Mudblood escrita por Ella


Capítulo 11
Eccedentesiast


Notas iniciais do capítulo

Não tem realmente uma forma de me desculpar pela demora, mas vou resumir em: Bloqueio criativo. Acho que boa parte de vocês são escritores e entendem isso. Eu reescrevi esse capítulo três vezes e em todas não gostei.
Acordei às três e catorze e a inspiração veio do nada enquanto eu procurava o que comer na geladeira. Botei BTS pra tocar e escrevi, o que é estranho, já que eu ouvi Kpop uma vez na vida e outra na morte. Mas ajudou.
Eu nem conseguia entrar no Nyah por que toda vez sentia culpa e me prometi só me recompensar e ler os comentários quando terminasse o capítulo. Agora que acabei, poso responder todo mundo. Tô muito feliz.
Quero agradecer pela paciência de vocês e por todo apoio que eu tenho recebido. Vocês são leitores incríveis ♥

PS.: Eccedentesiast é o ato de esconder dor por trás de um sorriso.



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   Minha vida é basicamente um fone de ouvido; eu recebi em perfeito estado, mas foi se emaranhando sozinha e, por mais que eu passasse horas desenrolando, ia acabar embolada e com uma parte quebrada. E a pior parte é que eu tenho noventa por cento de certeza de que maioria dos nós é culpa minha. Ou. Se levarmos em conta a minha tendência a não admitir estar errada, todos são.

   As coisas pra mim dão errado, dão errado e dão errado mais uma vez, eu perco a esperança e quando começo a recuperá-la, as coisas dão errado novamente. É um eterno loop.

   Virar as costas e tentar ignorar os problemas, como eu geralmente faço, nunca melhora a situação. Eu fico tentando fechar os olhos e fingir que tudo vai desaparecer, mesmo sabendo que nada vai mudar.

   Eu não consegui dar as costas pra o que aconteceu essa noite.

   Neal não conseguiu parar de olhar pra Jenn, eu também não. Eu a vi perder a aura alegre que tinha mais cedo em segundos, o sorriso de antes nem deixou uma pista de que já esteve ali.

   “Desculpa?”, “Ele já estava de saída.”, “É Neal, mãe.”. Havia algo pra ser dito? Eu só entrei em casa, nem mesmo consegui balbuciar nada.

   Mamãe conseguiu achar calma para mandar Elliot e Alex pra casa. Norrie, que tinha acordado, foi buscar Taylor e Mackenzie no andar de cima. Ele levou a menina e mamãe fez Kurt ficar em casa, ela não queria briga, o que com certeza teria se ele ficasse no mesmo cômodo que Neal. Quando o silêncio finalmente caiu na sala, minha barriga se revirou mais forte.

   Jenn não xingou Neal, nem pediu por respostas. Ela só o fitou por um tempo e depois começou a chorar, bem na nossa frente. Bem na minha frente.

   Aquilo foi desesperador. Foi bem pior que eu imaginava.

   Eu queria que ela gritasse com ele, jogasse copos de vidro em Neal, me perguntasse a quanto tempo eu vinha escondendo ele e berrasse comigo logo depois. Eu queria agressividade. Eu queria que ela fizesse o que eu queria ter feito quando o vi pela primeira vez.

   Mas, obviamente, ela não é nada como eu. E eu não sou nada como ela.

   Jenn limpa as lágrimas do rosto rápida e inutilmente, já que o seu choro se intensifica agora. Ela não olha pra mim por mais nenhum momento, apenas levanta do lugar que estava e corre para abraçar Neal. A confusão da minha cabeça não se reflete no meu rosto, meu corpo não consegue reagir àquilo.

   Agora finalmente olho para o rosto dele, que está igual ao dela. Eles se abraçam tão fortemente que parecem que vão se fundir em um. Como almas gêmeas.

   — Eu senti tanto a sua falta – a voz dela sai abafada pelo ombro dele.

   — Eu também, pequena.

   

 

 

   — Você não precisa ir se não quiser, sabe. Eu fico aqui com você.

   — Se eu não quisesse ir você iria conseguir me obrigar de qualquer forma – ri fraco. Ela deu um sorriso amarelo, tentando parecer casual.

   O rosto de minha mãe no pescoço de Neal é a imagem da noite passada que mais se repete na minha cabeça. Eu estou na casa da Norrie desde então. Não falei pra ela que estava aqui, mas Eleanor provavelmente a avisou. Não quero falar com Jenn e nem de como aquele abraço soa como uma traição aos meus olhos.

   Passei o batom vermelho, fingindo limpar os cantos da boca quando na verdade estava arranjando mais tempo para pensar em como eu queria me trancar no meu quarto pelo resto da minha vida. Lá os problemas ficavam do outro lado da porta e ninguém me perturbaria por um tempo.

   Eu sou uma covarde de merda.

   — Foi mal por não ter contado sobre o Neal.

   — De todas as coisas que vocês precisa fazer agora, pedir desculpas pra mim não chega nem a ser uma possibilidade. Tá tudo bem, eu entendo. – Não estava estava, mas fingir o contrário é tão mais fácil.

   — Acho que eu meio que quebrei esse código de melhores amigas contarem tudo umas pras outras.

   — Algumas vezes – o mesmo sorriso amarelo. — Mas acho que você devia gastar as suas desculpas com a sua mãe. Ela merece.

   Eu sabia disso, só precisava começar com Norrie, que era infinitamente mais fácil.

   Peguei a pulseira no bolso da calça, odiando o modo que meus dedos tremeram quando meus olhos caíram na marca.

   Não sentia mais a segurança de que se colocasse ela de volta, me sentiria menos exposta ou que conseguiria apagar o que quer que o destino tenha planejado pra mim. Minha mente trocou a frase posta lá anteriormente por “Não confie no destino.”, mas agora ela se alastrava por todo o meu corpo. Bijuteria nenhuma iria esconder.

   As mãos de Norrie envolveram a minha e seus dedos deram o nó. Ela finalmente sorriu pra mim e eu fiz o mesmo, verdadeiramente dessa vez.

   A buzina do carro entrou pela janela seguidamente do grito de Alex. Norrie saiu correndo do quarto, mais animada do que eu tinha visto em séculos. Revirei os olhos enquanto seguia ela. Deixei a casa – não sem antes derrubar o porta-retratos dos melhores pais do mundo no chão.

   — Acho que podemos ir.

 

 

 

   A festa estava bonita, ninguém diria o contrário. Norrie sabia disso e estava radiante.

   Eu devia ter me levantado e ido dançar aquela música idiotamente animada no meio do salão como todo mundo, não ter usado minha maior expressão de velório toda vez que Norrie parava de olhar pra mim. Eu devia ter procurado Taylor e dito pra ele o que eu tinha planejado dizer, não fugido dele toda vez que seus olhos pousavam em mim. Eu devia ter tentado, ao menos, parar de pensar em Neal.

   Mas, no lugar disso, eu estava planejando correr e me esconder em algum canto isolado apenas pra poder ficar sozinha e torturar um pouco mais a minha consciência. 

   Peguei o celular e coloquei na orelha, cutucando Eleanor e fingindo atender uma ligação. Ela pareceu preocupada mas balancei a cabeça, mostrando que não precisava se importar. Ela continuou com o olhar desconfiado, mas não disse nada.

   Saí do ginásio e guardei o celular. Sorri e acenei para algumas pessoas no caminho, o garoto com quem eu faço cálculo e a mulher que não me dava advertência quando me via matando aula no corredor. Continuei com a mesma expressão feliz por todo o caminho, apenas pra não ter que me esforçar pra abrir um sorriso a toda hora.

   Quando enfim cheguei na sala de biologia, desconsiderei as cadeiras desconfortáveis e sentei nas mesas geladas. Eu conseguia ouvir a voz da diretora me reprovando na minha mente.

   O celular vibrou pela centésima vez naquele dia. Diferente das outras vezes, conferi o que era. Mamãe, como esperado. Haviam catorze ligações perdidas dela e oito mensagens. Kurt também havia ligado algumas vezes e Neal também. Excluí as mensagens dele sem ao menos ver, me poupando da irritação.

   Abri o número de Jenn.

   “Mãe: hoje ninguém comeu meus donuts de baunilha, claro, até pq vc não estava em casa”

Imaginei a voz dela me dizendo isso enquanto seu rosto tentava continuar sério. Ela bagunçaria meu cabelo depois, me chamaria de pirralha.

“Mãe: eu vou fazer lasanha para o almoço, juro que não é chantagem haha :)”

Não era uma boa chantagem, mamãe não sabe fazer lasanha. Nem nenhuma outra coisa que envolva paladar, para ser sincera.

   “Mãe: atualização: a lasanha não estava boa, mas eu sei que você diria o contrário”

Me peguei rindo sozinha no escuro, sentindo saudade do cheiro de queimado que sempre vivia na cozinha.

   “Mãe: Norrie me disse que está bem, posso confiar?”

   “Mãe: se não responder essa msg, vai ficar de castigo por mais dezoito anos”

   “Mãe: foi brincadeira lol (a sobrinha do Kurt me explicou o que isso significa, lol, você precisa conhecer ela)”

    “Mãe: nós realmente precisamos conversar, venha pra casa depois da festa”

    “Mãe: Sei que não vai vir pra casa. Eu amo você, escove os dentes antes de dormir. xoxo”.

Não respondi nenhuma das mensagens, não sabia o que falar. Controlei ainda mais a minha respiração, tentando focar no barulho abafado abaixo de mim. Eu conseguia ouvir os risos, os gritos alegres, balões estourando e o som animado da música que tocava.

   Coloquei uma música animada pra tocar, não precisava ficar mais no fundo do poço do que já estava. E acredite: eu conseguiria.  

   Não estava completamente escuro, mas meus pensamentos pareciam mais barulhentos e bagunçados. Eu precisava organizar tudo.

   Ignorei tudo. Eu estava bem mais preocupada em descobrir o que diria pra mamãe quando chegasse em casa. “Desculpa de novo? “Sinto muito por ser uma egoísta de merda e achar que poderia proteger você de algo que tinha direito de saber”? “Por favor, não tira meu celular”?

   A calma barulhenta continuou a atormentar. Houve um silêncio desconfortável entre eu e eu mesma por alguns minutos, antes que a porta fosse abertamente, deixando um feixe de luz entrar.

   Era ele. 

   Existe isso sobre almas gêmeas. Eu sentia Taylor. Ele emanava algo diferente de tudo que eu já havia sentido. Era como estar no seu lugar favorito no mundo inteiro. Minha marca parecia queimar toda vez que ele ficava perto. E eu gostava, mesmo que nunca admitisse ou quisesse admitir. Perguntava-me se apenas eu sentia isso, se era coisa da minha cabeça. Perguntava-me se ele sentia isso, se quando apagasse a marca tudo acabaria.

   Desliguei a música e olhei para ele. Ele encostou a porta de volta lentamente e se posicionou na minha frente. Um dos cantos de seus lábios se arqueou, sorri por instinto também. Não sabia o que fazer. 

   Não o expulsei. Eu só o deixei ficar.

   Minha respiração começou a descompassar e ficou pesada ao ponto de quem nem mesmo consegui segurar meus soluços que foram saindo. Os braços dele me contornaram e eu soube, simplesmente soube. Aquele era realmente o meu lugar favorito no mundo inteiro.

   Envolvi-o, juntando tudo dele com tudo de mim. Era como se os meus problemas estivessem entre nós dois e quanto mais eu os esmagasse, mais eles se comprimiam. Meus dedos se agarraram na camisa dele ainda mais firmemente, eu podia visualizar os nós deles perdendo a cor.  

  Se foi dessa forma que Jenn se sentiu quando abraçou Neal, eu não podia culpá-la.

   — Tudo bem?

   Balancei a cabeça. Nada estava bem, nem parecia que um dia estaria.

   — Vai ficar.

   Quando ele falou, pareceu fácil acreditar. Eu aceitei e concordei.

 

 

 

   Quando abri a porta de casa, Jenn estava dormindo no sofá e a TV passava algum filme exagerado de ação. Como ela conseguia dormir com todos aqueles tiros, eu nunca poderia dizer. Me deitei junto com ela e botei seus braços em volta da minha cintura.

   — Senti saudades – sua voz soou sonolenta e cansada.

   — Eu também – sussurrei junto.

   — Está de castigo por uma semana. – E me abraçou mais forte, acalmando a criança assustada dentro de mim.


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Notas finais do capítulo

Eu realmente senti falta de vocês.



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