Malú escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 28
Capítulo 27




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Quando Benjamin disse há algumas semanas que as mãos de Malú seriam dele, a jovem não pensou que seria tão a sério. A jovem de cabelos pretos passou a ter aulas de Libras com Benjamin após a terapia com Ariadne, pois era o único momento livre que tinha em sua agenda, já preenchida com as obrigações e agora com o baile da ASM. Ele faz questão de que Malú repita os exercícios várias vezes até achar que estava bom. No grupo, ele escrevia e ela era quem falava como se fosse sua porta voz.

No começo tinha grandes dificuldades em transmitir a mensagem, mas agora está melhorando com a ajuda do pessoal que sempre sinalizava quando ela tinha errado algo. E também por estar praticando em casa com Aline que também começou a aprender Libras com Ricardo.

As duas também passaram a ensinar algumas expressõesaos empregados, incluindo Adelaide. Praticavam a todo o momento, incluindo durante o almoço daquele dia, quando Adelaide veio servi-las. Malú sorri para a governanta e então com sua mão espalmada voltada para dentro, toca seus dedos em própria testa levemente e em seguida leva sua mão para frente a afastando de sua testa. Adelaide retribui e com as mãos espalmadas, esfregando em movimento circular a palma uma na outra em horizontal. Maria observa os gestos sem entender, o que a deixa intrigada:

— O que está acontecendo aqui? – pergunta a matriarca.

— Nada, senhora – responde Adelaide sem graça.

— A Malú agradeceu Adelaide por estar nos servindo e a Adelaide correspondeu... Em Libras – traduz Aline ajeitando seu vestido azul marinho comprado recentemente. Ainda não está acostumada com seu novo look, mas pelo menos seus cabelos estão intactos. Ela encara Maria e a alfineta — Você entenderia se aprendesse.

— Não tenho tempo para... Isso– responde Maria, secamente. Ela toma um gole de vinho, se vira para Malú e avisa — Hoje, depois da sua sessão com o Doutor Ricardo nós temos de ir comprar seu vestido para o baile.

— É uma pena perder esse evento tão importante, mas eu tenho aula com Ricardo... Não posso perder – zomba Aline piscando para Malú que a encara, séria.

—Uma pena, mas acho que dou conta de escolher um vestido com minha neta.

— Você já conseguiu um par para Malú? – pergunta Aline, curiosa.

—Não, infelizmente todos os filhos dos sócios já estão com suas respectivas parceiras. Terei de encontrar alguém digno de fora do Clube – revela Maria, séria.

— Eu acho que tenho alguém que possa ser o parceiro da Malú – comenta Aline passando manteiga em seu pão, deixando um mistério no ar.

— E quem seria? –pergunta Maria tão curiosa quanto Malú que para de comer olhando para sua tia.

— Benjamin – revela Aline recebendo um olhar surpreso da jovem —O professor de Libras da Malú.

— E por que seria ele alguém digno de conduzir a minha neta no baile? O que faz dele especial? – questiona Maria, séria.

— Simples, ele é o responsável pelo projeto... O projeto que você apresentou as Senhoras de Magistrado – explica Aline, calmamente.

— Entendo o seu ponto. Colocá–lo para dançar com a Malú, nos fará ganhar mais ponto com o projeto. – conclui Maria. Ela se vira para Malú — Convide esse jovem para vir aqui em casa, ele precisa ensaiar com você o quanto antes, já que o baile é no sábado.

Malú acena para sua avó enquanto vira seu copo de suco de uma só vez, não concorda com a ideia de sua tia Aline. Apesar de conversarem bastante, nenhum dos dois dava brecha para falar sobre assuntos pessoais e nem mesmo fazer outras atividades que não envolvessem os exercícios ou o grupo. Agora, ela teria de convidá–lo para ser seu parceiro em um baile da alta sociedade curitibana.

***

Reginaldo estaciona o veículo no subsolo da Maison, onde Maria e Malú foram escolher o vestido para o baile de apresentação da jovem. Elas entram pelo elevador vip muito usado por Maria quando decidi ir às compras com privacidade.

Assim que as portas do elevador se abrem a beleza do lugar surpreende Malú que fica de boca aberta acompanhando Maria que ignora completamente o ambiente. A gerente da Maison vem em direção à matriarca com um sorriso de orelha a orelha.

— Maria – exclama a mulher de cabelos castanhos e mechas platinadas. Ela aproxima o rosto das bochechas da Senhora Almeida, mas não ousa tocar — Quem bons ventos a trazem aqui? Veio conhecer a nossa nova coleção?

— Olá, Michele – cumprimenta Maria com um leve sorriso. Ela acena para a neta que se aproxima sem graça — Hoje, eu preciso de ajuda para encontrar o mais belo vestido para minha neta.

— Sua neta? – pergunta Michele encarando Malú, surpresa.

— Sim, e saiba que conto com sua discrição – avisa Maria, séria.

— Eu mesma atenderei vocês – informa Michele colocando a mão sobre o peito.  —Então, para qual evento?

— Baile de apresentação à sociedade da Associação de Senhoras de Magistrados – revela Maria, orgulhosa.

— Uau, um evento importantíssimo da sociedade curitibana – exclama Michele. — Venham, temos vestidos exclusivos para esse momento tão importante.

Maria caminha ao lado da gerente em direção ao departamento, enquanto Malú se arrasta atrás, aquela seria uma longa tarde.

***

— Malú, deixe–me ver como ficou o vestido – ordena Maria sentada no puf marfim de frente para a cabine.

Malú abre a cortina revelando o vestido verde musgo rodado com decote bateau com pedrarias em prata no corpete até o meio da enorme saia de tule. O topo do vestido tanto na frente e nas costas com nude aplicações de renda paetizada. A cara de desgosto da neta era a mesma que estampava o de Maria que acena para a gerente escolher outro.

— Próximo – pede Maria sendo atendida prontamente pela gerente.

Longo, curto, saia removível, rodada e lisa, rodada e tule, vermelho, verde, amarelo, pastel, azul, rosa, branco, lilás, vinho... Um a Um, os vestidos eram eliminados pelas duas que estavam há duas horas na loja e nenhum vestido as agradava.

Então Malú volta agora vestida em um tomara que caia com decote de coração. Corpo com renda preta poetizada, bordada com miçangas. Saia rodada em babados rose, com acabamento do barrado em crinol preto. Fechamento em lace–up. Na cabeça, uma tiara com uma enorme flor preta.

— Olha, se você não arrasar neste vestido, nenhum outro o fará – informa Michele.

A jovem encara sua aparência no espelho, até gosta do vestido, mas não sente nenhuma conexão com ele. Mas já está cansada de tantas trocas. E não somente ela, como a avó e a gerente. Malú balança o luxuoso vestido tentando ficar grata por ter a oportunidade de ao menos ter um vestido daqueles para ir ao baile. Ela se vira para Michele e acena confirmando que irá levá–lo.

— Ótimo – exclama Michele batendo palmas se afastando para efetuar a venda.

Maria observa Malú que ainda está analisando o vestido, sabe muito bem que a neta não gostou tanto do vestido assim, mas não se sente no direito de intervir na escolha.

Após alguns minutos, Reginaldo está colocando a enorme caixa preta com detalhes em dourado no porta malas, enquanto as duas já estão no banco do passageiro apenas esperando o motorista as levarem para casa. Malú suspira pensando em como seria fácil se sua mãe estivesse ali. Com certeza em menos de meia hora já teriam escolhido o vestido mais barato e bonito da loja e em alguma sorveteria dividindo um Milk Shake. Então ela pega seu tablet e escreve para sua avó:

“Podemos parar em um fast food?"

— Fast food? – questiona Maria arqueando a sobrancelha.

“Sim, estou com vontade de tomar sorvete"

— Acho que você pode esperar até chegarmos à mansão, já que temos sorvete lá – alega Maria com pouco caso. Ela então observa Malú suspirar e voltar para o seu canto, tristonha. Então, a contra gosto, ela ordena ao Reginaldo — Leve–nos a uma sorveteria ou algo do tipo.

Malú sorri em direção da avó que revira os olhos, nem sabe o porquê cedeu ao capricho da neta, mas já que era isso que ela queria. Maria tenta se lembrar quando foi à última vez que pôs os pés em uma lanchonete, como era chamado em sua época.

Mal Reginaldo estaciona a BMW preta na frente de uma franquia de fast food e Malú já sai em disparada até a fila do caixa. Maria vai logo atrás colocando o óculos escuros para não ser reconhecida e assim evitar qualquer manchete que a cite entrando em um lugar como aquele.

— Espere–nos aqui, Reginaldo... Tenho certeza que nossa permanência será breve – informa Maria enojada.

Porém é impossível não chamar atenção com o conjunto elegante que usa, bem como o enorme chapéu em um ambiente descontraído. Todos do local observam as duas, curiosos.

Quando chega a vez de Malú ela fica nervosa, por um momento tinha esquecido que não falava mais. Sua avó toca em seu ombro e então diz:

— Aponte o que você quer e eu peço para você.

Malú sorri agradecida por sua avó estar ali ao seu lado e então aponta para o Milk Shake de Ovomaltine, sendo interpretada por sua avó ao caixa.

— Dois? – pergunta a caixa, sorridente.

— Um só – corrigeMaria recebendo um cutucão da neta — Não, de jeito nenhum eu irei tomar isso, Malú. – a neta faz uma careta para avó que continua se recusando, até ser vencida pelo cansaço e pelo olhar de cachorrinho abandonado que a jovem faz — Está bem, dois.

Maria fica observando o preparo dos Milk Shakes com cara de nojo enquanto Malú está com água na boca só de ver o atendente fechando os copos com a tampa de plástico. Ele coloca os dois Milk Shake na bandeja e entrega para Malú, após a clara recusa da avó em tocar em qualquer canto do balcão.

A neta caminha em direção a uma das mesas com dois lugares, encostada na parede sob o olhar depreciativo de Maria que só senta após jogar um pouco de álcool em gel na mesa e na cadeira, onde irá sentar fazendo Malú ficar vermelha de vergonha.

— O que foi? Só estou me precavendo de pegar qualquer doença aqui – explica Maria sentando com cuidado.

Malú estende o Milk Shake em direção a sua avó que relutante aceita. Ela ri com gosto quando nota que Maria não tem qualquer experiência em furar a tampa com o canudo.

— Do que está rindo? Em minha defesa, na minha época não era assim.

Então a ajuda colocando o canudo em seu devido lugar. A neta então tira o tablet da bolsa transversal, e escreve:

“Como era na sua época?"

— Primeiro, éramos servidos em taças de vidro e não em copos de plástico tóxicos. Segundo, a garçonete vinha com seu bloquinho de pedidos até você, em alguns lugares elas tinham patins. – recorda Maria olhando para o ambiente — Tinha também uma Jukebox e um espaço para dançar...

“Jukebox? O que é isso?" pergunta Malú, curiosa.

— Era uma... Um aparelho provido de toca–discos. A gente colocava ficha e escolhíamos o disco que estava no auge. – explica Maria sorrindo. Então ela percebe que Malú está com a mão na testa — Seu cérebro congelou? Coloque a língua contra o céu da boca... Isso mesmo viu só?

“Obrigada" agradece Malú, realmente a dor de cabeça desapareceu. "Agora, pare de enrolar e tome o seu"

— Eu não gosto – alega Maria rejeitando seu copo.

“A senhora já experimentou?"

— Não, mas nem tudo eu preciso experimentar para saber que não gosto.

“Só um pouquinho... Por favor" pede Malú empurrando o copo em direção da sua avó.

Maria segura o copo com guardanapo e após algum tempo decidi experimentar um gole daquele líquido duvidoso. Assim que sente em seu paladar é surpreendida pelo sabor que a agrada.

“Então?" escreve Malú, curiosa.

— É... Bonzinho –responde Maria provando mais um pouco. E depois mais um gole e então quando vê tomou metade do copo – Oh, Meu Deus... Isso é tão bom.

Ela sorri em direção à neta que se surpreende. Durante todo aquele tempo era primeira vez que tinha visto um sorriso tão genuíno de sua avó. Aquilo lhe dá uma sensação de que aquela distinta senhora não é uma má pessoa como pensava.

“Posso te fazer uma pergunta?" escreve Malú, séria.

— Se for sobre isso se tornar uma rotina, a resposta é não. – responde Maria saboreando o Milk Shake.

“A senhora conheceu a minha mãe?"

Maria coloca o copo calmamente na bandeja, enquanto ajeita sua postura. Sabia que um dia seria questionada a respeito de seu contato com Anna e o momento chegara. Ela se esforça para não lembrar o dia em que se conheceram... Do olhar de Anna quando contou quem era... A esperança da jovem se esvair com suas duras palavras... O choro da jovem desamparada e iludida pelo próprio namorado... O apelo... E o acordo entre elas. Mas aquelas lembranças sempre a persistiram em sua mente, em cada segundo desde então.

— Sim, eu conheci a sua mãe – responde Maria, séria.

“Qual foi o acordo que vocês fizeram?" Malú escreve sem rodeios.

— Quem lhe disse a respeito disso? – questiona Maria, irritada.

“Não importa, o que realmente importa é que acordo foi esse. Ela já está morta então nunca irá me contar, mas você sim. Então me conte"

— Malú, isso é um assunto de adultos. Não há nada que você mereça saber. – repreende Maria.

“Mas eu quero saber... Eu preciso saber se..."

—Se a sua mãe era uma pessoa ruim? – questiona Maria, irritada. —Sua mãe foi à pessoa mais adorável, honesta e de bom coração que já conheci na vida. Se quiser saber qual foi o acordo, não irei lhe contar. Mas espero que entenda que o que nós fizemos foi para o seu próprio bem.

O silêncio toma conta da mesa, Malú vira para o outro lado fingindo observar as mesas enquanto enxuga as lágrimas que escorrem pelo seu rosto. Maria termina seu Milk Shake tranquilamente e então coloca a mão na testa chamando atenção de Malú.

— Oh céus, tinha me esquecido o quanto isso doía – comenta Maria fazendo Malú sorrir. — Na próxima, tomaremos só um sorvete, está bem?

Malú sorri feliz em saber que a avó já está cogitando um retorno.

“Conte–me então mais a respeito da sua época" pede Malú sendo atendida prontamente por sua avó que começa a contar sobre a sua geração.


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