia como lidar com esse tipo de coisa, suas interações normalmente resumiam-se a violência, lidar com problemas alheios não era muito sua praia, a não ser que se tratasse de uma invasão domiciliar, roubos ou coisas parecidas. - Uhun... Tenho escutado que você tem... Tido algumas atitudes estranhas ultimamente. Quero dizer, é só olhar para você! Está acabada, parece que não dorme há semanas e, mesmo se dedicando tanto, parece desanimada. Fiquei sabendo também que volta tarde da noite, quando volta! Eu sei que garotas da sua idade estão na época de procurar diversão, talvez novas amizades, um pouco de rebeldia não faz mal. Mas não acha que... Está passando um pouco dos limites?

— Não é nada Undyne, sério. Apenas dou umas voltas pela cidade, dispersar a mente, sabe? Logo tenho vestibular, as provas finais estão chegando, a vida está uma loucura, mas nada com que devam se preocupar tanto. - era o mesmo discurso, Frisk quase começava a acreditar nele. Aquela não era a primeira e nem mesmo a ultima vez que tinha aquela conversa com Undyne, no mesmo dia, na mesma hora e no mesmo lugar. Até mesmo o sorriso que Frisk apresentava agora parecia ensaiado. Mas ela não tinha que se preocupar muito, logo sua salvação chegaria.

— Sozinha? - a morena assentiu, sem realmente prestar muita atenção no sermão que se seguiria. Sua contagem regressiva permanecia em sua cabeça: Dez, nove, oito, sete, seis, cinco... -  Frisk, a cidade é perigosa durante a madrugada, mesmo com meu treinamento você poderia...

— UNDYNE! - perfeitamente em sincronia, no exato instante que Frisk havia chegado a zero o grito exuberante de Papyrus havia interrompido a conversa, chamando a atenção das duas para o corredor que levava ao interior do departamento de policia, exatamente onde dois albinos se aproximava, um alto e esguio com o braço erguido em um acenar animado, enquanto o outro baixo e robusto, encurvado sobre seu corpo com as mãos dentro do bolso da jaqueta azul, sorriso permanente em seu rosto.

Sem esperar um segundo a mais Frisk saltou do banco, ignorou as pernas de gelatina e correu na direção de Papyrus, que já a esperava de braços abertos e enorme sorriso no rosto. Frisk já tinha feito isso diversas vezes, em algumas linhas do tempo aquela seria a primeira vez que encontraria Sans, mas dessa vez, seria a terceira que teria que fingir não conhecê-lo. Afinal, ninguém sabia que eles tinham uma "relação" fora dos olhares de todos eles.

Sans, por sua parte, observou um pouco afastado, o forte abraço entre seu irmão e a estranha garota que agora tinha sob seu comando. Ele sabia que a amizade que os dois nutriam era bem próxima, mas não imaginava tanto. Nunca viu seu irmão ostentar um sorriso tão grande, a alegria em seu olhar era inigualável e quase poderia identificar aquele carinho de irmão encoberto em pequenas atitudes simples, gestos pequenos como o aperto mais forte de seus braços ao redor dela enquanto a rodopiava no ar, a delicadeza com que ele a colocou no chão, garantindo que não iria cair, na tonalidade de suas palavras. Eram os mesmos carinhos encobertos que ele próprio, como um irmão mais velho, possuía.

Papyrus via Frisk como uma pequena irmãzinha e talvez isso explicasse o quanto ele tagarelasse sobre ela para Sans, o quanto afirmasse com alegria e convicção que queria que os dois se conhecessem. Papyrus amava aquela garota, era visível em seu olhar e mesmo que ele fosse tão inocente como uma criança, a alma e coração tão puro quanto a de uma, ele ainda poderia facilmente diferenciar alguém o qual deveria manter distância e alguém que deveria manter a seu lado o resto de sua vida. Sans sabia que seu irmão não era burro, por mais que se esforçasse para conservar seu pensamento e alma ingênua, ele deveria admitir que a capacidade de seu irmão de identificar as melhores pessoas era impressionante. Sans ainda não compreendia como poderia ainda tê-lo por perto.

Seja como for, o fato era que se Pap gostava daquela garota, então ela não deveria ser a garota que pensou inicialmente... Talvez, apenas talvez, estava sendo desconfiado de mais.

— FRISK, ESSE É MEU IRMÃO, SANS. - Papyrus apresentou animado, abrindo o maior sorriso que poderia ter em seu rosto, apontando para seu irmão a seu lado. Sans sorriu cordial, mascara de completo desconhecimento em seu rosto, tão bem posta que era bem possível acreditar que até então ele nunca tinha visto Frisk em toda sua vida.

Novamente, Frisk era péssima em mentiras, ela não poderia enganar nem mesmo uma criança se quisesse e, por experiências passadas, ela sabia que o pior que poderia fazer naquele momento era abrir a boca para dizer alguma coisa, procurando apenas, de alguma forma, manter seu rosto neutro, sorriso cordial nos lábios enquanto erguia a mão na direção do albino, aceitando seu próprio aperto em um cumprimento amigável. Talvez não tivesse sido impressão sua quando jurou ter visto uma chispa de zombaria e perversão em seu sorriso, mãos mantendo-se juntas por mais tempo do que o necessário.

— É um prazer finalmente conhecer a tão falada amiga do meu irmãozinho. - sua voz era calma, neutra e preguiçosa, o tom grosso saindo ainda mais grave por conta da forma lenta com a qual falava. Suas mãos se soltaram, ainda assim o contato visual permaneceu. Sans gostaria tremendamente de afirmar que não estava encantado com a bela cor que tinha a sua frente, mas seria uma grande mentira. Não importava o que fizesse, quanta desconfiança reunisse, aqueles olhos sempre o levariam para outro lugar de sua mente, o hipnotizariam a tal ponto que, se não prestasse atenção facilmente faria tudo que a calma e doce voz pedisse. Ele não era o tipo de homem que caia por uma garota com facilidade, não se jogava a seus pés e ofereceria o mundo de possibilidades, ele odiava promessas, em primeiro lugar, mas aqueles olhos facilmente poderiam jogá-lo de joelhos no chão se assim quisessem.

— O prazer é meu de finalmente conhecer o tão falado irmão do incrível Papyrus. Ouvi muito sobre você e suas... Piadas de seu irmão.

— FRISK!

— Ops, era segredo? - Frisk riu, tampando divertidamente a boca em uma demonstração de arrependimento falso observando como Papyrus tomava uma coloração rubra nas maças do rosto e como as feições de Sans se iluminavam como nunca. Apesar do momento repetitivo e conhecido, sempre era bom tê-los para se alegrar. Talvez fosse o lado positivo de ter uma mentalidade simples e altruísta: sempre existiria a felicidade apenas por ver o sorriso alheio.  

— VOCÊ ESTÁ OFICIALMENTE FORA DA MINHA LISTA DE MELHORES AMIGOS! O GRANDE PAPYRUS SE SENTE TRAIDO! - o enorme albino bateu o pé, braços cruzados e rosto contorcido em um muxoxo infantil, ainda constrangido. Em sua mente apenas repassava as desculpas que teria que dar ao seu irmão tanto para fazê-lo parar de dizer trocadilhos quanto para convencê-lo de que não gostava deles.

— Não! Desculpe, Pap! Foi um acidente, eu juro! Não me jogue para fora da grande honra que é ser sua melhor amiga! - chiou Frisk, tentando esconder seu próprio divertimento, apesar de ser visivelmente difícil. Ela abraçou-se a cintura de Pap, olhos chorosos voltado-se para ele em uma expressão pidona, como um cachorrinho a choramingar. Tanto Undyne como Sans divertiram-se com a cena.

— HUM... TUDO BEM, EU TE PERDOO. MAS APENAS PORQUE O GRANDE PAPYRUS É MUITO BENEVOLENTE.

— Eba! O grande Papyrus é o mais incrível de todos! - a morena saltou, braços estendidos para o alto em comemoração fingida. Frisk adorava esses momentos, tão simples e divertidos. Animar Papyrus sempre foi uma tarefa tão simples, mimando-o e enchendo-o de um enorme orgulho próprio. Ela nunca iria querer que ele percebesse o quão devastada ela estava por dentro, ela queria, de todo o coração e alma, manter aquele enorme sorriso no rosto inocente de quem considerava mais um irmão.

— Por que veio aqui, Papyrus? - questionou Undyne, seu jeito direto até mesmo parecendo um pouco rude, mas todos sabiam que simplesmente era seu jeito de ser. Ela conhecia Pap desde muito tempo, foi a amiga que o convenceu a deixar a carreira de policial de lado e dedicar-se a culinária, agora muito bem aplicada em sua faculdade, apesar de seus visíveis desastres nos momentos de inventar. Tacos com chocolate definitivamente não parecia uma boa ideia, principalmente quando envolvia chantili na mistura. Seja como for a amizade era antiga e bem firme.

Undyne também conhecia Sans, mas, agora que Frisk realmente pensava, era estranho uma policial e um marginal terem uma amizade tão intima. A ruiva levava a sério seu trabalho e sua tolerância para aquele que infligiam a lei chegava muito próxima a zero. Frisk, anteriormente, nunca havia pensado nesse detalhe, talvez pelo fato dos dois terem estudado na mesma faculdade ela automaticamente supôs que haviam se conhecido lá. Agora, pensando mais a fundo, cogitando as poucas informações que havia conseguido, ela começava a suspeitar que não tivesse sido esse o caso e sua relação guardava mais as obscuras do que a amizade em si.

Afinal, Frisk recordava-se, ambos tinham um acordo. Do que se tratava ela não saberia dizer, nunca foi especificado e nenhum dos dois pareciam animados em contar sobre. Teria relação com as atividades ilegais de Sans? Frisk não conseguia ver Undyne como um contribuidora disso.

Quantos segredos mais eram encobertos tão descaradamente e, ao mesmo tempo, interligados entre si? Primeiro Chara, agora Undyne. Isso para não dizer as próprias informações que eram acobertadas por Sans, como seus motivos, sua história... Muitas pontas soltas ainda se estendiam e Frisk mantinha-se curiosa. Em qual ponto da linha ela teria que mudar para ter alguma resposta?

— OH! É MESMO! FOI CONSTRUIDO UMA PISTA DE BOLICHE NO HOTEL DO METTATON E ELE CONVIDOU A TODOS PARA UM RODADA. - informou Papyrus, tão animado como sempre.

— Pap, eu tenho que pelo menos passar em casa para um banho. Eu e Undyne estamos suadas do treino. - resmungou Frisk, apesar de bem saber qual seria a resposta de tal pedido. Novamente ela já tinha passado por aquele momento mais do que realmente poderia se lembrar, algumas vezes de formas diferentes, mas sempre repetindo os mesmos diálogos, pouco se mudava e ainda assim ela se mantinha no papel.

— METTATON DISSE QUE TERIA UMA ROUPA SEPARADAS PARA VOCÊS, PODEM TOMAR UM BANHO NO HOTEL MESMO!

Frisk sorriu, sem realmente querer responder. Ela sabia que não daria tempo, o celular logo vibrando em seu bolso pedindo atenção. Com um pedido de desculpas e uma licença para atender a ligação Frisk se afastou dos outros três, pegou o aparelho e o levou até seu ouvido segundos depois de aceitar a chamada. E era sempre um pouco estranho, ao mesmo tempo que engraçado, sempre saber o momento exato de uma ligação. Poderia ter sido apenas três vezes a mesma coisa, mas Frisk já tinha pego o padrão, principalmente por associá-lo a outros acontecimentos já ocorrentes a mais linhas do tempo do que poderia contar.

— Alô? - não era preciso uma voz ou ver um número pra saber quem se encontrava do outro lado da linha ou o que queria. Tudo tão previsível e igual que Frisk passou a compreender o que Flowey queria dizer em seu conto quando Chara tomou o poder pela primeira vez.

— Ei, Anjo! Desculpe interromper suas "férias", mas preciso de uma ajudinha.

— Não se preocupe, Dee-dee. Qual ajuda precisa? - Frisk tinha achado engraçado passar a chamar Diana por um apelido carinhoso, assim como ela passou a reconhecê-la pela forma como todos na gangue passaram a chamá-la e conhecê-la. Ainda que Diana reclamasse algumas vezes por ser dita como um personagem bobo de um desenho dos anos noventa ela não parecia verdadeiramente se importar. Frisk achava que o apelido caia-lhe muito bem.

— Veja bem, temos uma entrega muito importante e sigilosa para fazer, mas de alguma forma o segredo vazou e uns membros bem irritantes de uma gangue nova em ascensão estão querendo interceptar o caminho. Tentamos convencer o cliente a mudar o lugar da entrega, mas ele se recusa. Como você é a rainha dos atalhos, pensamos que poderia dar uma ajudinha para arrumar um caminho melhor. - sejamos sinceros, Frisk nem ao menos precisava perguntar ou se quer saber para onde precisava levá-los.

Tudo tão igual.

— Apenas me passa o endereço do lugar de entrega e onde vocês estão, acho que tenho a rota perfeita. - Frisk rapidamente anotou o endereço dito, já preparada com um pedaço de papel e um caneta guardados na bolsa de ginástica que tinha trago para o treino, não muito distante de onde havia postado-se para atender a chamada tranquilamente.

Com a desculpa de ajudar uma amiga nova na cidade que se encontrava perdida, Frisk pediu um mapa para Undyne que, ainda desconfiada por aquela estranha história, entregou um dos sobresselentes que tinha guardado em sua sala. Ela já quase não o usava, depois de tanto tempo com rondas e buscas pela cidade ela já era quase tão experiente quanto a própria Frisk, ainda assim não tão bem informada nas diversas bifurcações e segredos que aquele lugar poderia resguardar em suas entranhas, facilmente possibilitando uma fuga rápida.

Frisk, por sua vez, guardou o pedaço de papel dobrado dentro de sua  bolsa e seguiu os outros até o enorme hotel de Mettaton. Era um investimento alternativa para lucros o qual havia tido não muito tempo atrás, talvez uns cinco anos. O hotel era bem popular e uma das atrações de Ebott mais visitadas, tanto por conta do próprio programa de televisão e fama de Mettaton quanto por sua excentricidade. Seu preço era relativamente acessível e suas atividades liberadas para até mesmo pessoas que não estavam hospedadas, como uma amostra do que conseguiriam se realmente decidissem permanecer.

Seria dispensável dizer que, assim que Frisk assomou pela porta, foi prontamente recebida por seu animado amigo, apressado em empurra-la para os banhos quentes e assim vesti-la como a uma boneca. A morena não reclamava, seu amigo tinha um ótimo gosto para roupas, assessórios e penteados, não importava o que fizesse Frisk sempre saberia que ele não a deixaria passar vergonha com relação a roupas, diferente dela própria que realmente não se importava com o que vestisse. Novamente, ela poderia muito facilmente colocar-se como um homem se bem quisesse, fato que Mettaton abominava terrivelmente, alegando que ela era uma menina bonita de mais para não se mostrar ao mundo e esconder-se em roupas largas e esfarrapadas.  

Quando finalmente foi capaz de reunir-se com os outros dentro da enorme sala de boliche, com pelo menos doze ou quinze divisórias para o uso, com direito a lanchonete e fliperama para as crianças que deveriam esperar por sua vez, ela já estava totalmente produzida para, se bobear, um desfile de moda. Os cabelos estavam amassados em anelados uniformes, criados enquanto ainda estavam molhados a secar naturalmente, a roupa sendo uma mistura entre o branco e o vermelho, combinando perfeitamente com o cachecol o qual não retirava, combinando perfeitamente com Papyrus que sempre encontrava-se encantado em saber que mais alguém exibia de seus mesmos gostos. Saia até metade de suas cochas, branca e rodada, um pequeno short por debaixo para garantir que nenhum pervertido aproveitasse de algum deslize, meias brancas até sua canela e all star branco com vermelho em seus pés. Blusa polo vermelha, mangas curtas com um pequeno enfeite de bolso sobre o seio, carregando a marca do próprio hotel.

Não apenas um rapaz havia quebrado o pescoço para poder observá-la até o fim de sua caminhada para onde encontravam-se seus amigos, em uma pista localizada bem ao canto da sala. Mettaton havia convidado até mesmo seus dois irmãos, Chara emburrada em um canto com Sans bem distante dela, o costumeiro clima de tensão a rodeá-los. Dessa vez Frisk sabia o motivo. Para não dizer também o fato de Sans quase secar Frisk com o olhar e Chara não aparentar gostar nada disso.

Eles fariam um jogo de duplas, a que ficasse com mais pontos no final seria a vencedora. Mettaton obviamente fazendo par com Papyrus, Alphys ficou com Blooky, Undyne acabou por manter-se com Chara, uma dupla deveras estranha. Asriel foi colocado com Tinn, que de alguma fora conseguia jogar usando seus pés e, por fim, Frisk havia sido colocada com Sans, para grande desagrado de uma boa quantidade de pessoas presentes.

Sans ainda trazia desconfiança, tanto por quem sabia quem ele realmente era quanto pela presença enganadora que ele emanava. Ninguém queria que ele machucasse a doce e inocente Frisk a qual, eles acreditavam, não sabia nada sobre o quão terrível era o mundo. Eles não poderiam saber que a própria garota havia se jogado dentro do talvez maior problema de sua vida.

 E não era como se pudessem dizer que, mesmo com as leves tensões causas pela partida competitiva e os próprios desentendimentos já existentes, todo o momento não foi divertido. Frisk aproveitava os pequenos lapsos de tempo livre entre suas partidas para poder fazer o favor que Diana lhe havia pedido, sendo que, em um desses momentos, Sans sentou-se a seu lado, curioso em ver o que estava fazendo.

— O que é isso? - ele questionou, vendo os traços que Frisk fazia com papel manteiga por sobre o mapa pousado logo abaixo, ainda visível por conta da transparência da folha a qual Frisk usava. Erguendo apenas um pouco de seu olhar por alguns segundos para ver quem estava a seu lado, apesar de perfeitamente reconhecer a voz, ela logo respondeu:

— Um pequeno mapa rebuscado das passagens subterrâneas da cidade. Dee-dee me pediu uma ajuda em uma entrega e acho que essa seria a melhor maneira de chegar até lá.

— Vias subterrâneas? Algo assim existe na cidade?

— Foram criadas durante a época da lei seca, usadas por muito tempo para contrabandear bebidas e outros produtos para dentro e fora da cidade, bem parecido com o que teve em Las Vegas, apenas com um pouco menos de uso. São bem simples apesar de parecerem um labirinto de catacumbas assombrado. Eu não costumo usá-lo muito, prefiro os telhados que dão uma boa visão da cidade, mas para o trabalho que Dee-dee precisa os tuneis são mais aconselháveis e mais rápidos.

— E como descobriu algo assim? Quero dizer, ninguém mais deve lembrar dessas passagens ou como não se perder.

— Digamos que, literalmente, eu cai encima desse segredo. - a duvida ainda mantinha-se no rosto do albino, pedindo por mais explicação do que apenas isso. Por tal, Frisk continuou seu conto: - Tinha ido para fora da cidade naquele dia, apenas queria ver o céu estrelado sem a interferência das luzes dos prédios e postes. Não fui muito longe, uns quinhentos metros talvez, tinha um pequeno buraco, grande o suficiente para uma única pessoa adulta passar, tampado por montes de terra e alguns pedaços quebrados e velhos de madeira. Para quem não está prestando atenção onde anda é bem fácil de cair. Quando percebi, já estava no fundo, rodeada por paredes feitas de blocos de pedra indo até onde poderia ver, o que não era muito porque estava bastante escuro. Precisei de alguns dias para explorá-los por completo, alguns dão direto para lojas ou casas mais antigas. Foi divertido.

Isso foi há várias linhas do tempo, uma boa emoção momentânea que durou mais tempo do que imaginava. Os tuneis não percorriam toda a extensão da cidade, principalmente por ela ter crescido desde a época em que eles haviam sido construídos, sem falar de boa parte deles irem de encontro ao esgoto ou rede de tratamento da cidade. Frisk perdeu a conta de quantas vezes se perdeu neles.

— Oh! Isso que chamo de cair na solução. Você não parece o tipo de pessoa que tem um queda por exploração. - Sans zombou, fazendo Frisk deixar escapar um pequeno bufo divertido enquanto continuava concentrada em seu desenho.

Não era a primeira conversa tranquila que tinham, sem flertes ou tensão sexual escapando pelos poros, mas talvez fosse a primeira nessa linha do tempo em que Sans falava sem manter uma distância "segura" da garota. Ele não era o tipo de pessoa que gostava que invadissem seu espaço pessoal sem sua permissão, a única vez que realmente mantinha-se em um contato intimo com alguém era quando tinha algum tipo de intenção maliciosa por detrás. Mas dessa vez não foi assim e nenhum dos dois ligou.

Frisk estava demasiadamente acostumada com a proximidade de Sans. Para ela, quando não tinha que manter toda sua força de vontade para resistir aos impulsos de seus hormônios e saudades corporais, sentia-se confortável na presença do mais velhos dos irmãos, recordando linhas passadas nas quais dividiam uma bela amizade ou mais do que isso. Para Sans foi uma simples distração. A conversa era confortável, não sentia ameaças ou restrições que pudessem impedi-lo de se aproximar como quando estava na presença de outras pessoas as quais conheceu dentro do mundo sombrio no qual era forçado a viver. Frisk tinha uma aura acolhedora, relaxante, tão convidativa que era demasiadamente complicado resistir e, sem saber ou se quer perceber, o corpo de Sans sentia-se acostumado a manter-se ali.

Um reflexo remanescente de outras linhas? Uma memória escondida em seu subconsciente? Não se sabia.

 Era simplesmente fácil para os dois manterem-se na presença um do outro, fato que não agradava os que haviam desligado sua atenção da partida em si para recair sobre o casal afastado na mesa reservada para o grupo de amigos.

Chara definitivamente não engolia essa história de que os dois haviam se conhecido naquele dia. Frisk não sabia fingir e Chara a conhecia demasiadamente bem para perceber o conhecimento em seus olhos e em suas ações. Sans, por sua parte, denunciava-se pela forma como a tratava, calmo e tranquilo, olhares desconfiados sim, mas com menos foco e atenção como costumava ter com alguém que acabava de conhecer.

Ela sabia, ela tinha certeza, que existia algo que não lhe foi dito, o qual havia passado despercebido por sua vigilância e com toda certeza não lhe agradava nem um pouco. Ela tinha que saber, tinha que descobrir o que era guardado longe de seus olhos. Ela ainda tinha que ter o controle.

Afastando-se um pouco, dando a desculpa a Asriel que percebeu a sua escapada de que iria ao banheiro, escondeu-se em um lugar onde ninguém poderia lhe ver ou escutar. O telefone marcou um numero pré determinado em sua tela e instantes depois ele estava sobre sua orelha, marcando o som compassado da chamada em espera, não demorando muito tempo para ser atendida.

— Encontraram alguma coisa? - perguntou, antes mesmo que a pessoa do outro lado da linha tivesse alguma chance de começar a falar.

—  Conseguimos alguns boatos, minha Rainha. Não sabemos ao certo de sua veracidade ainda, mas...

— Parem de enrolar e desembuchem logo o que descobriram ou arranco a cabeça de cada um de vocês! Eu disse que a pesquisa era para ontem! - esbravejou, fúria bem demarcada em sua voz. Do outro lado da linha a pessoa estremeceu em puro pavor, agradecendo mentalmente por não estar frente a frente com a famosa Rainha de Copas.

B-bem... F-ficamos sabendo de uma nova integrante da rede de transporte. Sem fotos, descrição física precisa ou relatos de algum desentendimento com outras gangues, dizem que usa uma rota alternativa para fazer as entregas que consegue passar despercebida. As pessoas da gangue a apelidaram de Anjo por causa de seu temperamento leve e recusa a lutar, sem falar da forma com que...

— Já é o suficiente. - interrompeu, mãos apertando o aparelho o qual carregava. Os pontos estavam ligados, a resposta estava ali, não tinha como negar. - Preparem as armas. Nosso acordo com os Sombras da Noite pode estar definitivamente desfeito. - a chamada foi cancelada, antes mesmo que pudesse ter uma resposta, olhos vermelhos queimando em uma fúria colérica de assustar, a sede de sangue exalando enquanto o sorriso desenhava-se em seu rosto. - Eu vou ter a cabeça do ceifador.

Duas partidas já tinham ido, Chara e Undyne haviam ganhado a primeira enquanto Mettaton e Papyrus a segunda, a terceira havia começado com toda a determinação de vitória de alguns participantes, com uma disputa acirrada entre as duas duplas vencedoras das partidas anteriores disputando o primeiro lugar com pontos extremamente próximos, sua empolgação contagiando os outros que prontamente se juntavam as gritarias e disputas exageradas.

Frisk apenas quis uma pausa, um momento para tomar alguma coisa e descansar de toda essa animação sufocante e acalorada. Escorregando para a lanchonete, sentou-se em um dos bancos dispostos próximo a um balcão de atendimento, uma lata de Coca-cola na mão e pernas erguidas pelo banco alto, suspiro pesado a escapar de seus lábios ainda ostentando um sorriso. Poucos minutos depois, assim como bem poderia prever, Sans estava sentado a seu lado, lata de cerveja na mão e um pacote de batatas fritas bem molhadas em ketchup na outra.

— Cansada da animação? - perguntou despreocupado.

— Apenas querendo alguma coisa para beber. Eles podem ser bem elétricos às vezes. Seu irmão principalmente.

— Ele é incrível, não é?

— Com toda certeza. Mas você também é, acho impressionante como ele pode tomar tanto cuidado com você sendo que é o mais qualificado para colocar todos no chão.

— HP baixo. Sempre leva as pessoas a pensarem que não sou capaz de fazer um bom estrago. É melhor assim. - a lata de cerveja foi levada a boca para um longo gole, em seguida a conversa continuou. - Aliás, agradeço por não dizer nada a Pap.

— Não é meu segredo, não tenho nada haver com o que você conta ou não para sua família. - Frisk deu de ombros, tentando parecer indiferente. Não era fácil, se ela fosse admitir, manter-se de boca fechada. Ela acreditava que Pap, assim como Gaster, tinham o direito de saber o que Sans escondia, o que ele era e o que ele fazia. Mas também compreendia o medo do rapaz de contar. - Mas você sabe, Pap não é tão bobo quanto parece, uma hora ele vai desconfiar e vai tentar achar a verdade e tudo vai ser pior.

— Não é da sua conta. - outro profundo gole na cerveja. Frisk apenas tentou disfarçar a decepção e tristeza, ela não entendia porque ainda tentava retirar alguma verdade de Sans, ele nunca a contaria. - Mas e você? Tem a vida perfeita, dinheiro, uma família amorosa, tudo de bom e do melhor... Por que se enfiar no meio de toda essa merda? Por que jogar sua vida fora? O que você vai ganhar com isso? Você nem ao menos tem a capacidade de machucar alguém! Vai acabar morrendo antes mesmo de perceber, jogada em um beco qualquer dessa maldita cidade sem que alguém saiba! Ou antes disso vai finalmente ceder a podridão do lugar e se tornar mais uma viciada moribunda jogada nas ruas a procura de mais dinheiro para pagar as drogas! Por que alguém como você se meteria em uma coisa dessas sem interesses por trás? O que você quer?

— Fico feliz que se preocupe comigo e com o que faço da minha vida, Sans, mas não acho que você esteja realmente preocupado com o que eu quero ou estou fazendo. - Frisk suspirou com tristeza, pela terceira vez repetindo essa conversa. Sans abriu a boca para retrucar, no entanto, Frisk logo interpor-se em sua fala, continuando seu discursos: - Você já percebeu, porque eu sei que você me observa mais do que deveria, seja por desconfiança ou simples interesse sexual, o que seja, que eu não sou a pessoa que inicialmente você pensou que eu seria. O fato de eu conhecer seu irmão foi um dos vários motivos que te levaram a me deixar entrar no "seu mundo", assim poderia manter seu olho sobre mim. Mas, você reparou que eu não quero confusão, eu não usaria, não teria coragem de usar, o que sei sobre outras pessoas para o meu próprio benefício, assim como não teria coragem de machucar alguém. O motivo de eu estar na gangue é complexo de mais, você não acreditaria ou simplesmente não entenderia. O que você realmente quer é que, jogando palavras certas contra mim, eu jogue o que você quer ouvir sobre você.

As mãos do albino tremeram em seu aperto sobre a lata, batatas esquecidas na outra mão. Frisk voltou seus olhos dourados para ele, prendendo os azuis sob seu domínio o qual sabia que ele dificilmente poderia escapar. Ela o encararia, durante todo seu discurso, para que sentisse toda a potência de suas palavras sinceras. Poderia ter repetido esse discurso três vezes, mas repetiria mais mil se isso ajudasse a aliviar a carga de auto-ódio que Sans insistia em colocar sobre seus próprios ombros.

— Você quer que, alguém como eu, que não mata, que não machuca, que aparentemente não tem pecados, julgue alguém como você que, durante tanto tempo, tem se escondido nas sombras da ilegalidade, assassinando e traficando, comandando em mãos de ferro, talvez pelo medo, outras pessoas mais fracas que você. Mas, Sans, eu não tenho o poder de te julgar, eu não posso fazer isso, porque não cabe a mim esse direito. Eu não sei seus motivos, seu passado, presente ou futuro, eu não passei pela sua dor, por sua pele para entender o que você faz. Sim eu discordo de muitas coisas, não acredito que a violência seja a melhor solução e que sempre temos mais de uma escolha, mas eu não sei o que te levou a escolher o caminho que você anda agora. - um sorriso singelo se desenhou nos lábios da morena, olhos dourados tornando-se mais velhos e sábios do que realmente deveriam ser. Sans estava congelado em seu lugar, apenas a escutar. - O único que pode julgar suas ações, Sans, é você mesmo. Apenas você sabe o que passou, sua própria história, apenas você pode dizer se o que você faz é certo ou errado. Repensar todo seu passado e voltar a encontrar a si mesmo. O que você quer de mim eu não posso dar.

Em um pequeno salto Frisk estava de pé, pronta para afastar-se. No entanto, ela ainda não tinha terminado.

— Ainda assim, eu não acredito que você é a pessoal cruel a qual você quer se passar. Posso não ter entrado nesse mundo há muito tempo, mas ainda tenho meus ouvidos para escutar e meus olhos para ver. E o que eu percebi, o que eu vi e ouvi, são exatamente as coisas que você deixou passar por estar mergulhado em seu auto-ódio, no pesar dos seus pecados. O que eu vi foi a esperança, a alegria e a lealdade daqueles que você ajudou, da bondade que você teve para pessoas que não tinham nenhuma relação com você. Uma nova chance, um novo sonho, uma nova vida. Obviamente não foi de forma tão aparente, mas ainda foi sentido por quem deve sentir. Seu próprio arrependimento e dor sobre as coisas que você acha que fez de errado, também mostra seu bom caráter, a bondade que você tenta não demonstrar. - a vontade era de encostar, segurar-lhe a mão e dizer cada palavra com calma e carinho. Mas aquela não era a linha do tempo certa para tal. Eles precisavam de uma certa distância, a proximidade era tão acolhedora quanto dolorosa. Pelo menos para Frisk. - E sei que não vai acreditar em mim quando me oferecer para ajudar, para ouvir, mas quero que saiba que estarei sempre disposta quando precisar de um desabafo. Todos precisamos de um amigo, guardar segredos de mais pode não ser muito bom para nossas almas. - uma de suas mãos apertou o peito, por sobre o coração, o calor de sua alma logo abaixo de sua palma. - Eu compreendo melhor do que imagina, Sans. Eu também sei o que é estar na pele de um assassino.

Sem dizer mais nada, virando-se com a ajuda de seus calcanhares, Frisk pôs-se a ir embora, deixando para trás o albino completamente perdido, pensamentos conturbados a açoitar-lhe os pensamentos como um furacão em fúria. Ele estaria perdido por um tempo, procurando respostas as quais eram difíceis de conseguir, lutando contra seus próprios demônios para tentar entender o que ela havia falado. Durante um tempo ele a ignoraria, Frisk bem sabia, e então ele passaria a procurá-la, curioso e tímido, ainda bambeando por sobre o muro de suas decisões, entre a desconfiança e a credibilidade em suas palavras. Ele começaria a se abrir, a falar, eles conversariam, o desejo sexual deixado de lado por um tempo para abrir espaço a um desejo sadio por um amigo.

Era tudo que Sans precisa, alguém em quem pudesse confiar para guardar seus segredos e magoas. Alguém que ele não temesse que fugiria, que o acusaria, que usaria aquele conhecimento contra ele. Frisk acreditava nisso.

Normalmente, depois dessa conversa, ela voltaria a confusão de amigos a jogar boliche, aproveitaria um pouco mais da loucura daquele dia antes de finalmente poder ir para casa. Todas as linhas do tempo anteriores foram assim. No entanto, dessa vez, ela escolheu diferente.

Ainda um pouco afetada pela anterior conversa, Frisk preferiu seguir para fora do estabelecimento a procura de um ar para respirar, alguma coisa para refrescar seus pensamentos e poder se acalmar para voltar. Ela não sabia ao certo no que isso poderia mudar no cronograma, mas não importava também. De qualquer maneira tudo voltaria ao começo e qualquer mudança não valeria mais do que breves momentos de satisfação.

E, novamente, por uma questão de pequenas mudanças, Frisk caia em mais segredos, em mais variantes na personalidade ou vida que acreditava conhecer perfeitamente bem sobre seus amigos.

Papyrus sempre foi uma pessoa gentil, seu jeito infantil o faziam parecer bobo e um pouco idiota às vezes, aqueles que o conheciam mais profundamente sabiam como ele poderia ser esperto a sua maneira, observador e dedicado. Mas até então, Frisk nunca tinha visto muitas mudanças de sua personalidade para outros universos os quais deveriam formar sua alma fundida. Todo seu jeito de ser era idêntico ao Papyrus que conheceu no universo do qual havia derivado sua mente, Frisk nunca tinha parado para pensar mais a fundo que, talvez, Pap pudesse esconder detalhes de si mesmo assim como Sans.

Quando Frisk saiu para o lado de fora do hotel ela prontamente havia se deparado, não muito longe dali, um pequeno grupo de cinco homens, visivelmente alterados de alguma forma por seus movimentos cambaleantes e impulsivos, assediando uma assustada mulher, empurrando-a para dentro de um dos becos próximos ao lugar. Não precisava ser um adivinho para saber exatamente o que estava acontecendo e Frisk não poderia, de forma alguma, deixar que simplesmente corresse sem fazer nada.

Deu passos pesados e apressados na direção do beco, pouco a pouco conseguindo escutar as risadas e comentários sujos e lascivos, ao igual que os pedidos chorosos da mulher que havia sido encurralada, muito provavelmente assustada e desesperada. No entanto, quando Frisk estava bem próxima a entrada do beco uma voz demasiadamente conhecida veio por sobre as que já existiam no lugar, mais baixa do que costumava escutar, mas definitivamente a mesma.

— Vocês não deveriam fazer isso. - baixa, muito mais baixa do que verdadeiramente deveria ser, seu tom vindo em um alerta perigoso o qual Frisk nunca tinha escutado antes nesses universo. A pressão mágica veio em seguida, tão semelhante a de Sans, apesar de em menor quantidade. Ela facilmente poderia ser comparada a intimidante aura de Gaster e Sans, muitas vezes quando estavam com raiva, mesmo que tivesse um toque diferente, bastante pessoal, o que a tornava unicamente da pessoa que a estava usando. A respiração de Frisk parou no meio de seus pulmões, corpo pregado a parede bem ao lado da entrada do beco. - É errado tratar uma garota dessa maneira.

— E quem é você para nos dizer o que fazer, garoto?! - provocou, provavelmente, um dos homens, erguendo-se desafiante mesmo com a ameaça mágica que vinha do novo envolvido na confusão. Frisk arrastou-se para mais perto da entrada, mãos tremendo, esticando a cabeça para espiar o que se passava dentro do beco.

— Não sou mais do que um passante, mas não posso permitir que façam uma coisa desse tipo. - a pressão aumentou, os homens cambalearam para trás, a mulher caída de joelhos ao chão encarando seu salvador sem saber se sentia ainda mais medo ou gratidão. Olhos alaranjados reluzindo como chamas revoltosas no meio da noite dentro da penumbra que era o lugar. - É nojento.

Um dos homens se precipitou para trás, assustado, tropeçando e caindo sobre seu traseiro enquanto ainda tentava arrastar-se para longe. E ninguém poderia culpá-lo por seu estado de pânico, qualquer um estaria em seu mesmo estado se estivesse em seu lugar. Talvez fosse um mal da família ser tão dotado em magia, apesar de não ser tanta como as de seu irmão e de seu pai, ainda era o suficiente para mostrar-se superior a muitas outras pessoas.

Frisk, definitivamente, nunca havia visto tal forma de Papyrus. Pelo menos não aqui, não nesse universo. Mas deveria ter presumido, existiam muitos outros em que Pap era mais ou igual em força do que Sans, talvez até mesmo em todos, mas nunca utilizasse de toda sua capacidade pelo simples fato de não gostar de machucar, de simplesmente querer amigos. Ele escondia uma incrível capacidade de se defender, o que tornava um pouco ilógico toda a proteção que Sans lhe dava.

O que tinha feito Pap tão furioso? Por que aquela situação era diferente de outras? Ela sempre aconteceu em outras linhas do tempo?

Provavelmente. Frisk sempre ficava no interior do prédio até o momento de irem embora e bem se recordava de Papyrus afastar-se por alguns minutos, não cronometrados, retornando como se nada tivesse acontecido e fosse apenas uma ida ao banheiro.

Então era isso que tinha feito? Por que?

— Senhorita, poderia ir? Eu tenho uma pequena lição a ensinar para esses... Senhores. - sem pensar duas vezes a garota correu para fora do beco, murmurando um leve agradecimento por sobre sua respiração para em seguida saltar para a rua, correndo o máximo que podia, nem ao menos reparando na presença de Frisk espiando bem quietinha por trás de um dos muros. - Agora, por que não ensino a vocês como tratar de verdade uma garota?

Não poderia chamar o que se seguiu de uma luta. Pap tinha tudo completamente sob o controle de sua magia, nenhum dos homens tendo realmente uma chance contra ele, sendo que o enorme albino nem se quer havia movido-se de seu lugar. Pap poderia ser assustador, Pap poderia ser forte e poderia facilmente machucar. Sua alma balanceada entre a piedade e a luta reagia de fora violenta para o que desagradava, mas nunca passava para o assassinato.

Os homens tinham ficado atordoados, jogados ao chão machucados e doloridos, alguns sangrando, mas todos vivos e com garantia de recuperação. Pap se erguia perto deles, observando imparcialmente o estrago que tinha feito, seu sorriso desaparecido de seu rosto, olhos ainda reluzindo na penumbra do lugar. Frisk não saberia como descrever o que viu, talvez mais uma surpresa, um detalhe esquecido, em sua enorme lista.

De repente Papyrus ergueu o olhar, expressão surpresa desenhada em seu rosto enquanto procurava alguma coisa pelo beco e Frisk se amaldiçoou em seguida, esquecendo-se por completo de sua própria magia que, mesmo sendo ainda pequena e fraca por manter tantos objetos conectados a si, ainda era forte o suficiente para ser detectada, para ser sentida. E, sem esperar, Frisk deslizou para longe, escondendo-se dentro do prédio que formava o Hotel Mettaton, de um jeito que ainda poderia espiar pela porta de vidro da entrada, Papyrus parado agora fora do beco a procurar alguma coisa não existente ao seu olhar.

Frisk poderia jurar que ele havia formado, de maneira lenta, seu nome no mover pensativo e confuso de lábios. Mas isso não seria possível, Papyrus não sabia que Frisk tinha magia, não sabia sobre seus poderes ou qualquer coisa do estilo, não tinha como identificá-lo. O albino logo balançou a cabeça, um suspiro pesado deixando seus lábios enquanto os ombros caiam, visivelmente cansados. Ele havia desistido de sua busca e apenas apreciava um pouco da brisa do final de tarde.

Momentos depois Mettaton passava pela entrada, tão próximo de Frisk que a garota quase jurou ter sido notada. Ele assomou-se para fora, chamando por seu namorado com um enorme sorriso em seu rosto, prontamente sendo atendido com toda a alegria que o Pap que Frisk conhecia poderia brindar.

O acontecimento tinha caído no esquecimento não muito tempo depois, para retornar quando Frisk estava de volta a sua casa, trancada no porão a fazer suas anotações.

Deveria ter algum motivo para Pap ter deixado-se levar por sua fúria e indignação. Poderia ter sido a possível ameaça de estupro? Claro, muitos homens, assim como mulheres, sentiam nojo e rancor contra essa prática, ela era quase inominável nos tempos atuais e bastante condenável com toda a razão. Mas isso poderia levar realmente alguém aparentemente dócil a tal explosão violenta? Frisk compreendia a quantidade de magia que Pap tinha, mas aquela "briga", se é que poderia chamar algo tão unilateral de briga, tinha sido completamente aquém de Papyrus. De seu melhor amigo, de seu irmão...

Talvez... Agora que Frisk realmente pensava Sans também ficava furioso com tal prática, fora de si, tanto que matar o praticante não parecia afetar-lhe nem um pouco. Era uma semelhança entre os dois irmãos, mas a que se derivaria? Da onde todo esse ódio havia surgido? No que ele afetaria?

Existiam muitos detalhes ainda a serem revisados, anotados e novamente avaliados.

Sans e Undyne. Papyrus e seus atos violentos as escondidas. Existia muito mais por trás daquele universo, toda uma história, do que um mundo feliz. Nenhum mundo era perfeito e esse também teria suas cicatrizes.

Frisk os descobriria... Com o tempo, pois isso era o que não lhe faltava.    


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Notas finais do capítulo

Ooops. Quem estava esperando treta com a chara?
Avisando galera, eu não tenho certeza se Fusion realmente pode ter uma continuação ou não depois que essa fanfic acabar. Ainda assim eu tenho algumas ideias e estou deixando algumas pontas soltas nessa história para serem abordadas na seguinte (caso tenha, isso é com vocês). Por isso algumas teorias podem acabar saindo pela culatra (por enquanto). Mas é vocês que vão dizer se realmente vão querer uma continuação ou não, para isso podem esperar o final da fanfic, falta muito ainda. Vão ser cerca de 65 capitulos, eu to com o cronograma pronto, mas tem alguns que eu estou com medo de se dividirem em dois.
Oh e deem uma olhada na fanart linda que fizeram para o capitulo passado! Definitivamente perfeita:
http://imgur.com/a/TXNMQ
Bem, é isso, obrigada por ler, espero que tenham gostado. Novamente o próximo é duplo, então esperem um capitulo de manhã e outro a tarde.
Até~! Mantenham-se determinados!