Eu, Meu Noivo & Seu Crush — Thalico escrita por Helly Nivoeh


Capítulo 20
Irmãozinho


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoinhas,
Quero pedir desculpas por não estar tendo tempo de responder os comentários (tá tudo uma loucura, quase que o capítulo não fica pronto e minhas notas na faculdade estão caindo, então tá complicado conciliar tudo), mas prometo que vou responder! Juro pelo Estige e tudo mais!
Eu amei as teorias, vocês são mais criativos do que eu! Mas, acho que é a teoria mais dolorosa é a vencedora mesmo...
Eu escrevi esse capítulo com algumas músicas, algumas pela melodia, outras pela letra:
Florence and The Machine - Never Let Me Go (Acústica);
Daughter - Smother (mais pela melodia);
Band Of Horses - The Funeral;
The Band Perry - If I Die Young (Amo o cover de Michael Henry & Justin Robinett e o da Naya Rivera [Glee]);
Enfim, boa leitura!



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Narração: Jason Grace

Eu realmente gostava de Will Solace, mesmo que nos tratássemos como inimigos em plena Guerra Fria. Às vezes, conversar com Nico é complicado: há uma infinidade de assuntos que evito tocar, uma infinidade de tons que não me permito usar e uma infinidade de palavras que mordo a língua antes de falar para não magoá-lo.

Mas, já com Will, é fácil: O Solace parece não se incomodar com qualquer assunto ou brincadeira, sempre rindo e fazendo chacota, pronto para falar desde a melhor forma de manter seu amigo dramático e autodestrutivo vivo, até sobre assuntos constrangedores, como o que nunca perguntar à uma garota.

Por isso, um dos meus passatempos favoritos é irritar ele. Mas eu só não sabia que, além das respostas sagazes, ele responderia as implicâncias com golpes rápidos que realmente estavam me irritando. Eu nunca havia visto Will lutar com uma espada, até onde sei, ele só lutava com Nico e outros campistas de sua confiança, mas me surpreendi ao ver que ele era um bom esgrimista, pelo menos, bom o suficiente para fazer meu sorriso sumir depois de alguns segundos, ao ver que não seria exatamente fácil vencer o Solace.

Já estávamos algum tempo naquela luta sem fim, meus óculos estavam embaçados por causa da temperatura do meu corpo e meu pulmão já estava pedindo por ar devido ao esforço repetitivo, além, é claro, dos vários cortes que pelo meu corpo onde Will havia atingido e eu ainda não havia conseguido compreender a lógica dos seus movimentos, a técnica que ele usava para atacar.

Defendi mais um golpe do Solace com meu gládio, tentando achar uma brecha para revidar, quando ouvi o grito de Thalia. Tentei focar na luta e olhar de relance, mas desisti quando minha irmã me gritou novamente, o desespero estampado em sua voz. Will também parou um golpe no ar, virando-se para ela e engoli em seco quando entendi o porque dos gritos.

Aquilo só poderia ser obra das gêmeas. Somente uma visão poderia invocar um pesadelo tão terrível e real. Thalia tentava segurar Nico, que caíra para frente, em um ângulo estranho. Eu não me recordo de correr para eles, ou de ajudar Thalia, tudo o que consigo me lembrar é de Nico deitado no chão, a cabeça sobre o colo da minha irmã, a respiração pesada e os olhos negros desfocados, enquanto sangue ensopava a camiseta branca.

Vagamente consigo me lembrar do grito de Will para não tocarmos na flecha envenenada e cravada no peito de Nico, e mal me vi retirar a armadura e a camisa, usando a roupa para colocar sobre o ferimento, porque Will havia feito o mesmo, mas não fora suficiente para o sangue estancar.

Eu me ajoelhei ao lado de Nico, segurando a mão dele enquanto Will fazia o mesmo do outro lado, um canto à Apolo soando trêmulo dos lábios do curandeiro. Os olhos do Filho de Hades reviraram para cima e apertei sua mão quase inconscientemente, ouvindo a voz de Will soar histérica, aumentando o ritmo.

Thalia estava com os dedos na garganta do Di Angelo, com a outra mão acariciava-lhe os cabelos negros ensopados de suor — o mesmo gesto que eu havia flagrado Nico fazer nela mais cedo —, que se colavam a testa. A pele sempre fria do garoto parecia arder como o inferno, o corpo entrando em ebulição devido ao veneno.

Ele arfou e Will gritou, sua mão caindo na terra negra ao lado do filho de Hades, apoiando o corpo no chão negro. O Solace estava extremamente pálido, os cabelos pareciam palha secas, os olhos azuis opacos, perdidos e loucos, derramando lágrimas de desespero, os lábios tremendo ao cantar em grego. Seu corpo tremia tanto em espasmos que ele parecia preste a desmaiar, tão similar a Octavian em sua insanidade que me fez segurar lhe o braço.

— Will, cuidado… — Sussurrei, o advertindo, com medo que o Solace viesse a sucumbir por usar os poderes demais. Seria uma das maiores ironias do destino.

— Não! — Will soluçou em pleno sofrimento, parecendo não ouvir minhas palavras; — Nico, por favor, não!

— Toma minha força. — Me vi oferecendo o braço por cima do corpo de Nico. Eu nem sabia se aquilo era possível, só havia visto na ficção. Mas, existindo ou não isso, Will deixou de se apoiar no braço e segurou minha mão, apertando com força enquanto eu sentia uma sensação gelada e dolorida me preencher, como se parte da minha alma fosse ofertada ao Di Angelo, parte da minha vida tentando segurá-la, como se o fio da minha vida se esticasse na tapeçaria, remendando a dele.

— Não!

Will gritou mais alto e percebi, naquele momento, que estava perdendo Nico.

Olhei para a face do meu amigo, vendo-o mais pálido do que nunca — até mais pálido do que quando fora resgatado do Tártaro —, ao mesmo tempo que o rubor da febre parecia lhe querer colorir a face. Os olhos negros olhavam para cima, completamente desfocado, os dentes trincados como se ele quisesse gritar de dor, mas sua consciência não suportasse tamanha agonia no corpo de se curar e cortar, quase que simultâneamente.

Eu quase pude ver seu coração se regenerando com o canto de Will, a carne se dilacerando cada vez que tentava se curar e encontrava o material duro e envenenado da flecha, machucando mais, doendo mais. Ele não suportaria sobreviver, curar-lhe era aumentar o sofrimento.

Já havia tomado decisões semelhantes àquela, já havia tido que escolher entre deixar alguém viver em agonia ou deixar que uma ponta afiada lhe cortasse o fio da vida. Eu sabia que a segunda opção deveria ser a certa no caso de Nico, ou eu perderia dois amigos: Will não aguentaria doar tanto de si sem morrer. A respostas era pragmática e fria, como o líder que me impunham, eu deveria ser capaz de fazê-la.

Eu abri a boca para dizer para desistirmos, mas não foi o que saiu da minha boca.

— Nico! — chamei seu nome, sentindo um gosto amargo na boca. — Nico, aguenta, cara! Aguenta, por favor! — Me vi suplicar, o desespero falando mais alto que a sensatez, minha voz soando aos meus ouvidos como a de outro alguém. — Você não pode fazer isso comigo! Não pode! Você é minha família, ok?! Você é minha família seu emo supersensível e idiota! E família não se deixa! — Trinquei os dentes, sem saber se estava chorando ou não. Eu só sentia meu corpo tremer, se pela força que estava me sendo retirada ou por desespero, eu realmente não sei. — Você aguentou tanto… Você sofreu tanto sozinho… Agora que você tem a mim vai desistir assim? Vai me deixar? Eu também preciso de você, cara. Eu… Eu não quero que você vá… Você é meu irmãozinho. Meu irmãozinho mau humorado e resmungão, mas meu irmãozinho… Então, só… Aguenta, cara.

Eu apertei sua mão, mas não houve qualquer reação dele. Eu só conseguia sentir uma dor terrível no peito algo tão gelado que parecia queimar — e não dizem que o gelo queima mais que o fogo? —, era algo tão dolorido quanto o ouro imperial, que cortava minha alma e só me fazia pedir pra acordar daquele pesadelo.

— Nico… — Ouvi a voz de Will soar baixa, mas tão desesperada e quebrada quanto a minha. — Vamos, Menino das Sombras, volta… Volta pra mim… Por favor…

Uma mão me tocou no ombro e olhei para o lado.

— Ele não está aguentando… — Olhei para Thalia, tentando registrar suas palavras, como se ela falasse em outra língua que eu desconhecesse. — Ele está sofrendo… Will, — ela se virou para o Solace, a voz dela trêmula e piedosa ao ver o estado deplorável que meu amigo se encontrava. — você sabe que você não pode fazer nada.

Senti uma vontade inexplicável de gritar com ela, mandar calar a boca, se afastar, perguntar quem ela pensava que era para decidir se meu amigo devia morrer ou não. Acho que só não o fiz por causa do seu tom pesaroso, ou porque eu já nem tinha mais força.

— Não… Ele não pode… — Me vi murmurar, suplicar para ela, como se Thalia pudesse fazer algo para salvá-lo. — Não deixe ele ir, por favor…

Thalia desviou o rosto do meu e encarou Will, que parecia pior a cada segundo.

— Will, — Ela chamou, mas o filho do Sol continuava a olhar para nosso amigo fixamente, esperando ele reagir. — Will, você vai morrer: Você sabe disso. — Thalia tentou argumentar, mas ele somente apertou os lábios, balançando a cabeça para recusar as palavras. — Se você morrer ele vai te odiar por isso. Eu sei como dói, eu sei que você acha que pode salvar ele, mas se continuar vocês dois vão morrer, se não levar Jason também. — Como testemunha do que ela disse, minha visão começou a escurecer nas extremidades, um desmaio se aproximando. — Will, Jason… Vocês precisam deixar ele ir.

Mas Will não o deixou ir, tampouco pedi que desistisse.

Ele continuou a cantar, aumentando a angústia a cada nota, minha força alimentando seu desespero enquanto sentia o corpo de Nico ferver em febre abaixo de mim, minha mão ainda apertando a sua. Thalia gritava pedindo que parassemos, mas tudo estava em câmera lenta e soando abafado, como um filme que eu não estamos prestando atenção.

Will gritou novamente, mais alto do que nunca, e eu quase pude ouvir o eco de uma tesoura distante. Uma tesoura mais antiga que os deuses, que, mesmo enferrujada, continuava a seguir afiada, Átropos cortando o fio da vida de tantos seres humanos. Minha garganta se apertou como se o ar estivesse se tornando rarefeito, como se todo o meu oxigênio estivesse indo com a alma do meu amigo. Como uma grande ironia do destino, eu me senti sufocar quando não consegui sentir o ritmo constante do coração do meu amigo ao tocar seu pulso.

A pele de Nico começou a diminuir a temperatura e seus olhos não reviravam mais, estavam tão fixos no céu escuro como os de uma estátua. Seu peito não mais subia cortando-se na madeira envenenada, estava completamente parado, e eu sabia que seu coração desistira de se regenerar, assim como sabia que a força de Will deixara de lhe alimentar o corpo.

Observei, estático, enquanto Thalia tirava os dedos do pescoço pálido do garoto, balançando a cabeça e apertando os lábios, constatando o mesmo que eu. Ela passou a mão pelo rosto de Nico, como se em dúvida se lhe fechava as pálpebras ou não. Will soltou meu braço e o deixei cair na terra, sem reação, sem conseguir pensar em nada, apenas segurando uma mão esquerda que continuava a cair a temperatura.

Um grito feminino soou pela floresta e uma garota se prostrou na minha frente, a cabeça abaixada deixando os cachos castanhos cobrirem o corpo do meu amigo enquanto as mãos lhe tocavam a camiseta ensopada de sangue.

— Nico! — A voz de Hazel berrou novamente, enquanto abraçava o corpo do irmão. Se os filhos do Mundo Inferior deveriam reagir bem a morte, era o dia propício para fugir à regra.

— Não toque na flecha! — Thalia advertiu, inclinando o corpo para afastar as mãos de Hazel do objeto envenenado.

— Irmãozinho… — A filha de Plutão murmurou antes de sentar-se ereta, as mãos deixando de tocar o irmão. Ela virou o rosto para o lado, como se pudesse ver o espírito dele.

— Ele se foi… — A voz dela soou baixa, quebrada e embargada. — … eu consigo senti-lo e…...e ele se foi...

— Não... — Will sussurrou antes de berrar: — Não!

Ele se atirou sobre o corpo do Nico, como se tentasse fazer uma massagem cardíaca com a flecha fincada, ou como se tentasse abraçar-lhe o corpo, tentando impedir que a alma — que já não habitava ali — fosse recolhida por Thanatos.

— Will! — Thalia gritou tentando jogar o corpo para a frente, como fez com Hazel, evitando que o Solace tocasse a flecha. Eu deveria segurá-lo, mas só conseguia ficar parado, esperando os olhos de Nico se mexerem. — Percy! Não deixa ele tocar na flecha!

— Não! Não! Nico! — A voz do Solace soava ainda mais histérica e tive o vislumbre de dois braços o segurarem, puxando-o para trás. — Me solta! Deixa eu curar ele! Eu consigo! Eu posso fazer isso! Me solta! Nico! Eu posso... eu posso…

Não consegui ouvir o resto, meus ouvidos estavam quase abafados, mas pude ouvir o soluço de Hazel, ver a maneira como ela estava prostrada, as mãos contra o chão, provavelmente escavando a terra com os dedos, extravasando a frustração.

— Ele pode voltar… — Minha voz soou, mesmo que eu não me lembrasse de abrir a boca para falar. — Leo conseguiu... E Nico... Nico é o rei dos fantasmas... ele sobreviveu a tanta coisa... ele vai voltar…

— Eu consigo senti-lo… — Hazel soluçou, mais para si do que para qualquer outra pessoa. — Ele está com Caronte, e… Óh, deuses! Ele está com tanta raiva. Não, não irmãozinho, se acalme. — Pediu, como se de fato conseguisse falar com ele. — Não fique com tanta raiva… Isso não vai te fazer bem…

Senti uma mão em meu ombro e vi Piper se ajoelhar ao meu lado, os olhos coloridos lacrimejados.

— Você está bem? — Ela sussurrou baixinho e assenti, sem conseguir falar nada.

Minha namorada me olhou com piedade, antes de passar os dedos pela testa de Nico, brincando com os fios pregados. Percebi que Thalia não havia parado como o carinho, continuando a afagar os cabelos negros mesmo quando ele parou de respirar. Os dedos de Piper desceram para os olhos escuros e sem vida de Nico e, enquanto eu esperava que ele piscasse, os dedos da McLean lhe abaixaram as pálpebras, escondendo a escuridão da sua alma.

Piper foi até Will e o segurou, sussurrando palavras de conforto, provavelmente usando o charme para acalmá-lo até que ele parasse de se debater e seus gritos se tornassem soluços quase silenciosos, o rosto pálido marcado por lágrimas constantes e manchas de sangue;

Eu não sei quanto tempo fiquei parado encarando a face de Nico, ansiando que ele abrisse os olhos e os revirasse, reclamando da atenção e ficando vermelho, tentando esconder o sorriso tímido enquanto Will ralharia pelo susto.

Mas isso não veio e eu mal ergui a cabeça quando uma imagem surgiu perto de mim.

Demorei a conseguir processar que era uma mensagem de íris, e não me pergunte como reconheci Frank. Eu não me importei com isso, muito menos com a voz do namorado da Levesque lhe perguntando o que havia acontecido.

— Nico… — Hazel respondeu, erguendo os olhos do chão escuro. — Morto… — Ela engoliu o choro e olhou em volta, o que fez com que eu me desse conta de que todo o acampamento nos rodeava, ansiosos, confusos e nervosos. Alguns sussurravam teorias, mas cada ruído cessou quando a Levesque olhou para cada um deles, antes de se pronunciar em uma voz firme e cortante: — Nico di Angelo está morto.

Morto.

A palavra ressoou pelo ambiente por cerca de dois segundos, antes que uma infinidade de murmúrios enchessem o bosque. Todos queriam ou pareciam saber como aconteceu, quem o matou, qual punição seria dada. Eu só queria que eles calassem a boca, que tivessem um pouco de bom senso e piedade e calassem a boca. Felizmente, Quíron queria o mesmo.

— Quem vai fazer os ritos agora? — A voz de um dos campistas soou depois que o centauro conseguiu colocar todos em silêncio, apenas para recomeçarem o falatório, até risos eu ouvi.

— Eu. — A voz de Hazel cessou as conversas e eu encarei a menina que ainda estava ajoelhada ao lado do irmão, o rosto marcado por lágrimas e dor. — Eu farei o funeral do meu irmão. — Ela engoliu em seco e olhou novamente para o corpo de Nico. — Ele pode ter morrido por causa de um covarde, de um assassino. Mas ele sempre foi um herói. Ele merece os ritos de um herói.

— Você tem certeza? — A voz de Quíron soou incerta e Hazel balançou a cabeça. — Não é a única filha do Mundo Inferior no Acampamento.

— Eu sei, mas meu irmão merece isso. Ele faria o mesmo por mim.

— Vou prepará-lo. — Quase me sobressaltei ao ouvir a voz de Will. Ele parecia menos desesperado, a voz rouca de tanto gritar, ainda parado segurando a mão direita de Nico.

— Eu também. — Falei, olhando para Will. Ele assentiu com a cabeça ao meu pedido silencioso.

— Vocês podem esperar? — Ouvi a voz de Frank e percebi que a mensagem de íris continuava, apesar do Pretor ter se mantido calado até o momento. — Tenho certeza que Reyna gostaria de dizer adeus.

— Amanhã, ao crepúsculo. — Tomei a frente quando Quíron deixou a decisão em nossas mãos. — E, então, todos diremos adeus a Nico di Angelo, o Filho de Hades mais corajoso que já conheci.

(...)

A partir daquele momento, minha memória se tornou mais confusa. Eu algum momento, decidimos que era necessário levar o corpo de Nico para o chalé. Eu, Will e Percy fomos na frente, retirando a cama de cima do beliche para deitá-lo quando Hazel transportou-o pelas sombras.

Com o máximo de cuidado possível, depositamos o corpo pálido e frio sobre a cama, mesmo com a flecha, e o cobrimos com um lençol escuro até o pescoço. Ele parecia apenas dormir, do jeito quieto e imóvel de sempre, o corpo sem qualquer tensão o deixando com uma expressão que fazia jus ao seu nome, um aspecto angelical.

Acho que fiquei parado encostado em uma parede o observando, não sei dizer, eu me lembro de Percy se aproximar e perguntar se queríamos ajuda com o corpo, me lembro de sentir raiva pensando que eles não eram realmente próximos e Nico havia sofrido demais por causa do filho de Poseidon, mesmo que a culpa não fosse dele. Me preparei para dizer um não quando Will se colocou à frente, negando de maneira diplomática.

— Obrigado, mas acho que isso é algo que eu e Jason precisamos fazer. Acho que é o que Nico iria querer.

Percy assentiu, olhando para o chão e Thalia o chamou, pedindo ajuda com alguma coisa. Eu fiquei um tempo parado ali, ao lado da cama, Piper se aproximou e me abraçou pela cintura, mas não tive ânimo para retribuir o abraço.

— Vou ajudar Hazel a falar com Reyna. Você vai ficar bem? — Assenti, sem olhá-la nos olhos e ela se retirou.

Algum tempo depois, era Thalia quem tirava a minha atenção das memórias que estavam circulando minha mente, meu cérebro tentando registrar que aquele garoto deitado era o mesmo garoto sombrio e raivoso que havia enfrentado o Cupido há alguns anos.

— Jason, — Thalia se colocou à minha frente, impedindo que eu olhasse para a cama. — não adianta pedir pra esperarem até amanhã, não é? — Neguei com a cabeça, enquanto meu estômago embrulhava pensando no que teríamos que fazer a seguir. — Eu e Percy trouxemos água e panos limpos. E eu te trouxe comida: mortal e ambrósia.

Neguei quando ela me ofereceu a comida dos deuses, fazendo-a soltar um suspiro cansado.

— Você parece a ponto de desmaiar. — argumentou, os olhos fixos nos meus de maneira preocupada. — Você e Will usaram muito dos poderes, mesmo que indiretamente. Se vão passar a noite aqui, vocês precisam de energia. Will eu já convenci, só falta você.

Fiz uma careta quando minha visão começou a escurecer novamente, como se meu cérebro tivesse pensado: “Olha, ela tem razão. Está na hora de você desmaiar de novo.”.

— Jason. — Thalia falou novamente e assenti, pegando um pedaço de ambrosia e uma barrinha de cereal. — Posso? — perguntou, apontando para os meus óculos e franzi o cenho, enquanto ela retirava o objeto. Percebi que que as lentes estavam sujas em vermelho.

Thalia passou um pano úmido pela lateral do meu rosto, provavelmente limpando sangue. Olhei para as minhas mãos que estavam escarlates, e acho que eu jamais conseguiria afastar essa memória da minha mente, mesmo se Juno me deixasse com amnésia de novo. O sangue do meu amigo no meu corpo seria um dos pesadelos a sempre me assustar à noite.

Por algum motivo eu comecei a rir ao ver tanto sangue nas minhas mãos, nos meus braços, no meu tórax… Eu comecei a rir como se fosse a melhor piada do mundo, afinal, o filho do Deus dos Mortos se encontrava morto. Aquela era a grande ironia do mundo e eu me vi gargalhando disso.

— Jason… — Thalia me chamou, mas não olhei para ela. Eu continuava a rir e olhar para as minhas mãos, a ponto de lágrimas começarem a surgir e, em algum momento, eu abracei minha irmã, enterrando meu rosto em seus cabelos.

As gargalhadas se tornaram soluços de desespero, meu corpo tremia e mais uma vez eu estava sufocando, uma dor no meu peito tão densa que fazia minha cabeça girar enquanto eu só conseguia pensar em Nico. Eu só conseguia lembrar da maneira dele revirar os olhos, em como ficava vermelho com quase tanta facilidade com que ficava com raiva, só conseguia lembrar dele tentando abafar as risadas, querendo passar a imagem de filho de Hades sem sentimentos, mas que, na verdade, só sentia demais, sofria demais. Era só um menino sob toda a fachada, um menino que adorava jogos infantis e histórias.

— Ele era meu melhor amigo… — Me ouvi soluçar, enquanto Thalia me apertou no abraço.

Quando toda a guerra com Gaia acabou, eu me vi tão perdido quanto no começo. Tinha que lidar com ambos os Acampamentos e meu coração me dizendo que Leo estava vivo, apesar dos indícios. Eu me aproximei muito de Nico nesse período, principalmente quando Leo voltou apenas para dizer que estava vivo e ia dar algumas voltas com Calipso pelo mundo. Em algum momento, me tornei tão próximo dele quanto fui de Leo, se não mais.

E agora não havia como meu coração me dizer que Nico estava vivo.

— Como um irmão. — Thalia falou baixinho, afagando meus cabelos e não precisei assentir: ela sabia que era exatamente assim que eu o via.

Acho que, em algum momento, eu entrei em um estado de anestesia, quando não há mais lágrimas e a mente não consegue mais reagir a tristeza. Eu me soltei de Thalia e me sentei no chão encostado a parede, ainda vendo o corpo de Nico sobre a cama.

Alguns amigos ficaram ali por um tempo, como se estivessemos em um velório, mas aos poucos foram saindo: Percy e Annabeth foram confeccionar uma mortalha tecida pela filha de Atena; Hazel foi estudar sobre os ritos para que nada desse errado, e Piper e Thalia a seguiram para ajudá-la, apesar de que desconfio que o motivo de Thalia foi o desconforto com a situação.

Por fim, me vi sozinho com Will, cada qual sentado no chão, velando, em silêncio, o corpo de nosso amigo. Sem dizer nada, me levantei e caminhei até uma das bacias com água e mergulhei um dos panos nela. Assim que minhas mãos adentraram o líquido, a água se coloriu em um vermelho claro. Engolindo em seco — ou um soluço, não tenho certeza — caminhei até Nico e me ajoelhei ao seu lado.

Tal como Thalia fez comigo, passei o pano sobre seu rosto, mesmo que não estivesse sujo de sangue, era mais como um afago do que, de fato, para tirar as impurezas.

— É irônico, não é? — Me sobressaltei com a voz de Will soando ao meu lado. Ele olhava fixamente para Nico, passando os dedos pela testa do garoto, afagando os fios negros, ainda úmidos de suor. — Ele realmente odeia que o toquem. E estamos fazendo isso porque parece ser a única coisa que nos resta.

— O que Nico não odeia? — Acabei por perguntar, me recusando a falar dele no passado.

— Reclamar. — Um pequeno sorriso invadiu meus lábios automaticamente por alguns segundos, pareceu certo em resposta ao tom de Will. — Pode me ajudar a tirar a camisa dele? — Assenti com a cabeça, levantando-me a procura de alguma tesoura. — Cuidado com a flecha. — recomendou e eu obedeci. Um minuto depois a lâmina cortava o tecido ensanguentado da camiseta, exibindo o peito pálido sob o sangue escarlate.

Pouco a pouco, Will foi deslizando pequenos pedaços do tecido sobre o tórax de Nico. Ele sempre foi gentil, mas demonstrava um carinho até anormal, imerso em pensamentos, como se cada vez que mergulhava o pano na água a colorindo em vermelho, mais ele mergulhava em lembranças. Como eu sei sobre isso? Bom, era o que me acontecia ao fazer o mesmo, ao seu lado.

— Como você sabe? — Perguntei depois de um tempo, quando boa parte do sangue havia sido limpo. — Que a flecha está envenenada?

— Meu pai é o deus das pragas. — Will murmurou, escorregando para o chão e encostando as costas na cama. — E há uma maldição realmente forte nessa flecha. Forte até demais.

— O que você está dizendo? — Questionei, me sentando ao seu lado.

— Flechas de madeiras… Maldições… Isso não é obra de um semideus, Jason.

— Acha que foi um titã? — Perguntei, mas Will se manteve em silêncio, demonstrando seus pensamentos. — Acha que foi o trabalho de um deus. — Mais uma vez ele não respondeu, o que indicava que eu estava certo. — Mas quem seria? Não são muitos deuses arqueiros, não diretamente ligado à nós. É impossível sabem que é… Mas você já sabe. — Adivinhei, ao ver ele franzir os lábios e olhar para as próprias mãos.

— Os dois deuses arqueiros principais: foram os que vieram à minha mente. E, bem, Nico odeia as caçadoras. Ele me disse isso no dia que Thalia chegou.

— Acha que Ártemis fez isso?

— Na verdade, não. Não acho que Ártemis perderia seu tempo só para matar alguém que não gosta dela, e, antes que pergunte: não, não acho que Thalia tenha feito, ela também está abalada com isso.

— Então quem?

Will se manteve tanto tempo em silêncio de cabeça baixa que eu me perguntei se ele responderia, mas quando falou, foi tão baixo que parecia que falava consigo mesmo.

— Às vezes eu tenho esse sentimento, sabe? Como se ele estivesse me observando. Às vezes, sinto ele, sinto como se ele estivesse ao meu lado, eu não sei se isso acontecesse com você, mas… Eu senti isso durante toda a luta, sabe?

— Você está dizendo que acha que…

— Eu estou dizendo o que sei: — Will ergueu a cabeça e me olhou nos olhos, o azul estava opaco como vidro embaçado, sem qualquer sombra de alegria. — Quem matou Nico foi meu pai.


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Notas finais do capítulo

Eu tentei preparar vocês para esse capítulo... O que acharam?
Eu preciso aprender a detalhar menos, isso era só metade do capítulo, mas espero que tenham gostado.
A vencedora do Game Poser é... Dama do Poente!
Próxima pergunta: Como Nico Di Angelo morreu e, se foi morto, quem o matou?
Lembrem-se que eu amo vocês ♥