Eu, Meu Noivo & Seu Crush — Thalico escrita por Helly Nivoeh


Capítulo 16
Aquela conversa


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoinhas!
Pois é, não tá dando mais pra postar toda sexta, mas vou tentar semana sim-semana não, okey?
Bom, eu espero que vocês gostem do capítulo porque ele ficou enorme!
Tem links do Polyvore (eu sempre faço, mas nunca lembro de postar).
Boa leitura!



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Narração: Nico di Angelo

 

Escutei os xingamentos de Thalia assim que saímos das sombras, meus all stars amassando a folhagem que caíra das árvores no bosque. Soltei seu pulso e me sentei no chão, escorando em uma árvore.

— Por que você faz isso? — A Grace perguntou irritada, tirando os cabelos escuros que caiam em sua face escapando da tiara de tenente.

— Isso o que? — Me fingi de inocente, tentando controlar a vermelhidão que ainda podia sentir no meu rosto. Will era louco por me perguntar aquilo!

— Isso! Do nada me puxar pras sombras!

— Você disse que queria falar comigo, ué. — Justifiquei. — Não queria que Will atrapalhasse.

Thalia cruzou os braços sobre a blusa escrita “Future Ghost” (Ok, tenho que admitir que eu gostei), uma expressão desconfiada.

— O que vocês estavam falando?

— Sobre… Maçãs. — Inventei.

— Maçãs? — Questionou, erguendo a sobrancelha.

— É. — Balancei a cabeça. — Maçãs, sabe? Aquela fruta vermelha gostosa, sabe? Estávamos falando de maçãs.

— E o que eu tenho a ver com isso?

— Não sei. O que você tem a ver com isso? — Me fiz de desentendido.

—É o que estou te perguntando. — Falou irritada, os olhos azuis faiscando. — Will disse que vocês estavam falando de mim. — Prioridade do dia: Matar Will Solace. — O que eu tenho a ver com maçãs?

— Ah! — Exclamei, tentando pensar em algo. — É porque você parece a branca de neve, sabe?

— O quê?

— É, sabe? Pele branca como a neve, cabelos pretos como asas de corvo… Você ficaria legal de batom vermelho, bem bonita. Annabeth tem uns legais, aposto como ela pode te emprestar, vamos lá nela?

— Nico? — A Grace me interrompeu. — Você está bem?

— Tô, ué. Super bem! Por que a pergunta?

— Por que não a pergunta, você quer dizer, né? Fala a verdade: O que você e Will estavam falando sobre mim?

“Will estava sendo o melhor amigo do mundo e fazendo perguntas extremamente intimas e indiscretas sobre você.”

Respirei fundo, tirando os óculos escuros e colocando-os presos na gola da camisa.

— Eu ia contar para Will sobre ontem, sobre nós dois. — Resolvi contar parte da história.

— Sobre ontem… Pelos deuses, você não ia dizer que sou louca, não é?!

— O que? Não, não! Bom, eu fiquei preocupado, mas acho que foi só porque você bateu a cabeça. Não acredita mais nisso, certo?

— Não é loucura! — Ela retrucou, rangendo os dentes, antes de respirar fundo. — Se não era isso, o que você ia falar?

— Sobre essa… — Parei, procurando a palavra certa. — ...energia… eletricidade… entre a gente. Sabe? Todas as vezes que nos encostamos tem esses choques e tudo mais. Achei que se alguém pudesse explicar isso, seria Will.

Olhei para a Grace, esperando sua reação, mas ela apenas me encarava pensativa.

— Talvez.... — Murmurou. — Mas, pelo o que vi ontem, tenho medo de que ele nos coloque grudados em um potinho pra nos fazer de cobaia.

Pior que ela estava certa, e levando em consideração os últimos comentários dele, Will adoraria nos ver abraçadinhos em um potinho do lado da cabeceira da cama.

— É provável… — Assenti com a cabeça. — O que você queria falar comigo? — Ela suspirou e levou a mão ao bolso da calça, retirando um celular e me entregando.  — O que é isso?

— Leia. — Ordenou e desbloqueei a tela do aparelho, encontrando algumas mensagens de um contato chamado “Papai”.

— Você tem o número do seu pai? — Ergui a sobrancelha, sem encará-la.

— Ele me deu isso, mas só responde quando quer. — Comecei a ler as mensagens. As primeiras confirmavam a versão da garota de que realmente era um presente de Zeus, ele até perguntava se ela havia gostado do presente. Mas foi a pergunta de Thalia que me chamou atenção, assim como a resposta dada pelo Tio:

Só uma pergunta: Nico sabe dos seus planos?“

“Claro! Ele ta ansioso pro casamento :) ♡”

— Espera aí, o quê?! — Quase gritei. — Que casamento?!

— O nossos casamento. — Thalia retrucou. — Eu te disse isso ontem, eles querem que nos casemos.

— Por quê?

— Você sabe: Guerra contra Cronos, primeira coisa foi jogar nossos pais uns contra os outros. Querem formar novas alianças agora. Nos tonar deuses símbolos da paz. Salvar o mundo. Paz e Amor. Essas coisas. — Ela deu de ombros.

— Espera! Deuses símbolos da paz? Eu não quero ser hippie!

— Não é isso! — Revirou os olhos. Ei, isso é mania minha! — É pra dizer que se nós dois conseguimos nos dar bem eles também conseguem e blá-blá-blá.

— E  você acreditou que eu diria sim?!

— Eu não achei que os deuses fossem mentir! — Ok, ela tinha um argumento. Não era de se esperar que os deuses perdessem a sanidade agora. Bom, eles perderam durante a guerra com Gaia, mas achamos que teríamos descanso pro algumas gerações antes de começarem as loucuras de novo.

— Por isso daquela aula de arco e flecha? Pra me torturar?! — Ela desviou o olhar, indicando que a resposta era sim. — Isso é loucura! Eu nunca me casaria com você!

— Poxa! Obrigada pela parte que me toca!

— Não é isso. — “É porque eu sou gay”, pensei, mas preferi não dizer. Poucos sabiam disso: Percy, Annabeth, Jason, Reyna e o Treinador Hedger. Nem Will sabia e também nunca falei sobre isso com Hazel.

— Vai dizer o clássico: “Não é você, sou eu”? — Ela franziu os olhos azuis, um sorriso sarcástico nos lábios.

— Ah, não. Seria mais: “Não sou eu, é você”. O problema é totalmente você. — Tentei fazê-la sorrir, mas ela quase me fulminou com o olhar, fechando a cara. — Estou brincando, Thalia. — Revirei os olhos. — Só estou dizendo que eu não aguentaria viver em um relacionamento assim, como um boneco dos deuses. Um casamento é importante de mais pra virar um negócio. Envolve amor, fidelidade, persistência, principalmente um que envolve eternidade e imortalidade. Um que vá significar um simbolo de amor e paz. Se nossos pais, que se casaram apaixonados hoje vivem em pé de guerra, e nós dois somos provas de traições, imagina a gente que em dois dias de convivência já tentamos nos matar.

— Não precisa de discurso.

— E você aceitou? — Questionei e ela revirou os olhos.

— É bem óbvia a resposta, não?

— “Eu não disse sim”, — recitei a mensagem. — Isso não me parece um não e você está aqui, comigo. — Ergui a sobrancelha e vi a garota ficar vermelha, de raiva ou vergonha, aí já não sei.

— Leia o resto e você vai ver que minha resposta é, definidamente, não.

 As mensagens seguintes fizeram com que um incômodo surgisse no meu estomago:

“Por favor

desista disso

me deixe ir embora

todos sabemos que esse casamento não vai acontecer

eu não aguento mais

eu preciso sair daqui”

Bom, aquilo definitivamente era um não.

— Não achei que odiasse tanto o acampamento. — Sussurrei, encarando a tela do celular. — Ou me odiasse tanto.

— Bom, é reciproco, não? — Ela retrucou em um tom estranho, como se estivesse magoada e a fitei.

— Eu não te odeio. — Falei, olhando fixamente em seus olhos.

— Tem certeza? — Questionou, com um sorriso sarcástico.

— Tenho. — Afirmei. De onde ela tirou isso? — Podemos não ser melhores amigos, mas não somos inimigos, Thalia. Não sei porque você me vê como um.

— Não sou eu que te vejo como inimigo. — Retrucou e percebi que havia algo naquela história que eu não sabia.

— Do que você está falando?

— Nada. — Ela desviou o olhar. — Mas não importa se nos odiamos ou não, o que importa é como vamos fazer nossos pais deixarem essa história de lado. Eu preciso voltar pra caçada.

A olhei chocado por alguns segundos, antes de recuperar a voz.

— Voltar pra caçada?! Você vai voltar pra caçada?

— É óbvio! — Exclamou. — Por que não voltaria?

— Ah, não sei! Por que sua adorada deusa Ártemis está te tratando como moeda de barganha?! — Exclamei, irritado. Thalia apertou os olhos, visivelmente ficando com raiva, mas não me importei. De todos os deuses, Ártemis era a que eu menos gostava por ter tirado Bianca de mim, não entendia como ela conseguia ser tão controladora. — Os deuses nos jogam nessa loucura, brincam com nossas vidas, nos tratam como… — minha voz falhou, enquanto procurava uma analogia. — como piões! Brinquedos, bonecos! E você me diz que vai voltar pra caçada como se nada tivesse acontecido?!

Percebi que havia elevado a voz quando Thalia retrucou, também gritando:

— Elas são minha família!

Um silêncio se instalou por alguns segundos. Tentei me acalmar, normalizar minha respiração e, ao que parecia, Thalia tentava fazer o mesmo, respirando profundamente, as mãos cerradas em punho e os olhos lacrimejando, olhando para o céu azul da manhã. Desviei meus olhos dela, focalizando o chão, recitando mentalmente um mantra: “sem rancor, sem dor”. Tentei convencer a mim mesmo que Thalia não tinha culpa disso.

Passou-se um minuto até que a voz de Thalia soasse, tão baixa que quase não escutei.

— Minha única família.  — Voltei meu rosto para ela, e seus olhos estavam fixos no meu. Mas não continham o brilho familiar, o azul estava opaco, como se os pensamentos dela estivessem em outro lugar. Eu me enganei mais cedo ao pensar que Thalia só deixava de ser intimidante dormindo: Ela estava se mostrando ali, na minha frente, toda vulnerável. — Que outra opção tenho?

Senti como um soco no meu estômago ao me encontrar não só nas palavras dela, mas também na sua expressão: algo que retratava o sentimento de estar completamente perdido e sozinho. Quando ela falou novamente, pensei que suas palavras soariam trêmulas, mas estava baixa e calma, factível.

— O único lar que conheci se despedaçou enquanto eu dormia. — Ela engoliu em seco e fez uma pausa, na qual eu não soube o que dizer. — Annabeth não precisa mais de mim e Luke está morto. Que lar me restou?

— Jason. — Afirmei e Thalia deu um riso de escárnio.

— Ah, sim, claro. Ele é mais irmão seu do que meu.

— Jason faz parte da minha família, Thalia. — Falei calmamente. — Por que não pode ser a sua?

— A caçada é minha família. — Ela deu um passo a frente, a cabeça erguida e no rosto uma expressão quase assassina. Toda a vulnerabilidade mascarada. — Eu sou uma caçadora. A Tenente das caçadoras!
Minha paciência tomou o caminho do Tártaro e meus lábios se retorceram em um sorriso cruel.

— Sim. — Falei em um tom baixo e frio, análogo ao do meu pai. — E o que isso significa pra sua deusa?

— É melhor que não diga isso… — Thalia vociferou, o corpo tremendo.

— O quê? — Continuei, no mesmo tom que antes, com o mesmo sorriso, a raiva me tornando cruel. — Que vocês são descartáveis? Morre uma criam duas? É a hidra por acaso?

— Cale a boca! — Ela murmurou entredentes, as mãos fechadas em punho.

— Quem nome se dá a isso, Grace? Descaso? Que nome ela dá à vocês? Servas? Escravas?

Percebi que fui longe de mais quando Thalia deu um passo pra frente e me empurrou, me fazendo dar um passo para trás, um choque de alta voltagem passou pelo corpo, partindo da mão da garota. Trinquei os dentes, ignorando a dor e segurei o pulso da Grace que ainda mantinha a mão sobre meu peito, provavelmente surpresa com a eletricidade que continuava a circular por nossos corpos, desta vez, machucando. Ainda a segurando pelo pulso, a afastei.

— Eu já disse pra não tocar em mim. — Vociferei, dando um passo atrás e sumindo nas sombras.

(...)

 

Confesso que, algumas vezes, as sombras me levavam para lugares bem inusitados. Como daquela vez que fui parar em um galinheiro em que eu podia jurar que estava havendo uma revolução. Também teve alguns cemitérios bem legais, algumas vezes fui parar dentro de alguns pentagramas ( uma vez até ganhei uma cantada de um cara com uma maquiagem super realista que fazia ele parecer ter olhos de gatos, além de uns brilhos azuis legais que apareciam toda vez que ele mexia as mãos. Percy iria adorar ele) e até no banheiro de uma garota que tava repetindo monossilabas em uma língua bem estranha só de toalha na frente do espelho de madrugada (juro que as lendas urbanas sobre invocar assombrações no banheiro existiam antes disso!). Bom, teve alguns lugares piores, alguns lugares melhores (até dentro da jaula em uma boate eu fui parar uma vez), mas, o importante é que, normalmente, eu conseguia chegar até onde queria. Isto é, quando não estão manipulando as sombras.

Então foi realmente assustador ter visualizado o chalé de Will, um refúgio para quando estou realmente com raiva, e ter ido parar no inferno (Perdoem-me o trocadilho ruim). Meu pai estava sentado em uma mesa posta para o chá da tarde  (no melhor estilo de filme inglês), levando uma delicada xícara de porcelana com coloridos desenhos de mortes aos lábios, os dedos indicador e dedão segurando a frágil asa enquanto o dedinho estava levantado. No fundo havia uma música instrumental bem mórbida, criando um clima adorável para um chá da tarde às onze horas da manhã. Cena legal, né?

— Pai? — Questionei, olhando em volta o jardim de Perséfone, repleto de joias raras formando flores, mas completamente vazio de vida. Como era verão no Estados Unidos, minha madrasta se mantinha no Olimpo com a mãe.

— Nico. — O Deus dos Mortos saudou, pousando a xícara no pires. — Há quanto tempo, meu filho?

— Três anos — Respondi, apesar de saber que era uma pergunta retórica.  — Desde a Capela dos Mortos em Portugal. — Ele balançou a cabeça, ponderando.

— Não tem muito tempo, não é?  Mas o protocolo manda que eu pergunte como vai.

— Muito bem, obrigado por perguntar. Tirando o fato de que descobri que o senhor me arranjou uma noiva, obviamente. — Falei sarcástico, revirando os olhos.

— Sente-se — Convidou, gesticulando em direção à mesa. — Tome um pouco de chá de romã e coma biscoitos.

— Ah… não obrigado.  — Neguei, nenhum pouco ansioso para ficar preso eternamente no Mundo Inferior por ter comido qualquer fruto dali, tal como Perséfone.

— Cereais? São de Deméter, você não ficará preso aqui.

— Muito obrigado, mas não. — Fiz uma careta ao lembrar do gosto dos cereais da minha tia mais natureba. Deuses, eu preferia beijar uma árvore.¹

— Tudo bem, então. — Ele deu de ombros e voltou a tomar mais chá, fazendo um ruído quando solvia o liquido.

— Pai, que historia é essa de casamento? — Perguntei, me sentando à mesa, mas sem tocar em nada.

— Isso é loucura de seu tio. — Ele fez um gesto de desdém com as mãos.  — Não se preocupe com isso.

— Ah, não?! — Ergui a sobrancelha, cético. — Por que me chamou aqui?

— Para passarmos o dia juntos, como pai e filho, ora! Sabe? Caçar drakons juntos? Forjar espadas? — Fiz uma careta, pensando em dizer que eu não sou filho de Hefestos.

— Um churrasco? — Sugeriu algo quase normal.

— A carne não é de almas torturas é? — Perguntei brincando (em parte).

— Pescaria, então?

— Você não vai usar a carne almas torturadas, né?  — Ele deu uma piscadinha. Era um brincadeira, certo?

— O que os pais fazem com os filhos nos dias de hoje?

— Sei lá.  — Dei de ombros. — Jogam bola?

Ele conjurou uma bolinha vermelha e lançou na minha direção, acima da minha cabeça.

— Pega! — Gritou e o encarei pasmo.

— Você sabe que não sou um cachorro, certo?!  — Perguntei exasperado.

— Mas é claro! — Ele retorquiu envergonhado, e me perguntei se ele sabia que eu não era um cachorro.. — Quem quer passear?!  — O encarei na melhor expressão: “Sério isso?!” — Venha, vamos dar uma volta!

Ele deslisou para fora da mesa e eu tropecei, o seguindo, em direção ao seu palácio. Enquanto passávamos pelos grandiosos salões e corredores, me perguntava o que que tava acontecendo. Meu pai havia deixado claro na última vez que nos encontramos que era melhor ele se manter distante para que eu fosse feliz, e ele queria que eu fosse feliz. Foi o mais perto de sentimento paternal que demonstrou e, infelizmente, foi na época em que eu estava levando uma estátua gigante pelo mundo, os perigos de mortes se sobressaiam a problemas familiares.

— Então, qual sua cor favorita? — Hades perguntou depois de um tempo andando, me despertando dos meus pensamentos.

— Quê? — Questionei, estranhando a pergunta.

— Vamos nos conhecer melhor! — Exclamou tão animado como se tivesse visto um sorvete gigante. — A minha cor favorita é um tom de rosa pastel, porque me lembra os olhos de Perséfone. Qual a sua cor favorita?

—  Hã… — Fiz uma careta, sem saber o que responder. — Preto.

— Preto não é uma cor! É a ausência das cores! — Exclamou, antes de mudar o tom para um jeito pensativo. — Achei que fosse dizer azul.

— Por quê? — Ergui a sobrancelha, sem entender.

— É a cor dos olhos da filha de Zeus não? Vocês quase se beijaram, não é?

— O quê?! — Gritei, arregalando os olhos e parando no meio do corredor. Eu não havia quase beijado, Thalia! Tá, nós estávamos em uma cena de filme de romance clichê, mas isso não significa que eu ia beijar ela!

— Ué, eu fico de olho nos meus bebês! Mesmo que não possa falar com vocês. — Meu pai parou de andar e deu de ombros, como se fosse a coisa mais normal do mundo você ficar vigiando e ouvindo a conversa privada dos seus filhos, principalmente em situações delicadas. — Então... seu amigo estava certo? Sobre aquela pressão… — Senti meu rosto queimar. Já era ruim o suficiente alguém ter me perguntado isso, saber que meu pai ouviu era tão legal quando saltitar no tártaro.

— Você tava escutando minha conversa com Will?! — Gritei novamente. Deuses! Isso não pode estar acontecendo!

— Só fiquei interessado. — Deu de ombros novamente. — Então, você fica ou não excitado pela garota? — Senti meu rosto queimar ainda mais. Era claro que não, eu sequer sinto isso por garotas!

— Pelos deuses, cadê a privacidade?! — Reclamei. Queria estar morto!

— Só estou tendo uma conversa normal com meu filho. Na verdade, acho que é a hora de termos aquela conversa. — Meu pai falou e arregalei os olhos. Não! Não! Não! Isso não pode estar acontecendo!

— Não! Eu não preciso daquela conversa! — Exclamei exasperado.

— Tem certeza? Você já está grandinho... — Ele pegou um livrinho de dentro das vestes negras e começou a ler. — Vamos ver... Você já começou a ter crescimento de pelos pelo corpo, como no rosto, nas axilas, no peito e...

— Pai! — Briguei, tampando os ouvidos com as mãos, como uma criança. Ele parou e ficou me encarando. Respirei fundo e destampei os ouvidos.

— Crescimento do fazedor de xixi?

— Paiê! — Reclamei  e peguei o livro da sua mão, verificando a capa. "Como dizer pro seu bebê que bebês não vem da cegonha: um guia para deuses poderosos terem aquela conversa com os futuros heróis do Olimpo" Em baixo trazia a informação de por quem era escrito: A Rainha Mãe e Titia Dedê, autora de "Mil papinhas pra fazer com cereais". — Isso não pode estar acontecendo...

Murmurei pra mim mesmo, em dúvida se tacava fogo ou jogava o livro para se perder pra sempre nas sombras.

— É um bom livro. — Hades argumentou. — Onde eu estava? — Pegou o livro de volta e começou a ler. — Na adolescência você pode começar a ter sentimentos estranhos e sonhos...

— Pai! — Gritei, novamente, quase me encolhendo no corredor. — Eu sei o que é puberdade! E eu já passei por ela!

— Ah, é? — Ele perguntou, realmente surpreso. —  Bom, vamos pro próximo capítulo. — Ele folheou o livro, parando algumas páginas depois. — De onde vem os bebês?  — Começou a ler. — Quando duas pessoas se amam muito...

— Eu também sei o que é sexo! — Corei extremamente ao falar a palavra. Respirei fundo, tentando me controlar. — Olha, por que não falamos de algo mais animado?  Podemos falar, por exemplo, em quando o senhor vai fazer Zeus desistir dessa ideia maluca...

— Hum... Tenho um presente pra você.  — Falou, me puxando pra dentro de um cômodo no corredor que estávamos. Quando entrei, abri a boca algumas vezes, sem conseguir dizer nada.

— Você se lembra da nossa última conversa?  — Meu pai começou, em um tom nervoso, enquanto eu só encarava o quarto que havíamos entrado. — Em Portugal? Quando eu disse que se algo te acontecesse eu faria um quarto para você.? Eu decidi me preparar, não que eu não acreditasse que você fosse viver, mas eu queria fazer algo bom, algo que você gostasse quando o inevitável, pelo menos até naquela época, acontecesse…

Ele parecia pedir desculpas e eu não conseguia esboçar qualquer reação, observando todo o quarto preto e branco. Havia uma cama grande, com uma cocha preto e branca com cenas de HQ's, uma tevê grande com um vídeo game que não soube identificar, toda uma parede com DVD's de séries e filmes, além de vários action figures. Haviam armários e guarda-roupas que cobriam toda um parede, a porta espelhada me refletindo parado surpreso encarando o quarto, e meu pai logo atrás de mim, desconfortável.

— Essa é a oitava temporada de GOT? — Perguntei, apressando-me para pegar um DVD que trazia Jon Snow sentado no Trono de Ferro na capa.

— Eu conheço um cara, que conhece um cara… — Começou a dizer, indicando que era.

— Pelos deuses! Não acredito nisso!

— Pode acreditar. — Meu pai falou em um tom animado. — E é seu.

— Espera! Se você está me dando tudo isso… — Parei, pensando. Ele havia feito o quarto para quando eu fosse morar para sempre no Mundo Inferior, quando… — Eu morri?

— O que? — Perguntou antes de entender. —  Não!  Não que eu saiba. Você morreu?

— Eu não me lembro… — Tentei revirar minha memória. A última coisa que lembro era da discussão com Thalia, mas acho que a Grace não me matou. Não ainda.

— Então não morreu.  — Meu pai respondeu em um tom animado. — E nem vai morrer.

— Como? — Franzi a testa, me virando para ele.

— Depois que você se casar com a filha de Zeus vai ser imortal...

— Você disse que isso era loucura! — Reclamei, fechando a cara.

— Não vejo problema nenhum em tirarmos proveito disso. — Ele deu de ombros, como se fosse a coisa mais normal do mundo. — Não vai tá machucando ninguém.

— Eu não vou me casar com Thalia! — Afirmei, pronto pra sair dali.
— Por que não?  — “Ah, sei lá. Por que eu sou gay?!” Quase disse, mas somente revirei os olhos.

— Eu vi o clima entre vocês.  São perfeitos juntos!

— Clima? Quê? — Sério, de onde estão tirando isso? Eu fico imaginando o que iria dizer se soubessem dessa história de energia entre a gente. — Não tem clima nenhum entre nós dois!

— Ah, tá.  Diz isso depois de ter a terceira pipopinhazinha na primeira década!

— O que? — Arregalei os olhos, primeiro pelo termo “pipopinhazinhas” (sério, minha vida tá passando na TV Hefestos em horário nobre?!) e segundo porque isso estava vindo de um deus. — Isso não é uma profecia, é? !

— Tem mais uma coisa! — Ele abriu a porta de um guarda roupa e deixei meu queixo cair. Dentro havia todas as estatuetas de deuses e monstros de mitomagia, incluindo algumas versões super raras como a do Ártico, além de caixas e caixas com centenas de cartas do jogo.

— Deuses… — Murmurei, impressionado.
— Tudo isso pode ser seu, Nico. — Meu pai sussurrou perto do meu ouvido, como aqueles diabinhos em desenhos animados. — Você só precisar dizer sim...
— Você está me comprando? — Questionei, saindo do transe.

— De jeito nenhum! — Mentiu. — É só um incentivo.

— Tá, claro. — Retorqui em um tom irônico.

— É verdade! — Meu pai retrucou, exasperado. — Olha, se você aceitar eu trago qualquer pessoa que você escolher e não tiver reencarnado de volta da morte. Ou eu mato quem tiver reencarnado e trago de volta. É só escolher. Que tal o Marley? O Goku? Tracy? Algum Stark? Até os personagens de Nicholas Sparks eu trago de volta.

— Por que quer isso? E não me diga que é por causa da paz mundial… — Advertir e ele mordeu o lábio, provando que havia mais naquela história do que paz e amor.

— Venha comigo. — Ele saiu do quarto e comecei a seguí-lo pelos corredores escuros. — A filha de Zeus já esteve aqui, não é?  Anos atrás?

— Sim, nós fizemos uma missão para Perséfone. — Franzi a testa, não entendendo muito bem o que aquela missão tinha a ver com isso. — Por quê?
— Você se lembra do que buscavam?

— Sua espada. — Respondi e ele se manteve calado, esperando que eu terminasse de desenvolver a história. — É seu novo símbolo do poder e contém as chaves da morte e da vida, Perséfone mandou ser forjada para o senhor se tornar mais forte que seus irmãos. — Ele assentiu com a cabeça, demonstrando que era exatamente aquilo. — O que isso tem a ver?

— Bom, a espada está pronta. — Ele abriu a porta de um novo cômodo, bem diferente do meu quarto. Era todo o escuro e, no centro dele, sob uma luz direcionada, encontrava-se a espada de Hades, presa por um apoio de ferro estígio e protegida por uma redoma de vidro.  — Você sabe o que isso significa, não é?  Se Zeus descrobrir que a possuo logo depois de duas guerras assim...

— Mais uma guerra. — Sussurrei, fascinado pela espada. Ela já havia me chamado atenção quando foi roubada, agora, completamente pronta, eu podia sentir o poder emanando dela.

— Quando Zeus me propôs o acordo, pensei que seria a melhor forma de consertar a tolice de Persefone.

— Acha que a aliança com Zeus impediria que ele se revoltasse por você possuir um novo símbolo? — Questionei, sabendo que isso não adiantaria nada.

— Não. — Meu pai respondeu. — Mas acho que ele não se importaria que, depois de forjada, ela não fosse minha. Se ela fosse sua e da filha de Zeus. — Completou, em um tom sombrio.

— O que você está dizendo? — Me virei para meu pai, concentrando-me nele, tentando acompanhar seus pensamentos.

— Vou oferecê-la como um presente no dia do noivado. — Explicou, com um sorriso macabro. — Como o símbolo da imortalidade de vocês.  

— Você a confiaria a nós? — Ergui a sobrancelha, nem eu confiaria tanto poder à nós.

— Você é o único herdeiro do submundo. — Ele deu de ombros. — Quero que meu legado seja seu.

— Mas teríamos que viver no mundo inferior… — Comecei a dizer, sentindo um aperto de medo, mas também uma pontada de orgulho pelas últimas palavras de meu pai.

—  Podem viver no mundo mortal. Mas quando estivessem fora a espada ficaria no mundo inferior, onde ela pertence. — Um desapontamento me afetou quando percebi o que aquilo significava.

— Ela seria nossa só no nome, não é? — Dei um sorriso sarcástico, para não mostrar que havia sido afetado.

— Não diria com essas palavras…

— Minha resposta é não. — Afirmei, seco. — Posso ir agora?

— Pensa bem, Nico, não é um grande sacrifício. Thalia é uma garota bonita, forte...  

— Pai, eu sou gay! — Exclamei, o interrompendo. Era a primeira vez que eu dizia aquelas palavras, e, mais uma vez, a informação fora arrancada de mim.

— E daí? — Ele deu de ombros, nenhum pouco afetado. —  Seu Tio Zeus nunca escondeu seus casos por aí.  Muito menos Apolo, acho que por isso é o filho menos favorito, conseguiu rapazes mais bonitos que o pai.

— Você sabia? — Perguntei, um tanto quanto surpreso. Não sei bem qual reação esperava dele, mas nunca esperei algo tão… natural. Como se eu tivesse dito algo bem óbvio.

— "Pai, o Percy isso... Percy aquilo... Percy, Percy..." — Me remedou com uma voz bem estranha, afinada. — Eu não sou estúpido, Nico. E eu vejo você e seu amiguinho ensolarado que puxou ao pai...

— Quem? — Franzi a testa. Amiguinho ensolarado? — Will?

— Esse aí.  Eu vejo vocês dois... Assim, até shippo, mas convenhamos que a diferença entre vocês é gritante de mais, meio pombo, prefiro ser team pipopinha… — Minha expressão era: o que?! Gente, além de programa de TV, minha vida tá virando assunto de revista de fofoca e debate também? Quero direitos autorais disso daí!

— Will é só meu amigo!

— Tá.  

— Você está sendo irônico?

 

— De maneira nenhuma. — Seu tom deixava claro que ele estava sendo irônico. Primeiro Thalia, agora Will. Sério? Por que as pessoas ficam vendo maldade na minha vida? — Então, vai casar?

— Você só pode estar brincando em me perguntar isso...

— Pensa bem antes de decidir, Nico. — Hades avisou, em um tom sério, encarando-me nos olhos. — Há muito mais em jogo do que algumas cartas... Pode voltar ao acampamento agora, darei alguns dias pra se decidir. Se quiser falar com a filha de Zeus sem que os outros deuses escutem, use meu chalé. Nenhum outro deus consegue ver o que se passa ali, assim como eu não consigo ver nos dos outros.

—Posso levar as séries? — Perguntei esperançoso. Eu não ia aceitar o pedido, então quem sabe quantos anos eu levaria pra conseguir ver depois  de lançarem todas aquelas séries e filmes.

—Não, isso é só depois do casamento. — Meu pai falou sério, antes de abrir um sorriso. —Mas podemos maratonar Game of Thrones  e pedir pizza, fazer aquele dia pai e filho, sabe?

— Existe entregador de pizza pro Mundo Inferior? — Ergui a sobrancelha, enquanto ele pegava um celular de dentro das vestes.

— Claro! Tem uma maravilhosa com pimentas inspirados em cada rio do Tártaro! — Passou a língua nos lábios, como que provando a pizza. — Mas as melhores são as inspiradas nas torturas. Podemos pedir algumas e aquela coisa que você gosta de comer. Como é o nome mesmo? Da caixa vermelhinha? Que você me mandou no dia dos pais?

— McLanche Feliz? — Ergui a sobrancelha.

— Isso mesmo! Só não gosto do nome. Vamos pedir McLanche Triste, pizza e tomar suco enquanto vemos GoT no cinema!

— Tem um cinema aqui? — Questionei, arregalando os olhos. Poxa, no tempo que fiquei no Mundo Inferior não sabia que tinha nada disso!

— Aqui é um palácio, querido. Você achou que só ia ter masmorra?



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Notas finais do capítulo

*Estou escrevendo um possível spin-off de EMNSC, um trecho futuro: https://fanfiction.com.br/historia/705986/Simplesmente/

*O que vocês acham que Zeus vai fazer?!
* Pequena curiosidade: Quais personagens de séries, livro, filmes, etc vocês iriam trazer de volta?
* O que acharam?
* Vencedores(as) do game poser: Filha do Pescador e Aluada"! Parabéns, sweets! Entrem em contato comigo pra ganhar os prêmios!
* Pergunta do game poser:
De onde vem os bebês?

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