Destino escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 24
Capítulo 23




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Araras azuis voam majestosas ao lado do barco , onde Ashley está sentada desenhando cada detalhe da exuberante paisagem, sendo observada com carinho por Murilo.

—E então? – pergunta o duque chamando a atenção da jovem que o encara com seus grandes olhos azuis.

—Você estava certo. Não poderia perder esse momento por nada – comenta Ashley sorrindo.

— Fico feliz em saber  que pensa assim –fala Murilo retribuindo o sorriso.

— Vamos parar aqui – avisa Fabiano que está no outro barco com Sofia que também está registrando cada momento com sua máquina fotográfica.

O rapaz desliga o motor do barco e ajeita a vara de pescar , a isca, além dos apetrechos necessários para pegar bons exemplares de peixes. Ele se levanta e então lança a linha de pesca longe, sendo acompanhado por Fabiano. O silêncio é interrompido apenas pelo canto dos pássaros que vem das árvores. Ashley o observa fazendo os movimentos calmos e precisos, com certo ritmo, como se fosse uma dança, inspirando Lady de Argyll a desenhar o Duque. Quase meia hora depois , Murilo pega um exemplar de Peixe Dourado digno de admiração por todos. Ele sorri em direção a Ashley que o aplaude pela conquista.

—Parabéns, meu amigo – fala Fabiano ainda na busca pelo seu primeiro peixe.

—Parabéns – parabeniza Ashley sorridente.

— Obrigado – agradece Murilo guardando o peixe dentro da caixa térmica. Ele ajeita a vara mais uma vez e então encara Ashley estendendo a mão em sua direção  — Venha.

— O quê? Por quê? – questiona Ashley surpresa.

— Sua vez de pescar – responde Murilo.

— Oh, não, muito obrigada, mas estou ótima aqui sentada desenhando – recusa Ashley sacudindo suas mãos.

—  Nada disso, mocinha. Agora nós vamos trocar de lugar – avisa Murilo balançando a cabeça. — Você irá pescar e eu, desenhar.

— Tudo bem – concorda Ashley que fecha seu caderno, ajeitando seu material ao seu lado.

O Duque de Wilkinson estende a mão em direção a ela que segura enquanto se levanta, então o rapaz entrega a vara e o anzol para Ashley que o encara, confusa:

—Achei que fosse pescar...

—E vai, mas primeira coisa que todo pescador deve aprender é amarrar o anzol à linha. – explica Murilo — Lambe  a linha.

— What? – exclama Ashley , surpresa — Não lamberei esta...linha. Enlouqueceu?  – alega fazendo cara de nojo.

— Você precisa passar um pouco de saliva na linha para lubrificá-la e garantir que o nó esteja bem apertado.

—Hugh – exclama Ashley fazendo uma careta enquanto leva a linha em sua boca, ato feito tão rapidamente que Murilo duvida que seja suficiente.

— Agora, passe a ponta da linha na argola do anzol... Isso mesmo... Enrole-a em torno de si mesma de quatro a seis vezes e puxe-a de volta em direção ao anzol. Insira a ponta da linha no laço e puxe-a bem forte. Conseguiu?

—Sim – responde Ashley terminando o último movimento.

—Agora – continua Murilo entregando o chumbo e a bóia — Coloque o Chumbo um pouco acima de onde ficará a isca...

—Para que ele serve? – pergunta Ashley ajeitando o chumbo no local indicado.

— O chumbo ajuda a manter a isca alguns centímetros acima do fundo, que é bem onde os peixes caçam. Ele também mantém a linha estável já que temos uma correnteza considerável aqui.

— E a bóia?

— A  bóia começar a tremer e afundar e isso permite saber que fisgou o peixe.

—Mas você não usou a bóia – alega Ashley encarando o rapaz, desconfiada. — Por quê?

— Porque eu sou profissional – explica Murilo balançando os ombros — Quando se é iniciante, usar uma bóia facilita muito as coisas.

—  Não usarei – recusa Ashley devolvendo a bóia ao rapaz que a encara surpreso —Não quero que facilite as coisas para minha pessoa. Se vou aprender a pescar , que seja da maneira correta e sem... Facilidades. Quero aprender como deve ser.

— Tudo bem – concorda Murilo pegando uma sacola plástica — Já que você insiste, agora está na hora de colocar a isca no anzol... E como você mesma disse que deseja aprender do modo tradicional... – Ele enfia a mão dentro da sacola e então encara Ashley sorrindo —Quero te apresentar o Minhocoçu[1].

Entre os dedos de Murilo a maior minhoca que Ashley já tinha visto em sua vida, além de ser gosmenta e ter a coloração mais escura que uma minhoca convencional, algo que definitivamente a jovem não esperava, ainda mais se contorcendo como estava naquele momento. Ela coloca uma das mãos na boca tentando segurar a ânsia que sentiu imediatamente.

— O que é isso? – pergunta Ashley com nojo.

—Minhocoçu, a isca que você irá usar para pescar o teu peixe.

—Não, não mesmo – recusa Ashley balançando a cabeça rapidamente.

—Qual é? Você mesma disse que gostaria de aprender sem qualquer facilidade.

—Eu sei o que disse, mas... isso – alega Ashley apontando para o Minhocoçu. —Isso é muito pra mim.

—É mais fácil do que imagina – argumenta Murilo se aproximando da Ashley — Dê a sua mão.

—Não – recusa a Ashley. —É nojento.

—Vamos, dê a sua mão. Confie em mim – pede Murilo sorrindo.

—Hugh – exclama Ashley de olhos fechados enquanto estende a mão em direção ao rapaz.

— Você precisa ficar de olhos abertos – informa Murilo observando Ashley abrir só um dos olhos e fechar rapidamente — Vamos, Ash. Cadê sua coragem?

—É fácil para você dizer sobre coragem quando se tem contato constante com esse tipo de animal – alega Ashley nervosa.

—Você acha que foi fácil pra mim? – questiona Murilo, surpreso — A primeira vez em que vi um Minhocoçu, quase pulei do barco.

— E como fez para ... lidar com isso?

— Pense que é uma linha – responde Murilo erguendo o Minhocoçu em direção a Ashley.

—Okay, uma linha... – repete Ashley segurando o animal com nojo enquanto faz uma careta — Uma linha gosmenta... E que não para de se mover.

— Eu sei que é asqueroso...

— Que bom que está ciente da propriedade desse animal – alega Ashley, deixando o animal bem distante do seu corpo.

— Agora você precisa atravessar a minhoca três vezes com o anzol.

—Três vezes?! – grita Ashley arregalando os olhos.

—Sim, Ashley. Iscas desse tipo têm de ser atravessadas o maior número possível de vezes pelo anzol para que fiquem seguras. É essencial que ela fique bem presa a ele, ou se soltará quando você lançar a linha.

— Três vezes? – repete Ashley encarando o animal.

— Sim, atravesse o minhocoçu três vezes, deve bastar. – confirma Murilo — Faça assim...

Ele pega a mão da Ashley que está com o anzol e a faz segurar firme, enquanto conduz a outra, a fazendo fincar a isca rapidamente. Ela o observa nervosa com o toque das mãos, enquanto o rapaz torce a isca outra vez contra a ponta do anzol e então a atravessa pela última vez.

—E sua isca está pronta – comenta Murilo terminando de prender o Minhocoçu. — Agora vire-se em direção ao rio coma vara em mãos.

Ashley se vira segurando a vara como acha que deve ser, então sente Murilo se aproximar, deixando o corpo colado ao seu  e o rosto apoiado em seu ombro, com os lábios quase grudados em sua orelha.

— Esta mão – sussurra Murilo no pé do ouvido de Ashley enquanto segura a mão direita dela e conduzindo pela vara — Fica no molinete...

— Certo – responde Ashley tentando se concentrar.

—Esta... fica aqui. – segura na mão esquerda a fazendo deslizar por todo comprimento até chegar no lugar. — Entendeu?

— Uhum. – solta Ashley fechando os olhos enquanto sente a respiração do Murilo em seu pescoço, fazendo alguns de seus fios dançarem no ritmo.

— Agora... Preciso que você faça o mesmo movimento com que atirariam uma pedra na água.

— Como? – pergunta Ashley tentando se concentrar na explicação.

— Incline seu quadril para o lado... Assim – responde Murilo que desliza as mãos pelo corpo da loira até chegar no quadril, então o puxa trazendo contra seu corpo. A respiração de Murilo no pescoço de Ashley a deixa inebriada — Agora puxe a vara para trás e balance-a delicadamente na direção em que pretende atirar o anzol – ele conduz os braços da jovem fazendo o movimento com a vara de pesca, devagar ,sentindo cada centímetro da pele da jovem. O movimento força seus corpos a se tocarem ainda mais, deixando o misto de sensações ainda mais difícil de ser controlado por eles.  — E soltando a linha no momento em que você agitá-la... Dessa forma – finaliza levando a mão de Ashley em direção ao molinete para soltar a linha, girando com cuidado enquanto mantém a mão dela sobre a sua.

— E agora? – sussurra Ashley virando o rosto levemente, encontrando os olhos de Murilo. Seus lábios estremecem enquanto ela se esforça em manter sua respiração o mais normal possível.

— Agora... – repete Murilo encarando a Lady de Argyll intensamente. Então ele pisca os olhos rapidamente e então se afasta, nervoso em direção ao lugar da jovem — Agora, você simplesmente espera.

— Sério? Eu ficarei aqui parada... Esperando? – questiona Ashley apontando para a vara.

—Sim. Você pode agitar de leve a linha para dar aos peixes a impressão de que a isca está viva. Ah, precisa ficar em silêncio. Os peixes se assustam com sons e ruídos altos, portanto,  se precisar falar comigo, apenas quando necessário e sussurrando.

— Está bem – sussurra Ashley observando Murilo pegar o seu caderno —E como saberei que o peixe foi fisgado?

— Você vai sentir um puxão na linha – responde Murilo. — Às vezes, pode ser difícil distinguir uma fisgada da força que a correnteza exerce sobre a isca.

—Como saberei que é um puxão e não a correnteza?

—Apóie um dedo em cima da linha: desse modo, você poderá sentir a fisgada facilmente, mesmo que não tenha uma bóia e deixe que a natureza se encarregue do resto – responde Murilo — Agora, se me permite, irei desenhar.

Ashley observa Murilo abrir seu caderno de desenho e o seu estojo, pegando um dos seus carvões. Ele se vira estendendo a mão com o polegar ereto em direção da jovem, como se estivesse medindo para reproduzir na folha em branco a imagem dela em seu primeiro dia de pescaria.

Ela tenta se concentrar na pesca, mas seu acaba no suor que escorre por sua testa devido ao calor intenso daquele dia de sol forte. Ou então nos mosquitos que a rodeiam com seus zumbidos, a forçando sempre a esfregar a orelha contra seu ombro. Também na curiosidade em saber o que o Murilo está desenhando a ponto de deixá-lo tão concentrado.

Ashley balança a cabeça e volta a olhar em direção ao rio, até que seus olhos se direcionam a margem oposta, onde um enorme jacaré está tomando seu banho de sol sem a menor preocupação. Então o mato atrás dele começa a se movimentar, até que surge a rainha do Pantanal: A Onça Pintada.

— Murilo – sussurra Ashley, nervosa, enquanto sacode uma das mãos em direção ao rapaz que por muito custo levanta a cabeça prestando atenção nela — Murilo, olhe.

— Uau – exclama Murilo admirado. Ele acena para o outro barco, fazendo todos prestarem atenção no que estava prestes acontecer — Essa briga será boa.

—Não há briga. Ela não ousaria nem ao menos se aproximar do Jacaré – alega Ashley.

—Por que não? – pergunta Murilo , curioso.

—Simples, ele é o dobro do tamanho dela – responde Ashley apontando em direção ao Jacaré — Sem dúvida, se ela avançar, o Jacaré a matará.

— Quer apostar? – propõe Murilo com um sorriso pretensioso.

— Por quê? Você acredita que a onça irá ... Comer o Jacaré?  - questiona Ashley, incrédula.

—Sem dúvida – responde Murilo, tranquilamente.

—  Certo. O que iremos apostar? – pergunta Ashley,curiosa.

— Se você estiver certa, eu votarei no Darwin assim que o projeto terminar e ainda farei com que todos os meus aliados votem nele.

— Gostei – responde Ashley balançando a cabeça, pensativa.

— Agora, se você estiver errada...

— Por favor, seja bonzinho – pede Ashley.

— Terá de dançar comigo – revela Murilo cruzando os braços.

—Dançar com você? Sério? Onde? Quando?

— No momento em que eu quiser – informa Murilo observando a onça se esgueirar atrás do Jacaré —  Aceita?

—Tudo bem, eu aceito – concorda Ashley convencida de que estava certa.

— Pessoal – chama Murilo fazendo Fabiano e Sofia se virar em sua direção — Eu e a Ashley  fizemos uma aposta: Ashley acredita que a onça não irá capturar o Jacaré e eu já acho que ela o fará sem problema algum.

— AAlááá Guri, essa eu quero ver – diz Fabiano, empolgado.

—Go, Ashley! – grita Sofia colocando  a mão na boca em seguida.

— Por que contou a eles? – questiona Ashley, sem graça.

—  Oras, nós precisamos de testemunhas. Vai que você decide esquecer o que disse.

— Eu não sou os seus pais – rebate Ashley se arrependendo logo em seguida das palavras ditas.

— Vamos ver – comenta Murilo olhando em direção a margem.

 Todos os passageiros dos barcos ficaram em silêncio,  respeitando o ambiente dos animais. O Jacaré permanece no mesmo lugar com a boca aberta sem se preocupar, enquanto a onça se aproxima. Ela está prestes a atacar quando o outro animal corre em direção à água, para satisfação de Ashley que já se vira para dizer que venceu a aposta. Então um barulho na água chama sua atenção: A onça mergulhou no rio.

Murilo sorri enquanto todos observam a onça-pintada saindo da água com o jacaré ainda vivo na boca. Ela sobe um barranco com o animal entre as presas. Já em terra, o felino solta o jacaré para se recuperar do esforço, para felicidade do Murilo que não consegue esconder a euforia diante a derrota de Ashley.

— Como sabia que ela iria conseguir? – questiona Ashley.

—Na verdade eu não sabia – confessa Murilo — Porém, aposto que ela tinha plena certeza que daria certo.

— Como ela pôde ter tanta certeza? Como ela conseguiu se arriscar tanto assim? – questiona Ashley sem entender.

— E por que não se arriscar? – rebate Murilo erguendo os ombros.

— Oras, era só ver o tamanho daquele Jacaré e a probabilidade dele levá-la para dentro da água.

—Mas ela não viu nada disso. A onça apenas levou em conta do que era capaz. A onça é uma exímia nadadora, tem velocidade e um ótimo ataque. Do que mais ela precisaria para conquistar a sua presa?

— De qualquer forma, parecia uma missão quase impossível.

—Exato, QUASE. Porém, ela não sabia que era impossível e foi lá e fez. Diferente do Jacaré que ficou pensando na probabilidade da onça atacá-lo e se esqueceu que precisava se defender. Então quando o fez, foi tarde demais. Nesta situação, a confiança prevaleceu e se mostrou uma aliada poderosa.

— Entendi – responde Ashley pensativa.

— E isso serve de lição para você, Ashley – comenta Murilo.

— Para mim? – questiona Ashley apontando para si, surpresa.

— Sim, você mesma. Pare de agir como o Jacaré e seja mais como a onça. Por mais difícil que um obstáculo seja, ele não é impossível. Arrisque-se mais, confie em si mesma, ou então sempre viverá achando que é o predador quando na verdade é apenas a presa.

Ashley se vira em direção à margem, observando a onça carregar o jacaré para dentro da mata, enquanto se recorda de todas as vezes que esteve na posição do Jacaré. Então suspira, tristemente por perceber que nunca foi a onça.

 

 


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Notas finais do capítulo

[1] O minhocuçu (Rhinodrilus alatus) é um oligoqueto (minhoca), ordem que abrange os vermes que vivem na terra e alguns outros de água doce ou salgada. Todos eles são hermafroditas, têm cabeça pouco distinta e desenvolvimento direto, ou seja, sem metamorfoses. Pode medir mais de um metro de comprimento



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