Mudblood escrita por Ella


Capítulo 13
Intervalo


Notas iniciais do capítulo

Eu não tenho vergonha na minha cara. É o motivo pra ter passado séculos sem postar.
Mas eu acabo essa fic ou eu não me chamo Gabriela.
Como vocês estão?



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   O dia amanheceu calmo.

   Era um dos meus dias. Céu escuro, nuvens carregadas, sol escondido, cheiro de terra molhada entrando no meu quarto. Era recomfortante, como se minha vida estivesse voltado pros eixos.

   Como pra provar o meu ponto e me mostrar que minha vida estava voltando ao normal, Jennevive havia me colocado de castigo e me deixado sem TV por duas semanas. Havia feito isso de propósito, é claro. Ela sabia que eu estava na última temporada de Gilmore Girls.

   Eu não via Taylor desde a festa. Ele havia me ligado e me perguntado como eu estava, ofereceu trazer o  bolo de frutas que a mãe dele havia feito que animaria o humor até do professor de Física. Recusei, mesmo que amasse bolo de frutas.

   E claro que o motivo de eu ter recusado a oferta dele não era por que estava envergonhada. Afinal, qual era a vergonha em chorar na frente da pessoa pela qual você sente coisas estranha. Eu havia chorado na frente dele. Soluçado. Sido abraçada. Envolta. Acariciada. Consolada.

   Na madrugada depois daquilo, muitas coisas na minha cabeça se movimentaram. Eu percebi que estava errada sobre Taylor, e acabei percebendo que estava errada sobre mim mesma também.

   Eu não gostava do Destino, mas ele existia.

   O Destino é o Deus e o Diabo. Foi ele quem colocou Elliot e Alex juntos, e fez a professora de Literatura ser roubada. Mas também foi ele quem juntou Jenn e Neal e privou Norrie da marca. Percebi isso quando Malfoy tinha beijado a minha testa antes de se despedir. Era impossível pra mim evitar sentir por ele o que eu sentia.

   Alguma coisa sobre o Destino me faz gostar de Malfoy. Por que, obviamente, eu não gosto dele por boa vontade. Só que sei o quanto queria odiar ele, quanto eu queria bater no rosto dele só e apenas pelo simples fato de querer beijá-lo 24 horas por dia. Havia alguma coisa me obrigando.

   Como eu disse, o Destino é o Diabo.

    Não, não é fácil admitir que eu gosto um pouco de Malfoy. Eu provevelmente vou morrer e levar essa informação comigo pro túmulo.

   Imaginei Eleanor me desenterrando enquanto colocava a jaqueta de Taylor nos ombros.

   — Você devia seguir a sua intuição.

   — Minha intuição diz que não vai acabar bem.

   — Não, a sua covardia é que diz.

   Olhei pra Elliot enquanto revirava os olhos. Quanto a Norrie estava pagando ele pra dizer essas coisas?

   Fingi voltar a olhar pro treino de Lacrosse. Na série de lobisomens da Norrie aquilo parecia bem mais legal. Alex piscou para nós dois de longe, enquanto levantava a camisa para limpar o rosto. Elliot corou e sorriu idiota. Eu queria algo assim pra mim? Parecer patética tão facilmente?

   — Esse é um conselho muito brega, eu acho em qualquer filme idiota de romance. Além do mais, eu nem pedi por um. – Dessa vez, foi ele quem revirou os olhos. Odiava quando ele me dava conselhos, por que os conselhos de Elliot geralmente eram ótimos e provavelmente a resposta certa pro meu problema.

   — É clichê por uma razão. É clichê por que funciona. Você sabe que a sua intuição diz o contrário – ele começou, ignorando a minha grosseria de antes. — Sua intuição sempre vai dizer que o certo é correr pra ele. O Destino quer assim.

    — Eu só não quero correr e terminar do mesmo jeito que Jenn. – As coisas que o loiro estava falando começaram a me assustar, eu não queria sentir a necessidade que sentia de Darling pra sempre. Já era agoniante demais.

   — O Destino não é sempre claro, Andy – ele deitou minha cabeça no ombro dele. — Sem o Neal, sua mãe nunca teria tido você e, consequentemente, nunca teria sido expulsa de casa, que por fim resultou em conhecer Kurt, que é a pessoa certa pra ela. Neal provocou uma coisa ruim, sim, mas no fim acabou mudando o curso da vida dela, de um jeito bom. Se almas gêmeas não são sobre isso, sobre o que são?

   — O Destino poderia ter oferecido o Kurt de primeira.

   — Qual seria a graça? Seria muito fácil. As coisas não funcionam assim. A vida é um monte merda acontecendo ao mesmo tempo com alguns intervalos felizes – eu relaxei os ombros. — Além disso, a Kenz não teria nascido se fosse simples do jeito que você quer.

   — Deve ser muito difícil pro Destino planejar tudo isso. Fazer bilhões de pessoas infelizes ao mesmo instante deve ser uma tarefa e tanto.

   — Deve sim.

   Mesmo que tudo que ele tenha dito fizesse sentido, eu ainda achava que o curso que as coisas tinham tomado poderia ter sido menos doloroso.

   Mamãe não estava bem, não importava quantas piadas ela fizesse pra me mostrar o contrário. Ela havia pedido um tempo pra Kurt, pra pensar um pouco em tudo. Eu entendia ela e Kurt também. Ele foi bem compreensivo e deixou donuts pra ela toda manhã. Ela não deixou nem mesmo um pra mim.

   Eu sabia que Jennevive não deixaria Kurt e voltaria pra Neal, mas meu peito doía com medo ainda assim. Ele era tão certo pra ela.

   Mamãe não tinha saído muito do quarto esses dias, só o fazendo quando era pra me chamar pra assistir filmes de ação do Vin Diesel com ela. Nessas noites a gente dormia de conchinha e se afundava em sorvete de baunilha enquanto eu fingia não ver os olhos vermelhos dela.

   Mamãe havia recebido a confirmação que a deixava apagar a marca dela uma noite antes de Neal aparecer e destruir o intervalo feliz dela. Ela estava confusa e isso me deixava confusa também. Eu dependia dela pra me fixar em algum lugar.

   Elliot voltou a focar no treino e eu beijei a sua cabeça enquanto descia a arquibancada e ia me encontrar com Neal.

   Martin era amigo de mamãe desde a infância. Eu podia comer de graça na lanchonete dele sempre que quizesse. Quando ele pousou o prato de panquecas e copo de milkshake na frente do meu suposto pai, o vidro fazendo um barulho estrindente, tamanha a raiva com a qual ele fez isso, eu me lembrei por que adorava tanto ele.

   Se o milkshake estivesse envenenado, eu não me admiraria. Nem me entristeceria, na verdade.

   — Martin não mudou nada, pelo visto.

   — Você pode pular pra parte em que chega ao assunto que quer conversar comigo? Eu realmente tenho mais o que fazer e nenhuma disposição pra gastar meu tempo livre conversando com você. – Na verdade, eu estava me afundando em tédio esses dias.

   — Eu quero conhecer você - e os cantos dos lábios dele se levantaram.

   — Dispenso. Passar bem.

   Soltei um riso nasalado, nem um pouco alegre, levantei da cadeira e me dirigi à porta. Neal foi mais rápido e segurou meu pulso. Não do jeito agressivo que eu esperava que ele fizesse, mas de um jeito gentil. Eu poderia me soltar dos dedos dele, mas a força com a qual aquele gesto me atingiu não me deixou movimentar nenhuma parte do corpo.

   — Por favor.

   Mesmo que eu quizesse fazer Neal sumir da minha vida num “puff”, não podia ignorar o fato de que ele faria parte da minha vida daqui pra frente. Jenn não o deixaria ir embora mais uma vez. Eu o odiava tanto. Mas não um ódio normal, mas aqueles que arranham seus ossos e te fazem querer gritar.

   Por Jenn, eu sentei na cadeira.

   Abri a boca pra falar. Queria gritar pra ele como o odiava, berrar sobre como foi horrível lidar com a falta que senti dele, mesmo sem nunca ter o conhecido antes. Falar sobre como ele era um dementador, de como se alimentava da minha felicidade, a cada dia. De como tudo estava dando certo, de como Jenn havia achado o cara certo pra ela, que a fazia feliz de um jeito que ele nunca faria. De como ela era amada de volta.

   Queria me gabar de como eu conseguia deitar a cabeça no travesseiro sem me perguntar mais o por que de meu pai não me querer, de como  ele começou a ser um assunto ignorado no meu dia-a-dia. Só uma pontada desconfortável na minha mente.

   Queria ferir ele no dobro da intersidade com a qual ele feriu Jenn.

   Mas nada saiu. Mais uma vez.

   Senti vontade de ver Kurt e ter meu cabelo bagunçado por ele. Ele sim me amava e me carregava nas costas quando eu estava triste.

   Mas eu continuei lá, sentada e frustrada.   

   — Então... Sua mãe falou que voce gosta de Harry Potter.

   Neal me ofereceu uma carona pra casa, mas é bem fácil descobrir qual foi a minha resposta. Ele estava tentando se aproximar de mim, percebi isso na nossa conversa, se é que posso chamar aquilo assim. Basicamente, só ele conversou. Quando os assuntos acabavam, um silêncio barulhento se postava entre a gente.

   Uma neve fina estava caindo, mas nada bonito o suficiente pra que eu pudesse fingir estar num clipe de música. A camada frágil de gelo se formando no chão nunca iria muito longe. Me agarrei ainda mais na jaqueta e reajustei o cachecol, xingando baixo por não ter pegado algo mais quente.

   Naquele instante, eu me senti sozinha.

   Meus dedos discaram o número de Eleanor automaticamente, até lembrar que ela estava numa viagem com os pais para Londres. Kurt provavelmente estava no trabalho, ou qualquer outra coisa que adultos façam.

   Por causa do trabalho, mamãe não vive em casa, se posso colocar assim. Nos dias da semana, quando ela está, eu provavelmente estou na escola. Não estou reclamando, é claro. Não é como se ela escolhesse aquilo. Na minha fase de rebeldia aos quatorze, eu costumava brigar com ela por horas por causa disso, achando que ela colocava o hospital acima de mim.

   Com os anos eu passei a apreciar meu tempo sozinha. Eu gostava de sentar no chão do quarto e ler Stephen King, pedir pizza e comer ela sozinha enquanto assistia algum filme idiota de comédia, andar semi-nua pela casa e cantar tão alto que os vizinhos ouviriam.

   Mas ali, no meio de uma neve feia, com frio e com tanta coisa guardada no peito, eu queria companhia.

   Eu não parei meus pés quando eles, como que por si próprios, me levaram até a casa de Taylor. Parei em frente ao portão e olhei para a janela dele, me perguntando se aquilo foi certo. Fiz isso usando a razão, já que meu coração sempre diria a mesma resposta quando o assunto era Taylor Darling.

   Meus dedos pegaram o celular do meu bolso e discaram o número dele e não demorou muito até ele sair pela porta com um sorriso que fez o meu interior inteiro formigar.

   — Bolo de frutas parece ótimo. – Tentei sorrir. E mesmo que eu tenha certeza de que não deu muito certo, Taylor sorriu também.

   O bolo não durou muito, é claro. Malfoy e eu acabamos sentados na minha cama assistindo um filme de terror muito ruim - a senha no notebook era sempre a mesma, Jenn é péssima com castigos. Não era realmente assustador, e quando fingir o contrário começou a parecer idiota, começamos a rir da falta de inteligência dos personagens. Quando o casal principal fez votos de amor durante o filme, não houve silêncio desconfortável, Taylor fez questão de apontar quão clichê o texto era.

   O filme acabou e eu ainda estava debochando de como a personagem principal havia morrido. Eu não ria tanto fazia um bom tempo, me agarrei naquele instante como se minha vida dependesse dele.

   Ele havia acertado todos que morreriam no filme e se vangloriou por isso, me dando um abraço de consolação. Joguei os restos de bolo nele, apenas pra ver o rosto dele assumir a mesma feição desafiadora de quando fizemos a aposta. Quando ele gargalhava, os olhos se escondiam e formavam rugas nos cantos. Era um som estranho, mas que me fazia querer rir também.

   Me perguntei como contaria pra ele sobre a minha decisão de apagar a marca. Me perguntei se ainda poderíamos ser amigos depois, eu gostava de perturbá-lo e de chamá-lo de Malfoy. Me pergunteis e ele sorriria pra mim do mesmo jeito que sorria agora.

   A possibilidade de perder ele pareceu sufocadora queria esmagar o medo de ter ele. No momento e eu o abracei, procurando pela mesma coisa que senti no dia da festa. A sensação de pertencer a algo me envolveu e eu o apertei ainda mais. 

 


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Notas finais do capítulo

Não desistam de miiimm



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