Eu, Meu Noivo & Seu Crush — Thalico escrita por Helly Nivoeh


Capítulo 6
"É como jogos mortais, só que mais legal e mais mortal."


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Narração: Nico di Ângelo

 

— Não acredito que você mudou de ideia! — Não precisei olhar pra saber que Jason abraçou a irmã, provavelmente sufocando-a contra sua armadura.

 Nós estávamos no refeitório quase vazio, acertando os últimos detalhes e nos preparando para a batalha com um milhão de anotações e mapas em cima da mesa de Hades, quando Thalia entrou com um sorriso nervoso, as botas de combate fazendo os passos ecoarem chamando atenção.

 Desviei meu olhar de cima da mesa e a observei vir até nós de queixo erguido, notando a tiara de tenente perfeitamente encaixada nos cabelos negros, mas completamente discrepante da calça legging preta, a cinta na cocha direita contendo o spray que se tornava uma lança, os equipamentos de proteção de arqueiros nos braços junto ao bracelete que se tornava aegis, e toda a maquiagem escura. Thalia parecia um punk que havia roubado a coroa de alguma princesa.

 — Eu precisa respirar. — Ela murmurou antes de ser solta e suspirar dramaticamente. — São poucas as chances de lutar do lado do meu irmãozinho, não podia perder essa. — Ela bagunçou os fios loiros do irmão, e eu dei um sorriso ao perceber que, pra isso, ela tinha que ficar na ponta dos pés.

 — Por que você mudou de ideia mesmo? — Perguntei e ela se virou pra mim com um sorriso sarcástico.

 — Como eu disse, Di Ângelo, são poucas as chances de lutar ao lado do meu irmão. Se isso te incomoda, você pode ir quando quiser. — Alfinetou.

 — Sem chance, Grace. Você não sabe quanto tempo ficamos preparando isso. Esse tem que ser o melhor caça a bandeira! — Retruquei. De maneira nenhuma iria desistir daquele jogo, a expectativa da batalha até havia me roubado algumas noites de sono em que fiquei pensando em estratégias.

 — E porque tanto entusiasmo na batalha de hoje?

 — Porque é óbvio. — Respondi, e Thalia ergueu a sobrancelha sem entender.

— Como?

— O que Nico quis dizer, — Jason interferiu. — É que nossas estratégias são bem óbvias, você não acha? Vamos colocar nossa bandeira no alto porque eu sei voar e os filhos dos deuses do vento também. Os semideuses de Hermes e Hefestos vão encher de armadilhas a floresta e tentar chega até a bandeira. A outra equipe vai mandar alguns filhos de Apolo pra tentar nos derrubar enquanto voamos, os filhos de Ares e Atena vão na frente, combatendo na floresta. E eles vão esconder a bandeira em um lugar cheio de plantas para Deméter, Dionísio e Perséfone protegerem. É bem óbvio.

— E vocês estão preparando surpresas, não é? — Em resposta à Thalia, olhei para Jason que devolveu na mesma forma, meu cúmplice concordando que era bom deixar alguns detalhes de fora.

— Nós também temos algumas mudanças nas regras. — Expliquei, sem querer que Thalia repetisse a pergunta anterior. — O riacho não é mais o limite. Podemos usar os campos de morango agora. Além de alguns lugares que normalmente treinamos… — Sorri, deixando óbvio o que faríamos: — Como a parede de escalada.

— Espera! Vocês estão me dizendo que vão colocar nossa bandeira em cima de um lugar que solta larva?

— E eles vão colocar a bandeira deles nos campos de morango. — Dei de ombros. — O que é o mesmo que colocar em um campo minado: Uma plantinha morre e Dionísio acaba com a gente. É como jogos mortais, só que mais legal e mais mortal.

— E por que vocês estão tão felizes com isso? Vai ser impossível pegar a bandeira deles! — Thalia olhou para nós como se fossemos loucos.

Caminhei em sua direção com um sorriso sarcástico, a ponto de ficar a poucos centímetros da Filha de Zeus. Pude sentir sua respiração se acelerar, os olhos azuis destacados pela maquiagem forte tentaram desviar meu olhar, seus lábios ficaram entreabertos em surpresa, e eu me aproximei mais, quase encostando nossos narizes, fazendo com que ela fixasse os olhos em mim.

— E quem disse, Grace, — Comecei, fazendo minha voz soar rouca e causar um arrepio em Thalia, que tremeu quase imperceptivelmente. Desviei o rosto do seu e me aproximei mais, falando em seu ouvido quase num sussurro: — Que queremos a bandeira?

Ainda sorrindo, me afastei, divertindo-me ao ver Thalia sem fala por alguns segundos. Eu sabia que era intimidante, e deixar ela desestabilizada era algo prazeroso.

— Nã-não...— Ela gaguejou, antes de pigarrear pra falar mais forte. — Não é esse o objetivo do jogo?

— Nós vamos conseguir a bandeira, Thalia. Mas essa é a parte mais fácil. — Dei uma piscadinha e voltei minha atenção para as anotações que estavam espalhadas na mesa.

— Achei que essa fosse a parte impossível.

— Nós temos Nico. — Jason falou divertido diante da cara de confusão de Thalia. 

— Eu trouxe a Atena Parthenus dá Grécia, acha que não consigo trazer um bandeira do outro lado do acampamento? — Expliquei, ainda sem olhá-la

— Mas vocês não vão fazer isso.

— E onde estaria a graça, Grace? — Jason soltou uma gargalhada diante do meu péssimo trocadilho.

— Na sua piadinha, com toda certeza, não está. E eu? O que faço?

— Ela poderia ficar com você, Jason. — Olhei pro meu amigo que balançava a cabeça pensativo.

— Acho melhor não. Eu realmente adoraria, mas acho que Thalia está mais acostumada com facas e espadas, não é?

Ela balançou a cabeça concordando, e antes que Jason completasse, sabia que ia sobrar pra mim. 

— Acho melhor ela ficar na linha de frente. Pode ser, Thalia? — Ela balançou a cabeça em um “sim”, me fazendo adverti-la:

— Isso significa que agora você quem vai seguir minhas ordens.

 — Vai nessa, Di Ângelo. — Retrucou.

 — Ou você pode ficar voando igual as sininhos. — Jason me fuzilou com os olhos quando eu disse isso.

 — Você tá na defesa? — Thalia perguntou pro irmão, mas fui eu quem respondi.

 — Nós não temos uma defesa, Grace. Agora vamos, está na hora de fazer alguns semideuses chorarem.

 

(...)

 

— Vai me contar o que estão preparando? — Thalia perguntou enquanto nos embrenhávamos pelo bosque, eu ia na frente e ela me seguia tentando quebrar o silêncio. O jogo ainda não havia começado, restava alguns minutos antes da primeira corneta soar convocando os campista para começar logo após o pôr-do-sol. Entretanto, havia algumas coisas que precisava fazer, infelizmente, precisava que alguém me ajudasse, e como Cecil havia ido parar na enfermaria, tive que me contentar com Thalia Grace, aproveitando pra fazer o que Will me pedira: Tentar ser legal com ela, ou, pelo menos, aturá-la.

 — Não. — Respondi, quebrando um galho seco ao pisar. Parei de andar e senti a Grace trombar nas minhas costas. Uma descarga elétrica passou pelo meu corpo enquanto ela exclamava um “ai” e se apoiava em mim pra não cair.

— Por que você parou de uma vez? — Não respondi, olhando pra cima e em volta, identificando as árvores. — Você se perdeu? Por favor, não diga isso.

 — Achei que as caçadoras vivessem na floresta. — Argumentei, virando-me pra ela.

 — O problema não é me perder em uma floresta. É você estar nela. — Sorri, sem me deixa afetar e lhe ofereci minha mão. Ela me olhou franzindo a testa, sem entender

 — Aqui começam as armadilhas. Você precisa segurar minha mão e pisar exatamente onde eu pisar. — Expliquei e ela hesitou. — Francamente, o que você acha que eu poderia fazer?

 — Sinceramente? Podia me levar pro Japão e me deixar por lá.

 — Realmente. — balancei a cabeça. — Eu podia dizer pra Jason que você resolveu voar por aí à procura do Tarzan.

 — Isso ajudou muito.

 — Vamos, Thalia. — Ela respirou fundo e pegou minha mão. Assim que seus dedos encostaram nos meus senti novamente um choque, que fez meus batimentos acelerarem e os pelos do meu braço se eriçarem. — Por que toda vez você tem que me dar um choque?

 — Não é por querer. E saiba que não é o único que leva.

 — Você dá choque em todo mundo?

— Eu também levo choque quando encosto em você. — ela explicou revirando os olhos. — Deve ser alguma coisa entre Zeus e Hades. Agora podemos ir? Não quero ficar o dia todo segurando sua mão. 

Assenti e senti minhas bochechas queimarem. Virei o rosto e dei um passo, olhando de soslaio e percebendo que não era o único vermelho ali. Pisei no locais seguros, puxando Thalia comigo.

— Por que estamos andando em círculos? — Ela perguntou depois de um tempo.

— Nós criamos uma nova passagem pra atravessar o riacho e ter uma visão melhor. Mas isso é obra dos chalés de Hermes e Hefestos, então é difícil de achar. — Respondi, encontrando a árvore certa.

— Sabe escalar árvores? — Sem esperar resposta, soltei a mão de Thalia e comecei a subir na planta, me apoiando nos galhos com cuidado.

— O que você está fazendo? — Ela gritou com raiva e a vi me encarar nervosa.

— Vamos, Grace. Vou te deixar aí se não subir logo.

Ela me xingou e começou a tentar se escalar, escorregando e praguejando. Esperei que me alcançasse, e voltei a subir lentamente enquanto a via tentar segurar exatamente onde apoiei. Me embrenhei por entre as folhas que escondia a escada e subi rápido, chegando até o apoio que haviam construído, e ajudei Thalia a subir. Assim que toquei suas mãos, percebi que ela estava gelada e escorregadia de suor. Ajudei ela ficar de pé notando como ofegava e estava trêmula.

— Achei que as caçadoras tivessem um preparo físico melhor. — Brinquei. Entretanto, me arrependi ao notar como Thalia estava pálida. — Você está bem? — Ela balançou a cabeça e se virou de costas pra mim, olhando o caminho que havíamos subido. Vi a filha de Zeus cambalear e a puxei pela barriga, antes que pudesse cair. — Thalia! — chamei, fazendo ela gemer em resposta. — Você está bem? — tentei novamente, sabendo que a resposta era não.

Mantive meus braços ao redor do seu corpo enquanto ela se virava.

— Foi só uma tontura, já estou bem. — sua voz sou trêmula e fraca, enquanto ela olhava pro chão.

— Tem certeza? — Perguntei.

— Po-pode me soltar. — Gaguejou e eu o fiz. — E agora, Di Ângelo?

— Temos que atravessar uma ponte aqui em cima. Ela é segura, não se preocupe. — Thalia assentiu ainda de cabeça baixa.

— Por que você não vai pelas sombras? — questionou.

— Vêm. — estendi novamente a mão, sem responder. Não seria muito seguro dessa forma, mas estava preocupado que Thalia desmaiasse. Ela segurou minha mão com força, fazendo a eletricidade passar mais forte pelo meu corpo. Ignorei a sensação e comecei a afastar os galhos que tampavam a escada, aproveitando para pegar o pequeno frasco branco escondido entre as folhagens.

Os semideuses haviam construído uma pequena ponte de madeira, com tábuas irregulares e pintadas em tons de verde e marrom, estreita o suficiente para só ser possível passar em fila indiana, com muitos galhos e árvores em volta, tentando ser o menos visível possível. Haviam escolhido o local com mais árvores ao redor do riacho e com vegetação mais densa, o que facilitava a camuflagem, mas dificultava a travessia.

A vertigem me atingiu assim que pisei na primeira tábua instável da ponte. Puxei Thalia comigo, mas percebi que ela permanecia parada. Voltei para o apoio e me virei pra ela.

— Você quer voltar? Não me parece bem.

Ela balançou a cabeça em negativa, virando-a pra direita e apertando meus dedos, arfando. Dirigi meu olhar pro mesmo ponto e pude ver o chão em baixo de onde estávamos, percebendo enfim o que Thalia tinha.

— Você está com medo? — Perguntei um pouco impressionado, e ela levantou a cabeça pra me fuzilar com os olhos.

— Medo de altura?! Eu?! Claro que não! — Arregalei os olhos. O.k, havia percebido que ela estava com medo, mas não sabia de que.

— Você tem medo de altura?! — Gritei. Thalia tampou minha boca com a mão.

— Nunca mais repita isso!

Segurei na mão dela e afastei da minha boca.

— Mas você é filha de Zeus! É tipo, sei lá, Percy ter medo da água! Ou eu ficar com medo de cadáveres! Ou... — Ela tampou novamente minha boca antes que eu completasse.

— Eu já entendi que é uma vergonha, tá?! Não precisa me dizer. — Franzi a testa, percebendo como aquilo a incomodava. — Eu vou te soltar e você vai ficar calado, certo? — Balancei a cabeça que sim. Ela tirou a mão da minha boca e fiquei calado por alguns segundos antes de acabar falando:

— Por isso você não quis ir com Jason! Você tem mais medo disso do que me odeia! Caramba, isso é muito medo mesmo! Sabia que eu tinha medo de assombração quando era criança? Uma vez, depois que Bianca foi dormir, eu fiquei acordado vendo um filme muito estranho com duas bananas gigantes com roupa de presidiário que ficavam cantando músicas estranhas! Eu não consegui dormir por um mês inteiro e...

— Espera! — Thalia arregalou os olhos. — Você tinha medo de bananas de pijamas?!

Senti meu rosto esquentar.

— Eu era pequeno!

— Você invoca zumbis e tem medo de banana?!

— Cala a boca, Grace! Você pode voar!

Ela me encarou magoada e percebi que fui longe demais. Respirei fundo, me dando conta de que estávamos perdendo tempo.

— Foi mau. Eu não devia ter dito isso. Não é como se eu nunca tivesse tido medo de escuro também.

Tentei sorrir, mas ela permanecia de cara fechada

— Olha, nós temos que atravessar essa ponte. Sei que não vai ser fácil pra você, mas pode se segurar em mim, não vamos cair. Ou você pode voltar, posso dizer que brigamos e você não quis vir comigo. Todo mundo acreditaria. — Thalia deu um sorriso mínimo e suspirou.

— Eu não sou de fugir, Di Ângelo. Vamos antes que eu te jogue lá em baixo.

— Você confia em mim? — Perguntei e ela revirou os olhos. — Você pode fingir confiar em mim? — ela balançou a cabeça que sim. — Você me abraça. .. — ela abriu a boca pra reclamar, mas levantei a mão pedindo que esperasse. — Eu também não gosto disso, mas você com toda certeza vai travar ao ver a altura.

— Isso me motiva tanto!

— E tenta não olhar pra baixo enquanto atravessamos. Eu não vou te deixar cair e você não vai travar. O que acha?

— Por que não vamos pelas sombras logo?

— Se você topar eu te explico. — Ela suspirou.

— Mas você não pode contar isso pra ninguém!

Exigiu e assenti.

— Vem. — ela me abraçou por trás e encaixou a cabeça no pescoço, as descargas elétricas que emanavam dela fazendo meus pelos eriçarem.

Suspirei e pisei novamente na tábua instável, segurando no corrimão feito por uma corda. Tentei não olhar pra baixo e seguir adiante. Thalia deu um passo e pisou na tábua, arfando e me apertando contra si, as unhas apertando meu tórax, chegando a machucar.

— Você está segura. — sussurrei a acalmando. — Não vamos cair, mas se isso acontecer eu te levo pelas sombras pra algum lugar seguro antes de atingirmos o chão.

— Achei que não pudesse usar as sombras! — ela guinchou.

— Podemos seguir? — ela balançou a cabeça contra meu pescoço, no que imaginei ser um sim, e comecei a dar passos lento, sendo seguido. — Você se lembra de Melinoe? Quando enfrentamos ela no Mundo Inferior?

— E assim que você quer me distrair?

— Ela tem duas filhas gêmeas aqui no acampamento, Mirah e Ayla. Você iria amar Ayla, ela realmente me odeia por algum motivo que eu não sei e as duas são realmente assustadoras.

— Por que as garotas geralmente te odeiam? — ela perguntou baixinho, sua respiração no meu pescoço me deu um calafrio. — Elas estão no time adversário?

— Exatamente. Junto com algumas feiticeiras, então se eu tentar usar as sombras vou acabar preso em algum lugar.

— Acha que vão te mandar pro Tártaro?

— Não, vão me prender em algum lugar que Will escolheu.

— Como tem tanta certeza?

— Nós temos um espião infiltrado.

— Isso não deveria ser contra as regras?

— O outro time também. É como uma regra nova, temos que aprender a lidar com a possibilidade de sermos traídos por um dos nossos, saber em quem confiar e quanta informação deixar sair.

— Por que tudo isso?

— É óbvio, não? Não foi só Luke que traiu os olimpianos.

Percebi uma leve mudança na respiração de Thalia, algo que só percebi devido a proximidade, e ela apertou um pouco mais meu corpo, claramente nervosa com o assunto.

—Quem é o espião de vocês?

— Não sei. — Dei de ombros. A essa altura estávamos já no meio da ponte, onde a água cristalina batia nas pedras e criava uma linda paisagem com o sol quase se pondo.

— Achei que você e Jason estivessem no controle.

— As informações que temos são anônimas.

— Como sabem se não foram plantadas pelo outro time?

— Não sabemos. — Respondi, o que era verdade. As novas atividades do acampamento foram planejadas de acordo com todos os desafios das antigas guerras, foi preciso Gaia e Cronos para ensinarem aos gregos que era hora de mudar algumas coisas, e isso incluía ensinar que não se pode confiar em todos.

— Mas…

— Conseguimos. — falei ao pisar no apoio. Thalia suspirou e me soltou. Ainda estava pálida e trêmula, mas não tão assustada. — Viu? Não foi tão difícil.

Ela deu um leve sorriso, quase imperceptível.

— Agora só temos que descer.

Ela gemeu, não gostando da ideia.

— Isso é pior que subir.

— Vamos, Grace. É só não olhar pro chão, eu também tenho medo de altura.

— Você está inventando isso só pra me animar?

— Quando você quase cai em um vulcão e vê seus amigos despencando no Tártaro, você aprende como cair é perigoso.

— Sério, garoto, você realmente sabe como alegrar e motivar alguém.

Sorri para Thalia e comecei a descer a escada de costas, com cuidado em onde pisar. A altura considerável me dava vertigem, fazendo meus braços tremeram levemente.

Quando alcancei o último degrau da escada, havia ainda mais de três metros pra descer apoiando nos galhos.

— Thalia, pode começar a descer. — chamei, mas ela não respondeu. — Vamos! — tentei novamente e alguns segundos depois ela se inclinava para ver a altura.

— É muito alto! — ela reclamou.

— Você não vai cair. E se cair eu te seguro, eu já te disse.

—Ai vamos ficar os dois presos em algum lugar.

—Vamos acabar sendo presos aqui mesmo, se você não andar logo! — Reclamei, perdendo a paciência. — Já perdemos muito tempo! Anda logo!

— Eu vou descer aí só pra te dar um soco, Di Ângelo! — Ela ralhou e começou a descer de costas. Me balancei em direção ao galho da árvore pra terminar de descer. Quando Thalia chegou ao fim da escada, eu já estava no chão.

— Cadê o resto dessa escada?

— Você tem que descer pelos galhos.

— Quem foram os idiotas que fizeram isso?

— Os idiotas que fizeram isso não queriam que todo mundo descobrisse a escada.

Thalia xingou e alcançou o galho ao lado, contorcendo-se até apoiar os pés em outro ramo abaixo. Ela começou a soltar o galho de cima pra alcançar outro quando vi que isso não ia dar certo.

Antes que pudesse alertá-la, Thalia escorregou no ramo e caiu em cima de mim, jogando nós dois de costas no chão. Tentei até esticar os braços pra imitar os filmes e tentar segurá-la, mas seu corpo se chocou ao meu e nós dois fomos parar em meio a terra e plantas, gemendo de dor e xingando.

— Isso que você chama de me segurar? — a filha de Zeus ralhou, rolando pra sair de cima de mim.

— Nos filmes isso dá certo. — Murmurei. Mas é claro que nos filmes o cara é, no mínimo, duas vezes maior que a garota, e nesse caso, devíamos possuir quase o mesmo IMC.

— Nós não estamos em Hollywood, Di Ângelo.

— Essa foi uma bela queda! — uma voz rouca feminina falou, fazendo com que eu olhasse pro lado e visse Mirah e Ayla armadas prestes a nos matar.

Thalia se pôs de pé e fiz o mesmo, ajeitando a roupa.

— Por que vocês demoraram tanto? Estamos aqui desde o início. — Ayla continuou, os olhos castanhos passeando entre nós, enquanto ajeitava os longos cabelos cacheados.

 Ayla era uma garota de quinze anos com uma beleza assustadora, do tipo que te faz prender a respiração por alguns segundos ao vê-la pela primeira vez. A pele era negra, com olhos grandes e nariz fino, além do cabelo tão escuros como o céu à noite. Sua irmã, Mirah, não era menos bela, apesar da pele branca, os cabelos loiros e os olhos cinzentos serem oposto aos da gêmea, além dos lábios carnudos, os olhos menores e as bochechas altas tornar impossível imaginar que são irmãs. As personalidades também não poderiam ser mais discrepantes: Ayla era agressiva e se colocava sempre à frente, enquanto Mirah era doce, recatada e dor lar¹.

 — Estavam nos esperando? Achei que a brincadeira ainda não tivesse começado. — Sorri e Ayla deu de ombros.

 — Podemos esquentar um pouco. — Ela tirou do cano da bota uma adaga de ferro estígio, enquanto a irmã fazia o mesmo. Elas possuíam um sincronismo estranho, quase sempre lutavam juntas, mas agora pareciam ter que se dividir, o que tornava a batalha bem injusta para elas.

 Enquanto Ayla vinha em minha direção com um sorriso malicioso, vi Mirah avançar sobre Thalia, os olhos que normalmente demonstravam doçura expressavam puro ódio.

 Ayla investiu com a faca em direção ao meu pescoço, dei um passo para trás e segurei seu braço, impedindo que ela desse o golpe novamente, senti um soco no meu estomago e segurei sua outra mão. Eu odiava bater em garotas, mas a filha de Melinoe era esguia e rápida, era impossível ficar na defensiva muito tempo. Tentei chutar suas pernas pra que ela caísse, mas ela foi mais rápida e empurrou o corpo contra o meu, me fazendo dar um passo para trás, e em seguida começou a dar chutes, tentando soltar os braços.

 Empurrei-a para trás, soltando-lhe os braços, vendo que ela avançava novamente com a faca em direção ao meu pescoço. Tive que interceptar novamente com um braço, enquanto dava uma rasteira antes que me acertasse outro murro. Ela caiu de costas, aproveitando pra chutar minhas pernas também, mas consegui permanecer de pé e me afastar, sacando minha espada.

 Ela voltou a me atacar com a adaga, desta vez consegui pará-la com minha própria arma, usando o impulso e uma joelhada no estomago para afastá-la. Ela desfez o sorriso e me olhou ameaçadora, sacando outra faca da bota esquerda. Avançou como antes e fiquei me defendendo, aproveitando pra recuar estrategicamente em direção ao lago. Quando estávamos na beirada, sai da defensiva e fui pro ataque, aproveitando pra girar nossas posições e deixar a filha de Melinoe de costas pro lago.

 — Cuidado! — Ouvi Mirah gritar pra irmã no momento em que investi novamente com a espada e Ayla aparou meu golpe com uma faca e, antes que investisse com a outra, a empurrei em direção ao lago.

 Ela caiu de costas, balançando os braços e as pernas enquanto afundava. Virei pra Thalia e ela estava em cima de Mira, seu escudo entre o corpo das duas. Provavelmente havia se aproveitado da distração da loira enquanto chamava a irmã e a havia jogado no chão.

 Escutei os xingamentos de Ayla e a vi emergir me encarando com bastante ódio, Mirah começou a se debater pedindo pra ir ajudar a irmã. Me virei novamente pra filha de Zeus e balancei a cabeça pra ela soltar a outra. Ela revirou os olhos e acabou fazendo. Enquanto Mirah ia em direção à Ayla, puxei Thalia pelo pulso e comecei a correr pra dentro da floresta, ouvindo o som da trombeta chamando os campistas para a batalha.

 

(...)

 

— Acho que despistamos elas. — Thalia arfou, diminuindo a velocidade e consequentemente me fazendo diminuir também.

 Parei de correr e apoiei as mãos nos meus joelhos tentando recuperar o fôlego. Mesmo que estivesse acostumado com esforços físicos, havíamos corrido por uns cinco minutos floresta a dentro, o que deixava minha respiração acelerada, assim como meus batimentos, além do meu corpo quente e suado.

 Olhei para Thalia que se encostava em uma árvore, provavelmente nas mesma condições que eu. Ela prendia os cabelos negros em um nó e era visível o suor escorregando pela face e pescoço, manchando a maquiagem.

 — Não estou despistando ninguém. — Expliquei quando meu peito parou de queimar um pouco. — Só estamos sem tempo.

 — Sem tempo pra que?

 — Temos que chegar no refeitório até o início da partida, se não vamos ser desclassificados.

 — Por que viemos pra cá, então?

 — Eu preciso ajustar algo e preciso da sua ajuda.

 — O que é?

 — Consegue correr? — Perguntei sem respondê-la. Ela balançou a cabeça que sim. — Então vamos. — Comecei a correr novamente, enquanto ouvia seus xingamentos ao ser seguido. Felizmente, em dois minutos estávamos no lugar que eu precisava. — Eu preciso da sua ajuda, ou não vai dar tempo. Preste bastante atenção..

 Me ajoelhei ao lado de um junípero e varri o chão com minhas mãos até achar algo de metal, a ponta quadricular de uma estrutura de bronze.

 — Esta vendo esses riscos? — Perguntei, apontando para as áreas do quadrado onde estavam afundadas, formando vários cilindros marcados no metal. — Você vai contar na horizontal cada um deles, e pressionar o nono, terceiro, primeiro e último. Nessa sequência. Depois vai contar na vertical e fazer os mesmo, certo? Mantenha pressionado até ouvir um clique e começar a se mexer. Conte até cem e faça isso, volto pra te buscar assim que configurar o meu.

 Ela assentiu corri em direção ao meu, contando mentalmente até cem, esperando que conseguíssemos fazer em sincronia. Realizei os comando e em menos de um minuto sentia a estrutura responder ao chamado e voltei até onde Thalia estava, encontrando-a com uma carranca não muito boa.

 — Você pode me explicar porque diabos essa coisa tem um relógio?! Por acaso isso é uma bomba?!

 — Eu não vou explodir nada, Grace. Não com isso. — ela ia retrucar, mas assoviei o mais alto que consegui.

 — Pelos deuses, garoto! O que você está aprontando?

 — Só estou chamando uma carona. — respondi olhando para o céu.

 — Estou falando sobre essa coisa! Eu não quero ser cúmplice de uma psicopata!

 — Você me peguntou por que esse capture a bandeira é tão especial. — Sorri a encarando, enquanto uma sombra passava por cima de nós. — A resposta é bem simples: — continuei, vendo o pégaso negro pousar ao nosso lado. Subi nele rapidamente e estendi a mão pra Thalia, enquanto terminava minha resposta. — Porque dessa vez, os deuses também vão brincar.

 


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Notas finais do capítulo

¹ Desculpem por isso, eu não resisti.
Adivinha quem vai chegar atrasada na aula porque tá postando?!
Pra quem não comenta porque não tem conta no Nyah!, estou postando também no Social Spirit, no site vocês encontram o link.
Sobre o Nico ter medo de Bananas de Pijama: é esse o tipo de coisa que penso durante a prova de lógica.
Vocês viram que Solangelo é canon? Fiquei três dias na bad sem escrever uma palavra, por isso demorei a postar :/
O próximo capítulo está só faltando editar, preferem que eu poste final de semana que vem ou no meio?
Please, comente, nem que seja pra compartilhar a bad pelos ships *choremos*