Um Rei para Hawktall escrita por Loba Escritora


Capítulo 7
Capítulo VI




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Hudde

A capital estava um verdadeiro caos. Com cavaleiros, nobres e meros plebeus chegando de cada um dos quatro cantos do reino, o ambiente ao seu redor mais parecia um formigueiro. As estalagens ficaram lotadas com menos de uma semana do anúncio feito, quem chegava precisava recorrer aos bordéis, e em mais alguns dias esses também não possuíam mais quartos, foi assim que as principais praças se tornaram acampamentos.

Se soubesse que mal conseguiria se mover por entre a multidão composta por pessoas, barracas e estandartes, Hudde teria saído mais cedo de sua casa. Precisava ir ao ferreiro para tirar as medidas para sua nova armadura, antes de partir para a aula de esgrima que daria a Kazimir.

O rapaz era a personificação do fracasso, só de pensar em suportá-lo durante algumas horas, fazia com que sua cabeça começasse a latejar e seu mau humor se tornasse ainda maior. Nunca deveria ter concordado em instruir aquela criaturinha magricela e sem culhões, mas o Barão Donoghan praticamente implorou, e era amigo da família… um dos poucos.

No fundo Hudde sentia pena dele. Um grande senhor, com dinheiro, boa posição e respeito, ter um filho… daquele. Se fosse meu filho, já teria o levado para uma caçada, aonde ele cairia de seu cavalo e seria pisoteado pelo mesmo, um trágico acidente, pensou. Mas o fato é que Kazimir não era seu filho e não cabia a ele a decisão sobre o que fazer com sua medíocre existência, tudo que restava a Hudde era se apressar antes que se atrasasse ainda mais.

Começou a se perguntar se havia errado a rua da oficina, até que avisou a pequena porta acobreada no muro azul, um enorme estandarte com uma serpente verde em fundo negro cobria o letreiro, o que havia dificultado que a identificasse com rapidez.

Há alguns passos do local jazia um corpo quase que cortado ao meio, sangue e carne tocando o chão através da abertura que ia do ombro à virilha, provavelmente fruto de uma briga na noite anterior. Cobriu o nariz com uma das mangas para caminhar em meio ao fedor quase insuportável.

— Alguém aí? — gritou, depois de ter algumas batidas na porta ignoradas.

— Quem chama? — fez-se ouvir uma voz assustada.

— Um cavaleiro à procura de uma armadura. Aqui por acaso não trabalham mais ferreiros? — Hudde revirou os olhos, impaciente.

Certamente procuraria por outro local para fazerem o serviço, senão fosse o fato de que ali eram produzidas até mesmo as armaduras da Guarda do Rei, então nenhum outro ferreiro ofereceria a mesma excelência em serviço.

— Um minuto, sor — disseram já rente à porta, enquanto pôde ouvir o que pareceu ser um molho de chaves.

A porta se abriu, revelando um minúsculo homem de meia idade, com uma barba de fios brancos cuidadosamente aparada, usando pequenos óculos em formato de meia-lua. Olhou para tudo ao redor antes de finalmente direcionar seu olhar para Hudde.

— Faça a bondade de me acompanhar, sor — disse enquanto se movia, indicando o caminho. — Ontem houveram disputas entre bêbados, não sei se dizer se por jogos ou se por putas… talvez pelos dois. Mas o resultado não foi nada bom… nada bom — o homem balançou negativamente a cabeça, em sinal de desaprovação. — A Proteção da Cidade chegou muito depois de um homem ter acabado morto, e nem sequer retiraram o corpo da rua. Embora minhas oferendas estejam em dia, algo me diz que Prussiya está tendo muito trabalho, então preferi trancar as portas com medo de um saque, queira me perdoar.

O homenzinho havia sido prudente, não importava o quanto você oferecia, deuses não costumavam perder tempo cuidando dos mortais.

— Não se preocupe, senhor. Fizeste bem —respondeu, enquanto se sentava no lugar indicado pelo ferreiro.

— E então? Gostaria de uma armadura? Seria reforçada para combate ou ornamentada para o grande torneio? — perguntou, enquanto oferecia a ele uma taça de vinho.

— Não preciso que seja reforçada para combate, já possuo uma assim — aceitou o vinho. — Minha intenção é diminuir o peso para melhorar os movimentos no torneio. Mas não procuro por ornamentos.

— Está certo disso, sor? — perguntou o homem, tentando fazer com que seu interesse pela venda de maior valor parecesse com uma real boa vontade. — Esses torneios promovem glória aos cavaleiros e às suas famílias, os ornamentos mostrando de onde vem podem ser muito úteis.

— Se soubesses de qual família venho, certamente não me atenderia com tanta amabilidade — a amargura invadiu o tom de voz. — Apenas faça como lhe pedi.

Havia marcado com o aprendiz na grande Pedra Rachada, com seu considerável atraso esperava que tivesse a sorte do rapaz ter ido embora e dado um dia de descanso aos seus ânimos. Mas ao chegar no local, pôde observar que Kazimir não havia desistido do dia de treinamento, ao invés disso estava tentando fazer com que pequenas pedras quicassem na superfície do rio logo à frente. Aquilo bastou para enfurece-lo.

— Eu me atraso todo esse tempo e ao invés de praticar um pouco, se exercitar ou até mesmo polir a espada, você está jogando malditas pedras na porcaria de um rio?! — gritou, assustando o rapaz.

— Perdão, Hud… sor. Perdão! — respondeu Kazimir, enquanto corria ao seu encontro. — O senhor acabou se atrasando um pouco e eu me distraí. Juro-lhe que o erro foi honesto, não tive intenção de…

— O que estava fazendo, Kazimir? — lhe interrompeu.

— Era apenas uma brincadeira, sor — abaixou a cabeça, deixando os pequenos cachos muito negros cobrirem a face pálida.

Hudde podia jurar que ele urinaria nas próprias calças, fedia a medo. Sua vontade era escavar sua pele com socos, à procura de uma gota que fosse de coragem em meio ao sangue.

— Uma brincadeira de criança. Quantos anos tem, Kazimir? — perguntou, contendo com muito custo seus impulsos.

— Quinze… — abaixou ainda mais cabeça.

— Você não é mais uma criança, Kazimir. Está mais do que na hora de se comportar como um homem — assumiu um tom de voz mais cortante do que sua espada. — Seu pai não espera que se torne um cavaleiro, ele não é nenhum tolo para apostar tão alto em você, sabemos bem disso — podia notar a respiração do rapaz tornar-se profunda enquanto tentava segurar o choro. — Mas ele espera que ao menos seja capaz de defender a si mesmo e sua futura esposa com uma espada. É… Ele espera que tenha uma esposa, que gere filhos e continue a linhagem da família. Pobre homem! — a única coisa que o rapaz tentava reter agora, eram os soluços, pois as lágrimas já lhe banhavam a face.

— E-eu… — tentou dizer, mas Hudde o interrompeu novamente.

— Você nunca será um homem, Kazimir. No lugar de seu pai, eu certamente já teria me livrado de você. Mas a semente do homem é fraca, só gerou mulheres e um maricas. Não o culpo por ainda tentar.

Pegou a espada no chão, segurando em sua lâmina, golpeou o estômago de Kazimir com o punho, com força o suficiente para que o magricela se encolhesse enquanto engasgava.

— Agora seque esse maldito choro e segure sua espada, já perdi tempo demais e não quero desperdiçar o resto do dia contigo.

Começaram então o treinamento.


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