Águas Obscuras escrita por Alph


Capítulo 5
Emboscada




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Notei sua face com dentes cerrados, punhos fechados e pupilas dilatadas. Nadei para próximo da encosta.

O local era cheio de rochas enormes, fiquei escorada em uma dessas pedras observando-oolhar para os lados, sua face ainda estava com um olhar de raiva. Ele respirou fundo e semicerrou os olhos na minha direção.

— Guardas, peguem-na! — Movimentou seu braço apontando com o dedo indicador para mim.

De repente, mais de quinze guardas saíram de trás das pedras com redes de metais. Eles me encurralaram. Tentei fugir, mas para onde eu olhava via homens com roupas azuladas e armaduras prateadas. Os que não estavam com redes em mãos, seguravam espadas apontando-as para mim. Fiquei aflita, sem rumo. Ao assimilar que estava acontecendo uma emboscada, comecei a ser tomada pelo meu instinto selvagem, ficando mais agressiva e soltando gritos agudos. Minha face começou a queimar, estava ficando estressada e agoniada.

Olhei de relance para o rapaz, e o vi ir embora com sua capa azul turquesa voando aos ventos rumo a uma construção enorme de pedras rústicas azuladas que ficava em cima de um precipício não muito alto. Meu sangue estava quente de raiva. Quando olhei ao redor, os homens que jogaram a rede de metal em mim, eles chegaram mais perto, prendendo-me contra uma pedra, me senti sufocada, tentei me esquivar de todas as formas.

Os guardas começaram a me arrastar pela água do mar com a rede de metal me apertando, meu cabelo ficou preso às correntes. Minha respiração estava acelerada, mas ao mesmo tempo eu me sentia sem ar, eu estava agonizando. Senti terra passando por todo o meu corpo enquanto tentava cravar minhas unhas no chão para me segurar, mas quando eu fui tentar me prender, um guarda me chutou. Encarei o homem fardado e com um pulo voraz da rede, eu arranhei a bochecha dele com minhas unhas cheias de veneno de sereia, senti a pele da face dele se dilacerando e aquilo me deu um grande prazer. O guarda deu um murro em meu braço enquanto ele resmungava da dor do arranhado e do sangue escorrendo.

Os homens que trajavam armaduras pararam de me arrastar pelas águas e todos eles me suspenderam pelos ombros dentro da rede de metal. Meus esforços foram em vão. Logo após de sair do mar, minha cauda começou a se transformar em pernas humanas, me deixando mais frágil, pois eu não sabia andar. Meu corpo estava completamente desnudo e cheio de terra, com os cabelos enroscados no metal. Eles me carregaram a caminho da grande construção e jogaram uma capa preta por cima de mim, impossibilitando-me de ver o que acontecia.

 

 

Jogaram-me no chão com brutalidade. A rede foi retirada junto com a capa e eu me vi no meio de uma vasta sala com um círculo de rochas no centro, de onde um vapor quente saía e indicava haver água. Rastejei-me até ser chutada pelo mesmo guarda do murro. Não tive tempo de tentar atacá-lo, pois não conseguia me movimentar bem com pernas. Escutei alguns guardas falando “Bem que essa puta deve dar uma boa foda.”

Fiquei no chão de bruços, então logo mudei de posição sentando-me e abraçando minhas pernas ao corpo.  Olhei de relance para as paredes do local, vi uma grande janela com vista para o mar. As paredes eram da mesma pedra azulada rústica, com algumas pilastras que aparentavam ser de mármore branco e o chão do lugar era de uma pedra cinza rústica polida combinando com o círculo cheio de água. A iluminação vinha das luzes de algo que era bem avermelhado em cima de coisas brancas que derretiam, parecia ser quente também.

Metade dos guardas saíram do quarto e a outra metade me vigiava. Passei alguns minutos calada apenas vendo os guardas me fuzilar com olhares de curiosidade. “Guardas, retirem-se, vou falar com a criatura pessoalmente. Não irei jogá-la em uma cela no calabouço, deixe-a aí mesmo na banheira. Meu pai não deve ouvir uma palavra sobre isso, entendido? Se ele souber, eu vou mandar cada um de vocês para forca!” Logo em seguida o rapaz que eu havia salvado apareceu na porta.  Agora ele estava sem sua capa, apenas usava um tecido branco sobre o tórax e outro preto nas pernas. Os guardasse retiraram da sala e a porta de madeira pesada foi fechada.

— São vocês que destroem os navios de meu pai, não é? — Ele respirou fundo, andou de um lado para o outro. — Responda-me! — vociferou.

Ele esfregava a nuca com certo nervosismo aparente. Fiquei calada no meu observando a apreensão dele. Os barulhos dos passos dos guardas saindo do corredor cessaram. Então o olhar do homem voltou para mim.

— Achei que sua existência fosse baboseira de pescadores e marinheiros bêbados. — Ele parou na minha frente cruzando os braços. — Há quanto tempo existem? Desde quando vocês matam homens inocentes? — Ele aumentou o tom de voz.

Tentei sair da frente dele me arrastando pelo chão para outro canto, o ignorava completamente.  Ao arrastar-me, senti diferentes texturas das pedras, aquilo me machucava, era uma dor suportável, mas algo que nunca senti antes.

— Você... — ele gaguejou, prendendo a respiração e engolindo em seco enquanto seus olhos percorriam a extensão do meu corpo que se arrastava. Eu não diria que sua expressão era inteiramente enraivecida nesse momento, mas surpresa. Logo em seguida, sacudiu a cabeça como se clareasse a mente. Encarou-me. — É melhor abrir essa boca, ou ficará aqui comigo até fazê-la.

Ele tentava se concentrar, mas parecia que algo tirava o foco dele. Então eu o vi se aproximando de mim. Pegando-me pelo colo com grosseria e me levando até a banheira, relutei, mas como eu não tinha muito coordenação em usar as pernas e movimentar-me fora da água, logo desisti, deixando que ele me levasse para a banheira. Logo me encolhi em um canto afastado dele.

Ele observou minhas pernas virarem uma cauda assim que a água encostou nelas, então relaxou os ombros e saiu de perto da banheira.O rapaz pegou o banco que estava no canto do quarto e o colocou de frente para mim. Levantei meu olhar até encontrar os olhos dele. Minha expressão estava abatida e triste, ele percebeu isso. O homem respirou fundo e se sentou no banco me encarando. Seus olhos percorreram pelo meu corpo e pararam nos meus braços quando ele viu nódoas negras em meus antebraços devido ao chute e o soco que levei. Ele passou a mão por sua cabeça demonstrando preocupação.

— Não vai falar nada, não é? — Ele respirou fundo novamente passando a mão pelo seu pescoço e depois pelas têmporas com gotículas de suor. — Pois bem, ficarei aqui contigo até você resolver falar.

 

 

No momento eu só pensava em sair dali, me senti culpada por algo que estava habituada a fazer. Olhei para as janelas e só pensava em pular, mas não sabia andar. Ele me encarava com o olhar pesado e a cada cinco minutos soltava um suspiro. Parecia estar com muita raiva de mim e ao mesmo tempo dó. Arrependia-me amargamente de ter ido à praia, devia ter ficado no mar. Mas tem algo nele que por mais que eu odeie, eu ainda o queria por perto.

Mais minutos se passaram, ele olhava para minha cauda com curiosidade. Sua respiração estava lenta, ele mudava constantemente de posição no banco. Aquilo me deixava atormentada, pois nós sereias conseguíamos nos manter paradas por muito tempo. O rapaz dobrava as mãos na frente da virilha, ficando curvado, respirou fundo e disse:

— Por que me salvou? Por que me deu essa marca no pescoço?

— É um símbolo de proteção — corrigi-o rapidamente.

— Você já me disso isso antes. Agora eu quero saber o motivo de ter feito ela! — Fiquei em silêncio novamente, movimentei meu corpo para o outro lado da banheira me afastando dele. Ele me olhava de relance então notei que suas pupilas dilataram.

— Ao menos me diga qual seu nome?

— Você não entenderia. — Olhei para ele.

— Fale mesmo assim — o homem disse nervoso.

— Na sua língua é algo como Allysa. Já na minha, é apenas um ruído agudo que estouraria seus tímpanos.

Ele sentou-se ereto no banco, deixou seus ombros caírem e posicionou as mãos em cima das coxas. Suas sobrancelhas estavam franzidas, o rapaz parecia tentar escolher as palavras que iria falar em seguida.

— Meu nome é Héclyro Lavyrio Fahíerys — ele respondeu curtamente.

— Não te perguntei seu nome — retruquei grosseiramente.

 

 

Houve outro breve silêncio, ele ficou calado dessa vez e olhava para o chão. O homem se levantou do banco e andou até o manto preto jogado no piso. Continuei imóvel, ele chegou até perto de mim e disse:

— Preciso te tirar daqui... — Ele parecia falar mais para si mesmo do que para mim.

Héclyro foi até o outro lado do quarto. Ele parecia tentar refletir algo ou sair de devaneios. Saí da minha posição na banheira e observei-o andando de um lado para o outro. O rapaz se aproximou do tecido preto que os me homens trouxeram. Ele estava sujo de areia e com os meus fios de cabelos platinados. Héclyro pegou esse tecido e veio até mim. Quando vi que ele se aproximava, me encolhi no canto da banheira assustada, pois odiava aquele pano.

Ele me encarava com um olhar de dúvida pesado, parecia completamente perdido ou em um conflito interno. Resmungava alguma coisa, tentei escutar, mas parecia apenas uma mistura de palavras sem sentido. Quando Héclyro percebeu que eu recuei por causa do pano, ele se afastou da banheira, jogou o manto para longe e saiu com passos fundos e tensos para fora do quarto batendo as enormes portas de madeira.

Quando ele saiu, só pensei em como escapar dali, nadei em todo o perímetro da banheira circular. Olhei para as grandes janelas e escutei o barulho do mar chicoteando as encostas.  Queria muito poder sair daquela banheira e saltar da janela.

 

 

Héclyro começou a demorar, então achei que os guardas iriam voltar e me matar, senti meu estômago embrulhado. Algo estava errado nessa demora toda.  Então resolvi não esperar mais. Segurei na borda da banheira e tentei me levantar, mas quando eu estava quase tirando todo meu tórax, as portas se abriram novamente, e então eu desisti do meu plano, voltando para a água.

Ele voltou sozinho, agora estava com passos longos e foi se aproximando da banheira. Héclyro pelo que vi, apenas saiu para pegar sua capa azul turquesa que havia tirado. O rapaz entrou na água, que batia em seu joelho, seus trajes começaram a se encharcar deixando o azul de sua capa mais escuro ainda.

Nadei para o outro lado da banheira batendo minha cauda azul perolada com força, jogando água para tudo que era canto. Estava assustada e não sabia o que pretendia fazer comigo. Então ele se aproximou vorazmente fazendo-me encolher no canto.

— Você me salvou uma vez, então é minha obrigação retribuir o favor. — Ele me pegou no colo tirando-me da água calmamente enquanto minha cauda se transformava em pernas, desta vez não relutei. — Mas não pense que isso significa que perdoei sua raça. — Então ele pegou parte da sua capa azul que estava limpa e cobriu meu corpo gentilmente deixando minha cabeça apoiada em seus bíceps. Seu manto tinha o mesmo cheiro que o dele, não era forte, mas era sutil e meio doce.

Em seguida, ele me carregou no colo passando pelos corredores vazios, estreitos e silenciosos do castelo. Passamos por vários locais da grande construção. Notei que de vez em quando ele encarava meu rosto pálido e continuava a andar.

Os corredores do castelo eram cheios de colunas com flores enramadas, estátuas e vários tecidos pregados nas paredes com os brasões de um dragão com uma espada no peito bordado. Ele tentava se esquivar dos guardas que faziam a ronda no local. Paramos de frente a uma porta pequena de madeira do lado de duas estátuas brancas. Quando ele abriu a porta e passamos, deparei-me com um corredor escuro e úmido com várias coisas penduradas na parede que iluminavam o espaço, olhei para aqueles objetos e tentava entender de onde vinha aquele brilho que parecia ser quente. No final daquele corredor tinha longos lances de degraus que iam descendo.

Prosseguimos calados até o final da escadaria. Quando ele abriu outra porta no final do corredor, nos deparamos com um caminho que levava até a areia da praia onde os guardas dele haviam me capturado. De longe, o Sol já estava nascendo e os primeiros raios brilhavam ao leste do mar.

Em seu colo ele me carregava com facilidade, deparei-me com ele encarando minha face novamente, e notei que, dessa vez, ele corou as suas róseas bochechas. Ao chegar perto das primeiras ondas que batiam em seus pés, Héclyro caminhava mais depressa até quando as ondas pesadas começaram a bater em sua cintura.

Sua cabeça encarava os dois lados da praia para confirmar que não tinha ninguém nos observando. Ele foi me colocando gentilmente sobre as águas e retirou o seu manto que estava sobre mim.

— Não quero te ver perto dos barcos de meu pai, nem as outras da sua raça. Vão para outro lugar! — Héclyro tentava falar mais alto que as ondas.

 

 

Nadei rapidamente no fundo das águas para chegar à tribo e só tinha um pensamento: vingança. Meu corpo estava cheio de raiva, o pior é que tinha algo em mim que me fazia gostar dele. Mas Héclyro iria pagar caro pelo que fez a mim. Meu rosto estava queimando, mordia meus lábios inferiores para apaziguar a raiva, queria compreender esse horror todo que é matar um humano.

 No caminho, fui passando pela Vala do Exílio. O local era um penhasco gigantesco ele tinha um breu total de lá só saía bolhas e um calor escaldante, as sereias nadavam beirando a superfície para não passar por ali. As irmãs mais antigas falavam que o monstro gigantesco que matou minha mãe era aprisionado lá e também tinha umas que falam que ele já está morto depois de tanto tempo exilado lá.

Fui rente ao penhasco e quando estava no meio da enorme vala escutei um rugido grave vindo do escuro profundo. Estava muito curiosa e sem pensar duas vezes comecei a entrar dentro daquela escuridão da vala, era um ação imprudente, mas eu estava muito curiosa para descobrir mais.

Quando eu estava me aprofundando escutei o soar das conchas na tribo. Então nadei para a superfície novamente e fui obrigada a tomar meu percurso até o Santuário de Encubação novamente, mas eu ainda queria descer até lá e descobrir tudo. 

Quando já havia saído da vala e retornado ao caminho para a tribo eu escutei de novo o rugido vindo da escuridão, olhei para trás e me deu uma enorme vontade de descer até lá, mas minhas obrigações falavam mais alto, principalmente minha raiva.

Chegando ao Santuário de Encubação, Tamara e Lyria me esperavam na porta. Lyria sorria para mim, já Tamara fazia uma expressão de desaprovação. Passei pelas duas de cabeça erguida e entrei no meu quarto. As olhei na porta e virei minha face para frente.

— Onde você estava? — Tamara me perguntou com grosseiramente olhando-me de cima a baixo. E depois tocou os ferimentos. — Que machucados são esses nos braços?

— Sem perguntas — falei rispidamente desviando meu olhar e tentando conter um gemido de dor ao toque dela, então retirei meu braço de suas mãos abruptamente.

— Você vai se atrasar para o torneio entre os tritões, Allysa — Tamara retrucou novamente enquanto Lyria fazia cara de paisagem.

— Então o que está esperando para vir me arrumar? Está esperando Amidh retornar? — Sorri ironicamente.

— Você está diferente. O que aconteceu contigo? — Tamara voltava no assunto. — Está com cara de abatida.

— Tamara, calada. Apenas faça o que você foi ordenada a fazer!

Ambas vieram pentear minhas longas madeixas e pôr meus trajes. Elas fizeram um penteado com um grande volume na parte superior e várias tranças pequenas segurando-o e o que sobrava do cabelo ficava solto. Agora as os tecidos eram diferentes, elas colocaram uma espécie de colar gigante que vinha do meu pescoço ao final dos meus ombros, ele era maciço e seu material parecia ser de ouro cinza. E o caimento desse colar era um tecido transparente de tonalidade branca que caía sobre meu corpo nu. E para finalizar era posto uma coroa de cristais de gelo com ouro branco e diversas pedras de brilhante marinhas que são extremamente raras de se encontrar.

Entrei com a cabeça erguida passando entre as duas estátuas de Amidh no Coliseu. Nas arquibancadas ouviam-se muitos aplausos e salvas de palmas de todas as sereias das tribos. No meio da arena estava o batalhão retangular de tritões perfeitamente alinhados. Quando cheguei perto deles por trás eles abriram uma passagem no meio do batalhão então eu e minhas damas de companhia passamos entre essa abertura indo até o balcão dos anciões na parte superior do Coliseu.

Entre todos os tronos que estavam ocupados pelos anciões, no meio estava o maior que era feito de gelo maciço com traços de mármore e abaixo dele tinha duas cadeiras menores que eram para as damas. Ao sentar no meu trono aplausos se cessaram, então a anciã Marissa foi à frente do balcão se pronunciar.

— Bem-vindos novamente à nossa primeira fase de desafios. Como a maioria sabe, essa etapa dos desafios será a disputa entre os dez tritões que serão escolhidos por nossa escolhida. — Ela apontou para mim enquanto falava em alto e bom som com sua voz aveludada. — Agora passarei a palavra a nossa escolhida.

— Bom dia a todas as tribos reunidas aqui hoje — falei pausadamente. Virei meu rosto para a Marissa e ela me encarou severamente. — E um bom dia aos deuses e especialmente a Deusa Amidh por me proporcionar essa grande oportunidade. Agora peço que se apresentem todos os tritões para que eu possa escolher. — De cabeça baixa tentando não encarar os seres presentes observei o chão de mármore enquanto estava sentada em meu trono pronunciei envergonhada aquelas palavras a todos.

Enquanto os tritões se alinhavam em uma fila única para a apresentação as sereias de Fertilitais tocavam harpas de corais e alguns instrumentos próprios delas que eu não conhecia que emitiam um som grave, ele era enorme e curvilíneo. Com uma das mãos elas seguravam-no e na outra uma agarravam uma vareta que era passada nas linhas daquele objeto.

Olhei a todos os tritões enfileirados então ordenei:

— Apresentem-se.

O primeiro da fila nadou um pouco a frente e se apresentou. Ele disse seu nome e sua idade, sua aparência era bela. Ele era um tritão negro com corpo malhado, uma cauda azulada enorme e tinha dentes perfeitamente brancos. Ele se curvou para mim.

— Escolho você — falei friamente enquanto o tritão escolhido por mim ia para o canto esquerdo da enorme arena ficando posicionado de frente para mim.

Assim se prosseguiu as escolhas dos dez tritões. Após todos os cento e cinquenta rapazes se apresentarem, os escolhidos ficaram em formação no centro da arena olhando para mim enquanto os que foram rejeitados foram diretamente para as arquibancadas. Marissa se levantou do seu trono.

— Agora que já temos os dez escolhidos, vocês serão divididos em pares e lutarão. E o que conseguir se manter consciente na água partirá para a próxima etapa de desafios. — Ao finalizar as palavras de Marissa os tritões se entreolharam.

— Primeira dupla a lutar será Khoy e Rollery. — Kai o líder dos tritões reclamou-os.

As duplas que não foram chamas se afastaram do centro da arena indo para o lado esquerdo novamente. Khoy e Rollery, ambos eram tritões de pele clara com longos cabelos, um com feições da tribo de Ferox e outro da tribo Fertilitais se posicionaram no centro do local. Duas sereias da tribo Divitias levaram lanças de gelo.

Os dois tritões se cumprimentaram dando beijos em suas bochechas e depois seguraram suas lanças, ambos trocaram olhares de fúria enquanto as multidões de sereias gritavam e urravam balançando seus estandartes. Eles se cercavam brutalmente. Os instintos selvagens deles comeram a aparecer. Suas peles ficavam mais brancas e suas garras cresciam, seu corpo se alongava e seus lábios se transformavam e presas.

Khoy atacou primeiro movendo a lança antagonicamente à sua postura cortando o ombro de Rollery. Começando uma dança de lanças e de rasteiras com caudas, seus corpos era como anavalhas um cortando o outro. Gemidos de fúria deixavam os dois tensamente agoniados. Até que Khoy que tinha traços da tribo Ferox quebrou a lança de Rollery em um golpe certeiro que ficou desarmado. Khoy em um ritmo voraz investiu o cabo de sua lança contra a face de Rollery que ficou inconsciente. Ele deitou-se na areia da arena, era possível ver inúmeros cortes em seu corpo e rosto. As sereias urravam aplaudindo Khoy que foi classificado pra segunda etapa enquanto Rollery estava caído, inconsciente com algumas machas de sangue na água e machucados profundos em toda extensão de seu peitoral.

 

 

Ocorreram as outras lutas, até só restaram cinco participantes. A forma que os tritões lutavam era extremamente agressiva. Algumas duplas pareciam que iriam se matar. O barulho das lanças se chocando era estridente a cada partida.

Os cinco ganhadores dos duelos ficaram posicionados a minha frente em formação, eles estavam cortados, machucados e alguns sangrando. Enquanto os tritões inconscientes que perderam eram levados para os templos de tratamento, levantei-me do meu trono com muito dó deles, então desci ao encontro dos rapazes.

Eles olhavam diretamente para mim exaustos. Analisei-os de cima a baixo e fui aproximando-me aos poucos dos tritões. Então usei meu dom para curar as feridas de cada um. Quando eu colocava a mão nos corpos a minha frente, meu poder fechava as feridas e estancava os sangramentos.

Agora eles olhavam para mim com um semblante menos abatido. Os seres ali presentes aplaudiram a gritavam meu nome. Marissa me observava do balcão com um olhar negativo sobre minha ação.

Após curar os tritões vencedores, subi para o balcão e sentei-me no trono. Marissa sussurrou algo desagradável e eu a ignorei.

— Silêncio, silêncio. Obrigada a todos os participantes que ganharam. E os que estão sendo tratados dos ferimentos graves, desejo Amidh tenham ótimos cuidados com suas almas — pronunciei as palavras calmamente para que todos pudessem escutar pausadamente.

— Agradecemos suas doces palavras, Allysa — falou sorrindo para mim e depois para o público. — Agora que a primeira parte do desafio está concluída, peço que os vencedores se juntem aos demais. As sereias de Divitias irão dar início a uma oração à Amidh por esse nosso glorioso festival. — Marissa sentou-se novamente e sussurrou para mim:

— Seu dever é ficar apenas aplaudindo e olhando, não curar os feridos. — Depois ela olhou para frente e continuou sorrindo e eu apenas a ignorei.

 

 

Uma longa e tediosa oração, todas as sereias já estavam cansadas. Já era noite e as luzes mágicas estavam começando a circular pela tribo. Após todos os duelos e orações chatas acabarem, aos poucos todos saíam do Coliseu indo para os templos do sono. Marissa e os outros anciões foram junto aos demais. Ela me ignorou totalmente depois dos duelos, e para mim isso não era algo ruim.

Eu e minhas damas de companhia fomos para meu Santuário de Encubação, lá deixei que elas tirassem todo aquele peso da coroa e dos tecidos que eu usava. Meu cabelo estava solto e meu corpo nu novamente, era bom me sentir livre.

Dispensei minhas damas de companhia que foram se juntar as outras sereias nos templos do sono me deixando sozinha. Deitei-me em minha cama e cochilei um pouco. Foi tempo suficiente para repor as energias e lembrar que o eu iria me vingar, nunca fui tão humilhada assim. Minha raiva estava se transformando em ódio, mas ao mesmo tempo ele mexia comigo de uma forma estranha.

Minha mente estava em uma enorme confusão e tentava manter o equilíbrio, mas eu estava sedenta de raiva e queria machucá-lo a todo custo como aqueles guardas fizeram comigo. Em meus devaneios eu só queria ter uma forma de reverter minha ida lá, queria que nada disso tivesse acontecido. Eu devia tê-lo deixado morrer.

Quando olhei pela janela aberta do segundo quarto, vi que estava um escuro total em toda a tribo, nenhuma sereia circulava pelas redondezas, peguei meu chicote de algas e parti. Passei rapidamente entre o templo aberto das estátuas dos deuses. O templo era cheio de pilastras com flores enroscadas que seguia a arquitetura da tribo e no meio dele havia um jardim das mais diversas espécies de flores e plantas marinhas, cardumes de peixes circulavam perto de mim enquanto meu cabelo flutuava acima de mim.

 Aumentei a velocidade das minhas barbatanas chegando à superfície, dei a volta em algumas pedras que se assemelhavam as que eu fui capturada pelos guardas de Héclyro na noite passada. Olhei todo o perímetro a minha volta. Minha cintura para cima estava fora da água, mexia meus ombros grosseiramente enquanto nadava, minha face estava queimando de nervosismo. Meu ódio veio à tona quando me lembrava dele. Eu queria matá-lo, arranhar sua cara toda, comer toda a sua carne e o fazer sofrer como ele me fez.

Cacei-o de longe. Olhei por todos os lados da praia. Não conseguia achá-lo, não conseguia me concentrar devido à raiva que eu estava dele. Usei minha mágica para poder rastreá-lo, e logo em seguida depois de um tempo eu consegui senti-lo por perto. Ao saber que ele estava próximo nadei com todas as minhas forças para matá-lo.

Minha raiva me cegava fazendo minhas ações serem abruptas. Foi quando eu o vi sentado nas pedras. Fui me aproximando sem que ele percebesse. Escorava-me nas rochas até conseguir ter uma visão mais ampla de onde ele estava. Héclyro estava sentado nos rochedos que eram molhados pelas ondas, ele parecia estar caçando algo, passava sua mão pelos cabelos e depois massageava a testa.

Em sua mão ele segurava algo feito de metal com pequeninas janelas e o mesmo brilho que parecia queimar, aquilo iluminava o lugar com uma luz alaranjada.  O rapaz mirava o horizonte ao redor tentando ver alguma coisa. Ele chutava a água que estava nas rochas, parecia estar estressado. 

Cheguei rapidamente para mais perto do rochedo onde ele estava e armei meu chicote para atacá-lo. No momento eu estava domada por algo que não conseguia controlar. Tudo o que aconteceu na noite anterior vinha à minha cabeça como vultos.

Apareci em sua frente com uma distância considerável deixando apenas minha cintura para fora da água enquanto as ondas se movimentavam para acometê-lo. Os olhos de Héclyro estavam com bastante olheiras e avermelhados. Sua respiração estava acelerada e sua cabeça reclinada.

E ele pareceu surpreso com minha atitude, mas logo em seguida, franziu a testa com um olhar triste comprimindo seus lábios rubros em dúvida, deixando seus ombros caírem, e falou:

— Sabia que te encontraria novamente. — Logo, eu fiquei sem reação, queria atacá-lo, mas aquele olhar dele me impedia, queria o fazer sofrer, mas não consegui. Permaneci com o chicote em mãos enquanto ele me fitava sutilmente.

Sempre fui muito voraz em minhas atitudes, nunca me prendi a regras e a criação que Marissa me passou foi ruim. De certa forma isso me influenciou de forma negativa, e agora eu via o tanto que era fraca e me perdia em pensamentos confusos.

Sempre queria manter um equilíbrio entre minhas ações e o que eu penso, mas isso nunca dava certo. Minha mente queria machucá-lo, mas meu corpo não correspondia. Literalmente eu estava tendo uma confusão interna e meu rosto começou a queimar. Héclyro era um humano, e eu estava me questionando o motivo de me sentir incapaz de querer ferir ele.

Suas orbes negras se dilatavam ao me ver, tentei me impulsionar de supetão, mas realmente me sentia incapacitada. Olhar para ele que estava com a guarda baixada me fazia sentir que o que eu estava prestes a fazer era errado. Era como se o símbolo de proteção tivesse outra finalidade além desta, a finalidade de me prender a ele.

 


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Notas finais do capítulo

Cap: betado por Reet
Sei nem o que dizer, só sentir.
Se verem erros, me avisem por favor.
Obrigado a todos que abriram o capítulo para ler.

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Obrigado por estar acompanhando a história. Continue nadando com a nossa tribo!

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