Malú escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 16
Capítulo 15




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Malu está enfeitiçada com o toque firme e macio do rapaz a sua frente. Ela não sente medo, algo nele lhe inspira confiança, como há muito não sentia.  Ele vira seu rosto em direção à jovem e lhe dá um leve sorriso e então se vira novamente... Seus passos desaceleram.

 — Até que enfim!- exclama Graziela aliviada ao ver Malú se aproximar segurando a mão do rapaz mulato. Ela sorri nervosa, enquanto anda em direção aos dois — Eu estava preocupada com você... Minha querida - encara o jovem rapaz, curiosa e continua — Obrigada... Hã...

 — Benjamim - responde Lisbela no lugar do rapaz.

 — Obrigada, Benjamim - agradece Grazi, olhando para o rapaz — O que gostaria de receber em troca? - pergunta ao rapaz que novamente não responde a deixando irritada. Porém, ela mantém a postura benevolente — Vamos, meu jovem, não seja tímido.

 — Ele é mudo, senhora – avisa a florista, deixando Graziela sem graça.

 — Hummm... Certo. Então vou lhe dar algo que todos nós gostamos - deduzGrazi, abrindo sua bolsa. Dali tira três notas de cem reais e estende em direção ao rapaz — Tome uma forma de agradecimento, apesar de que Malú não tem preço, tenho certeza que isso fará seus irmãos comerem bem essa semana... Será que além de mudo é retardado?

Benjamim encara Graziela, demonstrando todo o asco que sente por aquele gesto. Ele passa por Malú, enquanto caminha em direção a mulher, a fazendo encolher os ombros, segurando neles e a afastando para pegar as caixas de flores atrás dela. O clima fica pesado diante da recusa do rapaz, fazendo com que Grazi fique sem jeito. Ela sorri, forçadamente, enquanto se vira para a câmera que filmou todos aqueles momentos.

 — Como podem ver, esse projeto gera a inclusão de todas as pessoas... Inclusive os deficientes.

 — Corta! - grita o diretor que se aproxima da Graziela, satisfeito — Parabéns, tomada perfeita. Agora podemos fazer as tomadas individuais e encerrar o dia de hoje.

 — Acredito que ainda falta a escolha da flor para o meu buquê... É por isso que estamos aqui, lembra?

 — Claro... Faremos isso, mas convenhamos que só o sumiço da sua enteada e toda a tensão entre você e o rapaz, já dará o ibope que gostaríamos, ou até mais. Temos que tomar cuidado em exagerar demais na película. Estou pensando até em cortar alguns momentos do dia, como essa escolha e deixar o episódio voltado no sumiço dela e na sua preocupação.

Graziela apenas acena a cabeça para o diretor e se afasta, irritada. Não pode deixar que a situação saia do controle e que tudo gire em torno de Malú. Ela olha para enteada que está brincando com um lírio entre os dedos , se aproxima e abraça a enteada , dizendo:

 — Que susto você me deu. Não deveria ter andado por aí sozinha, imagine se algo acontece com você.

Malú encara a madrasta, envergonhada, enquanto aperta o lírio nas mãos. Sente-se uma idiota por ter se perdido. 

  — Espero que ele não tenha tentado nada contra você. - continua Graziela, apontando com a cabeça em direção a Benjamim — Não é por que ele é deficiente que significa que ele não seja mau caráter. Afinal de contas, a cor já o procede. Quem cala consente , não é? - ela sorri e pega o lírio das mãos de Malú, assustando a jovem — Lírios! Bom, acho que encontramos a flor para o meu buquê... Tive uma idéia!Vamos gravar a cena em que você me entrega esse lírio como sua forma de mostrar aprovação pelo casamento. O que acha? Eu amei a idéia, irei falar com o diretor imediatamente.

Malú fica desnorteada com tanta informação que só percebe a presença de Benjamim, após a saída de Graziela. Ela se vira em direção ao rapaz que a encara furioso, entendeu toda a conversa. Ele pega mais uma caixa do chão e caminha apressado em direção oposta à Malú.

 — Ele é só mudo - explica Lisbela, aparecendo atrás do balcão. Ela encara Malú, agora desgostosa — Vocês só aparecem aqui em época de campanha e ainda são preconceituosos com o rapaz. Que adianta vocês terem tanto dinheiro sendo tão podres por dentro? - finaliza, deixando Malú sozinha.

O resto do dia foi de filmagens de Graziela. A última tomada seria entre as duas, a entrega do lírio. Malú está sendo maquiada com um maço de lírios nas mãos, então escuta gritos vindo do lado de fora do camarim improvisado. Não dava para compreender nada, então Malú sai do camarim e vai em direção a discussão acalorada que acontece na estufa das mudas, onde estão Thiago e Graziela.

 — Como você teve a audácia de trazer a Maria Luísa para cá?- pergunta Thiago, agressivo.  — E ainda nem ao menos teve a capacidade de me avisar, deixando isso a cargo da minha mãe?

 — Como assim? Você me deu carta branca, esqueceu? - alega Graziela, desentendida.

 — Sim, eu deixei que fizesse as filmagens, mas não era para envolver a minha filha! Ainda mais colocá-la no meio desse circo! – esclarece Thiago, nervoso.

 — Qual o real problema com a Malú? - questiona Graziela.

 — O que está querendo dizer? - pergunta Thiago, confuso.

 — Por que você quer manter a garota isolada de todos, como se fosse um bicho?

 — Eu?  Lógico que não quero fazer isso com a minha filha, de onde tirou essa coisa absurda? – questiona o candidato.

 — De onde eu tirei uma coisa dessas?- pergunta Graziela, irônica — Porque não parece que você se preocupa com a Malú. Sabe o que realmente parece? Que você quer isolar sua filha de todos, só para forçá-la a gostar de você. E também por que tem medo de que todos saibam que você talvez não seja um bom pai.

 — Como é que é? – pergunta Thiago, indignado.

 — Estou sendo sincera com você, Thiago.  Você é o verdadeiro culpado por ela sentir tanto ódio. Eu até a compreendo, pois eu sentiria o mesmo pelo pai que me tirou do meu lar, me trouxe para um lugar que eu não conheço não me permite sair de casa, evita falar comigo e quando fala é só para me tratar mal! Esse pai, eu não desejo nem para minha inimiga.

 — Obrigado pela sua sinceridade. É muito bom saber que essa é a imagem que você tem de mim - comenta Thiago, magoado.

 — Mas essa não é a única imagem que eu tenho de você no momento - retruca Graziela. Ela se vira e pega um lírio e entrega para Thiago — Sua filha escolheu hoje para o nosso casamento. Eu acredito que ela esteja apoiando a nossa união.

 — Lírios? - pergunta Thiago, curioso. Ele levanta a sobrancelha, pega o lírio e o leva em suas narinas, respirando fundo. Então olha para Graziela — Vou retribuir o favor que me fez anteriormente e serei sincero com relação ao que penso sobre esse gesto da Malú: Ela só está com saudades da mãe, nada além disso.

 — Como pode ter tanta certeza disso? - questiona Graziela, cruzando os braços.

 — Porque essa é a flor favorita da mãe dela. - responde Thiago, observando a cara de surpresa de Graziela. Ele guarda o lírio no bolso do terno — E para ser ainda mais sincero: Eu também estou com saudades da Anna... Muita.

Thiago encara a noiva por alguns instantes antes de se virar e sair da estufa. Ele leva um susto ao se deparar com Malú do lado de fora, escutando tudo.

 — Vamos embora, não lhe dei permissão para vir aqui - ordena Thiago, segurando o braço da filha, sem ao menos encará-la.

A mente de Thiago fervilha enquanto dirige de volta para a mansão. Não consegue acreditar que ela pensa isso dele. Aquilo o desespera, pois acredita está fazendo de tudo para ser o pai que Malú precisa. Mesmo não tendo à menor ideia de como ser o pai de uma jovem de dezesseis anos. Observa sua filha de canto de olho, enquanto tenta imaginar o que se passa na mente da jovem. Será que eu cometi um erro?  , se pergunta Thiago, preocupado.

            Mas a mente de Malú está ocupada com os eventos que envolveram Benjamim. Tenta imaginar o que o jovem pensava dela e porque ela ainda o tinha na cabeça. Quer encontrar uma maneira de encontrá-lo novamente e pedir desculpas.  Desculpas pelo o que? Deixa de ser boba Malú, você não fez nada de errado, pare de se culpar? , pensa fechando os olhos. Será que o verei novamente? Por que sinto borboletas no meu estômago? O que está acontecendo comigo?

 — Chegamos - avisa Thiago, estacionando na garagem. 

Malú desce correndo do carro e vai para quarto, onde tranca a porta e se joga na cama. Pensa em tudo o que havia acontecido, mais uma vez. Fecha os olhos e deixa o belo rosto de Benjamim tomar sua mente, a fazendo sorrir.

 — Olá, meu bem - diz uma voz feminina.

 — Olá, mamãe - responde Malú, olhando para a mãe sentada ao pé de sua cama. Ela senta feliz — Que saudades eu estava de ver você.

 — Eu também, meu anjo. – responde Anna tocando no rosto de Malú que fecha os olhos por alguns instantes — Conte-me, o que a aflige?

 — O de sempre – responde Malú se aconchegando nos braços de sua mãe — Brigas, confusões... Thiago sendo um verdadeiro pé no saco, Graziela fingindo estar tudo bem... – responde Malú mordendo levemente o lábio inferior — Hoje eu reencontrei Benjamin.

 — O menino que a salvou? – pergunta Anna.

 — Sim, ele me salvou de novo hoje. – confirmaMalú. Então ela respira fundo e continua — E acho que é a última vez que ele fará isso por mim.

 — Por qual motivo acredita nisso?

 — Porque ele me odeia agora – respondeMalú se virando para sua mãe — E eu mereço ser odiada.

 — Malú – começa Anna segurando o rosto de sua filha por entre suas mãos — Ninguém merece ser odiado... Tenho certeza que qualquer seja o motivo que levou o Benjamin a sentir raiva de você, será esclarecido. Acredite em mim, não há melhor solução que o tempo. O tempo cura feridas que nunca deveriam ser abertas. Além disso, sei que é uma menina inteligente e saberá reverter essa situação ao seu favor. Saiba que tem todo meu apoio – finaliza Anna beijando a testa de Malú antes de começar a desaparecer.

 — Será mesmo, mamãe?- pergunta Malú olhando para a luz solar em sua cama.

***

Graziela chega a seu apartamento depois de inventar várias desculpas para o diretor sobre o cancelamento da cena dela com Malú que só de lembrar faz seu sangue ferver. Mas o que a irritava mesmo, eram as palavras de Thiago, se ele queria magoá-la, tinha conseguido. Assim que abre a porta, se depara com sua irmã bebendo um Martini no sofá, tranquila.

 — O que está fazendo aqui? Você não tem nada para fazer, ver alguém, encontros... Trabalhar? - pergunta Graziela, fechando a porta.

 — Boa noite para você também - responde Vera, irônica — Pelo visto, as filmagens foram péssimas.

 — Não, elas foram ótimas. Diga-se de passagem - responde Graziela tomando a taça das mãos da irmã e bebendo em um gole só.

 — A Malú furou com você? - pergunta Vera, convicta — Se for isso, eu já esperava mesmo. Aquela menina foi criada na anarquia, logo prometer e não cumprir é algo banal...

 — Não, ela foi. Comportou-se muito bem, quer dizer, ela se perdeu no meio das filmagens, mas conseguimos aproveitar isso. - explicando Graziela, abrindo a bolsa e tirando de dentro um lírio. Ela o joga para a irmã que a encara curiosa.

 — Lírio? Não me diga que você escolheu isso para o seu casamento? - pergunta Vera com desprezo — Eu esperava um gosto refinado vindo de você, minha irmã.

 — Foi a Malú. - responde Graziela — Mas essa flor é a preferida da mãe dela, eu não consigo entender o que ela quis fazer me dando esse lírio.

 — Como sabe que é a preferida da mãe dela?

 — Porque o Thiago me contou. – revelaGrazi sentada no sofá com os olhos fechados

 — Então ele também estava lá... Interessante. Pelo visto tudo deu muito certo para o próximo episódio, então me diga o porquê dessa carranca toda? – questiona Vera.

 — Não deu nada certo. O Thiago foi lá e discutimos - confessa Graziela se levantando — Eu disse coisas terríveis para ele... Mas o pior foi o que ele me disse: Que sente falta da Anna! Na minha cara, ele teve a audácia de dizer isso!

 — Espera um minuto - pede Vera, incrédula, se levantando também — Você discutiu com o Thiago no set de filmagens? O que você tem na cabeça? Por que pôs tudo a perder? Qual o problema com você?

 — Você devia estar do meu lado! – alega Graziela, nervosa.

 — Não, eu devo estar do lado de quem vence. E você, maninha, é uma perdedora nata - insulta Vera. Ela pega o celular e estende para a irmã dela — Você vai ligar para ele agora e pedir desculpas. Você não vai jogar fora tudo o que eu fiz só por que sempre foi uma garotinha mimada. Anda, ligue para ele.

 — Não irei fazer isso- recusa Graziela.  — Ele é quem está errado e sabe disso. Daqui a pouco ele volta me pedindo perdão.

 — Você vai sim! - ordena Vera.  — Eu conheço Thiago e sei que ele não virá atrás de você.

Antes que Graziela pudesse responder , o interfone toca ,interrompendo as duas. Grazi atende, ouvindo a voz do porteiro.

 — Pode deixá-lo subir. - ordena Graziela. Ela desliga o interfone e encara irmã — Você é só a relações públicas do Thiago, eu vou me casar com ele e o conheço melhor   que ninguém a ponto de lhe informar que ele está subindo até o apartamento para me pedir perdão.

 — É o que veremos - desafia Vera, sentando no sofá.

Alguns minutos depois a campainha do apartamento toca e Graziela abre a porta, mostrando Thiago que está com a cabeça baixa.

 — Nós precisamos conversar - diz ele.

 — Entre - responde Graziela.

Thiago caminha para dentro do apartamento, acena para Vera e pede:

 — Vera, será que pode nos deixar a sós?

 — Claro que sim, querido - responde Vera, olhando para a irmã. Ela se levanta e antes de deixá-los sozinhos — Comportem-se, crianças.

 — O que gostaria Thiago? Veio continuar me humilhando dizendo que está com saudades da Anna? – alfineta Graziela.

 — Não. Preciso conversar com você. Quero saber o que você acha a respeito da minha relação com a Malú , sobre o que eu devo fazer com relação a ela. – responde Thiago.

 — Sinceramente? - pergunta Graziela, desconfiada.

 — Sinceramente- confirma seu noivo.

 — Eu acho que deveria parar de forçar a situação. Eu sei exatamente pelo o que ela está passando e sei que isso não está dando certo. Thiago, ela precisa de suas raízes. A Malú precisa da vida que ela tinha e você não está dando isso. Como você acha que ela vai superar essa tragédia a mantendo em um cárcere privado? E sem contar que você ainda não está pronto para ser pai, ainda mais de uma adolescente de 16 anos com os hormônios a flor da pele. Convenhamos você não participou em nada nesses 16 anos e não sabe absolutamente nada sobre ela. – afirma Graziela.

 — O que sugere? - pergunta Thiago, sério.

 — Que a liberte - responde Graziela — ela precisa de tudo o que tinha antes, da vida dela antes. Liberte-a. E liberte-se dessa responsabilidade, pois ela é demais para você. Se ao menos tivesse alguém que soubesse melhor a respeito da Malú, seria mais fácil.

 — Eu não posso fazer isso, Grazi - alega Thiago, pensativo.

 — Então não posso ajudá-lo. – conclui Grazi com os braços cruzados.

 — Tudo bem - concorda Thiago, caminhando em direção a porta.

 — É só isso? - questiona Graziela, nervosa.

 — O que foi Grazi? – pergunta Thiago virando em direção a noiva.

 — Não sei, achei que fosse falar a respeito do que aconteceu hoje à tarde, pedir desculpas pelo modo como me tratou. – alegaGrazi.

 — Você passou dos limites, Graziela e ainda quer que eu te peça desculpas? - pergunta Thiago, confuso.

 — Eu não passei dos limites. Você foi grosso, rude e sabe disso. – pontuaGrazi.

 — Eu não vim até aqui brigar com você. Acho melhor eu ir embora - finaliza Thiago, saindo do apartamento.

Graziela observa a porta se fechar, desnorteada. Não esperava que a conversa fosse terminar daquela forma.

 — Ele pode ser o seu futuro marido, mas eu sou a relações públicas dele, querida - comenta Vera, atrás da irmã — Acho bom você mudar sua estratégia, se ainda quiser ser uma Almeida.

***

Thiago desce do carro devagar, entra na mansão e caminha em direção ao escritório, onde senta na cadeira e fecha seus olhos. Sente o cheiro adocicado do lírio e lembra que o guardou em seu bolso. Ele o segura em sua frente, pensativo, o girando devagar.

 — Diga-me o que fazer Anna. Eu preciso da sua ajuda... Preciso que me diga o que fazer para a nossa filha gostar de mim... Por favor... Ajude-me - pede Thiago.  

Então ele pára por alguns instantes, antes de pegar o telefone e discar para o escritório de advocacia. Talvez aquela fosse a única alternativa. Assim que sua secretária atende:

 — Preciso que compre passagens com destino a Belo Horizonte para amanhã bem cedo.


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