Um Rei para Hawktall escrita por Loba Escritora
Cateline
Enquanto o cavalo trotava embaixo de si, tentava colocar seus pensamentos em ordem. Como pôde concordar com uma sandice dessas? Por acaso havia perdido o juízo? Tudo que menos precisava era de mais um problema para lidar agora. Por mais belo que fosse ele… e sem dúvida alguma, belo ele era. Se seu tempo na terra acabasse hoje, certamente pediria à Prussiya para que a deixasse mergulhar naqueles olhos… Deixe de estupidez, Cat!, ordenou a si mesma, batendo na própria testa.
De qualquer forma, era só não ir. Ele nem sabia quem ela era… claramente a confundiu com outra pessoa. De repente começou a rir, incrédula de como a sorte resolveu lhe sorrir de uma hora para outra. Ele era sua chance, mais uma chance. Como pôde pensar em fugir? É claro que iria!
Precisaria de um vestido, antes de mais nada. Mas as modistas da capital já tinham preços altos, com a infestação de visitantes pela qual estavam passando, tudo deveria estar custando ainda mais. Maldição! Devo chorar no banco de um jardim para que a Fada Madrinha apareça?, pensou irritada, esmurrando o ar. Entretanto, poderia ela ter uma fada madrinha…
Olhou para o céu, o Sol estava alto, não deveria ser mais de meio-dia. Ele deveria estar lecionando esgrima na Pedra Rachada, se andasse depressa conseguiria encontrá-lo a tempo.
♢
Ouviu o entrechocar de espadas quando se aproximou. Aquilo certamente não parecia uma aula e sim uma batalha, apertou o passo, preocupada.
O garoto estava atirado ao chão, segurando a espada com as duas mãos, tentando evitar que os golpes desenfreados o atingissem no rosto. Hudde o atingia tão incansavelmente que o suor escorria por suas mangas, e madeixas negras já não se moviam mais, estavam molhadas e atadas ao seu rosto.
— Hudde! — gritou. — Pare já com isso! Vai matar o pobre garoto!
— Isso é uma espada de treino, estúpida! Não tem gume para que o mate! — e continuou a golpeá-lo com força.
— Ele está caído! O chão não me parece um bom lugar para uma aula ser assistida — Cateline disse com impaciência.
Hudde hesitou por um minuto, diminuindo a força e velocidade dos golpes, mas jamais parando de atacar.
— Vamos, maricas! Levante e lute como homem! — provocou, o rapaz tentava se levantar, cheio de dor e medo. — Ande logo! Já lhe disse que não perderei o dia todo aqui, inútil!
Quando Hudde ergueu novamente a espada, Cateline não pensou duas vezes, empurrou-o com toda força que tinha, suas pequenas mãos o atingiram na altura das costelas, ele se desequilibrou e saiu rolando pelas pedras até a margem do rio. Ela não conseguiu conter o riso, dobrando-se e apoiando as mãos no joelho, observou gargalhando Hudde voltar a ficar de pé, praguejando.
— Por que diabos ainda está aqui, garoto? — disse, retomando o fôlego e notando Kazimir ao seu lado, imóvel como uma estátua.
— V-você… salvou a minha vida — respondeu, incrédulo.
— E me agradece ficando aqui para morrer? Se pensa que ele voltará aqui mais calmo do que estava, é mais burro do que parece.
— Sei que devo ir, mas preciso dizer que não sei como retribuir-lhe. Ficarei devendo para sempre! — disse, enquanto olhava assustado Hudde se aproximando novamente.
— Não se preocupe, não me deverá por tanto tempo, tratarei de cobrar. Agora vá! — Cateline o empurrou.
O rapaz começou a correr aos solavancos quase que no mesmo instante que Hudde chegou.
— Volte aqui, maldito! — berrou estrondosamente, fazendo com que o rapaz corresse ainda mais veloz. Virou-se então para ela — Como se atreve a me derrubar assim na frente de um aluno?
Seu peito largo arfava, a camisa entreaberta mostrava a pele com poucos pelos subir e descer rápida e intensamente, fazendo com que Cateline tivesse que conter o impulso de se jogar em seus braços.
— Não te vi com um aluno. Te vi espancando alguém bem menor do que você — respondeu, com dureza na voz. — Agora trate de mostrar satisfação em me ver tão cedo depois da nossa discussão.
— Ora… não é como se fosse uma surpresa, Cateline — debochou dela. — Você sempre volta para mim.
O encantador sorriso descarado a fazia ferver de desejo e irritação.
— Não me faça te derrubar novamente, ogro — agora estava realmente aborrecida. — Não vai me perguntar o que quero aqui?
— Certamente um beijo — Hudde respondeu, já aproximando-se.
— Não ouse me tocar — ela o parou com uma das mãos. — Primeiro porque está cheio de areia e suor, e depois, minha presença já é mais do que merece, não te darei meus lábios também.
— Então o que quer, mulher? — bufou com impaciência.
— Um vestido! — respondeu, com um sorriso nos lábios.
Foi a vez de Hudde gargalhar.
— Vem aqui, estraga minha aula, me empurra diante de um maricas, me nega um beijo e espera que seja recompensada por isso?
— Depois de todo esse tempo juntos, você tem a coragem de me olhar nos olhos e dizer que competirá pela mão da Princesa, e acha mesmo que deveria voltar a olhar para essa sua cara de cafajeste sem nem mesmo ter direito de pedir uma prenda? — fez da voz um chicote.
— Cateline… — finalmente ele abrandou o tom. — O torneio não é pela mão de Marey, mas ainda que me case com ela, será porque é preciso. Mas em pouco tempo você é que será a minha rainha.
Sabia que o único motivo para esse súbito interesse na Princesa era o maldito desejo de vingança que nutria há anos. Mas estava perto de conseguir o que queria, não podia facilitar as coisas para ele.
— Ótimo. Estou pedindo um vestido para combinar com a coroa — continuou, impassível.
— Está certo — ele se rendeu. — Vá até o ateliê de Leyle, ela é a modista de minha mãe. Diga-lhe que tens minha autorização para comprar um vestido e que depois irei até lá quitar a dívida. Escolha o que quiser, está bem?
— Perfeito — bateu palminhas, sabia que ele adorava quando fazia isso.
— Ganho um beijo agora? — perguntou, com um meio-sorriso no canto da boca.
— Não! — divertiu-se ao ver seu rosto se contorcer. — Talvez amanhã, quando estiver sem toda essa areia — virou-se e começou a andar.
— É assim que me agradece? Seus pais não lhe deram educação, não?
— Muito obrigada! — gritou, já longe.
♢
Chegou a modista, e ao dar o recado foi extremamente bem atendida, como era de se esperar. Os Arkalis não eram queridos, mas seu dinheiro certamente que sim.
— Me acompanhe, vamos tirar suas medidas — disse Leyle.
Enquanto percorriam o ateliê, se deu conta de que não possuía tempo para esperar a confecção de uma veste.
— Na verdade, eu gostaria de algum vestido já pronto, tenho certa urgência — pediu.
— Oh! Sendo assim, venha comigo — a mulher robusta que trajava cores muito alegres encaminhou-se para outro cômodo através de um longo corredor. — Sor Hudde é um belo rapaz, és uma moça de sorte, querida — comentou com simpatia.
— Somos apenas amigos — respondeu Cateline, com um sorriso tímido, corando.
— Está certo, está certo — disse Leyle, enquanto indicava uma arara repleta de lindos modelos. — Veja se algum lhe agrada. Tem algo em mente?
— Tenho. Quero parecer uma princesa.
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