Malú escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 11
Capítulo 10




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Capítulo 10

 — Essa não era a pauta da entrevista, meu caro colega - alega Thiago tentando não demonstrar seu desconforto com a pergunta do jornalista — Estamos aqui para falar de política, do que fiz, do que faço e o que farei lá na frente pelo Paraná e por Curitiba. Próximo

 — O senhor disse que sua vida era um livro aberto, quando divulgou seu noivado com a mãe do que seria seu primogênito. E que não tinha de problemas em responder sobre sua vida pessoal. O que mudou nesses três meses? Tem vergonha da sua filha bastarda? - pergunta a jornalista ruiva acidamente.

 — Bom, já disse que essa entrevista é sobre política. Claro que não tenho problema algum em responder sobre minha vida pessoal, mas no momento esse não é o foco. - responde Thiago. Ele aponta para o homem careca a sua frente  que está com a mão erguida — Pode perguntar.

 — O senhor não acha que os eleitores devem saber a respeito da jovem? Ou será que o que saiu nos jornais é verdade. Ela é seu affaire juvenil?

 — Isso é um absurdo - exalta-se Thiago — Eu jamais me envolveria com uma adolescente. Eu achei que essa coletiva fosse para falarmos da minha campanha...

 — Seria, se o senhor não tivesse simplesmente desaparecido e depois surgiu com essa jovem com quem anda para cima e para baixo. Como podemos confiar que o senhor não irá sumir após eleito, se o senhor nem se quer fala quem é a jovem - argumenta o primeiro repórter.

 — Isso mesmo – concorda um repórter ao fundo.

 — Cadê o livro aberto? - pergunta outro do lado esquerdo.

 — Será que é apenas uma falácia? - pergunta bem ao centro.

Thiago vê a coletiva se tornar um burburinho de difamações contra ele. Por alguns instantes o candidato abaixa a cabeça e então se levanta dizendo:

 — Maria Luísa Braga de Almeida, esse é o nome da jovem a quem vocês demonstram ter tanto interesse, até mais do que saber como faria a educação, a saúde a segurança e os demais setores, caso eu fosse eleito a senador. Já que vocês preferem à fofoca a melhoria na qualidade de vida: Ela é minha filha. Minha primeira e única filha. Ela não é bastarda, como alguns de vocês, vergonhosamente, insistem em dizer. Ela é um fruto de um amor puro, o mais puro e verdadeiro que pude ter em minha vida e que infelizmente acabou sucumbindo à morte recentemente. Eu fui até lá me despedir da mãe da minha filha que hoje só tem a mim no mundo e quero poder suprir o que falta na vida dela. Então peço a vocês que respeitem a minha filha, pois se alguém aqui já perdeu alguém próximo que amava mais que tudo, sabe o quanto é importante um tempo tranquilo, sem perturbações... Então se pudermos voltar ao foco que é a campanha, me sentirei extremamente agradecido por isso.

Ele senta novamente e aos poucos os repórteres voltam aos seus lugares e direcionar as perguntas para a campanha do candidato. 

 — Seu pai pediu para você subir - lembra Vera, assustando Malú que escutou tudo do topo da escada.

A jovem encara a loira e sem dizer nada vai para o quarto, pensativa. É estranho para Malú ouvir que Thiago realmente sentiu algo pela sua mãe e que de certa forma, a defendia, mesmo sendo estúpido com ela, um pouco antes. 

Malú se levanta da cama e vai até a porta secreta, onde entra. Não queria pensar mais naquilo, então decidiu que era melhor começar a conhecer os livros da biblioteca. Assim que abre a porta se depara com um vulto fechando rapidamente a outra porta.

Ela corre em direção à outra porta que é trancada do lado de fora. Droga! Pensa Malú forçando a maçaneta, sem sucesso. Vira-se para a estante e percebe que o livro Diva está se destacando, ficando mais a frente que os demais. Aproxima-se da estante e tira o livro, fazendo assim cair o papel que estava dentro. Era o mesmo que ela havia colocado. Lê atentamente o que ela mesma tinha escrito e a mensagem nova.

“Bom gosto para Leitura. Abraços, Malú.”

“O livro é realmente muito bom, mas não é o melhor dessa biblioteca. Atenciosamente.”

Ela sorri e vai até a escrivaninha, onde encontra o lápis para responder a pessoa desconhecida. Pensa um pouco e então escreve:

“Então me diga qual é o melhor livro daqui? Malú”.

Ela dobra o papel calmamente e coloca novamente dentro do livro.  Deixa-o guardado junto com os demais livros. Assim mostraria que tinha lido a mensagem. Ao lado do livro está o exemplar que Ícaro havia lhe dado a fazendo entristecer. Pega o livro que está ao lado oposto, A Viuvinha, sentando na escrivaninha para ler. 

Concentra-se tanto no livro, imersa ao mundo que José de Alencar havia criado que nem percebe as horas passarem. Ela já está quase finalizando o livro, quando escuta o badalar do relógio central da mansão dar suas sete badaladas. Sete horas, droga, perdi o jantar, pensa correndo para fora da biblioteca.

Malú já fechava sua porta secreta, quando Thiago entra abruptamente em seu quarto. Ele a encara surpreso e então fecha a porta do quarto demonstrando uma leve irritação com o gesto.

 — Onde você estava? Procurei por você por toda a parte! - comenta Thiago colocando as mãos na cintura. Aquele gesto fez com que Malú se encolhesse com medo de que ele fizesse algo de ruim com ela. Seu pai passa as mãos nos cabelos negros com alguns fios brancos que surgiram por esses dias — Bom, vim dizer que amanhã você irá para a escola novamente. Esteja em pé às sete horas da manhã em ponto esperando o motorista no hall de entrada.

Da mesma forma repentina que Thiago entrou, saiu deixando Malú atordoada. Ela senta na cama nervosa, não quer nunca mais voltar para aquela escola. Tem certeza que o que eles fizeram hoje será muito pior amanhã. Ela sabe dar um jeito de fugir daquela casa e depois dar um jeito de voltar para Minas.

***

Thiago fecha a porta do quarto de Malú, pensativo. Ele balança a cabeça negativamente se repreendendo por mais uma vez não cumprir o que havia prometido a si mesmo: aproximar-se de Malú. Por algum motivo, toda vez que se aproxima da jovem, sua postura autoritária predomina na situação e daquela vez tinha visto nos olhos de sua filha certo medo. 

 — Ainda bem que te encontrei - diz Vera Lúcia atrás do candidato. Ela tem nas mãos, papéis das pesquisas da campanha — O resultado parcial da campanha saiu: Você caiu dez pontos.

 — O que significa? - pergunta Thiago pegando os papéis da mão da cunhada, tentando entender todos aqueles números.

 — Que estamos com 0,1% de aprovação do eleitorado. Você é o candidato mais indesejado dessas eleições para senador - responde Vera com a expressão de quem queria machucar Thiago com suas palavras.

 — E qual a sua ideia para reverter essa situação? 

 — É melhor irmos para o escritório, afinal três cabeças pensam melhores que uma.

 — Três cabeças? - pergunta Thiago, confuso.

 — A Grazi nos aguarda no escritório. Até o momento, acredito que a minha ideia é a melhor.

 — E Qual seria?

 — Está na hora de colocarmos a Maria Luísa, sua filha, no foco da sua candidatura. É assim que venceremos essas eleições.

***

Graziela está sentada no sofá com uma das inúmeras fotos da família Almeida, quando sua irmã e seu noivo entram na sala. Pela expressão de Thiago, ela percebe que Vera tocou novamente na ferida dele e que não tinha dado certo.

  — Um aviso para as duas: A Malú está fora da campanha. Não quero mais ouvir falar dessa ideia absurda. Ela nem bem chegou a Curitiba e já querem abusar da minha filha.

 — Não é abuso, Thiago. É trunfo, um trunfo que você tem, mas por algum motivo está com medo de usar- reage Vera.

 — De qualquer forma, essa ideia está fora de cogitação - retruca Thiago sentando ao lado da Graziela. Ele segura na mão da noiva — Mais alguma ideia?

Graziela se ajeita no sofá, virando o corpo em direção ao noivo. Ela sorri pra ele e depois para sua irmã e diz:

 — Bom, a minha ideia, que acredito ser a mais coerente, seria colocar o nosso casamento em pauta.

 — Mas nós já realizamos isso - recorda Thiago — Em nosso noivado, no começo da campanha.

 — Sim... Só que a minha ideia é que nós definíssemos a data. E mais, que os eleitores acompanhassem todo o processo desse momento das nossas vidas. Tenho certeza que isso iria atrair os nossos eleitores. O que acha? - finaliza Graziela com um sorriso de orelha a orelha.

 — Eu discordo totalmente dessa ideia - responde Thiago irritado. Ele coloca a mão no rosto e encara a noiva — Eu achei que tivéssemos combinado de resolver isso após a eleição. Além disso, você tá querendo transformar a nossa vida em um reality show, ou foi só impressão minha?

 — Não seria bem um reality, só divulgaríamos mais os nossos momentos pessoais, todo o material passaria por suas mãos, até você aprovar qual poderia ser colocado na mídia. Eu sei que está com a cabeça quente, mas pense por um momento em como isso será bom para a campanha. 

 — As pessoas hoje adoram saber da vida intima dos outros - argumenta Vera, acendendo um cigarro — Com certeza isso alavancaria a suas eleições, não como a sua filha, mas já salva a pátria.

 — Eu não quero a minha vida exposta - explica Thiago olhando para a Vera.

 — Mas é o preço que se paga, se quer mesmo ser senador. - rebate Vera. Ela dá uma tragada forte e então expele a fumaça calmamente — A menos que você não... Bom é melhor eu não falar isso. Talvez seja só impressão...

 — O que irmã? Diga logo!

 — A menos que o Thiago não queira casar com você, irmã - responde Vera, com seu olhar perverso. Tinha acabado de plantar a semente da discórdia entre os noivos.

 — Você não quer casar comigo, Thiago? - pergunta Graziela, encarando o noivo.

 — Não é isso, Grazi... Eu só não acho saudável que essa pressão caia sobre o nosso casamento. Sem contar que ainda temos alguém que está me ameaçando, se nós decidirmos fazer isso, ele pode ir atrás de você. Não acho que devemos apressar as coisas, afinal tínhamos combinado que nós veríamos a data após as eleições. 

 — Na verdade, você impôs isso para o nosso noivado - relembra Grazi, irritada. Ela se levanta e coloca as mãos na cintura olhando para Thiago — Sabe esses anos todos de relacionamento, foi conforme o que você queria. Nunca é o momento para o próximo passo. Mas agora EU QUERO! Eu também faço parte desse noivado e eu desejo ter o maior casamento que Curitiba, ou melhor, do Paraná e quem sabe do Brasil! Eu quero que ele seja acompanhado por todos e invejado por ser perfeito! Eu quero andar pelas ruas escolhendo tudo para o casamento!Eu quero uma data! E se você não me der uma, eu vou embora e nunca mais volto a colocar meus pés aqui! Então Thiago. O que vai ser?

Thiago encara a noiva sem acreditar naquela enxurrada de palavras proferidas por ela que agora o olhava séria. Ele abaixa a cabeça e coloca as mãos fechadas sobre os joelhos. Graziela ainda espera mais alguns minutos, sem sucesso e então pega sua bolsa que está ao lado dele e vai em direção da porta.

 — Graziela - chama Thiago ainda de cabeça baixa. Ela se vira olhando para ele irritada. Thiago levanta a cabeça e a encara com os olhos marejados — Escolha a data. Vamos fazer o que você quiser.

Ela sorri e sai do escritório, agora com um olhar de quem finalmente havia conseguido vencer uma batalha.

***

Assim como o combinado, às sete horas o motorista apareceu e a conduziu para o carro sem falar nada. Ela até agradecia, assim não teria de fingir que estava prestando atenção, conseguindo focar sua mente no plano de fuga. Aquela era a sua oportunidade e não iria desperdiçar.

Jaime encosta o carro em frente ao renomado colégio e ajuda Malú a tirar suas coisas do carro. Ele ajeita seu terno preto e entra no carro novamente. Malú acompanha o carro até onde sua vista não consegue alcançar. Ela olha para trás de si e percebe que ninguém tinha notado sua presença, sorri e caminha calmamente na posição oposta à escola.

Ela olha para o céu e sorri pensando em como foi fácil fugir. Maria Luísa apressa os passos, atravessando rua após rua alegremente. Está tão feliz que nem presta atenção no trânsito em sua volta. Ela só pensa que em breve estará em casa, junto com Aline. Corre em direção ao outro lado da rua e nem percebe que o sinal estava verde.

BÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌÌ!

Buzina o carro em alta velocidade, vindo a toda em direção da Malú que trava no meio da rua. Ela fecha os olhos e pensa: É o fim. 

Malú sente seu corpo ser arrastado... 

Em direção à calçada por dois braços a envolvendo, o que a faz abrir os olhos e encarar o rosto mulato em sua frente... É a última coisa que Malú vê antes da escuridão tomar conta.


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