Águas Obscuras escrita por Alph


Capítulo 7
Mar calmo


Notas iniciais do capítulo

Coloquei esse capítulo na visão do Héclyro dessa vez. Não estranhem esse capítulo. Quis dar um novo ponto de vista na história e de vez em quando irei por uma visão que não seja apenas da Allysa. Espero que gostem.
Qualquer dúvida, comentem ou me chama no chat de mensagens.
Mídias sociais da fanfiction estão listadas nas notas finais.



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Héclyro

— Sim. — Arquei uma sobrancelha e comprimi meus lábios. Por mais curta que tenha sido sua fala, ela pareceu surpresa com minha afirmação.

Toda vez que eu via a Allysa meu estômago embrulhava levemente, mas não era algo ruim. Às vezes era difícil assimilar que eu estava tendo contato com um ser que matou homens, meus colegas. Sua forma de conversar comigo era tão feroz e singela ao mesmo tempo, sua voz parecia ópio para mim.

Allysa estava com metade de seu corpo fora da água. Era tão bonita. Os fios de seu cabelo pareciam o metal de uma espada, era cinza meio prateado, porém um pouco mais escuro, talvez porque estivessem molhados. Mexas de suas madeixas caíam como rios sobre seu belo corpo escultural, tampando seus seios que tinham um belo tamanho.

Em seu pescoço eu notei suas brânquias se movimentando lentamente e meu olhar foi até seus braços, com barbatanas grandes e azuis que desciam como um longo véu por toda extensão de seu corpo. Sua beleza era inestimável e sua pele brilhava a cada movimento que ela fazia recebendo reflexo da luz da Lua. No reino de meu pai eu nunca vi uma beleza como aquela. As lendas que os marinheiros contavam não eram nem de perto comparadas à realidade de quão bela era uma sereia.

Lembro-me de que quando meus guardas capturaram Allysa, suas barbatanas dos braços e da cauda estavam ouriçadas e a ver ela calma com minha presença de alguma forma deixavam-me contente.

Allysa me fitava com sua face séria de sempre, mas carregava uma beleza incrível na sua frieza. Seus olhos acinzentados que pairavam sobre mim eram belíssimos e se destacavam ainda mais com suas pálpebras escurecidas e longos cílios que eram realçados perfeitamente pelas suas sobrancelhas arqueadas da mesma cor de seu cabelo.

Comecei a me sentir transtornado com minhas ações passadas que fiz a ela. Estava medindo minhas palavras com medo de que elas não se tornassem outro erro. Nas noites anteriores eu caçava Allysa tentando achar pretextos para testar minha honra. Senti que ela tinha algo de especial e eu deveria ser menos ingrato com a ajuda que recebi dela.

Toda vez que ela se movimentava, a luz da Lua fazia com que a pele dela brilhasse de forma espetacular e realçava pequenas escamas em seu rosto. O conjunto de toda obra era incrível, principalmente ao olhar para sua boca com lábios carnudos róseos entreabertos que combinavam com seu rosto meio quadrado e suas maçãs da face empinadas. Nossa! Realmente, ela era uma terrível assassina, mas a assassina mais terrivelmente perigosa e linda que já vi.

— Héclyro? — Allysa interrompeu-me dos meus devaneios. Santo Nifeus. Como era fácil se perder na própria cabeça quando ela estava por perto.

— Sim? — Recuei-me mais um pouco na pedra me afastando dela. Tive receio de que, quando ergueu as mãos da água, carregasse um chicote, mas eram apenas dois rolos de alga. Então deixei meus ombros caírem ficando um disperso sobre a rocha em que estava sentado.

Senti uma brisa fria do inverno que se alastrava mais ao Norte. Na nossa região, mais baixa que o extremo norte, não nevava, mas o vento era bem gelado.

— Eu estou com algumas dúvidas, sobre alguns assuntos e... Queria que me respondesse — dizia Allysa, calmamente, enquanto parecia estar à procura de algo atrás das rochas cobertas de musgos.

— Allysa, não precisa ficar com medo. Não tem ninguém aqui além de mim! — Notei que ela se assustou e parou de encarar as rochas cobertas de musgos ao redor.

— Tudo bem. — Fendas localizadas em seu pescoço se expandiam e retraíam como uma lenta respiração. — Bem, eu trouxe algumas coisas aqui e queria saber se você pode me falar se é verdade ou não.

A postura dela era sempre ereta, realmente ela não parecia nada humana, mesmo tendo uma metade do corpo semelhante à de uma pessoa.

— Claro. — Arquei minha sobrancelha e a observei. — Pode se aproximar se quiseres.

De início ela parecia não querer se aproximar de jeito nenhum, Allysa ficou um pouco pensativa e veio calmamente nadando ao encontro da rocha onde eu estava. As ondas no horizonte se debatiam sobre as areias das praias. O céu estava em um tom de azul escuro e a luz da lua brilhava sobre o mar criando uma bela sensação de serenidade. Uma neblina cobria toda a orla que era abraçada pela mata fechada.

Ao longe dali era possível notar a passagem que secreta que eu havia levado a Allysa, ela estava coberta de água devido estar em maré alta, e ela só seria visível novamente quando as águas se abaixarem um pouco antes do Sol nascer. Aquela rota de fuga foi criada há séculos no início da construção do castelo, ela ficava escorada na muralha do palácio.

Allysa já estava bem mais próxima de mim, ela parecia ainda ter algum tipo de receio. Não devia, pois estava mais que claro que ela só fazia o que desde pequena foi ensinada e eu não iria a ferir novamente.

— Tu não ficas cansada em nadar o tempo todo? Não queres sentar-se na pedra? — Apontei para rocha ao meu lado.

— Posso ficar nessa posição por dias sem me cansar — respondeu rispidamente.

— Tudo bem. — Allysa não tirava os olhos da minha face, parecia que a qualquer momento ela iria me matar ou arrancar minha cabeça com um único golpe.  — Então... O que tu querias me mostrar?

— Eu achei alguns pergaminhos na minha tribo. — Ela fitou as mãos e abriu os dois pedaços de algas que carregava em suas mãos. — Algum deles tem textos sobre humanos e eu queria saber se é verdade o que elas disseram sobre vocês.

Ela jogou apenas um dos pergaminhos para mim enquanto o outro ficou em sua mão. Ao segurar o pedaço de alga, sua textura era um pouco viscosa e úmida. Sua coloração era verde escuro e os símbolos naquela folha eram ilegíveis para mim, tentei entender o que estava escrito, mas aquela língua era bizarra. Vi Allysa me fitando com seus olhos acinzentados.

Abri o pergaminho na rocha e deixei visível para nós dois. A luz da minha luminária ajudava a iluminar o pergaminho que tinha letras douradas para se destacar no verde escuro. Allysa passou os dedos sobre os símbolos. Suas unhas eram negras e grandes e entre seus dedos tinha um tipo de membrana que parecia ajudá-la a nadar.

Ela começou a explicar o que cada símbolo significava na língua delas. Não sei como, mas alguns eu parecia entender depois de um tempo olhando-os, já outros, não. Mesmo nunca tendo contato com esse tipo de escrita, algum daqueles desenhos eu conseguia interpretar só que eu não queria contar para Allysa, pois era bom a ver falando comigo sem transmitir uma áurea de vou te matar se você me tocar.

Ela tinha uma paciência incrível para me explicar, mesmo minhas perguntas sendo incessantes para tentar compreender o motivo das sereias colocarem os humanos como se fossem animais inferiores. Allysa sempre afirmava que as sereias eram melhores em tudo, tanto nas construções da sua tribo como o jeito que eram seres quase indestrutíveis.

Após alguns minutos, Allysa começou a perguntar sobre os sentimentos humanos. Eu fiquei um pouco desconfortável com algumas perguntas, mas expliquei bem para ela como cada humano reagia às suas emoções. Ela parecia uma criança que tentava compreender mais e mais. Seus olhos brilhavam a cada resposta que eu dava. De alguma forma ela era hipnotizadora com seu jeito um pouco agressivo e encantador. Às vezes ela me lembrava minha mãe.

Ela ficava surpresa com algumas afirmações que eu fazia sobre suas perguntas, mesmo que fingisse não demonstrar isso. Eu não resistia e sempre que dava eu olhava toda a extensão de seu corpo sobre a pedra e sua cauda que se movia. Allysa de fato era o conjunto de toda a perdição para qualquer homem e se ela quisesse, ela poderia por impérios aos seus pés com sua beleza. 

 

 

Depois de um tempo ao seu lado, ela parecia reprimir uma pergunta. Era notável que Allysa demonstrava estar desconfortável e para evitar que ela se sentisse assim fui direto ao assunto.

— Queres me perguntar mais alguma coisa, Allysa?

— Sim... — Ela parecia caçar as palavras certas. — Você se sente ligado ao mar de alguma forma?

— Claro, eu e meus irmãos adoramos o mar, mas minha mãe nunca gostou dessa nossa ligação. — Allysa parecia estar bastante interessada no assunto, pois ela ergueu-se sobre a pedra para prestar atenção no que eu falava. — Ela sempre falou que o mar tinha muitos perigos. E realmente, tinha mesmo — ironizei as últimas palavras enquanto Allysa fechou a cara.

— Algo a mais? — Ela jogou seus longos cabelos pratas que já estavam secos para trás de suas costas, deixando seus seios expostos.

— Sim. Na noite em que vocês nos atac... Foram se alimentar, eu estava navegando escondido. Sempre faço isso, mas de dia.

— Eu quero saber se a água lhe traz algum beneficio ou algo do tipo.

— Não.

— Compreendo. — Ela saiu da sua posição em que estava voltando a deixar o seu peso cair sobre os cotovelos.

— O que tem no outro pergaminho que tu trouxeste? — perguntei mudando de assunto.

— Uma lista de pessoas das tribos, não só a minha, mas as vizinhas também. — Ela desenrolou aquele pedaço de algo que parecia mais surrado do que o dos humanos.

Tomei o pergaminho das mãos dela e comecei a tentar lê-lo. Parecia que quanto mais eu via aqueles símbolos e desenhos, mais fácil era de entender algumas coisas. Notei que Allysa me olhava com uma de suas sobrancelhas arqueadas, talvez surpresa com minha atitude. Devolvi o pergaminho para ela.

— Qual o intuito em me mostrar isso? — falei rispidamente.

— Acho que aqui tem uma informação importante, que talvez seja de teu interesse — dizia ela encarando-me.

— Improvável — respondi cético.

Ela ignorou o que eu disse e começou a passar os dedos pelos símbolos do pergaminho. Allysa lia só para ela sibilando algumas palavras em sussurros, ela parecia estar falando sozinha e ao mesmo tempo caçando algo naquele pedaço de alga. Com o breve silêncio que se estabelecia entre nós, apenas a voz suave dela saía em tom baixo entre seus lábios. Não queria interromper, pois de certa forma, o jeito que ela falava era hipnotizante e eu podia ficar escutando-a o dia todo.

— Allysa, tenho uma pergunta, mas se tu não quiseres me responder, irei compreender. — Ela deixou com que eu prosseguisse após eu interromper sua leitura. — Como tu sabes falar minha língua?

— Não sei explicar, nós sereias conseguimos compreender idiomas diferenciados apenas ouvindo por alguns minutos ou lendo-os. Por isso que as irmãs das tribos falam apenas uma língua com diferentes sotaques — ela disse pausadamente parecendo que tentava montar as frases certas. — Nós conseguimos aprender as coisas facilmente observando os outros.

— Então por que tu não andaste naquele dia e escapou? — Ela parecia odiar escutar menções sobre o dia que os guardas capturaram-na.

— Andar é diferente, pelo o que eu aprendi nós só podemos andar depois de algumas horas de termos criado pernas, pois a transformação precisa se estabilizar e ficar resistente.

— Entendi. — Tentei processar toda aquela informação dela. O sono parecia ter chegado para mim. — Agora tu podes voltar a me explicar sobre o pergaminho. Ele parece muito velho.

— Realmente é. Ele cita sobre alguns nomes de sereias. — Novamente ela demonstrava selecionar as palavras, parecia que qualquer uma que soasse errado iria causar um grande impacto. — Queria saber se você conhece algum deles. — Assenti com a cabeça deixei que ela fosse falando cada um deles enquanto deixei escapar um bocejo.

Allysa foi pronunciando cada um deles. Alguns dos nomes pareciam palavras aleatórias de tão difíceis de pronunciar, mas por mim ela poderia citar milhões deles, pois sua voz era ótima de se escutar.

Eu já estava ficando hipnotizado novamente com sua voz até que ela me encarou como se eu estivesse dormindo, pois de fato eu estava com sono devido ter dormido mal na noite passada pensando se ela ia sumir. Quase não andava pisando no palácio de meu pai direito.

— Héclyro, você entende o que estou falando? — Allysa estava com olhos semicerrados encarando-me.

— Sim, sim! — falei bocejando.

— Olha este sobrenome. — Ela fitou o pergaminho e pronunciou as palavras. — Fahíerys, parece familiar para ti?

— Certamente! É um dos meus sobrenomes, bem como dos meus irmãos. — Fiquei surpreso que também havia sereias que compartilhavam sobrenomes iguais aos dos humanos. — Qual é o primeiro nome que rege esse sobrenome?

— O nome está riscado — sua voz fraquejou como se não quisesse me falar. — É um pergaminho muito velho.

— Não sabia que vós sereias compartilhavam dos mesmos sobrenomes que os humanos. Essa sereia que tem esse sobrenome está viva?

— Não sei. Queria saber também.

Allysa permaneceu calada me observando. Ela parecia estar querendo não me contar algo. Eu não iria especular isso dela, pois mal a conhecia. Um breve silêncio foi estabelecido entre nós. Olhei novamente para a passagem secreta da muralha e notei que a maré estava baixando aos poucos. Aquilo era um sinal de que a aurora iria surgir. Ficar perto de Allysa fazia o tempo passar mais rápido.

Dessa vez, foi ela que quebrou o silêncio. Ficamos conversando até um bom tempo. Ela sempre recuava com algumas palavras ou às vezes era grossa. Allysa ainda parecia ter medo de mim.

Nós falávamos sobre coisas dos nossos cotidianos, era incrível ter um pouco de conhecimento sobre as sereias e estranho ao mesmo tempo. Trocamos valores dos nossos povos, ela me falava coisa sobre a sua cultura e eu sobre a minha.

O povo dela tinha um longo laço mútuo com a natureza, bem parecido com os nossos. Era estranho saber que mulheres que mandavam em tudo na sociedade delas.

Meus olhos piscavam cansados, estava exausto e eu queria dormir. Allysa parecia fogo, mesmo sendo fria. Como ela conseguia ficar tanto tempo acordada sem ficar com sono?

— Allysa, irei dormir. Estou bastante cansado. — Passei minha mão sobre meu cabelo descendo pela testa coçando os olhos.

— Tudo bem. — Ela apenas começou a descer da pedra sem cerimônias.

Talvez essa tenha sido uma atitude tola, mas em um impulso exagerado eu segurei o braço dela, ele tinha uma textura lisa, quente e suave. Aproximei dela.

— Se tu quiseres... Nós poderíamos nos rever amanhã à noite. Concordas?

— Não sei, Héclyro. Pensarei a respeito. — Novamente ela parecia escolher as palavras, mas dessa vez ela demonstrava dúvida. — Não irei lhe confirmar nada, mas tentarei.

— Sim! Desculpe-me. — Referi a apertar o braço dela. Então o soltei.

Allysa não respondeu as minhas desculpas, apenas desceu completamente da pedra carregando consigo os pergaminhos que trouxera.

Ela mergulhou por completo balançando sua cauda pelas águas. Allysa foi submergindo até eu não a ver mais. Levantei-me da rocha pegando a luminária. Os primeiros raios do sol de alastravam pelo horizonte ao leste e a maré já estava totalmente baixa.

Ajeitei minha capa amassada e caminhei até a passagem secreta da muralha. Ver o palácio de longe era muito bonito. Ele ficava em cima de um dos dois penhascos entre eles há uma rachadura em forma de círculo onde entra água do mar. Era como uma baía.

As casas do reino ficavam nas encostas dessa rachadura perto do mar, subindo o penhasco. O local era lindo, tinha cachoeiras e bastantes árvores e flores. Na área onde a água do mar batia no início dos penhascos era onde ficavam os portos de pesca.

No penhasco da direita ficava o castelo de meu pai e no esquerdo havia um dos templos feitos para todos os deuses. Nosso palácio tinha sete torres e um enorme saguão construído sobre abóbodas de arestas e dava para se ver o vitral da maior janela do salão do trono.

 A arquitetura de todo reino era bem requintada e fina, muitas partes de pedras azuis com mármore branco. O ambiente sempre era harmonizado com a natureza e estatuas do arquiteto, os quatro deuses e seus filhos que são os deuses menores.  E para fechar todo o reino, a muralha com torres totalmente detalhadas e esculpidas em mármores cobria toda a redondeza. As áreas que as muralhas não alcançavam eram as fazendas e minas.

 

 

Ao entrar pela passagem secreta e chegar aos jardins internos do leste, fui surpreendido com o sol que já brilhava no céu criando tons roxos meio róseos com laranja enquanto gaivotas voavam. Caminhei pela entrada até a primeira porta que dava acesso ao primeiro salão.

Entrei tentando não fazer barulho, mas quando os guardas abriram as enormes portas entalhadas de madeira do saguão de entrada fizeram um grande estrondo. Logo em seguida vi o gigantesco Salão do Trono Azul e meu pai sentado nele, aquele cômodo era muito grande e retangular. Ele tinha pilastras de sustentações em mármore branco entalhado com flores nas ramas como se os fossem os deuses que segurassem o teto de abóboda de aresta, totalmente decorado com pinturas em afrescos dos deuses e detalhado em ouro. No meio do ambiente havia uma fonte retangular de água extensa com alguns peixes ornamentais e plantas com flores, ela criava o reflexo dos grandiosos lustres que havia no teto.

Meu pai trajava uma túnica cinza com detalhes pratas que se arrastava pelo chão. Ele estava sentado no seu trono que parecia uma grande árvore retorcida totalmente feita de mármore com ramas de flores róseas. Nas paredes do saguão havia grandiosos vitrais que retratavam a criação do planeta Tarem de acordo com a religião Nifésis. Os raios solares atravessam as janelas iluminando o grande piso de pedra polida branca.

Alguns serviçais passaram passavam pelo meu pai curvando-se. Fui me aproximando calmamente me escorando pelas pilastras. Foi uma tentativa falha já que os dois cães de caça dele vieram atrás de mim pulando em meu corpo, lambendo minhas mãos e latindo. Ambos os cachorros tinham um porte atlético e eram negros. O primeiro de chamava Quiros, ele usava uma coleira fina de ouro branco para se destacar do seu irmão, Tisus usava uma de ouro negro. Os dois eram muito elétricos e sempre corriam empolgados destruindo tapetes ou roupas dos nobres.

— Héclyro, pare de tentar se esconder. — Me afastei dos animais indo em direção da voz grave de meu pai que ecoava pelo saguão.

— Desculpe-me pai — falei com ombros caídos tentando não manter contato visual com ele.

Ao levantar minha cabeça, olhei para a face de meu pai, a luz do vitral dificultava visualizar perfeitamente. Ele tinha cabelos loiros que batiam até os ombros, sua pele era branca e seus olhos azuis. Ele era o meu oposto, mas ainda assim tínhamos nossas semelhanças como o maxilar quadrado e o mesmo formato dos olhos. Sua coroa era em forma de ramas douradas que circulavam ao redor de sua cabeça e nas laterais duas asas douradas com algumas folhas de prata. Os cachorros saíram de perto de mim correndo até o trono.

— Por onde estavas? Você sabe que tua mãe estava muito preocupada contigo. — Seu corpo estava disperso sobre o trono confortavelmente. Ele era um homem muito insensível, mas tinha um grande coração. — Não me digas que tu andas... — ele foi interrompido.

— Em bordeis da cidade! — Minha mãe chegou pronunciando-se calmamente complementando a fala de meu pai, mas com um olhar severo. Ela cortou o Salão do Trono ao meio caminhando com o barulho de seus saltos que ecoavam.

— Não, mãe. — Fiquei imaginando de onde minha mãe tirava essas ideias mirabolantes.

Minha mãe era uma mulher magnífica, ela era bastante jovem para sua idade, muito mesmo. Ela possuía longos cabelos castanhos ondulados escuros jogados para suas costas com algumas tranças. Seus olhos eram castanhos escuros como o meu, suas pálpebras eram pintadas com maquiagens exageradas mesmo ainda sendo manhã cedo. Possuía lábios bem desenhados e maçãs do rosto ressaltadas. Sua pele era de um branco queimado do sol mais puxado para um tom iluminado.

Ela usava um longo vestido azul escuro com detalhes de ramas douradas em sua barra e em sua cintura havia um grosso cinturão de ouro cravejado de jóias preciosas e uma pequena corrente de ouro ligava da sua cintura a uma gargantilha de ouro grossa em seu pescoço. Quanto maior a sua grossura e quantidade de pedras do cinturão da esposa, maior eram os status da família. Seus braços eram tampados por uma grande capa que se arrastava pelo chão. Ela era feita do mesmo tecido escuro do vestido. Em sua cabeça ela usava a mesma coroa que meu pai, porém em tamanho reduzido.

Minha mãe sempre foi muito protetora em sua cabeça, quando algum de seus filhos passa mais do que três horas fora do castelo já era motivo de algo perigoso. Ela tinha uma personalidade forte e amorosa.

— Mal lhe vi ontem, Héclyro — disse enquanto subia as escadas do trono ficando ao lado de meu pai, colocando uma de suas mãos sobre seu ombro. — Devia nos avisar pode onde andas.

— Perdão — falei de cabeça baixa. — Eu estava apenas andando pelo reino, tive insônia.

— Notei, suas olheiras estão muito profundas. Devias descansar. — Ela franziu as suas poucas linhas de expressões faciais.

— Leve-o para seus aposentos, querida. — meu pai falou enquanto afagava calmamente a cintura de minha mãe. — Porque estou quase proibindo as saídas dele para fora do castelo. — Ele sorriu para mim, enquanto olhava para os dois cachorros que estavam deitados ao lado do trono.

— Sim, meu rei. — Ela retirou a mão do ombro de meu pai.

 

 

Eu e minha mãe caminhávamos passando pelos cômodos do castelo até subirmos juntos na torre, onde era meu quarto. Conversávamos sobre coisas do dia a dia. Eu e meus irmãos sempre fomos bastante próximos dela.

Quando chegamos aos meus aposentos, ela se sentou em uma das cadeiras que havia perto da cama enquanto eu fui ao outro cômodo me trocar. O meu quarto seguia os mesmos padrões de construção do castelo. Ele tinha três grandes janelas e era todo detalhado em pedras azuis com mármore branco. Ao voltar do meu trocador, estava com uma roupa de linho que usávamos para dormir. Deitei-me sobre a minha cama com cobertores de pele.

Minha mãe logo em seguida sentou-se na cama. Ela colocou as mãos sobre sua perna me observando com um olhar carinhoso. Então ela moveu suas mãos tocando minha face calmamente. O vento frio entrava pela janela enquanto a lareira do meu quarto crepitava.

— Tu estás com um semblante diferente, querido. — Ela fitava-me comprimindo o olhar. — Por acaso tu estás conhecendo alguém?

— Não, mãe! — Por mais que eu já tivesse vinte e cinco anos, essas perguntas ainda me deixavam desconsertado.

— Sua irmã disse que te viu entrando ontem no castelo apenas para comer e já ia para fora das muralhas. — Ela retirou a mão de minha face. — Tu sabes que eu não gosto que andes além das muralhas. E teu animal de estimação fica rugindo nas masmorras do castelo, tu deverias levá-lo para passear pelos jardins.

— Meus irmãos vão fazer o mesmo, por onde eles andam?

— Acho que sim, esses animais não podem ficar trancados em masmorras por muito tempo. E seus irmãos estão dormindo.

— Tudo bem, hoje à noite irei passear com eles, pois de dia o povo ainda se assusta.

— Sim, só que não vá além das muralhas, por favor. — Ela parecia suplicar isso várias vezes.

— Claro. — Quando fechei meus olhos para finalmente descansar ela me toca no ombro.

— Só mais uma coisa. — Ela levantou-se da cama. — Os alfaiates e tecelões virão para cá de tarde tirar medidas do teu corpo, pois só falta ti.

— Para que mesmo? — Posicionei minhas mãos atrás da cabeça enquanto encarava minha mãe. — Meus irmãos já tiraram as medidas?

— Como assim para que? Minha estação preferida, o verão está chegando e vosso pai vai dar uma festa de comemoração aos seus trinta e quatro anos de reinado. Sim, seus irmãos tiraram as medidas ontem enquanto tu estavas sumido. — Ela jogou uma indireta, sua especialidade.

— Havia me esquecido completamente.

Minha mãe beijou minha testa então saiu da cama caminhando em direção a porta. Tinha que ajudar minha mãe nessa festa, pois ela gostava muito do meu pai e viriam pessoas importantes, então não queria desapontá-la.

— Vou indo, querido, eu, a sua irmã e vosso pai iremos receber alguns camponeses para ir preparando o cultivo de flores para a festa.

— A senhora não acha que está muito cedo para isso tudo?

— Só faltam dois meses. — Ela saiu calmamente do quarto e antes que fechasse a porta, completou. — E quero conhecer essa garota que tu dizes não existir.


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Notas finais do capítulo

Esse foi um capítulo mais calmo e família, já que os passados estavam com muita ação. Visei trazer uma paz maior e mais descrições dos sentimentos e tal. Espero que gostem.
Cap: betado por Reet
Se verem erros, me avisem por favor.
Obrigado a todos que abriram o capítulo para ler.

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Obrigado por estar acompanhando a história. Continue nadando com a nossa tribo!

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