Coffee Breaks escrita por Kira Queens


Capítulo 9
After All, You're My Wonderwall


Notas iniciais do capítulo

Oláá!!
Bom, eu tenho umas coisinhas pra falar. A primeira novidade é que agora nossos capítulos têm nome!!! Me sinto bem melhor, eu tava muito incomodada pq não tinha título. Alguns vão ser nomes de músicas, outros frases de música ou talvez filmes, séries, livros etc, outros vão ter saído da minha cabeça mesmo e é isso. Outra novidade é que agora eu to escolhendo um comentário pra marcar como o melhor e tudo mais, porque eu não fazia isso né, mas não é justo com vcs que se dão ao trabalho de falar o que estão achando e tudo mais, então vou tentar ir variando.
Por enquanto é isso, espero que gostem, gente!!



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Foi quando eu tinha quinze anos que eu me apaixonei pela primeira vez. Ele era mais velho do que eu uns dois anos e tinha o seu próprio carro, o que, no auge da minha adolescência, fez com que eu me sentisse tão sortuda por ele me querer. Saímos para o nosso primeiro encontro durante o outono. Nada muito especial, nós só fomos caminhar pelo único parque da minha cidade natal do interior. Acontece que o outono na Inglaterra era encantador, com as folhas secas caindo ao chão em tons exuberantes de vermelho e amarelo. Lembro-me perfeitamente bem da touca cor-de-rosa que eu estava usando naquele dia, enquanto ele tinha um cachecol azul que combinava com os seus olhos enrolado ao redor do pescoço. Ele me beijara pela primeira vez ali, com a brisa fria batendo contra nossas bochechas fazendo nossa pele alva se enrubescer.

É lógico que não duramos muito tempo. Um doce amor juvenil, mas, como a maioria de sua espécie, não era muito promissor. Ele estava no último ano da escola, por isso quando ele foi me pedir em namoro eu praticamente surtei, porque como ele iria embora no ano seguinte para fazer faculdade eu não via como aquilo poderia funcionar. O pior era que ele estava disposto a desistir de tudo e fazer uma faculdade qualquer lá por perto só para ficar perto de mim, o que só serviu pra me assustar mais ainda. Depois disso, ele passou a me odiar e nós nunca mais conversamos. Ele se formou, é claro, levou outra garota como seu par e, dois anos depois, eu levei outra pessoa para a minha própria formatura e nós seguimos nossas vidas separadamente, sem nunca mais ter notícias um do outro.

Ainda assim, era nele em quem eu pensava enquanto percorria a distância da minha casa até o meu trabalho. As folhas coloridas típicas dessa estação do ano me lembravam daquele dia no parque e, se eu fechasse os olhos sentindo o vento contra a minha face, quase me recordava do toque de seus lábios sobre os meus. Quase. De qualquer modo, aquela fora minha única experiência real com o amor e eu era um pouco mais ingênua do que agora, portanto me peguei perguntando a mim mesma se eu iria reconhecer o sentimento quando me apaixonasse novamente.

O que me levava de volta à questão Finnick. Parecia que não importava o tanto que eu tentasse pensar sobre outras coisas, outras pessoas, no fim das contas seria sempre ele. Sempre sobre aqueles dois beijos sobre os quais nós não faláramos, até porque não significava nada, mas por algum motivo incompreensível eu era incapaz de me livrar da impressão de que aquilo tinha de fato importado. Só que eu não iria tocar no assunto e, pelo visto, nem ele. Os acontecimentos recentes me fizeram descobrir que nós éramos excepcionais em fingir que nada tinha acontecido.

Nesse dia específico, entretanto, seria mais fácil me manter distraída dos meus próprios involuntários pensamentos cheios de segundas intenções. Isso porque Haymitch e Effie haviam finalmente contratado alguém para tomar o lugar de Katniss, apenas algum tempo após suas aulas terem começado. Cheguei ansiosa ao café e deparei-me com os meus chefes conversando apressadamente com uma garota loira cujo rosto não pude ver, já que ela estava de costas para a entrada. Aproximei-me hesitante, em dúvida se eu deveria esperar; se estava tudo bem em interromper ou se eu simplesmente deveria ignorar e começar o meu trabalho – o que me pareceu rude, de forma que descartei essa opção.

— Oh, querida! — exclamou Effie ao se dar conta de minha presença — Essa é Annie Cresta, ela vai te ajudar com o resto das coisas, tudo bem?

— Tudo bem — confirmou a garota, sua voz fina e melodiosa preenchendo o ambiente. Meus chefes correram escada acima em direção ao escritório. Imaginei que eles teriam que reorganizar os investimentos agora que dispunham de uma funcionária a mais. Senti-me triste por um momento, sabendo que agora a garrafa nova de chantilly que eu tanto desejava não seria comprada tão cedo, e nem os aventais novos que Katniss almejava. Deixei de pensar nisso quando a garota se virou para mim e a minha animação em conhecê-la voltou a ser predominante dentre os meus anseios — Muito prazer, eu sou Madge Undersee — ela se apresentou, mostrando seus dentes tão brancos que eu podia pensar que ela havia acabado de sair do dentista.

Eu sempre me achei bonita. Não bonita ao ponto de todo mundo virar o rosto no corredor para me olhar ou querer ser modelo nem nada, mas eu gostava da minha aparência, especialmente do jeito como meus olhos verde-claro contrastavam com o meu cabelo cor de chocolate. Mas eu juro que por um momento a garota parada à minha frente fez com que eu me sentisse um patinho feio. Seu cabelo loiro brilhava em um tom de ouro, aparentando estar sedoso e hidratado. Madge tinha os olhos azuis e os traços delicados, sem falar que sua pele clara parecia ser feita de porcelana. Ela curvara os lábios bem desenhados em um sorriso simpático como se estivesse sendo fotografada, mas não era proposital, era só que ela se parecia com a Barbie mesmo, foi o que eu pensei e eu quase dei risada da minha própria comparação.

— Eles já adiantaram, mas eu sou a Annie — respondi-lhe. Andei para trás do balcão, amarrando o avental por cima da blusa de frio larga e colorida que eu usava. A combinação só não ficou mais ridícula ainda devido à minha saia e meia-calça serem pretas, da mesma cor do avental — É bem fácil trabalhar aqui, só aparece gente de dois em dois meses e nós só temos que saber fazer uns três tipos diferentes de bebida — eu brinquei, mas sem demonstrar isso no meu tom de voz, esquecendo-me de que era Katniss quem estava acostumada com as minhas brincadeiras sem graça. Madge me olhou confusa, fazendo com que eu risse — É brincadeira, você vai adorar. Pelo menos, eu adoro — dei de ombros.

— Alguma recomendação ou alguma coisa que eu deva saber? — ela perguntou, nitidamente apenas para tentar puxar assunto. Enquanto eu pensava na resposta, um de nossos fregueses mais fiéis, Harold, entrou pela porta. Sorri gentilmente, já começando a preparar seu habitual cappuccino.

— Ele sempre faz o mesmo pedido — disse a Madge — Sempre — reafirmei. Tentei pensar em algo a mais para lhe dizer, não que realmente importasse, porque eu havia sido sincera quanto a ser fácil trabalhar ali, mas sim porque eu queria continuar conversando. Durante os dias em que eu tive que trabalhar sozinha, senti-me bastante solitária sem Katniss para tagarelar o dia todo comigo. Ela podia vir apenas no turno vespertino, mas, mesmo assim, estava cada vez mais complicado por causa de algumas aulas extras e trabalhos, coisas das quais ela não reclamava, mas eu podia ver o cansaço e preocupação em seus olhos diante da ideia de que ela não fosse dar conta da faculdade e do café ao mesmo tempo.

Servi o pedido de Harry, que me perguntou sobre o conto e eu lhe respondi que estava praticamente finalizado. Desde o dia em que eu o acompanhei ao cemitério nós havíamos conversado com mais frequência. Prometi lhe dar uma cópia da história sobre ele e Maggie o mais rápido possível e ouvir suas sugestões, caso ele as tivesse.

Achei divertida a maneira como Madge tentava manter sua postura o mais profissional possível. Eu a ensinei a preparar algumas bebidas e ela tomava tanto cuidado que parecia que seria demitida caso derramasse uma gota. Mal sabia ela que Haymitch já viera trabalhar de ressaca várias vezes e Effie gostava de sair para comprar roupas quando não havia muita coisa a ser feita. Mas não disse nada, porque logo ela descobriria que eu lia alguma coisa ou dava continuidade ao meu livro nos breves intervalos que nós tínhamos de tempo em tempo e perceberia que seriedade não era um termo apropriado para designar nosso ambiente de trabalho.

Em um desses intervalos, coincidiu-se de Katniss chegar irrompendo pela porta, berrando meu nome e correndo para me abraçar com o balcão entre nós, fazendo com que o móvel apertasse meu estômago e eu quase caísse por cima desse, gemendo de dor. Mas nem me dei ao trabalho de reclamar muito, porque minha melhor amiga parecia mesmo feliz em me ver, e só então eu parei pra pensar no quão pouco nós estivemos nos encontrando.

— É você que tomou o meu lugar? — Kat disse à Madge, quando me libertou de seus braços. Sua expressão estava séria, de modo que a loira ergueu as sobrancelhas, boquiaberta, e gaguejou alguma coisa inaudível. Como ela não a conhecia, pensou que estivesse falando sério.

Katniss não estava na lista de pessoas mais delicadas e amáveis que eu conhecia. Ela era o tipo de pessoa de quem você só gostava depois que conhecia; um pouco porque ela era bastante reservada e desconfiada, o que costumava passar a impressão errada e também porque ela quase nunca sorria, fazendo parecer que estava sempre irritada. A verdade, no entanto, era que valia a pena conhecê-la e descobrir assim seu lado engraçado e sensível. Katniss já havia perdido pessoas que amava muito, tudo o que ela queria agora era ter a certeza de que quem entrasse em sua vida estivesse determinado a ficar.

—Relaxa — ela disse, após uma alta gargalhada — Você só tem que ser legal com a Annie e vai ficar tudo bem.

Percorri o olhar pelo ambiente, certificando-me de que não havia nada a ser feito e, de fato, não havia uma alma viva ali com exceção de nós três. Juntando isso ao céu nublado nosso café poderia ser usado como cenário de filme de terror. Madge sorriu para Katniss, mas dava pra ver claramente que ela estava pensando que nós éramos loucas ou algo do tipo. Ela ficou entretida mexendo nos armários e eu me sentei em uma mesa qualquer com Katniss.

Minha amiga ficou batendo os dedos no suporte de guardanapos e olhava para um ponto fixo na mesa com a testa franzida. Decidi não pressioná-la, mas sabia que ela não estava prestes a me dizer algo bom. Por fim, Katniss suspirou e me fitou com um ar de tristeza.

— Eu vou ter que me demitir — contou — Não vou dar conta de tudo ao mesmo tempo.

Eu não estava nem um pouco surpresa e ela também não pareceu esperar que eu ficasse. Kat estava no último ano de seu curso, ou seja, as coisas não estavam ficando mais fáceis, pelo contrário. Nós sabíamos que mais cedo ou mais tarde aquilo iria acontecer. O mais triste é que nós estávamos acostumadas a ficarmos juntas a maior parte do tempo e agora só teríamos os fins de semana. A notícia era boa para Madge, que ganharia o emprego em tempo integral se o quisesse.

— Está tudo bem — tranquilizei-a, colocando minha mão sobre a sua — Nós moramos perto, você pode sempre passar aqui e tomar um café.

— É, eu sei, mas eu vi esse café ser montado, sabe? É triste me despedir — ela afagou a mesa de um jeito bobo, como se quisesse guardar sua textura como recordação.

Antes que ela pudesse dizer mais alguma coisa, seu celular começou a vibrar em cima da mesa, com o nome de Peeta brilhando na tela. Katniss revirou os olhos e recusou a chamada. Eu a fitei como quem aguarda uma explicação. Ela não havia falado muito sobre a noite em que ela e Peeta passaram juntos após sairmos da lanchonete aquele dia. Eu queria que ela conversasse comigo sobre os seus sentimentos, mas não conseguia pedir isso a ela sem me sentir culpada por não ter contado que eu e Finnick nos beijáramos. Não era porque eu não queria que ela soubesse nem nada, é só que aquilo parecia ser um segredo só nosso, algo para ser guardado e relembrado, mas não repetido ou comentado sobre.

— Eu vou gostar dele — admitiu por fim — Se a gente continuar se vendo ou conversando, e eu não posso.

— É claro que pode! — exclamei — E se ele for o tal amor da sua vida? — Katniss pressionou os lábios um contra o outro antes que eles começassem a tremer. Ela mantinha os olhos cinzentos fixos na janela quando eles começaram a lacrimejar.

A beleza de Katniss era natural e encantadora. Aquele tipo de beleza que não é justificada por uma característica específica, mas sim pelo conjunto completo. Mas naquele momento, tudo o que eu via olhando para ela era uma garota triste e cansada, que tentava se esconder por atrás de uma expressão dura e algumas piadas engraçadas, e ela era boa nisso, porém deixava transparecer a verdade quando estava distraída ou quando o assunto era delicado.

— Se ele for, então ele vai ter que me desculpar — sussurrou em resposta.

— Katniss, não fuja — pedi a ela, falando gentilmente para não chateá-la — Eu sei que não é fácil, mas dessa vez não tem porquê complicar uma situação que é bem simples, se for analisar.

— Você não entende, Annie! — ela balançou a cabeça, lutando com algum dilema interno sobre o qual eu não sabia nada — Um dia eu vou estar disposta a explicar, mas não hoje.

Assenti, encerrando a discussão. Quando eu refletia sobre a situação, não encontrava sentido algum. Eles se gostavam! Por que não podiam simplesmente ficar juntos? Mesmo assim, optei por não dizer nada, pois compreendia que a decisão não cabia a mim. Havia fatores maiores envolvidos na história do que eu sabia e, se Katniss não se sentia preparada para falar sobre isso, tudo bem. Todos nós temos coisas sobre as quais não conseguimos falar nem mesmo com as pessoas de quem mais gostamos.

— Mas vamos combinar alguma coisa lá em casa qualquer dia — sugeriu — Você pode levar o Finnick. A gente pode jogar algum jogo, beber, não sei.

— É claro — concordei.

Depois disso, eu fiz a ela um chocolate quente de despedida. Ela segurou a caneca vazia em suas mãos por alguns segundos antes de subir as escadas pra conversar com Effie. A Sra. Trinket-Abernathy ficaria arrasada; Katniss era para ela como uma filha que ela nunca tivera. Após uma meia-hora, a morena retornou, envolvendo-me num abraço apertado e saindo porta afora. Notei que Madge estava um pouco sem graça por não conhecer Katniss e, consequentemente, não entender o que estava acontecendo. Tudo o que ela entendia era que agora o emprego era totalmente seu.

— Qual seu filme preferido? — perguntei aleatoriamente. Madge ergueu a cabeça para me olhar, como se estivesse se certificando de que era com ela que eu estava conversando. Ela continuou secando a pia, parecendo não saber que resposta me dar. Eu tinha uma lista mental referente aos filmes dos quais mais gostava, já que não conseguia escolher um só.

Breakfast at Tiffany’s — respondeu por fim, seu tom de voz indicava que ela não considerava aquela pergunta importante. Mas do meu ponto de vista você poderia descobrir muito acerca da personalidade de alguém só analisando seus filmes favoritos — Titanic — balancei a cabeça positivamente, aprovando. Ela perguntou o meu e eu lhe respondi apenas os três primeiros da minha lista pra ela não pensar que eu era uma viciada em cinema ou algo do tipo.

Mas a verdade é que eu era. E eu também procurava filmes preferidos em comum que eu tinha com as pessoas ao meu redor. Finnick e eu tínhamos em comum Lord of the Rings; com Katniss, 10 Things I Hate About You; e minha mãe, agora Madge também, e eu, gostávamos de Titanic. Mas o assunto sobre televisão não colocara a loira em nenhum tipo de frenesim verbal, então começamos a falar sobre outras coisas.

Ela me contou coisas básicas de sua vida: tinha 21 anos, havia terminado recentemente com o seu noivo, um cara chamado Marvel, que herdara a humilde fazenda de seu falecido pai, o que causou um enorme repúdio da parte de seus pais quando eles se apaixonaram, então ela foi morar com ele. Agora que eles estavam brigados, ela decidiu que vir à cidade grande tentar seguir a carreira de modelo era a melhor opção e, enquanto não dava certo, ela resolveu trabalhar no Café Paris. O que tinha com esse lugar que toda recém-chegada vinda do interior acabava despencando aqui? Sinceramente, eu não fazia a mínima ideia. E no caso de Madge, achei tudo uma grande estupidez, porque se seus pais eram ricos ela podia simplesmente ter ido até eles e pedido desculpas, então talvez eles dissessem que tudo bem e pagassem uma faculdade pra ela ou algo do tipo.

Contudo, Madge parecia surpreendentemente animada em trabalhar e ser independente pela primeira vez na vida, então decidi não ser cruel e não falar nada que pudesse destruir seu otimismo. Mas no fundo ela deveria saber que aquela não era a melhor das ideias. Hollywood fazia parecer que tinha algum glamour em sair de casa e trabalhar duro pra ganhar uma miséria no fim do dia, mas miséria essa da qual você necessitava se quisesse estudar. A verdade é que na realidade era bem triste quando era essa a sua única opção. Se eu pudesse, faria faculdade nesse exato momento e correria de volta para a minha mãe o mais rápido possível. Ela tinha essa opção, mas a rejeitara.

De qualquer forma, alguma coisa em seu sorriso não me deixou fazer nada que não fosse encorajá-la. Eu li em algum lugar uma vez que entre ter razão e ser gentil, devemos escolher ser gentil. Essa ideia me agradava bastante.

Nós continuamos a conversar e, no fim do dia, já parecíamos amigas íntimas. A garota tímida que eu encontrei mais cedo desaparecera, cedendo seu lugar à versão tagarela e divertida dela. Ela tinha uns assuntos um pouco fúteis, mas me deixei levar, escutando atentamente a cada palavra que ela dizia sobre suas antigas amigas e como elas eram falsas ou algo do gênero.

— E acontece que ela estava dando em cima do Marvel o tempo todo! — exclamou indignada, terminando de colocar chantilly em uma xícara, usando as unhas pintadas de rosa para limpar uma gota de café que escorria ao longo do copo.

— Não! — fingi incredulidade com um pouco de ironia na voz, mas ela não percebeu. Eu sorri para o pires que eu estava ocupada lavando.

Em determinado momento nossa conversa fora interrompida pelo barulho da porta de vidro se abrindo. Madge exclamou um “Nossa!” em tom baixo e malicioso, o que me fez erguer a cabeça para procurar o motivo de sua exaltação. O que eu encontrei foi Finnick, vindo em minha direção com um terno preto que o deixava um pouco pálido. Seu rosto estava desanimado, mas seus olhos cor do mar se iluminaram assim que me viram.

— Finnick! — deixei o pires onde estava e usei um pano de prato para secar as minhas mãos. Corri até ele esquecendo-me que eu tinha louça para lavar e que Madge ainda estava lá nos observando. Eu literalmente pulei em cima dele, sentindo seus braços imediatamente me segurarem enquanto eu envolvia os meus ao seu redor. Só então, ouvindo sua risada abafada no meu pescoço, eu percebi o quanto sentia falta dele. Já fazia alguns dias que estivemos nos comunicando apenas pelo telefone, porque nós dois estivemos ocupados.

— Desculpa aparecer aqui do nada — ele disse, soltando-me quando meus pés se firmaram novamente no chão — Eu ia dizer que estava só passando por aqui e resolvi parar, mas não é verdade, é que eu senti muito a sua falta mesmo.

— Eu sei, eu também. Não tem problema, pode sentar aqui — gesticulei para um dos banquinhos e voltei para trás do balcão, continuando a lavar a louça restante — Estava no trabalho? — ele assentiu em resposta — Como foi?

— Eu passei o dia todo desejando que eu ou o meu pai estivéssemos morrendo de câncer pra eu poder ficar livre daquele maldito escritório — respondeu com tanta naturalidade que quem não o conhecesse ficaria assustado ao perceber que ele estava falando sobre desejar a própria morte.

— Que ótimo — respondi-lhe — Da última vez você queria que um meteoro destruísse o planeta, já é um progresso — ele sorriu.

— Estamos trabalhando no caso de um cara que supostamente matou a própria esposa que estava grávida de outro homem, mas ele fala que foi o amante que cometeu o crime — contou-me Finn — Eu odeio como essas coisas ainda são tratadas com tanta banalidade. A sorte é que agora que as aulas da faculdade já voltaram tem um tanto de estagiário lá, aí eu posso jogar tudo em cima deles — ele riu maldosamente, levantando-se para pegar um muffin de chocolate contido dentro da pequena estufa em cima da outra extremidade do balcão — Ah, oi! — exclamou Finnick, surpreso ao deparar-se com Madge — Você é nova por aqui.

— Eu comecei hoje — ela se explicou, sorrindo após ajeitar o cabelo atrás da orelha. Foi só então que eu me lembrei da exclamação que ela soltara quando avistou Finnick pela primeira vez. Senti um desconforto que identifiquei como ciúme e odiei a mim mesma por isso. Madge era bonita demais e eu me peguei pensando que nunca poderia competir com ela se eu já não tivesse tido um par de meses de vantagem.

Não existe competição, precisei me lembrar disso repetidamente. Finnick era meu melhor amigo, Madge era minha nova colega de trabalho, ele não havia olhado para ela com segundas intenções – e se tivesse, eu não tinha nada a ver com isso –, ela tinha, mas eu entendia, afinal, ele era mesmo atraente. Senti-me estúpida por estar com ciúme, ainda mais por algo tão insignificante como aquilo. A cada dia ficava mais difícil convencer-me de que eu não sentia nada por Finn.

— Katniss pediu demissão — contei à Finnick, explicando os motivos dela — Você poderia dar um emprego a ela. Kat se demitiu de seu último estágio, porque não era remunerado e ela precisa muito do dinheiro.

— É claro, fale pra ela me ligar e marcar uma entrevista comigo — eu assenti com um sorriso de gratidão. Não tinha ideia do porquê de eu não ter pensado nisso antes. Mas na verdade eu nem sabia que o escritório dos Odair oferecia estágio até que ele mencionasse isso. Ele esticou suas mãos entrelaçadas sobre o balcão e suspirou hesitante. Fixei meu olhar nele, esperando que ele me dissesse seja lá o que fosse — Minha mãe me contou o que vocês estão fazendo e tudo mais.

Não reagi. Por um lado, eu havia ficado um pouco chateada porque queria manter em segredo a ideia do meu livro o máximo possível. Eu só queria ter certeza de que iria dar certo antes de fazer com que meus amigos nutrissem expectativas em cima disso. Por outro lado, era bom que Meredith compartilhasse isso com Finnick. Por mais que essa iniciativa não fosse grande coisa, era a primeira vez em que ela se dispunha a falar sobre os seus problemas e considerar tomar uma atitude em relação ao marido, e eu acreditava mesmo que seu filho deveria saber disso. Se não para ajudá-lo, então ao menos para lhe dar algo em que acreditar. E, de qualquer modo, eu estava verdadeiramente empenhada naquilo; não teria por que não dar certo.

— Você poderia me deixar ler um pouco? — pediu-me ainda oscilante. Imediatamente eu abri a boca para negar, mas parei no último segundo. Era irônico, mas eu tinha vergonha de deixar as pessoas que eu conhecia lerem o que eu escrevo. Entretanto, não era só uma história que eu estava escrevendo, nesse caso. Era sobre a família dele e ele tinha o direito.

— Tudo bem — cedi, pegando o notebook que estava guardado dentro da minha bolsa. Ele ficou sentado lendo enquanto eu terminava de organizar as coisas, visto que faltava apenas cinco minutos para fecharmos o café.

— É o seu namorado? — Madge me perguntou num sussurro quando fomos juntas guardar as xícaras no armário. Dei uma rápida olhada para Finnick, que estava concentrado na tela do meu pequeno computador portátil. Suas feições haviam ficado sérias, provavelmente devido ao tema da história que ele lia.

— Não.

— Deveria me apresentar a ele, então — ela deu uma risada maliciosa, de forma que eu engoli em seco, encarando-a com seriedade. Até que ela se aproximou de mim, mantendo um sorriso gentil e verificando se Finnick não estava prestando atenção em nós — Vai ter que disfarçar melhor do que isso se quiser fingir que não gosta dele.

— Eu não... — gaguejei, sem saber ao certo o que dizer.

— Agora já é tarde demais pra tentar mentir pra mim — ela me interrompeu, desamarrando o avental e guardando-o na bolsa. Deu uma piscadela em minha direção antes de se despedir de mim e Finnick e ir embora.

— Nós temos que ir também — anunciei, chamando a atenção dele. Guardei meu notebook ao mesmo tempo em que Effie e Haymitch desciam as escadas, também se preparando para irem embora.

Finnick e eu nos acomodamos em seu carro. Ele parecia estar digerindo os parágrafos que lera.

— Está muito bom — ele verbalizou — De verdade, você precisa terminar.

— Pode deixar.

Quando chegamos ao meu apartamento, Finnick jogou o blazer em meu sofá e arrancou a gravata que antes estava frouxa em seu pescoço. Ele alimentou minha gata enquanto eu estourava pipoca para nós comermos.

— Eu odeio vocês advogados — comentei, falando alto porque eu estava na cozinha e não tinha certeza se ele me escutaria do cômodo ao lado — Vocês se vestem como se estivessem em um velório.

Finnick apareceu rindo, ficando encostado no batente da porta. Ele pegou uma tigela para que eu depositasse a pipoca quente. Despejei o conteúdo da panela no pote vermelho escolhido por ele e nos sentamos no chão da sala, procurando alguma coisa para assistir na televisão, mas não encontramos muita coisa, por isso preferimos deixar o aparelho desligado.

Algum tempo de tédio depois, nós demos certa distância e ficamos tentando arremessar pipocas na boca um do outro.

— Sabe — começou Finnick, fazendo uma pausa para mastigar a pipoca abocanhada por ele — Aquele dia nós falamos sobre ir à praia e tudo mais — consegui apanhar a pipoca que ele jogara, mas ela caiu direto em minha garganta, fazendo-me engasgar. Comecei a tossir e ele correu para me ajudar, dando leves tapas em minhas costas que de nada serviram até que eu cuspisse fora o alimento. Depois disso, paramos de brincar e ficamos sentados lado a lado — Nós deveríamos fazer várias coisas, sabe? Tipo, coisas que nós nunca fizemos ou nunca mais pudemos fazer.

— Essas coisas nunca funcionam — eu dei de ombros — Vamos combinar e acabar esquecendo.

— Que seja, então, mas deveríamos combinar. Nem que seja só agora mesmo — e então ele me olhou com aqueles olhos brilhantes e eu não tive coragem de negar.

— Deveríamos ir a um concerto, você disse que nunca foi a um — sugeri e ele assentiu, concordando e sorrindo em agradecimento.

No começo, nós falávamos sobre coisas sérias, como eu dei o exemplo do concerto e depois prometi levá-lo à minha cidade natal. Eram sugestões sensatas e possíveis. Mas depois de um tempo falávamos só por pura diversão mesmo e acabamos combinando de interromper um casamento na hora do “Fale agora ou cale-se para sempre”, pular de paraquedas, recriar a cena de Kate Winslet e Leonardo DiCaprio na proa do navio em Titanic e mergulhar com golfinhos no oceano Atlântico.

Eventualmente, nós fomos perdendo a criatividade e começamos a simplesmente contar do nosso dia. Até que ele se despediu e, ao vê-lo sair pela minha porta, precisei resistir ao impulso de pedir para que ele ficasse, enquanto a verdade que eu vinha tentando evitar praticamente gritava em minha mente, estampada em meu rosto para qualquer um que olhasse com mais atenção: eu estava irrevogavelmente apaixonada por ele.


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Notas finais do capítulo

Preciso confessar que adoro colocar a Madge nas fics, acho ela mt amorzinho!! Esse capítulo ficou parado, eu achei, mas ele é importante, tanto pelos motivos óbvios (A ANNIE ADMITIU FINALMENTE MINHA GENTE!!) quanto por outras coisinhas que já começaram a dar abertura para acontecimentos futuros da fic.
OUTRA COISA eu mudei um trem do capítulo 3 que o Gale aparecia só que eu esqueci que ele não podia aparecer ainda porque eu preciso dele mais tarde pra outra coisa. Então o outro migs do Finn não é o Gale, é o Cato, ok? Tirei o Gale e coloquei o Cato no lugar, finge que vcs nem lembravam e que era o Cato o tempo todo.
Preciso confessar tbm que to programando esse capítulo porque é muuito raro eu ligar o note nos dias de semana, tanto que respondo vcs pelo celular, mas não achei justo esperar mais 1 semana sendo que já ta pronto né gente? E nem vou falar que dia sai o próximo porque eu nunca posto nos dias que eu falo mesmo, mas prometo que vou fazer o possível pra não demorar, o problema é que eu to cheia de prova nessa vida.
E vcs devem ter reparado que todo capítulo eu cito uns filmes ou livros ou músicas e afins. São tudo coisinhas que eu gosto e tudo mais pq eu sou dessas viciadas, e eu não consegui deixar isso de fora(??/ mas enfim, se vcs estiverem a toa algum dia e quiserem assistir/ler/escutar as coisas que eu cito aqui, eu recomendo muito!!!
Bom, espero que vcs tenham gostado. Beijos ♥