Um Rei para Hawktall escrita por Loba Escritora


Capítulo 15
Capítulo XIV




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Giuseppe

Giuseppe acordou com o coração sobressaltado, sentia-se zonzo e pensar na perna dava-lhe vontade de gritar… de raiva, de desespero, e acima de tudo, de dor. Lágrimas não convidadas salgavam sua boca, o ferimento doía demasiadamente.

A escuridão lá fora mostrava que a noite ainda reinava. Em meio ao fedor que sua perna emanava, sentiu um leve aroma doce. Ao olhar ao seu lado, viu-a deitada em sono profundo. Havia retirado o corpete apertado do vestido, e a seda vermelha beijava sua pele muito branca, o peito inflava e murchava, conforme a pesada respiração, hipnotizando-o. Os lábios, tão rubros quanto seus cabelos, pareciam um convite aos céus. Incapaz de resistir, a beijou…

— Giuseppe… — abriu os belos olhos para fita-lo.

— N-não quis a-acorda-la — ao tentar falar, Giuseppe percebeu que tinha tanto frio que seus lábios tremiam.

— Está tudo bem? — ela sentou-se na cama, preocupada.

Giuseppe não queria assusta-la, tampouco parecer fraco diante dela.

— Sinto frio — admitiu com esforço. Sentia que iria congelar. — Muito frio.

— Está ardendo, meu amor — disse ela, enquanto tocava-lhe a face com as mãos delicadas.

Sua princesa se levantou e correu até uma grande penteadeira de madeira escura, encostada à parede no fundo do quarto. Nela havia um jarro, uma tina e alguns tecidos muito brancos. Ensopou um deles com água fria e o depositou em sua testa.

— Sua perna… — ela observou a ferida escura, que parecia soltar um líquido amarelado. — Dói?

— N-não precisa se p-preocupar…

— Dói ou não? — perguntou com firmeza. — Preciso que me diga a verdade.

— Jamais senti tanta dor em minha vida — Giuseppe resolveu admitir, afinal, estava claro pelo olhar de preocupação dela que suas expressões já o haviam traído.

Sua princesa buscou outro pano, limpou o ferimento suavemente, e pegou um unguento com ervas de cheiro forte, em um misto de verde e marrom.

— Talvez arda um pouco — o alertou. — Kazimir disse para só usá-lo em caso de gangrena, pois é bem forte.

Giuseppe assentiu, permitindo a aplicação, mas grunhiu quando a mistura tocou sua perna.

— Prussiya tenha piedade! Morrerei!

— Não diga isso! — ela não conseguiu conter as lágrimas. — Não permitirei que morra! Eu o proíbo! Ouviu? Está proibido de morrer!

Seu choro o atingiu em cheio. A chamou para perto de seu rosto, secando suas lágrimas com beijos.

— Perdoe-me… não morrerei. Não irei para nenhum lugar em que você não esteja — prometeu.

Ela usou os lábios para tocar os dele, como quem toca algo frágil que pudesse se quebrar a qualquer momento. Aos poucos, a intensidade do beijo foi aumentando, já não conseguia soltá-la.

A puxou pela fina cintura e a colocou sobre si, sem nunca parar de beija-la com fervor. Tomado por um desejo súbito, tocou-lhe os ombros e os libertou das mangas do vestido. A seda caiu sobre ele, deixando aqueles belos seios à mostra. Foi quando interrompeu o beijo para contempla-la.

— És tão bela… — parecendo se dar conta do que fez, sentiu seu rosto enrubescer. — Perdão… eu não deveria…

— Não se desculpe… — ela lhe sorriu.

Suas pequenas mãos terminaram de tirar o vestido, colocando-o no chão junto com o mar de cobertores que havia sobre ele. Há alguns instantes, isso faria com que ele sentisse como se tivesse submergido em um gélido lago no inverno, mas o calor dela aquecia cada centímetro de seu corpo.

Abocanhou sua pele como quem saboreava uma suculenta maçã vermelha, podia ouvir sua respiração ofegante. Enquanto acariciava suas costas, pôde sentir sua pele arrepiar-se sob seus dedos, ansiosos por percorrer todo aquele exuberante corpo.

Quando chegou ao seu íntimo, sentiu a umidade quente chamar por ele.

— Tem certeza? — perguntou, olhando o mar que suas pálpebras abrigavam.

Ela desabotoou sua calça, e então respondeu: — Sim…

Quando acordou, o brilho do Sol invadia o quarto, a perna ainda latejava, mas já não sentia como se fosse morrer há qualquer momento. Sua princesa havia sumido. Terá sido um sonho? Um maravilhoso sonho…, pensou. Mas ao olhar para o outro lado da cama, viu um pequeno pedaço de renda vermelha, como a marca de um beijo dizendo que de fato ela estivera ali.

Kazimir entrou no quarto com o médico das redondezas, Doutor Gardto, o mesmo que consultara seu pai.

— Como vai o senhor seu pai, rapaz? — perguntou, enquanto se sentava em um banquinho próximo à perna de Giuseppe.

— Certamente melhor do que eu — respondeu. Não intencionava ser indelicado, mas a dor lhe alterava os ânimos. — Kazimir fez a bondade de me adiantar o suficiente para que pudesse comprar a medicação necessária até o fim do torneio.

— Fico aliviado ouvindo isso — o médico esboçou um sorriso. — Agora vamos ver essa perna.

Quando ele retirou os unguentos, Giuseppe pôde constatar que o fedor diminuíra, e que a carne, apesar de esponjosa e muito negra rente à ferida, voltava a se avermelhar ao redor.

— Precisamos tirar a pele morta e fechar o corte — começou a limpar os resquícios da mistura. — Isso certamente doerá um pouco.

— Duvido que possa doer mais do que já doeu — Giuseppe tentou sorrir. — Vá em frente.

Se arrependeu do que disse instantes depois de ter dito. Enquanto o médico cortava a pele, Kazimir parou ao seu lado e estendeu-lhe a mão.

— Aperte o tanto que precisar, mas não grite — disse o amigo. — Hudde deve estar espreitando nos arredores da casa, não dê a ele a satisfação de ouvi-lo gritar.

Segurou firme a mão do rapaz. Quando a pele enegrecida havia sido retirada por completo, o médico passou a apertar a ferida, unindo novamente a carne, e costurando a pele avermelhada ao redor. Sentia as lágrimas escorrerem até o pescoço, e podia jurar que por pouco não quebrara nenhum dedo de Kazimir.

— Repouso absoluto agora — Gardto entregou um frasco a Kazimir. — Para o caso de febre. A dor é normal. Mantenha sempre limpo os pontos, não podemos descuidar, ainda corre o risco de infeccionar.

— Qual é a próxima prova, Kaz? — Giuseppe se lembrou do torneio.

— Arco e flecha, mas… — Kazimir começou a responder.

— Mas está de repouso absoluto — Doutor Gardto interrompeu o jovem.

— Não preciso usar as pernas para manejar um arco, doutor — Giuseppe não queria saber de argumentos, não deixaria o torneio.

— Estou dizendo, meu jovem, ainda pode perder a perna se isso infeccionar…

— Não irá — Giuseppe encerrou o assunto.

O médico se retirou com cara de poucos amigos.

Foi somente após Kazimir mencionar o nome de Hudde que Giuseppe se lembrou dele.

— Kaz, o que houve com Hudde? Foi desclassificado, certo?

— Errado — Kazimir estava nitidamente frustrado. — Seu escudeiro assumiu a culpa, disse que se confundiu ao pegar as lanças.

Uma clara mentira, pensou.

— Maldito seja! — socou o colchão desejando que fosse a cabeça de Hudde. — E meu cavalo?

— Sinto muito, Giuseppe… parece ter quebrado o quadril na queda brusca. Já o retiraram da arena morto.

Fez-se um silêncio triste. Guardião era mais do que um cavalo para Giuseppe. Sua montaria era aquilo em que mais confiava.

Foi Kaz a quebrar o silêncio: — Você ainda tem mais uma visita… vou busca-lo, está ocupado com alguns bolos na cozinha.

Minutos depois, Louis atravessou saltitante pela porta entreaberta e pulou na cama.

— Irmão!!! Eu senti tanta saudade — disse enquanto se pendurava no pescoço de Giuseppe.

— Ei, rapazinho, cuidado com minha perna — Giuseppe soltou uma gargalhada. — Que bom te ver! Sabes que é minha saudade constante — afagou os cabelos do irmão — Esse é Kaz…

— Já nos conhecemos! — Louis começou a tagarelar. — Ele é muito legal, me deixou comer três bolos diferentes na cozinha, e disse que eu posso brincar no jardim quando quiser. Você sabia que ele tem um labirinto só dele? — os olhos do menino brilhavam.

— Pensei que talvez pudéssemos esconder um presente para ele lá, Giuseppe, e então ele teria que encontra-lo — sugeriu Kaz.

— Um presente? Que incrível! — Louis olhou para Giuseppe. — Posso aceitar?

— Claro que sim. Você não deve aceitar presentes de estranhos, Louis — olhou então para Kazimir. — Mas Kaz não é um estranho, é meu irmão também — era a vez dos olhos de Kazimir brilharem.

— Então você é meu irmão também, não é? — Louis animou-se com a ideia. — O que vai me dar de presente? Me dá uma espada? Eu sempre quis uma espada, mas o Giuseppe não quer me dar uma.

Ambos caíram na gargalhada.

— Acho que você é jovem demais para uma espada, Louis — Kazimir tentou ponderar. — Além do mais, assim como você, sou um irmão mais novo, tenho que obedecer Giuseppe também. Posso lhe dar alguns livros que eram meus na sua idade, que tal?

— Pode ser uma história com espadas? — Louis novamente os fizera gargalhar.

— Certamente! — Kazimir e Giuseppe responderam em coro.

Os três tiveram uma tarde animada, quando o menino foi levado para casa por uma das carruagens do Barão Donoghan, Kazimir entregou a carta que a mãe de Giuseppe havia enviado.

Fez-se um breve silêncio até que ele pudesse terminar a leitura e então disse: — Meu pai está firme, as dores diminuíram, mas o sangue na tosse permanece — ajeitou-se na cama, incomodado. — Essa foi a pior hora para me acidentar, minha pobre mãe deve estar exausta cuidando dele e de Louis.

— Talvez Louis possa passar um tempo conosco — sugeriu Kazimir.

— Não quero incomodá-los ainda mais — Giuseppe resolveu ser franco. — Mas seria ótimo ter meu irmão por aqui, será que seu pai permitiria?

— Falarei com ele, mas creio que sim — Kazimir tomou coragem e continuou. — Gostaria de perguntar-lhe uma coisa, já que me considera um irmão, acho que não se incomodará em responder…

— Pois pergunte.

— Como conheceu… a princesa?

— Oh, sim… — agora era a vez dos olhos de Giuseppe se iluminarem, e a luz que eles produziam era mais intensa do que o luar lá fora. — Essa é uma história que com certeza me animará.

E começou desde o princípio, naquele dia comum em que escolhera escalar uma torre e isso tornou sua vida extraordinária.


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